Acórdão nº 569/08.1BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE CORT
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I- Relatório MARIA ... interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença do TT de Lisboa de fls. 419 a 434 (rectificada por despachos de fls. 452 a 454 e 521 a 523) que, no âmbito da execução fiscal n.º ..., contra si instaurada por dívida relativa à realização de obras coercivas por parte da Câmara Municipal de Lisboa, no valor total de € 6.631,64, julgou a oposição deduzida apenas parcialmente procedente, declarando verificada a prescrição da dívida exequenda relativa a juros do período de 12/12/2001 a 16/01/2003, e improcedente quanto ao mais.

Nas alegações de recurso (fls. 458/479verso), a recorrente formula as conclusões seguintes: « I – No presente recurso está posto em causa ter o Tribunal a quo considerado as obras coercivas executadas pela Exequente com natureza proper rem das obrigações derivadas de despesas referentes à conservação e fruição das partes comuns de prédio em propriedade horizontal, cabendo tal obrigação sobre o sujeito que for titular da fracção, integrada no condomínio, no momento em que haja lugar ao pagamento da parte do preço que cabia efectuar.

II – Neste cenário, o Tribunal a quo decidiu ser a Recorrente a responsável pelo pagamento da execução das obras por à data ser proprietária das fracções K e Q.

III – Decidida esta questão, entendeu o Tribunal a quo que à dívida em causa era de aplicar o prazo mais longo da prescrição, os 20 anos previstos no preceituado do artigo 306º, do CC.

IV – A Recorrente não se pode conformar minimamente com a sentença recorrida, pois a mesma padece de evidentes erros de julgamento quanto à fixação da matéria de facto, com relevo para a decisão da causa, decorrentes de evidente incorrecta apreciação e aplicação dos meios de prova, quer por omissão da produção testemunhal e omissão de factos que deveriam ter sido considerados matéria julgada provada.

V – Sem prejuízo do princípio da livre apreciação da prova, previsto no disposto no artigo 411º do CPC, é por demais evidente que o Tribunal a quo não continha toda a factualidade necessária para a decisão sobre a matéria de facto e proferir a sentença final, resultando violado o disposto nos artigos 211º, 114º e 115º, do CPPT.

VI – Consequentemente, o Tribunal a quo fez errada aplicação dos meios de prova apresentados, o que levou à fixação de factos cuja prova não foi produzida nos autos.

VII – Ao invés, os autos contêm documentos que se o Tribunal a quo fizesse uma análise cuidada, uma interpretação correcta levaria a que desse por provados outros factos cuja fixação conduziria a sentença de teor diferente.

VIII – Ao Tribunal Central Administrativo é legítimo alterar e modificar a matéria de facto julgada provada, conforme previsto no artigo 662º, do CPC.

IX – Na sentença recorrida o Tribunal a quo deu como provado o ponto 5 da matéria instrutória do seguinte teor: “Da caderneta predial do prédio identificado no ponto 1) emitida em 03/02/1997 consta que a Oponente residia na Av. ... nº 48-7º Dto. (cfr. fls. 224 a 247 dos autos)”.

X – Para fixação deste ponto o Tribunal a quo teve em conta o documento de fls. 224 a 247 dos autos que é uma fotocópia em substituição da caderneta predial do prédio, conferida em 03/02/1997, pelo Serviço de Finanças de Lisboa do ... Bairro Fiscal.

XI – Da análise desse documento não se pode extrair o teor do ponto 5 da matéria instrutória, concretamente, que da caderneta predial, emitida em 03/02/1997, consta que a Oponente residia na Av. ... nº 48,7º Dto.

XII – Por um lado, porque não é isto que os elementos apostos nesse documento (fls. 224 a 247 dos autos) dizem. E por outro, XIII – Dos autos constam outros documentos que provam o contrário e que o Tribunal a quo omitiu, nomeadamente o documento junto com o nº 16, com a p.i. da Oposição, que é o cartão de contribuinte fiscal onde daí, sim, se extraiu que, em 03/05/1990, a Recorrente residia no concelho de Oeiras onde se manteve até 2004. Tendo o Tribunal a quo omitido este documento, resultou violado o disposto nos artigos, 114º, 115º e 211º, do CPPT.

XIV – Igualmente a Recorrente alegou e ofereceu prova testemunhal para fazer prova cabal dos locais onde residiu no período de 1987 à presente data. Porém, igualmente o Tribunal a quo omitiu a produção de prova, resultante do violado disposto nos artigos 114º e 115º, do CPPT e 411º, do CPC.

XV – Do documento de fls. 224 a 247 apenas é licito retirar que: em relação à fracção Q, os elementos nele apostos referentes à pessoa da Recorrente – nome, morada e local onde se formalizou a escritura de venda, foram averbados por aquele Serviço de Finanças no ano de 1988 e extraídos do documento de compra e venda exarada em 14/12/1987.

XVI – Deste documento não é possível retirar, como erradamente o fez o Tribunal a quo, que em 03/02/1997, a Oponente residia na Av. ... nº 48-7º Dto, por ausência de qualquer prova que o sustente.

XVII – Assim sendo, deve o facto julgado provado no ponto 5 da base instrutória ser eliminado e em seu lugar exarar outro do seguinte teor: “A Oponente de 1987 a finais da primavera de 1988, viveu na Av. ..., nº 48-7º Dto., do verão de 1998 a Março de 2004, residiu na Rua ..., nº 2-4º Esq., em Paço de Arcos, Oeiras e de Março de 2004 a Maio de 2005, na Av. ... nº 61-3º Esq., em Lisboa de Maio de 2005 à presente data, na Av. ... nº 59-7º, em Lisboa em virtude de resultar provada tal factualidade.

XVIII – Por outro lado, dos elementos constantes dos autos, nomeadamente a escritura de compra de 14/10/1987 (doc. fls. 11 a 15), se o Tribunal a quo tivesse feito uma correcta análise daquele documento, teria sido dado como provados e levados à matéria de facto, absolutamente necessária para a justa composição do litígio e da decisão final proferida.

XIX – Igualmente, sem prejuízo da livre apreciação da prova, é por demais evidente que deveria o Tribunal a quo levado à fixação da matéria de facto o seguinte: “Na escritura de 14/10/1997, a proprietária das fracções K e Q, Maria ..., declarou vendê-las, à Recorrente Maria ..., livres de ónus ou encargos”.

XX – Neste contexto, de posse de mais estes factos julgados provados, o Tribunal a quo teria decidido que a Recorrente é parte ilegítima na execução fiscal uma vez que as aludidas obras coercivas foram executadas à sua total revelia, desconhecendo as mesmas.

XXI – Resulta ainda de factualidade de documentos constantes dos autos (vd. doc. de fls. 61 a 133 do processo administrativo), que em 10/3 e 30/7, do ano de 1999, a Recorrente vendeu as fracções K e Q do referido prédio.

XXII – Pelo que, deve ser alterada a matéria de facto julgada provada e criado um novo facto do seguinte teor: “Em 10/03/1999 e 30/07/1999, a Recorrente vendeu as fracções Q e K, respectivamente”.

XXIII – A sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 14..., nº 2, alínea a), 204º, do CPPT ao decidir, em contradição, que à exequente é legítimo recorrer-se do procedimento processual do CPPT para a cobrança coerciva da quantia exequenda e afastar a aplicação destas normas à Recorrente, nomeadamente, pondo em causa o recurso aos fundamentos da própria Oposição à execução previstos no artigo 204º, os quais foram invocados pela Recorrente.

XXIV – Aceitar o decidindo da sentença recorrida, que afastou a aplicação dos fundamentos da Oposição previstos no artigo 204º do CPPT – caducidade do direito à liquidação e recurso à prescrição – previstos na Lei Geral Tributária e aplicáveis à situação sub judice.

XXV – À luz do disposto na alínea i), do nº 1, do artigo 204º, do CPPT, tendo a sentença recorrida declarado que “dos autos não resultou provado que a Oponente tenha sido pessoalmente notificada da intimação, nem da deliberação de ocupação do prédio”, é por demais evidente que a dívida exequenda, acrescida de juros, não é exigível à Recorrente; quando muito será à proprietária Maria ..., que foi a pessoa a quem a intimação e deliberação de tomada de posse coerciva do prédio foi valida e regularmente notificada.

XXVI – Ao atribuir à Oponente o conhecimento da urgência da realização das obras e a execução coerciva das mesmas, em virtude de na escritura pública de 14/10/1987 ter declarado que residia numa e destinava outra a residência permanente, ou que da caderneta predial em 03/02/2007 vivia no prédio e não podia deixar de conhecer da necessidade da execução das obras e da tomada de posse coerciva do prédio, violou o disposto nos artigos 9º, 10º, 12º 165º e 166º do RGEU, já que não lhe foi dirigida qualquer notificação.

XXVII – A responsabilidade pelo pagamento de tais obras só pode ser reclamado à proprietária Maria ... pois só a ela foram tais obras validamente notificadas.

XXVIII – Efectivamente, como resulta da matéria da base instrutória, todo o processo que terminou na deliberação da execução das obras e tomada de posse coerciva do prédio para a execução das mesmas, foi feito pela via de contacto pessoal ou sob registo com aviso de recepção à sua legitima proprietária, a Maria ..., que é a responsável pelo pagamento das mesmas.

XXIX – Em resumo, da análise da matéria produzida não se retira qualquer fundamento em que assente a decisão recorrida para responsabilizar a Recorrente da obrigação do pagamento da divida exequenda acrescida de juros, impondo-se uma decisão inversa da proferida.

XXX – No mesmo sentido, a invocação das normas dos artigos 1430º, nº 1 e alínea i) do artigo 1436º, do CC, impunha que a sentença recorrida tomasse uma decisão diversa, devendo a Exequente exigir a divida ao próprio condomínio do prédio e não aos condóminos individualmente.

XXXI – Ao decidir em sentido contrário a sentença recorrida violou aqueles preceitos.

XXXII – Acresce ainda que, a sentença recorrida decidiu que a Recorrente, ao efectuar a compra das fracções K e Q, em 14/10/1987, adquiria também as obrigações de pagamento das obras em execução coerciva por as mesmas revestirem carácter ambulatório, acompanhando o bem a que se reportam. Neste ponto a sentença recorrida aderiu, na íntegra, aos fundamentos...

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