Acórdão nº 07670/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 23 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelCATARINA ALMEIDA E SOUSA
Data da Resolução23 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul 1 – RELATÓRIO A Fazenda Pública e R..., inconformados com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente procedente a oposição judicial à execução fiscal nº ... e apensos, originariamente instaurada contra “M... – Soluções Internet e sistemas de Informação, Lda”, por dívidas provenientes de "juros compensatórios - com juros de mora (IRS de 2003 a 2005) - 6.180,28€, Retenções na fonte/ Outros impostos com juros de mora - 11.662,65€ e Coimas DGCI e Ot. E. A DGCI: 20.315,65€", dela vieram interpor os seguintes dois recursos jurisdicionais.

A Fazenda Pública termina o seu recurso formulando as seguintes conclusões: I – Visa o presente Recurso reagir contra a Sentença que julgou parcialmente procedente a oposição à margem melhor identificada, quanto às dívidas de coimas fiscais e encargos do processo de contra-ordenação em que foram aplicadas, e com a qual não concordamos; II - Na situação “sub judice” está em discussão saber se foi por culpa do Recorrido que o património da sociedade se tornou insuficiente para pagamento das coimas, ou que lhe é imputável a falta de pagamento; III – Decidiu o Tribunal “a quo” que não existiu nenhuma conduta culposa na diminuição do património que possa ser atribuída ao Recorrido; IV – A Fazenda Pública não se conforma com o decidido, porquanto, quer no período a que as dívidas se referem, quer nos períodos posteriores, o Recorrido e a sua cônjuge, na qualidade de gerentes da devedora originária, receberam a título de salários, quantias muito avultadas, como se pode constatar pelo Doc. 1 de 22 fls,. junto aos autos em audiência de inquirição de testemunhas; V – A afirmação anterior é reiterada pelo depoimento da TOC em audiência de inquirição de testemunhas, quando refere que, efectivamente emitiu as declarações de rendimentos para efeitos de IRS com os rendimentos auferidos pelo Recorrido e pela sua cônjuge; VI - As preditas quantias foram reflectidas nas declarações de rendimentos Mod. 3 de IRS, entregues pelo Recorrido e pela sua cônjuge, como se pode verificar a fls. 111 a 122 dos autos; VII - Foi por culpa do Recorrido que o património da sociedade se tornou insuficiente para pagamento das coimas, mais, o não pagamento das dívidas em crise, traduziu -se na sua má gestão, e consequentemente na diminuição do património da devedora originária; VIII - Assim, a douta sentença ora recorrida, a manter-se na ordem jurídica, é convencimento da Fazenda Pública que incorreu em erro de julgamento sobre a prova documental apresentada.

Termos em que deve o presente Recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência ser revogada a Sentença ora sindicada, assim se fazendo por Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA.

* O Recorrido, R..., apresentou contra-alegações, as quais, porém, por despacho de fls. 294 foram desentranhadas.

* O Oponente interpôs recurso jurisdicional, o qual terminou formulando as seguintes conclusões: A) Tendo o oponente nisso interesse, o pagamento não deve ser considerado uma causa de extinção da execução da reversão, à semelhança do que acontece com a impugnação judicial ou recurso judicial, na medida em que ao gerente não lhe pode ser negado, pelo facto de ter pago a dívida de imposto, a defesa dos seus direitos até ao final, ou seja, até à última instância, sem prejuízo dos benefícios previstos no referido regime extraordinário de regularização da dívida tributária.

  1. É o que decorre do princípio constitucionalmente consagrado do acesso ao direito e do artigo 9° da Lei Geral Tributária.

  2. Salvo o devido respeito, existe uma contradição nas conclusões da sentença na medida em que, por um lado, dá como provado que o gerente em causa, ora Recorrente, não teve culpa na situação de insuficiência patrimonial a que chegou a devedora originária para solver as suas dívidas e que a sua actuação como gerente não foi de modo a comprometer a solvabilidade da empresa, mas, por outro, considera que não provou a falta de culpa no pagamento do imposto.

D) A sentença dá como positivamente provado que o oponente, ora Recorrente, não teve culpa na situação de insuficiência patrimonial a que chegou a devedora originária para solver as suas dívidas (está provado o nexo de causalidade) e E) Que a sua actuação como gerente não foi de modo a comprometer a solvabilidade da empresa (pág 12 da sentença).

F) Acresce ainda que o artigo 24º da LGT não permite que os factos a provar sejam diferentes quando se trate de dívida de imposto relativo ao IVA e a retenção na fonte (em parte em causa).

Face ao exposto, formula-se e o seguinte PEDIDO: Deverá conceder-se provimento ao presente Recurso, julgando procedente a totalidade da oposição judicial, devendo a decisão de 1° instância, da parte ora recorrida, ser revogada com as legais consequências.

Com as alegações de recurso foram juntos dois documentos.

* Não foram apresentadas contra-alegações.

* O Exmo. Magistrado do Ministério Público (EMMP) junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de que “O Recurso da AT deverá merecer provimento”.

* Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência para decisão.

* 2 - FUNDAMENTAÇÃO 2.1. De facto É a seguinte a decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida: 1. O oponente foi citado por reversão, em 05/11/2009, no processo de execução fiscal n.º ... originariamente instaurado contra "M... - Soluções Internet e Sistemas de Informação, Lda.", por dívidas provenientes de Coimas e Encargos do Processo de Contra-Ordenação, do ano de 2008; IRS - Retenções na fonte e juros compensatórios, dos anos de 2003, 2004, 2005 e 2007; IVA do ano de 2007 e IRC do ano de 2006, perfazendo a quantia exequenda 38.157,58€; 2. O oponente exerceu a gerência da devedora originária no período a que se reportam as dívidas e o seu prazo de pagamento; 3. A reversão concretizou-se por despacho de 14/10/2009, a fls.77 do apenso de execução, dele constando como fundamentos da reversão: "Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/ entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art.º24.º/n.º1 b), LGT]"; 4. A oposição foi apresentada no serviço de finanças em 09/12/2009, conforme carimbo de entrada aposto a fls.2; 5. A devedora originária era uma empresa prestadora de serviços de software, vendendo programas informáticos que desenvolvia a pedido dos clientes e para responder a necessidades específicas destes (depoimentos de M..., L... e J...); 6. Tinha ao seu serviço cerca de 10 a 15 trabalhadores, sem prejuízo de outros que contratava para o desenvolvimento de determinados projectos (depoimento de M...); 7. Cerca de 2005, a actividade do sector tecnológico em que se insere começou a experimentar um progressivo abrandamento e, em contrapartida, uma crescente competitividade, com a entrada de novos "players" no mercado (depoimento de J...); 8. Alguns clientes de peso na facturação da M... começaram a deixar de recorrer, progressivamente, aos serviços da empresa, por se terem tomado desnecessários face ao desenvolvimento das suas próprias actividades (depoimento de F...); 9. A empresa começou a experimentar dificuldades de cobrança junto de clientes, sendo que uns apenas atrasavam os pagamentos, às vezes por razões meramente burocráticas, mas acabavam por pagar; de alguns outros, não chegou sequer a receber (depoimento de M...); 10. A empresa procurou sempre desbloquear as verbas necessárias para pagar pontualmente aos trabalhadores (depoimentos de M... e L...); 11. A empresa entrou em derrapagem em finais de 2007, princípios de 2008, tendo até essa altura uma actividade sã, com um volume de negócios da ordem dos 390.000€ a 400.000€ (depoimento de I...); 12. As dívidas de clientes, à data da declaração de encerramento do IVA ascendiam a 250.000€ (depoimento de I...); 13. Em 2009, a empresa já não tinha qualquer actividade.

Factos não provados: Com interesse para a decisão a proferir, nada mais se provou de relevante.

Motivação: Assenta a convicção do tribunal no conjunto da prova dos autos e apenso de execução, com destaque para a assinalada. As testemunhas depuseram com sólida razão de ciência pois eram, ao tempo, colaboradores da empresa (caso de M... e L...), ou com ela se relacionaram na qualidade de clientes (caso de J... e F...), sendo que I... foi técnica oficial de contas da empresa desde o seu início até, pelo menos, o encerramento da actividade. Resulta do depoimento de todas as testemunhas que era o oponente quem gerenciava a sociedade devedora originária.

* 2.2. De direito Através da sentença objecto do presente recurso jurisdicional, a oposição deduzida contra a execução fiscal nº ... e apensos foi julgada parcialmente procedente.

Em concreto, foi reconhecida razão ao Oponente na medida em que se opôs à execução na parte em que a dívida exequenda tinha subjacentes montantes correspondentes a coimas fiscais e encargos do processo de contra-ordenação; no mais, a oposição foi julgada improcedente, sendo considerada a sua legitimidade enquanto responsável subsidiário e, como tal, mantida a execução fiscal quanto às dívidas provenientes de IRS, IVA, IRC e juros compensatórios.

Como dissemos, são dois os recursos que nos ocupam.

Comecemos a nossa análise pelo recurso interposto pela Fazenda Pública, o qual se cinge à parte da sentença que respeita à dívida de coimas e encargos do processo de contra-ordenação.

Contra a decisão do Mmo. Juiz a quo, defende a Fazenda Pública que o Tribunal “a quo” errou ao concluir que não existiu nenhuma conduta culposa na diminuição do património que possa ser atribuída ao Recorrido, já que, quer no período a que as dívidas se referem, quer...

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