Acórdão nº 296/13.8GCAGD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA PILAR DE OLIVEIRA
Data da Resolução08 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório No processo sumário 296/13.8GCAGD da Comarca do Baixo Vouga, Águeda, Juízo de Instância Criminal, Juiz 2, após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: Nestes termos o tribunal decide: 1.

Absolver o arguido A...

, um crime de desobediência, previsto e punido pela alínea b) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal; 2.

Condenar o arguido pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 65 (sessenta e cinco) dias de multa, à taxa diária de 5,00 euros (cinco euros), o que perfaz um total de 325 euros; 3. Condenar ainda o arguido na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, prevista no artigo 69.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal, pelo período de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias.

  1. Condenar o arguido a pagar as custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 2 U.C, que se reduz a metade por força da confissão (artigo 513º e 344.º, n.º 2, al. b) do Código de Processo Penal conjugado com artigos 8.º, n.º 5 do Regulamento das Custas Processuais, e legais encargos com o processo nos termos do art.º 514.º do C.P.P.

    Inconformado com a parte absolutória desta decisão, dela recorreu o Ministério Público, rematando a correspondente motivação com as seguintes conclusões: 1. Os factos dados como provados na sentença, nomeadamente os numerados como 1 a 5, 7, 8, 11, 12 e 16 são suficientes para o preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do crime de desobediência previsto e punido pela alínea b) do n.º 1 do artigo 348. º do Código Penal.

  2. O arguido A... sabia que o veículo automóvel de matrícula (...)EB lhe havia sido apreendido a 13 de Setembro de 2012 por falta de seguro de responsabilidade civil e que tinha sido designado fiel depositário do mesmo, tendo sido advertido por militar da Guarda Nacional Republicana que a utilização do veículo, enquanto estivesse apreendido, o faria incorrer no crime de desobediência.

  3. Em 18 de Dezembro de 2013, o arguido, ao conduzir o veículo apreendido, agiu com o propósito de faltar à obediência devida à ordem que lhe fora regularmente comunicada por autoridade competente e cuja observância lhe era imposta.

  4. A celebração do contrato de seguro de responsabilidade civil em 1 de Outubro de 2013 não levantou imediatamente a apreensão do veículo automóvel.

  5. Ao absolver o arguido o Tribunal a quo violou a alínea b) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal.

    Face ao exposto, deve a sentença proferida ser parcialmente revogada, condenando-se o arguido A..., para além da condenação já sofrida, pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido a alínea b) do n.º 1 do artigo 348.º do Código Penal.

    Admitido o recurso e notificado o arguido este respondeu, reafirmando os argumentos da decisão recorrida e pugnando pela sua manutenção.

    Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o recurso deve proceder do seguinte teor: Devemos antes de mais salientar o empenhamento do Exm.º Magistrado do Ministério Público, junto da 1.ª instância, a qual, de forma concretizada e minuciosa apresenta a sua discordância em relação à aplicação do direito aos factos dados como provados.

    Concordamos, assim, em absoluto com a bem elaborada motivação do recurso, na qual, de forma objectiva, delimita a questão (única) da subsunção legal dos factos ao crime pelo qual o arguido estava acusado, apoiando-se em jurisprudência que cita a propósito.

    Quanto a esta matéria de direito, que surge impugnada pelo Ministério Público, sem necessidade de qualquer repetição quanto à argumentação já apresentada no sentido de que merecia, na perspectiva do Ministério Público, diferente conclusão no recurso apresentado, com o que por se concordar em absoluto, damo-la por reproduzida.

    Mais se dirá, em reforço da posição do Ministério Público, que o seguinte: - Efectivamente na sequência do já alegado nos parece verificar-se o vício de contradição insanável da fundamentação e entre a fundamentação e a decisão que atinge pontos da matéria provada, previsto no art.º 410º, n.º 1 e 2 al. b) do CPP, quando a partir dos pontos indicados pelo Ministério Público que se afiguram suficientes para a condenação do arguido, na motivação de direito o tribunal recorrido extrai uma conclusão oposta, isto é, de que se não verifica o elemento objectivo da prática do crime.

    Por outro lado, importa sublinhar que, para além da pertinente argumentação do Ministério Público quanto ao bem jurídico que está em causa salvaguardar, com a norma legal, que, conforme se dá como provado no ponto 3, transcrevendo, aliás, o documento de fls. 15 e 16 dos autos - assinado pelo arguido - que constitui o auto de apreensão, este tinha perfeito conhecimento que, depois da regularização da situação que motivou a apreensão, poderia pedir o levantamento dos documentos apreendidos no IMTT de Aveiro, o que ainda não tinha feito.

    Não o tinha feito ainda, tendo perfeita noção de que a apreensão se mantinha, tal como aliás confessou integralmente em audiência.

    A ser assim, também nos parece que apesar de ter já pago o seguro, importava que essa situação fosse verificada pela entidade com competência para tal, a pedido do interessado e, desse modo, fosse autorizado ( ou não consoante a análise a fazer) o levantamento da apreensão do veículo com a devolução dos documentos do veículo que, afinal, nem estavam na posse do arguido.

    Para concluir, afirmando que nos parece que com a factualidade provada se mostra violado o bem jurídico que a norma penal pretende proteger, "a autoridade pública, a autoridade do Estado"; ou, mais em concreto, "a ordem de não poder circular, legítima porque ancorada em lei expressa", parafraseando a jurisprudência citada pelo Ministério Publico na sua motivação.

    Deverá nos termos expostos e por tudo o mais doutamente alegado na motivação pelo recorrente na 1 ª instância, ser o arguido condenado pela prática do crime de desobediência, tal como pugna o Ministério Público.

    Face ao exposto, sem necessidade de outros considerandos, somos de parecer que o recurso do Ministério Público deverá proceder nos apontados termos, alterando-se a douta sentença recorrida em conformidade.

    Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, não ocorreu resposta.

    Corridos os vistos legais e realizada conferência, cumpre apreciar e decidir.

    *** II. Fundamentos da Decisão Recorrida Da sentença recorrida constam os seguintes fundamentos de facto: 1. FACTOS PROVADOS Da audiência de discussão e julgamento resultaram provados os seguintes factos: 1. No dia 14 de Setembro de 2012, cerca das 16h15, na Estrada Nacional 1, Km 242, localidade de Serém, foi apreendido ao arguido o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula (...)EB, de que é proprietário, pelo facto de se encontrar a circular sem que tivesse sido efectuado seguro de responsabilidade civil.

  6. O arguido foi designado fiel depositário de veículo apreendido e, na altura, foi devidamente advertido por militar da Guarda Nacional Republicana de que a utilização do veículo, enquanto estivesse apreendido, o faria incorrer no crime de desobediência.

  7. Do auto de apreensão constava, além do mais, o seguinte: “ O veículo actualmente esta com 193230 Kms vai ficar depositado em sua morada, na posse do proprietário, acima identificado, com a obrigação de o entregar quando lhe foi exigido, não o podendo remover, alterar o estado, utilizar, alienar, destruir, danificar ou inutilizar, total ou parcialmente, ou, por qualquer forma, subtrair ao poder público a que esta sujeito, sob pena de incorrer na pratica de um crime de desobediência e/ou descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder publico, previstos e puníveis nos termos dos artigos 348.º e 355.º do Código Penal.

    Juntamente com o veículo procedido à apreensão do Livrete do Veiculo como o n.º (...)EB (art. 161.º, n.º 1 alínea a) do CE). O arguido poderá levantar o(s) documento(s) apreendido(s) no serviço desconcentrado do IMTT de Aveiro, após regularização da situação que motivou a apreensão”.

  8. No dia 1 de Outubro de 2013 o arguido celebrou com a companhia de Seguros Ocidental Seguros um contrato de seguro de obrigatório de responsabilidade civil automóvel relativo ao veículo ligeiro de passageiros com a matrícula (...)EB, com valido ate 21.04.2014. 5. Apesar de tal advertência e estando convencido que desrespeitava a ordem que lhe havia sido regularmente comunicada, no dia 18 de Dezembro de 2013, pelas 15h23, na Estrada Nacional 1-11, localidade de Sernada do Vouga, concelho de Águeda, o arguido conduziu o veículo acima referido.

  9. O arguido conduziu o referido veículo nas circunstâncias de tempo e lugar supra referidas, após ter ingerido bebidas alcoólicas e apresentando taxa de álcool no sangue de 1,44g/l.

  10. Em 18 de Dezembro de 2013 o odómetro do veículo apresentava mais 259 km percorridos do que os que apresentava à data da apreensão.

  11. No dia 18 de Dezembro de 2013, o arguido agiu estando convicto de estar a faltar à obediência devida à ordem que lhe fora regularmente comunicada por autoridade competente e cuja observância lhe fora imposta por normas legais em vigor, por ainda não se ter dirigido ao IMT.

  12. O arguido conhecia o seu estado e sabia que o mesmo não lhe permitia efectuar uma condução cuidada e prudente e lhe diminuía a capacidade de atenção, reacção e destreza, mas, ainda assim, quis conduzir o veículo automóvel, o que efectivamente fez.

  13. O arguido, ao conduzir o referido veículo com a TAS de 1,44 g/l agiu de modo livre, consciente e voluntário, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punível por lei.

  14. O arguido, ao conduzir o referido veículo que tinha sido apreendido no dia 14 de Setembro de 2012, agiu de modo livre e voluntário, estando convencido que a sua conduta era proibida e punível por lei.

  15. O processo de...

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