Acórdão nº 13723/16 de Tribunal Central Administrativo Sul, 19 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCH
Data da Resolução19 de Janeiro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório Luís ………….. (Recorrente) intentou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa contra o Instituto da Segurança Social, I.P.

(Recorrido) acção administrativa onde peticionou a anulação do acto que indeferiu o pedido por si efectuado de atribuição do Rendimento Social de Inserção e a condenação do Recorrido a conceder-lhe o mesmo.

Por sentença de 30.10.2015 a acção foi julgada improcedente e o Instituto da Segurança Social, I.P.

absolvido do pedido.

Não se conformando com o assim decidido veio o ora Recorrente interpor o presente recurso para este Tribunal Central Administrativo, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: 1ª. Ao contrário do decidido pela douta sentença recorrida, o acto administrativo padece do vício de forma por preterição de formalidade essencial, pelo que ao decidir em sentido contrário a douta sentença recorrida violou os arts. 100º e seguintes do CPA.

  1. O princípio da participação dos particulares na formação das decisões que lhes disserem respeito foi violado pelo acto em questão, pelo que ao não considerar como tal, a douta sentença recorrida violou o referido princípio.

  2. Por outro lado, quer a entidade demandada, quer a douta sentença recorrida fazem um enquadramento imperfeito da natureza dos títulos de residência dos elementos do agregado familiar do A., sendo que ao decidir no sentido de não integrar o agregado familiar do Recorrente na al. a) do n.º 1, do art.º 6º do D. L. N.º 133/2012, de 27/06, a douta sentença recorrida violou o artigo 20º, n.º 2, da Lei n.º 37/2006, de 09/08 e a referida disposição legal.

  3. Além do mais, acresce que o A./Recorrente encontra-se involuntariamente desempregado, sem auferir qualquer rendimento (como se encontra documentado no processo instrutor) necessitando do deferimento do seu pedido para fazer face à pobreza e exclusão social, já que tem direito a uma existência condigna que entronca no princípio da dignidade humana, pelo que a douta sentença recorrida violou o art.º 63º, n.º 3, da CRP ao decidir em sentido contrário.

  4. . E, salvo o devido respeito, não colhe a opinião expendida pela douta sentença recorrida de que os requisitos são cumulativos, no sentido de por tal razão ter que ser negada a atribuição do RSI ao Recorrente a título individual, se o requisito previsto na al. b) do n.º 1, do artigo 6º, da Lei 13/2003 não estiver preenchido, pois tal interpretação, para além de ser inconstitucional por violar o princípio da igualdade previsto no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa, pressupõe a atribuição do RSI ao agregado familiar e não a título individual, até porque, se o A., que é cidadão nacional, continuasse a não ter o seu agregado familiar em Portugal e solicitasse a atribuição de RSI, seguramente que não teria que preencher, cumulativamente, os requisitos previstos nas alíneas a) e b), do n.º 1, do referido artigo 6º, pois nesse caso, as mesmas são contraditórias e impeditivas de preenchimento cumulativo, pelo que ao decidir em sentido contrário, a douta sentença recorrida violou o art.º 13º da CRP.

  5. Por outro lado, a interpretação dada pela douta sentença recorrida ao artigo 6º, n.º 1, al. b) e n.º 4 da Lei n.º 13/2003, de 21/05, ao considerar que relativamente ao tempo de residência legal em Portugal dos membros do agregado familiar do Recorrente, nacionais de um país terceiro, a norma exige que seja não inferior a três anos à data do requerimento de atribuição de rendimento social de inserção, padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da equiparação previsto no art.º 15º da CRP e do princípio da proporcionalidade.

  6. Em matéria de direitos dos estrangeiros há que atentar no princípio da equiparação, constante do artigo 15.º da CRP, que estabelece, no n.º 1, que "os estrangeiros e os apátridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e estão sujeitos aos deveres do cidadão português". Sendo certo que o n.º 2 do mesmo artigo prevê a possibilidade de reserva, por via legislativa, de determinados direitos aos cidadãos portugueses, a CRP impõe como regra uma atitude de abertura ao cidadão estrangeiro (cfr. art.º 19º, n.º 6 CRP) e em legislação ordinária.

  7. E qualquer restrição legal do princípio da equiparação só será constitucionalmente legítima, se for exigida pela salvaguarda de outro direito ou interesse constitucionalmente protegido, e se se limitar ao necessário para assegurar tal salvaguarda, pelo que a medida restritiva deverá subordinar-se ao princípio da proibição do excesso ou da proporcionalidade em sentido amplo, com as suas três dimensões - necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido restrito.

  8. Ao RSI é reconhecido um grau de fundamentalidade, com íntima ligação ao princípio do respeito da dignidade humana, proclamado logo no artigo 1.º da Constituição e decorrente, igualmente, da ideia de Estado de direito democrático, consignado no seu artigo 2.º, e ainda aflorado no artigo 63.º, n.ºs 1 e 3, da CRP, que garante a todos o direito à segurança social.

  9. O Tribunal Constitucional caracterizou o Rendimento Social de Inserção como o direito constitucional a um mínimo vital, de existência condigna, decorrente do princípio da dignidade da pessoa humana, e, nessa medida, deverá verificar-se um motivo forte para se impor uma exceção ao princípio da equiparação nesta vertente, devendo a restrição imposta aos estrangeiros relativamente ao RSI limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

  10. O princípio da proporcionalidade, nesta matéria, exige que as medidas restritivas legalmente previstas sejam o meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei e que os meios restritivos e os fins obtidos se situem numa "justa medida", pelo que o requisito que impõe a residência legal por um período mínimo de 3 anos para atribuição do RSI aos estrangeiros se afigura desnenecessário, inadequado e desproporcional, tendo em conta os valores constitucionais que com ele se visam, em especial a salvaguarda da sustentabilidade do sistema global de segurança social.

  11. Face à abertura manifestada no artigo 15.º da CRP, ao consagrar como regra o princípio da equiparação, a exclusão dos estrangeiros residentes legalmente em Portugal há menos de 3 anos não se afigura proporcional, em sentido estrito, para salvaguardar outros valores constitucionais, sendo que na ponderação a efetuar, há que dar o devido relevo, por um lado, às exigência legais estabelecidas no regime de jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento do território português, por outro, à natureza e ao peso do direito em causa - verdadeiro direito a uma prestação que garanta um mínimo de sobrevivência, pelo que só uma fortíssima razão, uma necessidade evidente, poderá justificar a dilação de 3 anos imposta.

  12. Refira-se que a Lei 23/2007 estipula que "é garantida a aplicação das disposições que assegurem a igualdade de tratamento dos cidadãos estrangeiros, nomeadamente em matéria de segurança social" (artigo 83.º, n.º 2), sendo que só serão elegíveis como titulares do direito ao Rendimento Social de Inserção os cidadãos estrangeiros aos quais tenha sido concedida pelas autoridades portuguesas uma autorização de residência, sendo que a maioria dos estrangeiros admitidos segundo as regras definidas pelo Estado que os acolhe - que venham a encontrar-se em situação de necessidade tal que justifique o requerimento do Rendimento Social de Inserção, assim se encontrarão devido a circunstâncias de vida ocorridas após a concessão da autorização de residência, e que consistirão em factos como doença ou desemprego do beneficiário principal.

  13. Efectivamente, a exigência de um prazo de residência legal de 3 anos para concessão do RSI a cidadãos estrangeiros, com o intuito de prover à sustentabilidade da segurança social, sacrifica um direito a uma prestação que garante um mínimo de existência socialmente adequado, pelo que a imposição de um prazo tão longo não deixará, muitas vezes, de comprometer o acesso, em tempo útil, a um benefício que assegura necessidades mínimas vitais a cidadãos em situação de grave carência económica e de desinserção social e profissional, pondo irremediavelmente em causa a finalidade do mesmo, sendo que ao fazer depender, do prazo de 3 anos de residência legal em Portugal, o direito a uma prestação social que assegure uma sobrevivência minimamente condigna ou a um mínimo de sobrevivência, que é resultado da conjugação do princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à segurança social em situações de carência, o legislador impõe aos estrangeiros um sacrifício desproporcionado ao fim da restrição.

  14. Tal opção atinge cidadãos em situação de grave...

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