Acórdão nº 1904/16.4BELSB-A de Tribunal Central Administrativo Sul, 04 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução04 de Outubro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I- RELATÓRIO O MUNICÍPIO DE LISBOA, e a Contra-Interessada VALOR ………………………………………, S.A., com os sinais dos autos, inconformados com a decisão do TAC de Lisboa que, no âmbito do processo de contencioso pré-contratual instaurado pela Douro………….- Medição e ………………….. S.A., indeferiu o pedido de levantamento do efeito suspensivo deduzido pela ora Recorrida, vieram interpor recurso jurisdicional ao abrigo do disposto nos artigos 142, n.º 5, 143.º, n.º 1, e 147.º do CPTA e 644.º n.º 1, al. a), parte final, e n.º 2, al. h), do CPC.

As alegações de recurso que O MUNICÍPIO DE LISBOA apresentou culminam com as seguintes conclusões: “1. Em 20 de abril de 2017 foi proferida douta decisão que julgou improcedente o pedido de levantamento do efeito suspensivo requerido pelo Réu Município de Lisboa nos presentes autos.

  1. O concurso suspenso tem como objeto a "Aquisição de Gás Natural Comprimido (GNC) para os veículos da frota municipal" e não se vislumbra no petitório da Autora quaisquer interesses superiores aos do Réu. 3. Como refere o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, com data de 24 de novembro de 2016, disponível em www.dgsi.pt. o regime que parece resultar dos n° 2 e n° 4 do artigo 103º-A, à luz da letra da lei e da teleologia, é que a metodologia decisória deve passar pela ponderação racional de todos os interesses em presença e de todos os danos respetivos, ponderando os prejuízos a causar pela continuação do efeito suspensivo automático ou a causar pela retoma do prosseguimento do procedimento pré-contratual na fase pós-adjudicatória, sendo que, com base nestas premissas, o Juiz deve decidir levantar o efeito suspensivo da interposição da ação se concluir que os prejuízos que resultarão da manutenção do efeito suspensivo se mostrarem claramente superiores aos prejuízos que possam resultar da retoma do prosseguimento do procedimento.

  2. Ao contrário do referido na douta decisão, o Réu no presente processo não se bastou em alegar "factos em abstraio, de provocar as consequências típicas havidas como prejuízo ou como causa do prejuízo invocado".

  3. Ficou provado que o Réu dispõe de 50 viaturas na sua frota de recolha de lixo movidas a GNC e que o total de resíduos urbanos recolhidos anualmente é de 291.789 toneladas, o que, dividindo por 365 dias, dá cerca de 800 toneladas recolhidas diariamente.

  4. No total de 172 viaturas, cerca de 1/3 das viaturas da frota do Réu para recolha de resíduos poderá ficar parado, ou seja, 266 toneladas de lixo não serão recolhidos diariamente, ou seja, cerca de 8000 toneladas ao fim de um mês.

  5. Por parte da A., nenhum prejuízo ficou provado, tendo esta apenas meras expectativas, económicas com a eventual adjudicação do contrato.

  6. O Tribunal motivou a presente decisão, na parte em que apreciou o mérito do incidente, na necessidade de ser realizada uma operação de ponderação dos prejuízos segundo um juízo de proporcionalidade e no facto de caber ao requerente não só o ónus de alegar e provar os factos concretos que demonstrem as condições legais que depende o levantamento do efeito suspensivo automático, bem como, a demonstração da gravidade dos danos que resultariam para o interesse público e/ou da desproporcionalidade dos danos - o que o Réu fez.

  7. Ao contrário do referido pelo Tribunal o juízo de gravidade ou de proporcionalidade não tem de ser de certeza ou de probabilidade quase a tocar a certeza.

  8. O Réu cumpriu com a exigência legal para o levantamento do efeito suspensivo automático, ou seja, provou que a manutenção da suspensão do ato impugnado é gravemente prejudicial para o interesse público, na medida em que propiciará a imobilização das viaturas movidas a GNC e provou ainda que as consequências lesivas são desproporcionais para os interesses envolvidos.

  9. Na sua decisão o Tribunal refere que os prejuízos invocados pelo Município de Lisboa são meras possibilidades abstraías e que não está demonstrada "... a gravidade, em concreto, a exata magnitude dos prejuízos invocados..." (negrito e sublinhado nosso).

  10. Esta exigência referida no artigo anterior, para o eventual deferimento do pedido de levantamento do efeito suspensivo automático, imputaria ao Réu uma muito difícil ou inultrapassável tarefa, consubstanciadora de uma probatio diabólica.

  11. Como bem refere o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte, com data de 21 de outubro de 2016, disponível em www.dgsi.pt. "Inquestionavelmente a continuidade do funcionamento eficaz do serviço de recolha do lixo é uma necessidade geral imperiosa, por irreparáveis os efeitos nocivos para a saúde e higiene pública previsivelmente advenientes da perturbação e descontinuidade dessa tarefa, em contraponto e sem qualquer dúvida em sobreposição ao interesse privado, de índole económica...".

  12. O Tribunal absteve-se, contrariamente ao que se lhe impunha, da tarefa de analisar as provas interpretativamente.

  13. Com base na prova por presunções judiciais, previstas nos artigos 349° a 351° do Código Civil, pensamos que o julgador pode preencher o requisito necessário para o levantamento do efeito suspensivo automático, previsto no artigo 103-A, n.º 2 do CPTA, ou seja, que a manutenção do efeito suspensivo será gravemente prejudicial para o interesse público defendido pelo Réu no caso concreto.

  14. De referir ainda, que o regime do contencioso pré-contratual ao remeter para o artigo 103-A, n.° 2, não exige uma prova stricto sensu - mas apenas uma prova sumária do direito ameaçado, não cabendo neste regime, urgente por natureza, a produção de prova em quantidade tal e de exigência técnica rigorosa, por parte do demandado e dos contrainteressados, que impossibilite o julgador de analisar a mesma no curto prazo legal que dispõe para decidir.

  15. O Réu Município de Lisboa, fez prova no presente incidente dos superiores interesses públicos que defende face aos interesses da A..

  16. A obrigação de gestão dos resíduos urbanos por parte do Réu - com a finalidade de garantir a saúde, segurança e higiene urbana, obviando nomeadamente aos riscos iminentes para a saúde pública decorrentes do abandono dos resíduos nos contentores ou na via pública - decorre da própria lei, nomeadamente, o Regime Geral da Gestão de Resíduos, Decreto-Lei n.° 178/2006, de 05 de Setembro, com um regime contra-ordenacional ambiental muito severo para o Réu, constituindo um direito fundamental e constitucionalmente protegido, artigo 66° da CRP.

  17. É de conhecimento intuitivo geral o facto de uma ineficiente gestão de resíduos urbanos representar perigos vários para a saúde e para o meio ambiente.

  18. Como refere o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Norte supra referido, de 21 de outubro de 2016, citando e aderindo à decisão proferida pelo TAF em processo com o n.° 123716.6BEPRT, em que foi decretado o levantamento do efeito suspensivo a propósito do dever que assiste ao Município em zelar pelo regular serviço de recolha de lixo «E um interesse notoriamente público, que não pode estar sujeito às vicissitudes de quebras contratuais ou a incertezas de continuidade ou às delongas de um procedimento concursal, mesmo que motivos legais o possam eventualmente inquinar. E é de um interesse público de extrema relevância, porquanto, não se admite sequer a hipótese de vir a ser perturbado ou interrompido sob pena de, como assevera o R., vier a estar em crise apropria higiene dos espaços públicos e, pior, a saúde pública.».

  19. Acresce que, tal situação agravaria o não cumprimento das metas definidas para a recolha seletíva de resíduos urbanos da cidade, estipuladas na Diretiva Europeia 2004/12/CE, de 20 de dezembro de 1994 e no PERSU 2020, aprovado (Portaria n°187-A/2014, de 17 de Setembro), lesando gravemente os interesses públicos defendidos pelo Réu.

  20. Resulta de toda a argumentação expendida no presente processo, e dos factos provados, que o único interesse da A. é de natureza exclusivamente económica, o que sucumbe, de forma evidente, perante o interesse público defendido pelo Réu e subjacente à contratação do objeto em causa, nos presentes autos.

  21. Por fim, o Tribunal refere que o Réu dispõe de soluções alternativas para assegurar a continuidade do serviço uma vez que o CCP autoriza o recurso ao ajuste direto para celebração de qualquer espécie de contrato, através do "critério da urgência imperiosa" previsto no artigo 24°, n.° l, alínea c) do CCP, sendo que ao defender esta solução está ele próprio a reconhecer que a manutenção do efeito suspensivo automático é gravemente prejudicial para elevado interesse público sustentado pelo Réu nos presentes autos.

  22. Sem prejuízo do que foi dito até agora, acresce que o Tribunal "agarrou-se" ao número de viaturas que constam no relatório da ERSAR junto aos autos pelo Réu, no total de 172, e não às 98 indicadas pelo Município de Lisboa na sua Contestação, sem atender à justificação prestada pelo Réu e à prova que consta no referido relatório da ERSAR.

  23. A discrepância dos números foi explicada pelo facto de a ERSAR contabilizar todas as viaturas que no decorrer de 2015 realizaram transporte de resíduos, mesmo as viaturas descontinuadas para o serviço de recolha de resíduos urbanos e que apenas realizaram num dia especifico um único circuito de recolha de resíduos.

  24. Por outro lado, e resulta ainda do Relatório da ERSAR o facto de o volume de consumos de GNC das viaturas do Réu afetos à recolha de resíduos ser bastante superior ao volume de consumos das viaturas movidas a gasóleo, o que comprova a argumentação levada a cabo pelo Réu e demonstra que o número de resíduos recolhidos pelo Réu é feito maioritariamente com recurso à frota de viaturas movidas a GNC.

  25. Por todo o exposto, pelos factos dados como provados na douta decisão (sem prejuízo do que referimos supra no que se refere à falta de atendimento de restante prova produzida pelo Réu), pelo prejuízo que ficou provado por parte do MUNICÍPIO DE LISBOA...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT