Acórdão nº 241/13.0TBTMR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Outubro de 2014
Magistrado Responsável | MARIA DOMINGAS SIM |
Data da Resolução | 14 de Outubro de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
-
Relatório No Tribunal Judicial da comarca de Tomar, A...
, empresário em nome individual, residente em (...), Ferreira do Zêzere, instaurou contra B...
SA, com sede no lugar de (...), Tomar, acção declarativa de condenação, a seguir a forma ordinária do processo comum, pedindo a final a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 38 305,75 € (trinta e oito mil, trezentos e cinco euros e setenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora contados desde Agosto de 2012, à taxa de 4%.
Em fundamento alegou, em síntese, ter sido adjudicada à ré em Março de 2012, pelo Município do (...), a empreitada de obras públicas denominada “Execução da Nova Escola EB 2-3 R...” pelo valor de € 4 778 551,97. Tendo em vista a execução do contrato, a ré celebrou com o demandante contrato de subempreitada, nos termos do qual este se obrigou a executar todos os trabalhos de corte, moldagem e aplicação de ferro, pelo preço de €0,1675 por cada quilo de ferro que fosse trabalhado, ascendendo o preço global contratado ao valor de €56 563,25, sem Iva.
O autor deu início aos trabalhos, tendo emitido as pertinentes facturas no valor de € 18 257,50, quantia que foi paga, até que a ré empreiteira lhe comunicou que, caso quisesse prosseguir, teria que reduzir o preço para € 0,14 por Kg. Tal proposta recusou-a o demandante, por não corresponder ao acordado.
Por carta que pouco depois lhe foi enviada, a ré comunicou que o contrato celebrado ficara sem efeito, invocando para tanto o facto do dono da obra ter resolvido o contrato de empreitada com fundamento em alteração anormal e imprevisível das circunstâncias, ao abrigo do disposto no art.º 335.º, n.º 1 do Código dos Contratos Públicos. Sucede, porém, que tal fundamento, conforme a ré bem sabia, não correspondia à verdade, justificando a resolução a circunstância do Município do (...) não ter publicado o concurso no Jornal Oficial da União Europeia, formalidade de cuja preterição resultou ficar inviabilizado o acesso ao financiamento comunitário de que carecia. Acresce que o contrato celebrado entre a ré e o referido Município não chegou a ser resolvido, uma vez que, repetido o procedimento concursal, desta feita com observância da formalidade antes omitida, foi a obra de imediato adjudicada à B..., SA, que mais não fez do que aproveitar-se das referidas circunstâncias para forçar os subempreiteiros a descerem os preços contratualmente fixados.
Porque o descrito comportamento da ré privou o demandante da quantia de €38 305,75 euros correspondente à parte da obra que se viu impedido de executar, assim caracterizada como lucro cessante, tem direito a ser ressarcido deste valor, conforme reclama.
* Citada a ré, apresentou contestação, peça na qual confirmou ter sido o primitivo contrato declarado resolvido pelo dono da obra Município do (...) com o aludido fundamento, e se é certo que no novo concurso, ao qual concorreram outros empreiteiros para além da contestante, a obra lhe foi de novo adjudicada, trata-se de um outro contrato, e tanto assim que o preço agora acordado foi inferior em € 78 970,20 ao fixado no contrato resolvido. Por assim ser, a demandada contactou todos os subempreiteiros anteriormente contratados, indagando da disponibilidade para garantirem a realização dos trabalhos com o ajustamento de preços imposto pelo novo valor da adjudicação, o que todos eles aceitaram, com excepção do autor, que declarou não aceitar as novas condições, alegando ainda ter muito trabalho. O autor não sofreu quaisquer prejuízos com a resolução do primitivo contrato de subempreitada, sendo certo que nunca a indemnização poderia corresponder ao montante reclamado, que não contempla os custos que sempre teria de suportar.
Com tais fundamentos concluiu pela sua absolvição.
* Dispensada a realização da audiência preliminar, prosseguiram os autos com selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, tendo o autor reclamado desta última, por excesso. A reclamação, com excepção de uma alteração sugerida pela ré aquando do exercício do contraditório, foi desatendida (cf. fls. 270-271).
Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo que da acta consta, vindo a ser proferida sentença que decretou a improcedência da acção, absolvendo a ré do pedido formulado.
Inconformado, interpôs o autor o presente recurso e, tendo apresentado as indispensáveis alegações, rematou-as com extensas conclusões[1], das quais se extrai com relevância: - ocorreu erro de julgamento quanto aos factos constantes da sentença sob os n.ºs 4 (parte), 12., 23., 24., 25. e 26., indevidamente dado como provados, quando a prova produzida, designadamente os depoimentos prestados por C..., D...., E.....e F....., este administrador da ré, nas passagens que identifica e transcreve, impunha respostas divergentes; - verificou-se igualmente erro de julgamento no que concerne às respostas dadas aos artigos 1.º, 2.º, 5.º, 7.º e 13.º da base instrutória que, diversamente, deveriam ter sido considerados assentes, atentos os depoimentos das testemunhas antes mencionadas e ainda de G...., nas passagens que situa e transcreve; - o Tribunal errou na interpretação dos art.ºs 1227.º e 1229.º do CC porquanto, tendo o dono da obra CME desistido da obra, também a ré desistiu, respondendo perante o autor por essa mesma desistência, atento o princípio da relatividade dos contratos; - o facto da ré não ter pedido indemnização ao dono da obra Município do (...) não a exonera da obrigação de indemnizar o autor, tanto mais que está a tempo de exercer sobre aquele o seu direito de regresso; - tendo sido a ré a terminar o contrato, cabia-lhe justificar o seu incumprimento; - o demandante tem direito a ser indemnizado, devendo ser a ré condenada no pagamento da quantia de € 38 305,75, valor correspondente à parte do contrato de subempreitada que ficou por cumprir.
Com os aludidos fundamentos conclui pedindo que, na procedência da apelação, seja revogada a sentença apelada e proferido acórdão que condene a ré no pedido formulado.
Contra alegou a ré, pugnando naturalmente pela manutenção do julgado.
* Assente que pelo teor das conclusões se define e delimita o objecto do recurso, como deflui do disposto nos art.ºs 639.º, n.ºs 1 e 2 e 635.º, n.º 4 do CPC, são questões a decidir: i. indagar do invocado erro de julgamento quanto aos factos constantes da sentença sob os n.ºs 4 (parte), 12., 23., 24., 25., 26., e artigos 1.º, 2.º, 5.º, 7.º e 13.º da base instrutória; ii. indagar da causa de extinção do contrato de subempreitada celebrado entre autor e ré, determinar se o primeiro tem direito a indemnização e, na afirmativa, fixar o respectivo montante.
* i. Da modificação da matéria de facto Dirigindo à sentença apelada áspera censura, impugna o apelante a decisão proferida sobre a matéria de facto, pretendendo ver alterada a redacção do ponto 4. e eliminados os pontos 12., 23., 24., 25. e 26. da sentença, todos, em seu entender, erradamente dado como provados, devendo, inversamente, ser considerados assentes os factos perguntados nos artigos 1.º, 2.º, 5.º, 7.º e 13.º da base instrutória, aos quais o Tribunal respondeu negativamente.
Cumpre, antes de mais, fazer notar que, por evidente lapso, o Mm.º juiz “a quo” respondeu a 22 artigos da base instrutória -número dos inicialmente formulados- sem ter atentado na circunstância de, em consequência de alteração determinada no despacho que apreciou a reclamação dirigida àquela peça, ter sido eliminado o art.º 14.º, que ingressou no elenco dos factos assente sob a al. S) (cfr. despacho de fls. 270/271). O facto em causa viria a ser dado como provado nos seus precisos termos, não afectando a irregularidade cometida os ulteriores termos do processo. Todavia, e para evitar eventual confusão, manter-se-á a numeração original, e não a que decorreu da supressão daquele art.º 14.º.
Efectuada esta nota prévia, entremos, pois, na apreciação da impugnação, transcrevendo os factos descritos na sentença que dela foram objecto: “4. No âmbito deste contrato celebrado entre A. e R., ficou definido que a B..., S.A., dava de empreitada ao A. os trabalhos de corte, moldagem e aplicação de ferro na obra “Execução da Nova Escola EB 2.3 R...” (alínea D) dos factos assentes).” A propósito deste facto, o fundamento da discordância do apelante prende-se com a incorrecta qualificação do contrato aqui em causa, tratando-se de um contrato de subempreitada, e não de empreitada, conforme ali consta.
A este respeito dir-se-á que a referida designação é a que consta do acordo escrito celebrado entre as partes -cf. fls. 94 a 99- motivo seguramente pelo qual foi acolhida aquando da prolação do despacho de condensação, sendo certo que, na ocasião, tendo o réu reclamado deste último, omitiu qualquer crítica à redacção que agora impugna. De todo o modo, sempre se dirá que a denominação que as partes atribuem aos acordos celebrados não vincula -como neste caso não vinculou- o Tribunal, a quem compete, no exercício da sua função jurisdicional, aplicar o direito aos factos. E a verdade é que da conjugação dos factos apurados, nomeadamente do teor do vertido no ponto 5., o acordo celebrado surge perfeitamente caracterizado nos seus elementos essenciais, de molde a permitir a sua correcta qualificação jurídica.
Atento o que vem de se expor, porque o facto impugnado alude ao contrato celebrado entre as partes e seus termos, sendo certo que no documento escrito em que o mesmo ficou corporizado consta a menção a “empreitada”, razão não se vê para determinar a pretendida alteração, para além do mais absolutamente irrelevante para a decisão.
* Ficou assente sob o n.º 12, facto este provindo da al. J) dos factos assentes, que: “Posteriormente, o A. recebe uma carta da B..., comunicando que o contrato celebrado entre o A. e a R. tinha sido “considerado sem efeito” e que iriam procurar novo subempreiteiro para os trabalhos de armação de ferro, terminando assim o contrato. – alínea L) dos factos assentes”.
As...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO