Acórdão nº 10175/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Outubro de 2016
Magistrado Responsável | HELENA CANELAS |
Data da Resolução | 06 de Outubro de 2016 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO C……………. A…………………….. ARQUITECTURA, LDA.
(devidamente identificada nos autos), instaurou no Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa a presente ação administrativa comum (Proc. nº 2444/04.0BELSB) contra o ESTADO PORTUGUÊS e o MINISTRO-ADJUNTO DO PRIMEIRO-MINISTRO, pedindo a condenação solidária dos Réus a pagarem-lhe a quantia de 2.072.980,00 € [dois milhões e setenta e dois mil novecentos e oitenta euros] a título de honorários pelos serviços de planeamento urbanístico e arquitetura prestados no âmbito da preparação da candidatura portuguesa à realização da America’s Cup, bem como no pagamento de juros de mora à taxa legal desde a apresentação da respetiva nota de honorários, até efectivo e integral pagamento.
Pelo saneador-sentença proferido em sede de audiência-preliminar levada a cabo em 18/10/2010 (fls. 817 ss.
) a Mmª Juíza do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa julgou improcedentes as exceções de incompetência em razão da matéria e do território que haviam sido suscitadas pelo réu ESTADO PORTUGUÊS na sua contestação e procedente a exceção de ilegitimidade passiva do réu MINISTRO-ADJUNTO DO PRIMEIRO-MINISTRO que por este havia sido suscitada na sua contestação, absolvendo-o em consequência da instância, e conhecendo do mérito da ação, julgou o pedido improcedente dele absolvendo o réu ESTADO PORTUGUÊS.
Interpõe a autora recurso daquele saneador-sentença de 18/10/2010 quanto ao segmento em que nele foi julgada procedente a exceção de ilegitimidade passiva do réu MINISTRO-ADJUNTO DO PRIMEIRO-MINISTRO e bem assim quanto ao julgamento de improcedência da ação, com absolvição do réu ESTADO PORTUGUÊS do pedido, pugnando pela revogação do saneador-sentença recorrido, com correção da seleção da matéria de facto relevante e com improcedência da exceção de ilegitimidade passiva pelo Réu Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro, devendo o processo prosseguir para julgamento, para apuramento dos factos a levar à base instrutória.
Nas suas alegações a recorrente formula as seguintes conclusões, nos seguintes termos: I. A douta sentença recorrida seleccionou de forma deficiente a matéria de facto relevante para o julgamento dos presentes autos, pois, por um lado, omitiu factos relevantes que tinham sido alegados quer na Petição Inicial, quer na Réplica. Por outro lado, não distinguiu claramente qual a matéria a levar à base instrutória e qual a matéria considerada realmente assente.
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Essa errada selecção da matéria de facto foi determinante para que a Meritíssima juiz a quo julgasse, como o fez, que a matéria de facto em questão não era suficiente para que as pretensões da Autora, ora Recorrente, pudessem a final, se provadas, resultar em procedência da acção.
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No facto relevante indicado na douta sentença recorrida sob o n.º 26, a Meritíssima juiz a quo deveria ter adoptado a redacção original dos artigos 33º e 34º da Petição Inicial, mesmo que tivesse que levar os mesmos à Base Instrutória, pois a Autora, ora Recorrente, propõe-se provar o facto tal como alegado.
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O facto relevante indicado sob o n.º 27 deveria corresponder à redacção original do artigo 35º da Petição Inicial, pois, o texto da douta sentença recorrida acaba por deturpar o seu sentido.
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Deveria ter sido considerada relevante e levada à Base Instrutória, a matéria dos artigos 37º e 38º da Petição Inicial.
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Deveria ser acrescentado à base instrutória o seguinte facto relevante: a aceitação por parte da Autora, ora Recorrente, da realização do trabalho, e do recebimento de € 50.000, teve como importante condicionante o facto de lhe ser garantido que caso a proposta Portuguesa viesse a ser aceite, o trabalho realizado daria origem ao plano da zona de intervenção da America's Cup - cfr. artigo 39º da Petição Inicial e doc. n.º 20.
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A Meritíssima juiz a quo deveria ter seleccionado como relevante a totalidade do artigo 47º da Petição Inicial, e não apenas parte, como o faz no ponto 35 da lista de factos relevantes, VIII. A douta sentença recorrida não deveria ter omitido da matéria de facto considerada relevante os factos constantes dos artigos 52º e 53º da Petição Inicial.
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Também, e salvo o devido respeito, não ficou correctamente indicado na douta sentença recorrida (ponto 41 dos factos relevantes) o facto que vinha descrito no artigo 48 da Petição Inicial, devendo ser mantida a redacção do que foi inicialmente alegado.
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A douta sentença recorrida também deveria de ter seleccionado como relevantes os factos que constava dos artigos 69º, 74º, 76º, 82º, 86º e 92º da Petição Inicial.
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Também deveriam ter sido levadas em consideração as correcções e clarificações à matéria de facto realizadas na Réplica, nos termos do artigo 273º, n.º 1 do CPC, pois os Réus a elas tiveram oportunidade de responder e responderam. Foi no âmbito dessas clarificações que a Autora, ora Recorrente, alegou com circunstâncias de tempo e de lugar, como é que o Senhor Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro convidou a Autora, ora Recorrente, a apresentar a sua nota de honorários pelos serviços prestados.
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O douto tribunal recorrido, salvo o devido respeito, não julgou bem, e julgou mesmo contra o disposto no artigo 26 º do Código de Processo Civil, ao considerar que o Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro como parte ilegítima, embora a Autora, ora Recorrente, nunca tivesse objectado que, conforme alegado por esse Réu, a acção houvesse que prosseguir contra a Presidência do Conselho de Ministros.
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Quando o Senhor Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro, em 20 de Novembro de 2003, decide afastar a Autora, ora Recorrente, do processo, e afirmar que iria convidar outros arquitectos para realizar o trabalho que tinha sido garantido à Autora, caso a candidatura portuguesa saísse vencedora, e por fim convida a Autora, ora Recorrente, a apresentar a sua nota de honorários pelos serviços prestados até então, decide-o não só no âmbito da COAC, pois a mesma funcionava na sua dependência nos termos da Resolução do Conselho de Ministros n.º 77/2003 de 28 de Maio, mas também em representação do Governo Português: (i) em primeiro lugar porque seria mais tarde o Governo português a lançar o tal concurso e não a usar o ajuste directo, como tinha sido dito à Autora, ora Recorrente; (ii) em segundo lugar porque a COAC se extinguiria daí a pouco mais de um mês, (iii) nem tinha fundos próprios para pagar os honorários da Autora, ora Recorrente, pelo que teria que ser o Governo a pagá-los.
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Além disso, quem acabou por utilizar os trabalhos realizados pela Autora, ora Recorrente, foi o próprio Governo português ao assinar o contrato com a AC M..........................., do qual esses trabalhos constituíam anexo, XV. Pelo que haveria por concluir que o Réu Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro (ou Presidência do Conselho de Ministros), ora Recorrido, é parte legítima nos presentes autos face ao disposto no artigo 26 º do CPC.
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Por fim, o douto Tribunal a quo também decidiu mal ao absolver o Réu Estado do pedido. Tal absolvição, salvo o devido respeito, deveu-se não só a uma errada selecção da matéria de facto, mas também a uma má interpretação das razões de direito que fundamentam o pedido da Autora, ora Recorrente.
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Na verdade, a relação contratual estabelecida entre a Autora, ora Recorrente, e a COAC têm carácter complexo e evolutivo. O que parece resultar da douta sentença recorrida é que, na opinião da Meritíssima Juiz a quo, a Autora, ora Recorrente, aceitou prestar serviços de arquitectura quase de graça, e que se Portugal ganhasse a candidatura, provavelmente, iria ter algum outro ganho não concretamente definido. Não foi isso que concretamente se passou.
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O que se passou concretamente foi que o Arquitecto André ………….. foi envolvido na preparação do primeiro esboço da candidatura portuguesa à organização da America's Cup e para isso foi contratado pelo Senhor Patrick ………………., ainda antes da constituição da COAC. Mas a verdade é que Portugal foi passando às fases seguintes do processo de selecção e a COAC e o Estado Português foram aprovando os trabalhos sucessivamente realizados pela Autora, ora Recorrente. Aceitação essa que culminou na assinatura entre o Estado Português e a AC M……………. LTd. de um contrato em que os trabalhos realizados pela Autora, ora Recorrente, constituíam anexo.
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A Autora, ora Recorrente, fez uma primeira proposta de honorários (quando ainda não se vislumbrava a dimensão de trabalho que iria ter a final) de € 800.000. O Dr. Patrick ………………… disse que a COAC não tinha essa verba e que apenas podia pagar € 50.000, mas que a Autora, ora Recorrente, iria receber a sua compensação se Portugal ganhasse a candidatura porque lhe seriam adjudicados os trabalhos de arquitectura que corresponderiam ao plano de reconversão urbanística no Âmbito da organização da America's Cup.
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Assim, a Autora, ora Recorrente, só aceitou reduzir drasticamente os seus honorários, a valores abaixo de custo, porque tinha esperança que Portugal saísse vencedor do concurso internacional para organização daquele evento desportivo, pois nesse caso, iria sair compensada, com a adjudicação daqueles trabalhos que lhe traria não só honorários a preço de mercado, mas também o prestígio correspondente a essa realização.
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Essa futura adjudicação foi assim condição fundamental para que a Autora, ora Recorrente, aceitasse receber apenas € 50.000 pelos trabalhos a realizar. Essa futura adjudicação não só foi prometida em diversas conversas havidas com o Dr. Patrick …………………………. e outros membros da COAC, mas consta expressamente do doc. n.º 20, que é o documento em que a Autora, ora Recorrente, aceita os termos da colaboração.
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Nem pode colocar-se em causa, como o faz a sentença recorrida, embora de forma indirecta, a validade formal dessa promessa de futura adjudicação.
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É que, caso essa promessa seja inválida formal ou materialmente, todo o acordo tem que ser...
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