Acórdão nº 06047/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 26 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | ANA PINHOL |
Data da Resolução | 26 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I.
RELATÓRIO A FAZENDA PÚBLICA inconformada com a sentença da Mmª. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por M..., S.A, (anteriormente “ M..., S.A”) incorporante por fusão da “M... SGPS, Lda” (já extinta), contra o acto de liquidação de IRC e juros compensatórios, no montante de € 1.089.924,38, dela recorre para este Tribunal, pretendendo a sua revogação.
Nas suas alegações de recurso formula as conclusões seguintes: «A.
Salvo o devido respeito, que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida fez uma errada apreciação dos factos controvertidos e sujeitos a análise o que consequentemente conduziu a erro de julgamento.
B.
Conforme resulta dos pontos 13 e 21 da fundamentação de facto os sócios da M... SGPS, constituíram-se em Assembleia Geral e deliberaram a restituição ao sócios das prestações suplementares nos termos indicados, devendo a gerência da sociedade efectuar os procedimentos administrativos que se tornem necessários para o efeito.
C.
Tal deliberação foi tomada tendo em conta a proposta apresentada pelo Gerente da M... SGPS; D.
De acordo com a referida proposta a M... SGPS tinha à data disponibilidades financeiras para efectuar a restituição das prestações suplementares, conforme consta da acta nº 9 que constitui o anexo 14, fls. 66 e 67, ao Relatório de Inspecção Tributária.
E.
Pelo que, a restituição das prestações suplementares pela M... SGPS aos sócios não se encontra conforme o deliberado.
F.
Face ao exposto verifica-se que, a Impugnante decidiu recorrer a um empréstimo para reembolsar os sócios das prestações suplementares sem que estes tivessem exigido essa restituição e, quando não estava legalmente obrigada à restituição, suportando um encargo desnecessário que resultou na diminuição do lucro; G.
Não se mostrando tal operação indispensável ao exercício normal da actividade da Impugnante.
H.
No que respeita ao alegado em sede de inspecção tributária entendemos que assiste total razão à Administração Tributária na interpretação que faz dos factos e na sua fundamentação conforme exposto no Relatório de Inspecção Tributária.
I.
O artº 23º, nº 1, al. c) do CIRC, aplicável à data dos factos, considerava os encargos de natureza financeira, como juros de capitais alheios aplicados na exploração.
J.
Da análise de toda a operação objecto dos presentes autos, verifica-se que empréstimo que a Impugnante contraiu junto da “M... International AG” não reúne tais requisitos, porquanto foi obtido para pagamento das prestações suplementares e não para aplicação na exploração ou actividade da mesma.
K.
Pelo que, os juros suportados pela Impugnante não se mostram indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
L.
Acresce que, as prestações suplementares, prestadas pelos sócios foram na sua totalidade aplicadas na sociedade “M..., SA.” e parte das restituições dessas prestações suplementares foram efectuadas por esta última directamente aos sócios da Impugnante; M.
Ora, verificando-se que em 1996 e 1997 a “M..., SA.” distribuiu lucros no montante global de cerca de 4.000.000.000$00, e tendo em conta o prazo concedido para a amortização do empréstimo por parte da “M..., SA.” à M... SGPS, deveriam aquelas ser restituídas de acordo com as amortizações do referido empréstimo à sociedade participada.
N.
Assim, face ao exposto, os custos incorridos pela Impugnante para proceder à restituição das prestações suplementares, também não se mostra indispensável, quando o mesmo visava apenas que se mantivesse o empréstimo “gratuito” à sua participada, objectivo com o qual foram exigidas as prestações suplementares.
O.
Face ao exposto, salvo o devido respeito que é muito, entendemos que a douta sentença recorrida ao julgar proceder a presente impugnação judicial, enferma de erro de apreciação da prova, de erro de interpretação de lei e viola o disposto no artº 23º do CIRC.».
A recorrida M..., S.A apresentou contra-alegações, nas quais apresenta as seguintes conclusões: «1.
A decisão a quo não merece censura, em virtude dos fundamentos por si utilizados terem assentado em factos provados, a que se justapôs uma correcta interpretação e aplicação da lei. Orientação que seguiu a posição de que no âmbito da comprovação da efectividade e indispensabilidade de um custo se deve recorrer, para além da prova documental, também à prova testemunhal. Em face da prova produzida e da apreciação das circunstâncias do caso, a decisão concluiu que:
-
Da noção de custo fornecida pelo artigo 23º do CIRC a Administração fiscal não pode pôr em causa o princípio de liberdade de gestão, sindicando a bondade e a oportunidade das decisões económicas da gestão da empresa, bastando que o custo seja realizado no interesse da empresa em ordem, directa ou indirectamente, à obtenção de proveitos; b) Que do ponto de vista económico não merece censura a decisão do gestor de obter um empréstimo para não desviar capitais aplicados no negócio; c) Que face ao objecto social da recorrida a aplicação na sua participada M... Auto Serviço Grossista dos montante relativos às prestações suplementares, tem pleno cabimento no seu objecto social.
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A sentença reflecte os factos que resultaram da instrução do processo, designadamente da inquirição de testemunhas e a correcta aplicação do direito, a saber:
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-
Está plenamente demonstrado que os juros foram aplicados na exploração, pois o mútuo destinou-se a financiar a M... SGPS, que manteve assim a normal prossecução da sua actividade económica, sem comprometer os seus activos e sem “sangrar” as suas participadas; b) A contracção do empréstimo para assegurar o reembolso das prestações correspondeu a uma legítima e racional escolha dos meios de financiamento, posto que a M... SGPS estava já em «velocidade de cruzeiro» e tinha capacidade de remunerar a cedência de capital; c) É totalmente irrelevante que, no que respeita aos exercícios de 1993 e 1994, a restituição das prestações suplementares tenha sido concretizada não mediante a aplicação de fundos próprios da SGPS e com a venda dos seus activos ou com o pedido de restituição das prestações concedidas às suas participadas, mas sim à custa de um empréstimo de Esc.: 3.600.000.000, disponibilizado pela ‘M... International AG’, directamente a favor dos sócios da M... SGPS que tinham realizado as prestações suplementares; d) A M... SGPS viu–se obrigada a encontrar os meios financeiros necessários que lhe permitissem, no âmbito da sua actividade de gestão, proceder a esse reembolso, mantendo a sua actividade corrente e o seu equilíbrio financeiro intocados; e) O reembolso das prestações suplementares por via da conversão de activos patrimoniais em dinheiro líquido, através da alienação de participações e/ou exigência de reembolso de capitais aportados às sociedades participadas, teria provocado um sério abrandamento do negócio e da respectiva expansão e, em consequência, uma diminuição do negócio e do lucro tributável das participadas e da M... SGPS face ao registado na época; f) O mútuo contratado com a ‘M... International AG’ permitiu que a M... SGPS mantivesse o capital investido, sem o retirar às suas participadas, que assim continuaram a expandir o negócio e a incrementar o lucro; g) Os juros em causa nos presentes Autos foram calculados e fixados de acordo com o preço de mercado, como é apanágio do Grupo M..., como, aliás, não foi sequer sindicado pela AT; h) O mútuo a que nos vimos referindo representou apenas uma substituição de meios de financiamento, de capital próprio para capital alheio, devendo salientar-se que, logo no início da entrada do Grupo M... em Portugal, os próprios sócios poderiam ter decidido prestar suprimentos ou celebrar um mútuo bancário para financiar o arranque da sociedade, tendo esta, nesse caso, de suportar os inerentes juros desde o início (i.e.
nesse caso, com custos muito superiores…); i) Para fazer face aos investimentos a efectuar no exercício de 1990 e 1991, a M... SGPS necessitava de novos capitais para além do seu capital social, tendo a gerência equacionado várias possibilidades, designadamente o recurso a capitais alheios com vencimento de juros (i.é, empréstimos, fossem de terceiros ou dos sócios) e a capitais dos sócios (eg., novos aumentos de capital social ou prestações suplementares) j) Por ser extremamente difícil e oneroso captar capitais no mercado, uma vez que a sociedade era muito recente (não tendo capitais próprios nem garantias suficientes), os sócios efectuaram prestações suplementares de modo a permitirem que a sociedade começasse a sua actividade sem custos de capital; k) Ao invés de fazerem suprimentos à sociedade com o correspondente vencimento de juros, ab initio os sócios assumiram sobre si esse encargo, sendo certo que, num momento futuro, quando a sociedade já tivesse capacidade para subsistir por si no mercado...
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