Acórdão nº 2538/16.9BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO Evaristo ……………..

e Maria ………………..

, devidamente identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 10/11/2017, que no âmbito do processo cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo movido contra o Município de Lisboa e a G…………….. – Gestão do …………………………….., EM, SA, julgou improcedente a providência cautelar, absolvendo as Entidades Requeridas do pedido.

Formulam os aqui Recorrentes nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “1.

O Tribunal a quo errou quanto à matéria de facto dada por provada, ao não ter considerado provados os factos alegados nos artigos 39.º, 42.º, 52.º e 53.º do requerimento inicial.

  1. Trata-se de factos com relevância direta para o apuramento do fumus boni iuris e do periculum in mora de que depende a concessão da providência cautelar de suspensão da eficácia do ato requerida pelos ora Recorrentes e cuja prova - não colocada em crise nos autos - resulta dos documentos n.os 4 a 7 e 11 e 12 juntos pelos Requerentes em 1.ª instância.

  2. Quanto à matéria de Direito, são de dupla ordem os erros do Tribunal a quo: (i) errada aplicação da lei no tempo e (ii) errada apreciação dos vícios de que padecia o ato suspendendo.

  3. Desde logo, o Tribunal a quo procedeu a uma errada aplicação da lei no tempo, ao desconsiderar o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º do RAAH, tal como alterado pela Lei n.º 32/2016, de 24 de agosto, em cujos termos se dispõe que a cessação do contrato de arrendamento em regime de renda apoiada (só) pode cessar se o arrendatário for “proprietário (...) de prédio urbano ou de fração autónoma de prédio urbano destinado a habitação localizado no concelho ou em concelho limítrofe, desde que o imóvel seja adequado a satisfazer o fim habitacional do agregado e não constitua residência permanente de terceiros com direitos legais ou contratuais sobre o mesmo”.

  4. Seja em atenção ao disposto no artigo 39.º do RAAH, seja por decorrência da aplicação das regras gerais de Direito transitório inscritas no artigo 12.º do Código Civil, seja, finalmente, por se considerar que a alteração introduzida neste regime jurídico em 2016 se limitou a clarificar a solução - óbvia - já decorrente da sua versão originária, certo é que a condição destacada se aplicava ao caso dos autos e ao arrendamento social titulado pelos ora recorrentes.

  5. É que, como resulta da matéria de facto dada por provada pelo Tribunal a quo, a suposta “alternative habitacional” de que dispunham os ora Recorrentes - a fracção sita no 1º andar do prédio urbano, sito na Rua ……………., n° 5, ……………, …………….. - encontra-se arrendada em terceiros.

  6. Razão pela qual o ato suspendendo é inequivocamente ilegal, por erro sobre os pressupostos de facto, suficiente para concretizar o fumus boni iuris exigido pelo n.º 1 do artigo 120.º do CPTA.

  7. Por outro lado, ao perspetivar como “alternative habitacional” uma fração que não reúne as mínimas condições de habitabilidade para os ora Recorrentes, o ato suspendenda é patententemente nulo, por ofensa do direito fundamental à habitação garantido pelo artigo 65.º da Constituição, ex vi alínea d) do n.º 2 do artigo 161.º do CPA.

  8. Também por essa via se encontrando garantido o requisito do fumus boni iuris legalmente exigido neste tipo de providências.

  9. Ao que acresce que, como alegado em primeira instância e retomado nestas Alegações, os prejuízos que emergem para os ora Recorrentes da execução do ato suspendendo são potencialmente irreparáveis e não encontram contraponto em nenhum interesse público que, do lado das entidades agora recorridas, seja necessário salvaguardar.”.

    Termina pedindo que seja concedido provimento ao recurso e revogada a decisão recorrida, decretando-se a suspensão de eficácia do ato que determinou a cessão do direito de utilização do fogo municipal atribuído aos Recorrentes.

    * O ora Recorrido, Município de Lisboa, notificado apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: “1. Os Recorrentes interpuseram recurso da douta sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 10/11/2017.

  10. Todavia, não assiste razão aos Recorrente, porquanto o Tribunal a quo fez uma correta apreciação e interpretação dos factos e das normas aplicáveis, não podendo, em consequência, ser apreciada a questão de forma diferente da que fez o referido Tribunal.

  11. É por demais evidente que os Recorrentes há muito que não se encontravam nas condições económicas de carência que justificaram que em 1981 lhes fosse atribuído por parte do ora Recorrido uma habitação social.

  12. Não se verifica o vício de nulidade por afetação do conteúdo essencial do direito à habitação invocado.

  13. Ficou amplamente demonstrado no processo que os Recorrentes têm uma casa onde viver, que é uma verdadeira alternativa habitacional, não estando em causa o facto de ser uma construção de génese ilegal, porquanto a mesma é passível de ser licenciada, e inexiste qualquer ordem de demolição proferida pelo Município da Amadora.

  14. Não assiste razão aos Recorrentes quando afirmam que o ato suspendendo viola o disposto no art. 6º nº 3 da Lei nº 81/2014, de 19/12, porquanto foi realizada uma vistoria ao local, que apurou o estado de conservação do imóvel, estando o mesmo em condições de ser habitado, como aliás atestam os serviços do Município da Amadora.

  15. Não deixa de ser curioso que os ora Recorrentes considerem que a fração em causa é boa para dar de arrendamento, suscetível de criar rendimento, mas que não é digna para ser a sua residência.

  16. Também não colhe frutos a tese de que o imóvel por estar arrendado a terceiros não é alternativa habitacional, pois como referido no art. 5º da oposição do Recorrido, o procedimento de desocupação esteve suspenso durante 2 anos, período mais que suficiente para que os Recorrentes denunciassem o contrato existente.

  17. Tal como estipulado pela norma legal em vigor à data que foi atribuído o fogo e posteriormente proferido o despacho que determinou a cessação da ocupação do fogo e a sua desocupação, e que se mantem hoje embora previsto em diverso diploma, a concessão das habitações pelo ora Recorrido prossegue um fim social de alojar famílias carenciadas, havendo que ser rigorosa a ponderação da sua concessão e manutenção.

  18. Estamos, pois, perante um regime especial de ocupação, com causas de desocupação expressamente previstas na Lei.

  19. As razões de cessação de utilização dessas habitações encontram-se expressamente previstas na lei 81/2014, de 19/12, estando contemplado, entre as demais, o facto do titular ser proprietário de prédio ou fração autónoma de prédio destinado à habitação (art. 6º nº 1 al a)), regime esse que se aplica ao caso em análise, como expressamente previsto no mesmo.

  20. Dúvidas não subsistem ao Recorrido que bem andou o Tribunal a quo ao decidir pela improcedência da pretensão deduzida, na medida em que entendeu não estar preenchido o requisito essencial do “fumus bonis iuris”, uma vez que os ora Recorrentes têm uma alternativa habitacional.

  21. Em conformidade, o Recorrido acompanha integralmente o entendimento vertido na douta sentença recorrida.”.

    Conclui pedindo a improcedência do recurso, confirmando-se a decisão proferida.

    * A Recorrida, G…………….

    , contra-alegou o recurso, tendo assim concluído: “1.

    Interpuseram os Requerentes recurso de Apelação da Douta Decisão proferida pelo Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa que decidiu indeferir a providência cautelar com fundamento na não verificação do requisito do fumus boni iuris.

  22. Salvo o devido respeito e, salvo melhor opinião entende-se que nenhuma razão assiste aos Requerentes/Recorrentes, não estando a Douta Decisão recorrida ferida de qualquer vício, como infra se procurará demonstrar.

  23. Alegam os Recorrentes que quanto à matéria de facto, o Tribunal a quo não considerou provados os factos alegados pelos Requerentes nos arts. 39°, 42º, 52º e 53º do seu Requerimento de interposição de providência cautelar e quanto à matéria de direito, “o Tribunal a quo procedeu a uma errada aplicação da lei no tempo, ao desconsiderar o disposto na alínea a) do n° 1 do artigo 6º do RAAH, tal como alterado pela Lei nº 32/2016, de 24 de agosto” assim como, procedeu a uma “errada apreciação dos vícios de que padecia o ato suspendendo” na medida em que a “suposta “alternativa habitacional “..encontra-se arrendada em terceiros” e “não reúne as mínimas condições de habitabilidade para os ora Recorrentes”.

  24. Quanto à alegada não consideração dos factos alegados pelos Requerentes nos arts. 39º, 42º, 52º e 53º do seu Requerimento de interposição de providência cautelar, cumpre dizer que, foi precisamente porque os mesmos foram considerados que a providência em causa foi indeferida. Mas mesmo que não tivessem sido considerados os mesmos não eram relevantes para a decisão em causa.

  25. Quanto à alegada errada aplicação da lei no tempo, ao desconsiderar o disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 6º do RAAH, tal como alterado pela Lei nº 32/2016, de 24 de agosto”, cumpre dizer que à data do Despacho cuja suspensão é requerida (12.05.2016), ainda a Lei n° 32/2016, de 24 de agosto não tinha sido publicada e consequentemente ainda não tinha entrado em vigor, pelo que não podia ser aplicada.

  26. Quanto à alegada errada apreciação dos vícios de que padecia o ato suspendendo” na medida em que a “suposta alternativa habitacional”...encontra-se arrendada em terceiros” e “não reúne as mínimas condições de habitabilidade para os ora Recorrentes, cumpre dizer que a alegação de que o imóvel em causa porque está arrendado a terceiros não é alternativa habitacional, não pode...

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