Acórdão nº 288/13.7TBANS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução21 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório A..

, divorciado, residente em (...) Ansião, instaurou contra B...

, divorciada, residente na Rua (...) , Leiria, acção declarativa constitutiva, pedindo a final fosse pelo Tribunal proferida decisão que substituísse a declaração negocial da ré, contraente faltosa, “substituindo a escritura pública de partilha por divórcio celebrada nos termos acordados, com adjudicação ao autor do direito de propriedade sobre o prédio que identifica”.

Em fundamento alegou, em síntese útil, ter casado com a ré em 24/8/2006, com quem celebrou no dia 5 de Novembro de 2012, no âmbito de procedimento de divórcio com partilha por ambos intentado na Conservatória do Registo Civil de (...), o acordo de partilha que juntou, nos termos do qual o prédio urbano sito em (...) freguesia e concelho de (...), inscrito na matriz predial respectiva sob o art.º 2775 e descrito na CRP da indicada freguesia e concelho sob o n.º 2673, com o código de acesso (...) seria adjudicado ao requerente marido, que assumiria o pagamento do crédito titulado pela Caixa (...) garantido por hipoteca constituída sobre o imóvel, sendo adjudicado à requerida o veículo automóvel de marca (...), com a matrícula (...)FJ.

O acordo em causa, tendo sido celebrado no âmbito do procedimento de divórcio com partilha, ficou assim subordinado à condição do divórcio vir a ser decretado, o que ocorreu no pretérito dia 10.04.2013, no âmbito do processo de divórcio sem o consentimento do outro cônjuge que veio a ser convertido para a forma consensual, tendo corrido termos no TJ de Ansião sob o n.º 118/13.0TBANS.

Sucede que a ré, apesar de para tanto ter sido devidamente interpelada, recusa-se a outorgar a escritura de partilha nos termos acordados, tendo mesmo instaurado processo de inventário para partilha dos bens comuns, o qual corre termos por apenso ao identificado processo de divórcio, assim revelando inequivocamente a sua intenção de não cumprir o acordo celebrado. Porque se trata de um verdadeiro contrato promessa de partilha, é o mesmo passível de execução específica nos termos do disposto no art.º 830.º do CC, providência que o autor vem requerer a juízo.

* Citada a ré, contestou, peça na qual impugnou que o acordo de partilha junto pelo autor possa ser convertido em contrato promessa de partilha, conforme este pretende, uma vez que foi celebrado tendo em vista a sua junção ao procedimento de divórcio instaurado na identificada Conservatória e que, por motivos vários, na altura se frustrou. É assim abusivo o uso que o autor pretende fazer do acordo naquelas circunstâncias celebrado, impondo-se a improcedência da acção.

* Teve lugar audiência prévia nos termos e com as finalidades previstas no n.º 1 do art.º 591.º do CPC, aí tendo sido tabelarmente saneado o processo, delimitados os contornos do litígio e enunciados os temas da prova, sem reclamação das partes.

Teve lugar audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo que da acta consta, após o que foi proferida sentença que, decretando a improcedência da acção, absolveu a ré do pedido.

Inconformado, apelou o autor e, tendo apresentado alegações, rematou-as com as necessárias conclusões, de que se destacam e sintetizam as seguintes: 1.ª- Verifica-se uma incorrecta apreciação da matéria de facto, quando o Tribunal - dá como não provado que “a Ré não compareceu à escritura dita em 8) dos factos provados na data agendada, pelo que não foi possível realizar a escritura nesse dia”, facto que deve ser aditado à matéria assente com o n.º 10, face à junção feita com a petição do certificado emitido pelo Cartório Notarial no qual a dita escritura havia sido agendada, tendo o próprio Notário atestado que a aqui Ré não compareceu e que foi por esse motivo que não foi possível realizar a escritura; - foi omitida a referência, no facto 2), à circunstância do documento aí referido ter sido elaborado de acordo com as indicações dadas pelos Requerentes, devendo ser alterada a redacção do indicado facto de modo a conter tal menção, uma vez que se trata de facto essencial à boa decisão da causa saber se o documento exprime a vontade das partes e se foi elaborado de acordo com as instruções das mesmas, o que foi afirmado pelo próprio autor do documento, a testemunha D... ; - não dá como provado que: “A e Ré assinaram o documento mencionado em 2) com a intenção de celebrarem um contrato de partilha nos termos aí acordados, após o divórcio ser decretado”, facto que deve ser aditado à matéria assente com o n.º 11 por ter resultado dos depoimentos prestados por C... , D... , E... , a qual esteve presente na data de assinatura do documento, e ainda F... , nas passagens que identifica e transcreve; 2.ª- A douta sentença, assentando nas premissas de que não foi possível determinar a vontade das partes e que o documento a que se reporta o facto n.º 2 da matéria assente constitui “verdadeira e acabada partilha”, faz tábua rasa da matéria de facto assente.

  1. - A vontade negocial das partes resultou cristalina de toda a prova: partilharem os bens nos termos que constam desse documento se o divórcio seguisse a via do mútuo consentimento, sendo desprovido de qualquer razoabilidade o entendimento de que a vontade negocial se altera por subir as escadas – o edifício é o mesmo, a CRC é no Rés-do-chão, o antigo Tribunal Judicial de Ansião é no 1.º andar, o que interessa é a forma do divórcio e esta foi a pretendida pelas partes: o mútuo consentimento.

  2. - As declarações das partes efectuadas no documento em questão apenas e só podem ser interpretadas à luz do disposto no art.º 236.º n.º 2 Cód. Civil, e não nos termos do n.º 1 daquele dispositivo legal, sendo certo que nunca, em tempo algum, algum dos declarantes entendeu, quis e declarou, ao assinar o documento em questão, que aquele era o documento pelo qual procedia à partilha dos bens comuns (factos n.º 3 e 11 da matéria assente); 5.ª- Ambos os declarantes sabiam que com a declaração que emitiram (facto n.º 2), não partilhavam rigorosamente qualquer bem comum; a partilha (efectiva) dependia da assinatura em outra data, e após o divórcio, de um outro contrato (procedimento/escritura); estavam a acordar o modo como no futuro procederiam à partilha.

  3. - E tanto sabiam e tinham a consciência que nada tinham partilhado efectivamente ao assinarem aquele documento que a Ré requereu processo de inventário (facto n.º 7 da matéria assente).

  4. - Logo, o documento em causa não é uma partilha, porque essa não é nem nunca foi a vontade dos outorgantes, tendo o Tribunal “a quo” incorrido em erro de qualificação do negócio jurídico querido e celebrado pelas partes.

  5. - A grande maioria dos autores seguidos pelo STJ defendem que “o simples contrato promessa de partilha é válido, independentemente de os cônjuges se encontrarem em processo de divórcio” -nesse sentido veja-se Ac. STJ 27.03.2003, proc. 03B2003, sumariado em www.dgsi.pt/stj- tornando estéril a discussão sobre a questão de saber se o contrato é apenas e só válido para o caso do divórcio ser decretado na conservatória e não no tribunal.

  6. - O documento subscrito pelas partes configura um contrato promessa de partilha bi-vinculante, através do qual autor e ré pretenderam naquele exacto momento vincular-se e vincularem a outra parte a assinar naqueles exactos termos a partilha que realizariam num outro momento (futuro).

  7. - O incumprimento por parte da Ré resulta claro do facto 7) da matéria assente; 11.ª- Ao que acresce o facto de o A ter procedido à interpelação admonitória da Ré fixando prazo à mesma para cumprir (factos 8., 9. e novo 10. da matéria assente).

  8. - Estão reunidas todas as condições legais para que o A possa aqui requerer a execução específica do contrato, nos termos do disposto no art.º 830.º n.º 1 do Código Civil.

Dando por violadas as disposições legais contidas nos artigos 830.º e 1714.º do Código Civil, conclui pela revogação da sentença recorrida e sua substituição por...

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