Acórdão nº 582/12.4TBCTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | ARLINDO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 21 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Na presente oposição à execução que A... e B...
movem ao exequente C...
por apenso à execução comum para pagamento de quantia certa que este move contra aqueles, pretendem os opoentes que, pela sua procedência, seja extinta a instância executiva quanto a si, fundando-se para tanto, nas seguintes excepções: - o cheque sem preenchimento da data não constitui título executivo, sendo que o cheque dado como título executivo não apresenta data; - o cheque dado à execução não foi apresentado a pagamento no prazo de 8 dias, pelo que, não tem força de título executivo, já que não foi invocada no requerimento executivo a relação jurídica subjacente; - a acção cambiária encontra-se prescrita, dado que, prescrevem no prazo de 6 meses a acção do portador contra os endossantes, contra o sacador ou demais co-obrigados, a contar do termo do prazo de apresentação (oito dias após a data de emissão); - O exequente nunca emprestou qualquer quantia à executada mulher, que, segundo alega, do mútuo nada sabia, nem tirou qualquer proveito ou benefício, sendo que, também não deu a sua autorização ou consentimento, além de que, nas datas das alegadas declarações de dívida encontrava-se separada de facto do executado, pelo que, não pode a mesma ser responsabilizada por tal dívida.
Regularmente notificado o exequente contestou a presente oposição à execução aduzindo, fundamentalmente, que a dívida é da responsabilidade de ambos os executados, pois, o cheque dado à execução foi emitido sobre uma conta da executada e os mútuos destinaram-se ao proveito comum de ambos, já que se destinavam a resolver questões atinentes a partilhas de uma herança da qual a executada mulher é titular, pretensamente para adquirirem quotas partes de outros interessados.
Ademais, caso se considere que o cheque padece de qualquer vício formal, o mesmo sempre valeria enquanto documento particular com valor executivo.
Pugna pois, pela improcedência da presente oposição à execução.
Com dispensa da audiência preliminar, foi elaborado despacho saneador tabelar, com dispensa da seleção da matéria de facto.
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante dos requerimentos de oposição e contestação, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 67 a 69, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.
Após o que foi proferida a sentença de fl.s 70 a 74, na qual se decidiu o seguinte: “I - Termos em que, tudo visto e considerado decido julgar a presente oposição à execução parcialmente procedente por provada e consequentemente, decido:
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Declarar a executada B... parte ilegítima para figurar na execução de que estes autos constituem apenso, absolvendo-se a mesma da instância; b) No mais, julgar a presente oposição improcedente, determinando-se, em consequência, o prosseguimento dos autos de execução.
II- Custas a cargo do Opoente e Exequente na proporção, respectivamente, de 90% e 10%.”.
Inconformado com a mesma, interpôs recurso o exequente C..., recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 118), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: a. Em causa no presente recurso está a parte da sentença que julgou a Recorrida B... como parte ilegítima para figurar como Executada nos presentes autos, já que no modesto entendimento do Exequente, ora Recorrente, a sentença em apreço, naquela parte, atento a prova produzida, merece os reparos e a censura que lhe vão feitas pelo presente recurso.
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Nos autos principais está em apreço uma Execução que tem por base a emissão de um cheque, sacado sobre uma conta da qual é primeira titular (da conta) a ora Recorrida B... que, ao mesmo tempo, era a cônjuge do co-executado A...; no entanto, apesar de ser cônjuge e primeira titular da conta, que emitiu e assinou o cheque em apreço foi o co-Executado A...
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Assim a questão central que se coloca em apreço é se sendo a Recorrida cônjuge e primeira titular da conta, deve ou não ser considerada parte legítima para efeitos de execução.
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É que apesar de em face do Cheque – atenta a identidade de quem preencheu e assinou o cheque - ser patente que a Recorrida não é parte directa na relação jurídica cambiária decorrente do titulo, no sentido que não foi ela quem emitiu o referido cheque, a questão, que de facto, fáctica e jurídica, que se coloca, é que sendo essa Executada e ora Recorrida como primeira titular da conta bancária sobre a qual é emitido e sacado o cheque e sendo, ela, cônjuge do outro executado, se deve ou não ser parte legítima para ser executada nos presentes autos? e. Importa notar que no tocante a esta Recorrida foi, desde logo, alegada causa debendi, que é constituída pelo contrato de mútuo, que, segundo o requerimento executivo, vincularia ambos os cônjuges.
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É certo que a recorrida figura nos cheque numa única qualidade: a de titular da conta bancária e, correspondente, de parte no contrato de depósito e da convenção de cheque.
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No entanto, conforme se referirá adiante, é modesto entendimento do Recorrente que tendo, desde logo, sido alegada a causa debendi e sendo esta Recorrida cônjuge do outro Executado, seria a esta que incumbiria a prova de que “era alheia ao mútuo e nada beneficiou com os mútuos” titulados pelo cheque e para que remetem as declarações de dívida juntas aos autos.
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E, conforme adiante notado, é modesto entendimento do Recorrente que a Recorrida não fez esta prova que sobre si incumbia e, razão pela qual sendo a Recorrida a titular da conta e estando à data da emissão do cheque (e bem assim da emissão das declarações de dívida juntas) casada com o Executado A..., que também ela deve ser considerada parte legítima para figura na Execução como Executada.
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Para julgamento da matéria de facto releva a prova documental junta aos autos, designadamente o cheque que serve de base à Execução, as declarações emitidas pelo co-Executado A... e a documentação junta pelo banco sacado (esta a pedido do Tribunal a quo) e, bem assim, a decisão que decretou o divórcio entre os Executados.
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Quanto à prova testemunhal, relevarão, para efeitos de apreciação, os depoimentos das testemunhas arroladas pelos Executados, G... e D..., supra transcritos.
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E, atenta a prova documental e testemunhal referida e, ainda, atento as regras do ónus da prova, é modesto entendimento do Recorrente que o Tribunal a quo deveria ter dado como provada a seguinte matéria: (…) 5. O exequente emprestou as quantias em Execução ao casal constituído pelo Executado A... e executada B...; 6. A aqui executada B... não assinou o cheque em Execução, mas era a primeira titular da conta e autorizou o co-Executado, seu marido, a assinar o referido cheque.
7. Desconhece-se quando é que a executada B... teve conhecimento da sua situação em apreço nos autos; 8. Não resultou provado que os empréstimos feitos aos executados A... e B... não tenham revertido em proveito comum do casal, para a aquisição de bens e satisfação de interesses comuns.
(…) l. E, em face da matéria de facto que, atento as regras do ónus da prova, devia ser dada por provada, merece censura e os reparos que são feitos pelo presente recurso à sentença, na parte em que considerou a Recorrida como para ilegítima, para figurar como Executada.
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Não se desconhece que, juridicamente, a acção executiva, que visa a realização efectiva, por meios coercivos, do direito violado, tem por suporte um título, que constitui a matriz da prestação a que se reporta (artºs 2, 4 nº 3 e 45 nº 1 do CPC, 10 nºs 1, 4 e 5 do NCPC) e, ao mesmo tempo, define os limites quantitativos e qualitativos da prestação e, bem assim, da Execução.
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Não se desconhece que o título executivo, que é o documento do qual resulta a exequibilidade de uma pretensão e, portanto, a possibilidade de realização da correspondente pretensão através de uma acção executiva, incorpora, em si mesmo, o direito de execução, ou seja, o direito do credor a executar o património do devedor ou de terceiro para obter a satisfação efectiva do seu direito à prestação.
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O título executivo exerce, assim, uma função constitutiva – dado que atribui exequibilidade a uma pretensão, permitindo que a correspondente prestação seja realizada através de medidas coactivas impostas ao executado pelo tribunal.
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Mas, conforme notado, o título executivo cumpre, no processo executivo, também uma função delimitadora, dado que é por ele que se determinam, designadamente, os limites subjectivos da acção executiva, i.e., os limites respeitantes às partes na execução (artºs 45 nº 1 do CPC de 1961 e 10 nº 5 do NCPC).
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E, em termos processuais, exerce, por fim, uma função de legitimação: ele determina as pessoas com legitimidade processual para a acção executiva.
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Ou seja, as partes legítimas para a execução determinam-se, em regra, pelo próprio título executivo: são partes legítimas, aquelas que figuram no título como credor e devedor (artº 55 nº 1 do CPC de 1961 e 53 nº 1 do NCPC).
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Neste sentido, juridicamente a ilegitimidade executiva só ocorre quanto a parte não coincide com aquela que consta do título executivo e nenhuma outra circunstância lhe atribua legitimidade.
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É será incontroverso que o título que Serve de suporte à execução no tocante ao recorrente é um cheque (artº 1 da LUC), ao qual estão associadas um conjunto de declarações particulares, que atestam um conjunto de mútuos; e também é claro que foi sacados sobre uma conta bancária do casal, da qual é primeira titular (tal qual figura no cheque) a Executada mulher (isto apesar do cheque ter sido emitido e assinado pelo Executado marido) u. Trata-se, portanto, de uma conta do casal, que, atento ao documento junto aos autos pela Instituição Bancária sacada, cada titular podia proceder à sua movimentação, sem o concurso do outro contitular, e...
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