Acórdão nº 623/12.5TBTMR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução21 de Outubro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A...

, casado, residente na Rua (...), em Paço de Arcos, instaurou contra B...

, residente na (...), em Tomar, a presente ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum sumário, peticionando a condenação do Réu no pagamento do valor de uma letra (7.000,00€), acrescidos de juros vencidos até à data de entrada da petição inicial em juízo (5.841€) e vincendos e numa indemnização no valor de 3.000€.

Para tanto alegou, em suma, que constituiu seu mandatário o Réu, em Setembro de 2004, para que o mesmo intentasse uma ação judicial contra C...

, a qual consistiria na execução de uma letra no montante de 7.000,00€. Não obstante, o tempo foi passando e o Réu nunca o contactou a fim de discutir algum assunto relacionado com o processo ou tirar dúvidas. Em Junho de 2009 tentou contactá-lo via telemóvel e remeteu-lhe uma carta, demonstrando preocupação. Devido à ausência de qualquer resposta, remeteu-lhe uma outra carta em Março de 2010, mencionando que não queria que o mesmo continuasse com o processo e que passaria no escritório para recolher os elementos e saber informações. Em Janeiro de 2011 tentou novo contacto e, em 3 de Outubro de 2011, mandou mais uma carta registada, solicitando a devolução dos documentos. Porém, o Réu não deu qualquer resposta. Concluiu que, devido à conduta negligente do Réu ficou privado de receber o montante de que era credor (7.000,00€).

Citado, veio o Réu contestar, tendo alegado, em suma, que os factos não ocorreram da forma como o Autor os reportou, verificando-se omissão de factos essenciais para a boa decisão da causa. Confirmou ter sido, efetivamente, mandatado pelo Autor, em 30 de Setembro de 2004, para que levasse a efeito a tramitação necessária, com vista a que C... pagasse a importância que tinha em dívida para com aquele. Pelo que, nesse mesmo dia, enviou uma carta ao devedor para o mesmo pagar, o que não se verificou, tendo antes contactado o Autor para que este aguardasse algum tempo, e comparecido, ainda, nas suas instalações [dele, Réu], comunicando o seu acordo com o Autor, tendo, por isso, a tramitação subsequente ficado a aguardar o cumprimento da obrigação. Porém, como o pagamento não veio a ser feito, o Autor deu-lhe instruções para que fosse instaurada a competente ação executiva, motivo porque solicitou a presença do mesmo no escritório, a fim de efetuar o necessário pagamento, englobando este o adiantamento por conta de honorários, assim como o pagamento das respetivas custas judiciais e o já gasto na carta registada com aviso de receção enviada ao devedor, o que não veio a suceder. Considerando que a intenção do Autor era fazê-lo suportar todos os custos, alguns já efetuados, e uma vez que a sua presença já tinha sido solicitada, não mais atendeu os telefonemas do mesmo para o seu telemóvel, uma vez que para o escritório aquele nunca telefonou.

Acrescentou, igualmente, que através de carta datada de 29 de Março de 2010, o Autor referiu que no dia 1 de Abril seguinte, pelas 11h00, viria ao seu escritório, aludindo também que não queria que continuasse com o processo. Contudo, para não ser confrontado com a falta de pagamento, não veio a comparecer. Aludiu que o único telefonema que atendeu ao Autor foi há alguns anos, tendo aí solicitado a sua comparência no escritório, no intuito de ser ressarcido das despesas que já tinha suportado e das vindouras, correspondentes à interposição da ação executiva, não tendo este comparecido, uma vez que pretendia serviços gratuitos.

Por fim, aduziu que o Autor litiga de má-fé, peticionando a sua condenação em conformidade.

Pugnou pela improcedência da ação e consequente absolvição.

* Notificado, o Autor respondeu, imputando ao Réu a litigância de má-fé.

Aludiu que o mesmo foi notificado várias vezes por carta registada e, sendo advogado, tinha a obrigação, no mínimo, de responder por carta registada a solicitar os honorários ou a informar que não o patrocinava por falta de pagamento da provisão solicitada. O certo é que nunca, até à presente data, o Réu pediu qualquer provisão de honorários, bem como nunca respondeu a nenhuma interpelação por parte do Autor.

Com dispensa de audiência preliminar, foi elaborado despacho saneador tabelar e seleccionou-se a matéria de facto assente e controvertida, sobre o que não incidiu qualquer reclamação.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 82 a 87, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.

Após o que foi proferida a sentença de fl.s 89 a 105, na qual se julgou a presente acção improcedente por não provada, com a consequente absolvição do réu do pedido, ficando as custas a cargo do autor.

Inconformado com a mesma, interpôs recurso o autor A..., recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 138), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. Da factualidade dada como provada resulta que estamos perante um contrato de mandato, com representação.

  1. Tendo o tribunal a quo considerado que houve uma actuação omissa, ilícita e culposa por parte do Recorrido 3. O Recorrido não cumpriu o mandato que lhe foi conferido, o que gera responsabilidade contratual, 4. Ao contrário do que a douta sentença recorrida afirma, existe, no caso em apreço, um dano; 5. Esse dano consubstancia-se na privação de o Recorrente vir a ser ressarcido no montante de que era credor, através da apresentação de requerimento executivo através de um título executivo válido; 6. Este dano, foi devidamente demonstrado e comprovado nos autos, primeiro através da afirmação plasmada no Artigo 7.º da petição: “O Autor com a conduta negligente do Réu ficou privado de ser ressarcido no montante de que era credor” e segundo, através da junção aos autos da letra prescrita; 7. Um requerimento executivo com base numa letra prescrita, enquanto documento quirógrafo, apresenta maiores dificuldades na demonstração da constituição da obrigação pecuniária, não só na formulação da petição inicial, como na própria produção de prova; 8. Assim, o Recorrente perdeu a oportunidade de ver o seu crédito reconhecido e, consequentemente, ser ressarcido de forma “transparente” e célere, como aconteceria se o requerimento executivo fosse suportado por um título executivo válido; 9. Ou seja, ao deixar passar o prazo de prescrição da letra enquanto título executivo, o Recorrido fez o Recorrente perder a expectativa de ganho de causa na ação, independentemente das vicissitudes processuais que a mesma conheceria, na hipótese de tal não haver sucedido, o que, por si só, representa um dano ou prejuízo autónomo para aquele.

  2. Esta perda de oportunidade é denominada no ordenamento jurídico nacional como um “dano de chance”; 11. Face ao comportamento grave em termos contratuais, profissionais e deontológicos que determinou a improcedência da acção, repugna à consciência jurídica da comunidade que a culpa não tenha consequências em termos de responsabilidade.

  3. Assim, por se encontrarem verificados os requisitos do artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil, deverá o Recorrido ser ressarcido pelo dano resultante da violação da obrigação a que se tinha proposta, por via do contrato de mandato celebrado com o Recorrente.

Pelo exposto, nos melhores de Direito e naqueles que V. Exas. doutamente suprirão, com os fundamentos que o consubstanciam, deve:

  1. Serem julgadas procedentes as presentes Alegações de Recurso, por provadas e legalmente consubstanciadas; a) E, consequentemente, ser o...

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