Acórdão nº 09594/13 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelPEDRO MARCH
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório Eduarda ………………… (Recorrente) e …………………..

intentaram no Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada uma acção administrativa comum, sob a forma ordinária, contra a Região Autónoma dos Açores (Recorrida), pedindo que na sua procedência a R. fosse condenada a pagar-lhe [à Autora] as quantias de 165.579,87€, a título de danos patrimoniais, na vertente «lucros cessantes» e de 250.000,00€ pelos danos não patrimoniais já sofridos (e que ainda sofre) em decorrência do acidente em serviço que a incapacitou permanentemente para o exercício das suas funções, bem como a proceder ao pagamento “das despesas médico- medicamentosas, alojamento e deslocação para estabelecimento de saúde [à sua] escolha e bem assim [das] despesas com a aquisição de quaisquer bens ou serviços necessários ao [seu] bem estar em consequência directa e necessária do acidente de que foi vitima, a liquidar em execução de sentença» Pediram, ainda, que a R. fosse condenada a pagar ao Autor [(então) marido] a quantia de 75.000,00€, a título de danos não patrimoniais, pelo sofrimento suportado em consequência do acidente que vitimou a Autora, à data sua mulher.

A Ré contestou, tendo aí sustentado que o acidente não resultou de actuação ilícita e culposa dos seus serviços, já que haviam sido observadas todas as regras vigentes no ordenamento jurídico português sobre segurança e higiene no trabalho. Mais alegou que a Autora já se encontra ressarcida de todas as despesas resultantes do acidente em serviço, pois que, por efeito ou consequência da qualificação do acidente sofrido em 11.7.2007 como acidente em serviço, a GGA atribuiu-lhe uma pensão vitalícia correspondente à sua redução da capacidade geral de ganho, como também foram pagas todas as despesas com saúde resultantes do acidente em serviço que a Autora apresentou e efectuadas as obras necessárias à readaptação da sua habitação, face às sequelas do acidente em serviço que sofreu.

Por sentença de 21.06.2016 o Tribunal recorrido decidiu “não estarem reunidos os respectivos pressupostos legais conducentes ao apuramento do dever legal de indemnização à luz da responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública (…) a presente acção terá de improceder”.

Inconformada com o assim decidido, veio somente a Autora, ora Recorrente, interpor recurso de apelação para este Tribunal Central, culminando a sua alegação com as seguintes conclusões: 1) Peticionaram os recorrentes a condenação da Região Autónoma dos Açores, em sede de responsabilidade extra - contratual, o pagamento à Autora da verba de 166.579,87€ a titulo de danos patrimoniais, na vertente de danos emergentes e lucros cessantes e 250.000€ a titulo de danos extra patrimoniais, bem como, o pagamento ao recorrente de 75.000€, ao mesmo titulo; 2) O fundamento de tal peticionado residiu no facto da recorrente ter sido vitima de paraplegia dos membros inferiores permanente, com grau de incapacidade de 84% em virtude de uma estante, e livros nela colocados, lhe terem caído sobre a coluna vertebral.

3) Esta paraplegia foi consequência directa e necessária duma ordem dum superior hierárquico para ser efectuada a deslocação duma estante, e livros, mediante a utilização dum tapete pese embora, a advertência em contrário da recorrente; 4) O tribunal recorrido, perante o cenário fáctico dado por assente, entendeu não existir responsabilidade extra contratual da Região Autónoma dos Açores ditada pela violação das regras de higiene e segurança no trabalho por interpretar que esta violação apenas se circunscreve a adequação, condições e equipamentos de trabalho ou seja, 5) Passa pela perigosidade e/ou inadequação dos meios colocados ao serviço do trabalhador apenas contemplando no processo produtivo os meios utilizados e não as ordens que ditam a utilização desses meios.

6) Entende contudo o recorrente, sempre salvo o devido respeito e melhor opinião, que esta violação ocorre, igualmente, nos casos em que as ordens para utilização desses meios (ainda que aptos e seguros aos fins a que se destinam) sempre que potencialmente perigosas para a integridade do subordinado, e assim sendo, é abarcada no conceito de violação das regras de segurança e higiene no trabalho com a consequente responsabilização extra contratual.

7) No caso "sub judice" a decisão do superior hierárquico exigindo da recorrente a deslocação duma estante, carregada de livros, não autorizando que os livros fossem retirados "por não haver tempo" colocou em risco a saúde daquela; 8) Ordem perigosa, insensata e inconsciente que o superior hierárquico era obrigado a saber e que qualquer cidadão comum conhece.

9) Ao ter sido ditada, como foi e nos circunstancialismos assentes nos autos, tal ordem consumou uma violação das aludidas regras de higiene e segurança no trabalho, 10) Neste sentido, por força à luz dos artigos 4°, n°1, 8°, n°1 e 2°, alínea c), 15°, alínea c), a contrario ex vi artigo 1°, n° 1, alínea a) e 3° alínea a) todos do Decreto - lei n° 491/91, de 14 de Novembro consubstancia uma infracção das regras de segurança no trabalho determinando por isso a condenação da Região Autónoma dos Açores ao pagamento das verbas peticionadas sendo que, 11) Ao assim não entender, douta decisão recorrida enferma de manifesto erro na interpretação das normas jurídicas, Devendo, pelo exposto, ser revogada e, em consonância, a recorrida condenada ao pagamento aos recorrentes das verbas peticionadas, por decorrerem dos autos os elementos bastantes assim se fazendo a habitual Justiça.

• A Recorrida, Região Autónoma dos Açores, contra-alegou, produzindo as seguintes conclusões: 1) Peticionaram os recorrentes a condenação da Região Autónoma dos Açores, em sede de responsabilidade extra - contratual, o pagamento à Autora da verba de 166579,87€ a título de danos patrimoniais, na vertente de danos emergentes a lucros cessantes e 250.000 € a título de danos extra patrimoniais, bem como, o pagamento ao recorrente de 75000€, ao mesmo titulo; 2) O fundamento de tal peticionado residiu no facto da recorrente ter sido vítima de paraplegia dos membros inferiores permanente, com grau de incapacidade de 84% em virtude de uma estante, e livros nela colocados, lhe terem caído sobre a coluna vertebral.

3) Alegam os recorrentes que tal paraplegia foi consequência direta e necessária duma ordem dum superior hierárquico para ser efetuada a deslocação duma estante, e livros, mediante a utilização dum tapete pese embora, a advertência em contrário da recorrente; 4) Decidiu, a nosso ver corretamente, o tribunal de 1ª. Instância, perante o cenário fático dado por assente, por não existir responsabilidade extra contratual da Região Autónoma dos Açores ditada pela eventual violação das regras de higiene e segurança no trabalho por interpretar que esta violação apenas se circunscreve a adequação, condições e equipamentos de trabalho ou seja, 5) Tal passa, necessariamente, pela perigosidade e/ou inadequação dos meios colocados ao serviço do trabalhador apenas contemplando no processo produtivo os meios utilizados e não as ordens que ditam a utilização desses meios.

6) De facto, as condições de segurança, higiene e saúde no trabalho constituem o fundamento material de qualquer programa de prevenção de riscos profissionais e contribuem, na empresa, para o aumento da competitividade com diminuição da sinistralidade.

7) Dos factos alegados e provados resulta que o acidente que vitimou a autora consubstancia um acidente em serviço, tendo sido tratado desse modo — as despesas médico-medicamentosas bem como outras apresentadas pela recorrente (deslocações, alojamento, etc...) têm-lhe sido reembolsadas; procedeu-se à adaptação da sua habitação ao facto de ter ficado com paraplegia dos membros inferiores; a autora recebe atualmente urna pensão pela incapacidade permanente de € 266,39 mês —, mas não resulta que haja lugar a responsabilidade civil extracontratual da entidade demandada pela ocorrência do acidente, por não ficar demonstrada a ocorrência de uma qualquer atuação ou omissão desta que possa classificar-se de ilícita.

8) A ocorrência de um acidente em serviço só importará um ato ilícito por violação das condições de segurança, higiene e saúde no trabalho quando as circunstâncias concretas do caso revelem a existência de uma fonte de risco que, de acordo com os conhecimentos técnicos e ou experiência comum (segundo o critério do homem médio), se impunha eliminar 9) É que, na situação em apreço, não vem alegado, nem tal resulta dos factos provados, que a ora recorrente e os colegas estivessem expostos a fatores de risco cuja eliminação ou atenuação se impusessem, sabendo-se que, segundo o artigo 6.° do Decreto-Lei n°48051, do 21 de novembro de 1967, -tendo em consideração a data em que se produziu o facto danoso, 11.07.2007, a eventual responsabilidade civil extracontratual da ré deverá ser apurada nos termos desse diploma - se consideram ilícitos os atos jurídicos que violem as normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os atos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração.

10) De facto, não é suficiente a existência de uma qualquer ilegalidade para se estar perante um ato ilícito gerador de responsabilidade civil, sendo necessário que a Administração tenha lesado direitos e interesses legalmente protegidos do particular, fora dos limites do ordenamento jurídico.

11) Do mesmo modo, é necessário que a norma violada revele a intenção normativa de proteção do interesse material do particular, não bastando uma proteção meramente reflexa ou ocasional. (..) 12) Ou seja, o conceito de ilicitude não se reconduz, sem mais, ao conceito de ilegalidade, antes pressupõe a violação de uma posição jurídica substantiva (direito subjetivo ou interesse legalmente protegido) do particular, pois...

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