Acórdão nº 12849/15 de Tribunal Central Administrativo Sul, 14 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução14 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

António ……………… e Paula ………………….., com os sinais nos autos, inconformados com a sentença cautelar proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria dela vêm recorrer, concluindo como segue: 1. Considerando que o teor do pedido deduzido nos autos principais é a "condenação da R. a acatar, cumprir e executar a deliberação da Assembleia Geral da Ordem dos notários ocorrida na reunião extraordinária de 23-05-2015, que aprovou a destituição do Bastonário, da direcção e dos suplentes e, consequentemente, a convocar eleições antecipadas, a realizar no prazo de 60 dias, através da convocação de uma reunião extraordinária da Assembleia Geral, como assembleia eleitoral", a circunstância de mostrar impossível haver uma decisão daquele processo até ao termo do mandato em curso da direcção da Ordem dos Notários, em Dezembro de 2017, demonstra claramente que a natureza das questões e a gravidade dos interesses envolvidos permite concluir que a situação não se compadece com a adopção de uma simples providência cautelar.

  1. Por outro lado a composição provisória do litígio por via cautelar implica a manutenção de uma dúvida relativa à legitimidade da direcção da entidade requerida e à legalidade da continuidade do mandato em curso e dos actos praticados no seu exercício, que é claramente desaconselhável para uma instituição com o papel e as atribuições de interesse público da Ordem dos Notários.

  2. Estão, por isso, preenchidos os pressupostos legais previstos no art. 121°, n°1 do CPTA para a antecipação da decisão da causa principal.

  3. Ao assim não entender, o despacho recorrido violou aquele preceito legal.

  4. O despacho recorrido não apreciou o segundo dos requisitos previstos no n°1do art. 121° do CPTA, que exige que "tenham sido trazidos ao processo todos elementos necessários para o efeito".

  5. A questão subjacente aos autos principais é estritamente jurídica, sendo portanto, objectivamente desnecessária a produção de quaisquer diligências de prova.

  6. Acresce que partes esgrimiram e esgotaram os argumentos sobre a questão jurídica decidenda nos articulados apresentados neste processo cautelar.

  7. De modo que deverá este Tribunal, ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 149° do CPTA, julgar verificado também este segundo requisito.

  8. Ao contrário do que decidiu a sentença recorrida, o requisito da manifesta procedência da acção principal presente no art. 120°, n°1, ai. a) do CPTA não se afere em função da extensão do argumentário deduzido pelas partes, nem tão pouco pela necessidade de proceder à aplicação de normas por via subsidiária.

  9. A manifesta procedência da acção principal afere-se, isso sim, pela força e clareza dos fundamentos jurídicos que lhe subjazem e que no presente caso determinariam a adopção da providência cautelar.

  10. A competência legal da Assembleia Geral da Ordem dos Notários para deliberar a destituição da direcção resulta do art. 21°, n°2, ai. h) do EON ou, caso assim não se entendesse, do art. 172°, n°2 do CC, aplicável ex vi do art. 4°, n°2, ai. b) da Lei n°2/2013, de 10 de janeiro.

  11. Assim o exige também a interpretação do quadro legal em conformidade à Constituição, determinada pelo art. 267°, n°4 da CRP, que impõe o respeito pelo princípio democrático na organização interna das associações públicas.

  12. Já a maioria necessária à aprovação da deliberação de destituição não pode deixar de considerar-se regulada pelo disposto no art. 175° do Código Civil, de onde resulta à evidência ser apenas a maioria simples, respeitado que esteja o quorum deliberativo.

  13. Este enquadramento jurídico não é complexo e é fácil de verificar que os requerentes têm razão, c que redundará na procedência da acção principal.

  14. E isso é o bastante para que a providência cautelar seja decretada ao abrigo do art. 120°, n°1, ai. a) do CPTA.

  15. Ao assim não decidir, a sentença recorrida interpretou erroneamente aquele dispositivo legal, violando-o.

  16. A sentença recorrida, ao recusar a adopção da providência cautelar com fundamento na ausência de alegação concretizada de prejuízos, não tem em conta que o art. 120°, n°1, ai. c) do CPTA estabelece como pressupostos alternativos o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos no processo principal.

  17. Ao ignorar o primeiro daqueles requisitos alternativos, a sentença incorre, de imediato, na violação do referido art. 120°, n°1, ai. c) do CPTA.

  18. A inevitabilidade do fim do mandato da direcção em curse, em Dezembro de 2017, na pendência da acção principal, na qual é peticionária a condenação da R. a cumprir a deliberação da Assembleia Geral que determinou a respectiva destituição, consubstancia uma evidente de perigo de verificação situação de facto consumado, totalmente irreversível no plano dos factos, que põe em causa a utilidade da decisão a proferir nos autos principais.

  19. Pelo que deveria a sentença ter julgado verificado o periculum in mora por via do perigo da constituição de uma situação de facto consumado.

  20. Ao assim não decidir, a sentença recorrida violou o art. 120°, n°1, ai. c) do CPTA 22. A norma prevista no art. 120°, n°1ai.c) do CPTA determina que deve considerar-se verificado o periculum in mora quando haja fundado receio da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente pretende ver reconhecidos no processo principal e não quando se tratem de prejuízos de natureza económica por si sofridos na pendência dos autos principais.

  21. O interesse, ou direito, que os requerentes pretendem ver reconhecido no processo principal é que a deliberação da Assembleia Geral da Ordem dos Notários, em que participaram, que aprovou a destituição da direcção seja respeitada, cumprida e executada 24. Sendo que a demora de processo principal face ao tempo de mandato da direcção que resta cumprir, dois anos, acarretará, inevitavelmente, um prejuízo irreparável, para esse interesse, pondo em causa a utilidade da sentença a proferir naqueles autos.

  22. Bem interpretado o disposto no art. 120°, n°1, ai. c) do CPTA, impunha-se considerar verificado "o perigo da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que os requerentes visam assegurar no processo principal".

  23. Ao assim não decidir, a sentença recorrida violou o art. 120°, n°1, ai. c) do CPTA.

  24. Não tendo a sentença recorrida apreciado os restantes requisitos de decretamento da providência cautelar, impõe-se a este Tribunal de Apelação fazê-lo, ao abrigo do art. 149°, n°3 do CPTA.

  25. Face ao alegado nos arts. ponto 2.1. das presentes alegações e nos arts. 1° a 83° do r.i., a procedência da pretensão deduzida no processo principal, não só é provável, como é manifesta, pelo que está, igualmente verificado o segundo requisito de decretamento previsto no citado art. 120° n°1, ai. c) do CPTA (provável procedência da pretensão formulada no processo principal).

  26. A providência cautelar requerida não implica a paralisação da actividade da entidade requerida, mas apenas o seu condicionamento, por via da abstenção de atos que extravasem os poderes de gestão corrente.

  27. Nesses poderes não podem deixar de considerar-se incluídos os actos cuja prática imediata e urgente seja imprescindível para a assegurar a defesa do interesse público, pelo que nenhuma lesão para o interesse público advém da concessão da providência.

  28. Ademais, havendo alguma categoria de actos não contemplados no âmbito da gestão corrente que sejam considerados como absolutamente necessários a evitar a produção de danos ao interesse público, sempre o Tribunal poderá determinar, ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos precisamente pela parte final n°2 e pelo n°3 do art. 120° do CPTA, excepcioná-la da condenação cautelar, permitindo a sua prática sem limitações.

  29. É, pois, inevitável concluir pela verificação do requisito negativo previsto no art. 120°, n°2 do CPTA.

  30. Deve, assim, este Venerando Tribunal revogar a sentença recorrida e decretar a providência cautelar requerida.

    * Os Recorridos contra-alegaram, concluindo como segue: A. Os Recorrentes intentaram a presente providência cautelar tendo em vista obstar a que o Bastonário e a direcção da Recorrida continuassem a representar os interesses dos seus membros, designadamente junto do Ministério da Justiça, e em matérias que consideram de importância vital para a classe como a tramitação dos processos de inventário - que entendem irá arrastar muitos notários para uma situação de insolvência; possibilidade que os Recorrentes querem ver afastada ao solicitarem ao Tribunal que condene a direcção e o Bastonário da Ordem dos Notários a absterem-se de praticar quaisquer actos que extravasem os actos de mera gestão corrente; B. Neste conspecto, bem andou o douto despacho recorrido ao considerar que uma eventual decisão cautelar favorável aos Recorrentes é suficiente para tutelar as suas pretensões: a providência antecipatória requerida, a ser deferida, paralisará quase por completo a actividade da Ordem dos Notários, passando a direcção...

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