Acórdão nº 05870/10 de Tribunal Central Administrativo Sul, 16 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução16 de Março de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL 1- RELATÓRIO O presente recurso jurisdicional vem interposto da sentença proferida em 21.07.2009 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, que julgou improcedente por não provada a acção administrativa comum, sob a forma ordinária, intentada por "Associação ……………………………" contra a A….. - Administração do …………, SA, Instituto Português dos Museus, e Associação ………………….. - Japão.

Dela recorreu a "Associação ………………….." apresentando as seguintes conclusões: “1 A sentença impugnada violou o princípio do contraditório, por se ter baseado em fundamento não alegado, nem discutido durante o processo - a qualificação do protocolo como licença e a conclusão de que a sua revogação não dava origem a indemnização não foi discutida no processo, não foi abordada por nenhuma das partes, nem pelo tribunal.

2- A sentença qualificou erradamente o protocolo, que não é um acto unilateral (licença), mas um contrato.

3 A Administração Pública apenas pode rescindir unilateralmente os direitos de uso privativo por motivos de interesse público, o que não se verificou neste caso. Não está provado qualquer interesse público na rescisão do contrato. O comportamento dos RR. constitui assim acto ilícito.

4 Há direito a indemnização do particular perante a rescisão do contrato, mesmo que com fundamento em interesse público, pelo que é ilegal a decisão do tribunal em sentido contrário.

5- Por último, a A. não tem qualquer culpa no facto de o contrato não estar ainda executado, não lhe sendo portanto imputável qualquer incumprimento.” Contra-alegou a A….., para concluir: “1.A sentença proferida pelo Tribunal a quo não violou o princípio do contraditório.

  1. Foi para cumprimento de tal princípio que se realizaram diversas "sessões e sessões de julgamento", se apresentaram, complementarmente, diversos documentos e se realizaram, durante a fase de audiência de discussão e julgamento, diligências complementares de prova, designadamente, a inquirição de peritos, que o Tribunal entendeu necessária para a produção da prova.

  2. De todos os elementos de prova trazidos aos presentes autos foi dado conhecimento às partes em litígio, tendo a respectiva prova sido discutida, produzida e valorada em audiência de julgamento.

  3. O Tribunal a quo julgou segundo a sua prudente convicção e com base na livre apreciação da prova, nos termos permitidos pelo art.°655.° do CPC, aplicável ex vi art.° 1.° da LPTA.

  4. O juiz, na sua decisão, não está sujeito ao quadro normativo e às qualificações jurídicas referidas pelas partes no processo, a sua decisão é, antes, balizada pela prova dos factos que os litigantes trouxerem à demanda, a qual é feita em audiência de julgamento.

  5. A parcela de terreno do domínio público cujo direito de uso privativo, através dos Protocolos juntos aos autos, foi atribuído à Recorrente, estava sujeita ao regime jurídico previsto no Decreto-Lei n.° 468/71, de 5 de Novembro - diploma que estabelecia, à data dos factos, o regime jurídico dos terrenos integrantes do domínio público hídrico - cfr. art.os 3.°, n.° 2 e 5.°, n.°1 do citado Decreto-Lei n.° 468/71 - e era parte integrante do domínio público portuário (hídrico) - art.° 2.° n.° 2 e art.° 7.° do Decreto-Lei 336/98, de 3 de Novembro e art.° 4.° do Estatuto Orgânico da Administração do Porto de Lisboa, aprovado pelo Decreto-Lei 309/87, de 7 de Agosto.

  6. Nos termos do referido regime, os direitos de uso privativo atribuídos são-no sempre a título precário e, revistam eles a natureza de licença ou contrato de concessão, pode a autoridade competente para a sua atribuição revogá-los, ou rescindi-los, conforme for o caso), por incumprimento (art.° 27.° do citado Decreto-Lei n.° 468/71) ou, ainda, extingui-los por motivo de interesse público (art.° 28.° do mesmo diploma legal).

  7. No caso concreto, independentemente de se estar perante uma instalação fixa ou não, o uso privativo em causa não preenche os requisitos impostos pela alínea e) do art.° 19.° do Decreto-Lei n.°468/71 uma vez que, relativamente à obra em questão, não houve qualquer declaração de uso de utilidade/interesse público (a edificação em causa não foi declarada de interesse para o turismo nem tão pouco foi classificada como conjunto turístico nos termos da legislação aplicável).

  8. Nos termos da norma constante do art.° 18.°, n.° 2 in fine, do mesmo diploma legal, bem andou o Tribunal recorrido ao classificar o uso privativo em causa como licença, no âmbito da qual a Recorrente estava sujeita a determinadas obrigações, que não cumpriu.

  9. A Recorrente apresentou para aprovação da APL, tal como era sua obrigação nos termos do "Protocolo", um Anteprojecto que mereceu parecer negativo dos técnicos da ora Recorrida que acompanharam o respectivo processo, não tendo, consequentemente, sido aprovado pelo seu Conselho de Administração, conforme resulta das alíneas H, M, O, Q, U, Y, Z, T, WW, XX, KKK, LLL, MMM, NNN dos factos provados.

  10. Não havendo qualquer projecto aprovado, a APL não autorizou a realização de levantamentos topográficos nem de sondagens - cfr. alíneas R e S da matéria de facto dada como assente - não tendo, pois, a Recorrente exercido qualquer posse (pacífica e pública) sobre a parcela em questão.

  11. Nunca a Recorrente submeteu à aprovação da APL qualquer outro projecto da obra em causa que suprimisse os aspectos negativos que, por diversas vezes, lhe foram comunicados ou, sequer, aceitou localizações alternativas que apresentassem menos condicionantes de envolvência.

  12. Assim, não existe fundamento para o direito de indemnização alegado pela Recorrente, uma vez que na decisão recorrida foi entendido que a revogação em causa ocorreu com fundamento em incumprimento, por parte da Autora, das suas obrigações (art.°27.°, n.°1 do Decreto-Lei n.° 468/7), situação que, nos termos da lei, não confere direito a qualquer indemnização.

  13. Foi a Recorrente e não a ora Recorrida que incumpriu o "Protocolo" em causa.

  14. Andou bem, portanto, o Tribunal a quo ao decidir nos termos em que o fez, absolvendo a APL de todos os pedidos, não tendo tal decisão violado qualquer norma legal.

    Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve negar-se provimento ao recurso interposto pela Recorrente, confirmando-se, em consequência, a decisão proferida pelo TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE CÍRCULO DE LISBOA no sentido da absolvição da Ré APL, S.A. de todos os pedidos.” Também o Instituto dos Museus e da Conservação, I.P. (ex-Instituto Português de Museus) contra-alegou com as seguintes conclusões: “A. Não existiu qualquer violação do princípio do contraditório pelo Tribunal a quo na sua Sentença, tendo o processo sido pautado pelo estrito cumprimento de tal princípio e dos demais aplicáveis.

    1. Não seria possível estarmos perante uma concessão na medida em que se verifica a falta de um elemento essencial para a mesma, a utilidade pública.

    2. A Administração Pública pode revogar os direitos de uso privativo por incumprimento do utente das obrigações para si resultantes, como foi o caso.

    D.A revogação por incumprimento dos protocolos não confere à Recorrente qualquer direito a uma indemnização a favor última.

    E.A Recorrente tem, como ficou devidamente provado, culpa pelo não cumprimento dos protocolos subjudice.

    Termos em que, com o douto provimento de V.Exa., deve o presente recurso ser indeferido, confirmando-se a Sentença recorrida na sua íntegra e assim se fazendo a costumada Justiça.” O DMMP junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

    Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    * 2. FUNDAMENTAÇÃO 2. 1 Dos factos Ao abrigo do n.º 6 do art. 663º do CPC, remete-se para a factualidade dada como assente na sentença recorrida que consta dos autos a qual se dá por integralmente transcrita.

    * 2. 2 DO DIREITO O presente recurso vem interposto da Sentença proferida em de 21 de Julho de 2009, a fls. 879 e sgs. dos autos, na qual o Tribunal a quo julgou improcedente, por não provada, a acção administrativa comum, sob a forma ordinária, intentada pela Recorrente contra a ora Recorrida, a A…. - Administração do Porto de Lisboa, S.A. e a Associação …………………….-Japão.

    No âmbito da referida Sentença, o Tribunal a quo decidiu ainda, baseada na prova produzida, que a "A. não cumpriu com as obrigações que para si resultavam dos termos do «título constitutivo da licença» (...) o que constitui na esfera jurídica das contrapartes, APL e IPM, o direito à rescisão da licença de uso privativo por incumprimento das obrigações do beneficiário (artigo 27°/1 ("Não cumprimento das obrigações do utente"), do Decreto-Lei 468/71".

    Na verdade, a sentença decidiu julgar improcedente a presente acção administrativa comum, sob a forma ordinária, instaurada pela A. contra a A…. - Administração do Porto de Lisboa, SA, Instituto Português dos Museus e contra a Associação de Amizade Portugal-Japão, absolvendo os RR. dos pedidos, com base na seguinte fundamentação jurídica: “III- Direito 1. Nos presentes autos, vem requerida a condenação das RR. APL, SA e IPM no cumprimento dos "protocolos" celebrados em 1995 com a A., relativos à implantação do Museu da Criança na parcela da zona ribeirinha de Belém, correspondente à Zona do Bom Sucesso/Espelho de Água, melhor identificada na planta anexa aos mesmos.

    Concretamente, são formulados os pedidos seguintes:

    1. Condenar os 1.° e 2.° RR. no cumprimento dos "Protocolos" celebrados, com a A., em 24.05.1995; b) Condenar a 3.ª R. a restituir à A. a posse dos terrenos que lhe foram cedidos para construção do Museu das Crianças; c) Condenar os RR. no pagamento da quantia de €712.256,23, acrescidos de juros, desde a data da citação até integral pagamento, a título de responsabilidade por incumprimento do contrato.

  15. Trata-se de parcela do leito do rio Tejo, integrante do domínio público estadual, sob jurisdição da Administração do Porto de Lisboa, actualmente APL, SÁ (artigos 84.°/1/a) e f), da...

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