Acórdão nº 4816/12.7TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução28 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I Em 28 de Setembro de 2012, o Ministério Público instaurou a presente ação especial de interdição por anomalia psíquica relativamente a M (…), ação essa distribuída, ao tempo, ao 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria.

Os autos prosseguiram de acordo com a tramitação prevista no art. 944º e seguintes do Código de Processo Civil (de 1961) e, após a junção do exame pericial à requerida, o Mmº Juiz a quo proferiu despacho ordenando a notificação do Ministério Público, assim como da patrona da interditanda, para querendo, se pronunciarem sobre a eventual incompetência material do tribunal par aos presentes autos.

Pronunciou-se apenas o Ministério Público no sentido de que a ação de interdição não é da competência das Secções de Família e Menores, não se integrando no artigo 122º da Lei nº 62/2013, de 26/8, mormente na alínea g) do nº1 do mesmo artigo, pelo que, deve o tribunal onde a ação foi instaurada, agora da instância local cível – núcleo de Leiria, ser considerado competente para prosseguir com a ação.

Mas o tribunal a quo assim não o entendeu decidindo que: «Nos termos do disposto nos artigos. 96º, a), 97º, nº1 e 98º todos do CPC, e artigos 38º da lei nº 62/2013, e 104º, 117º do decreto/lei nº 49/2014 de 27 de Março, declaro incompetente em razão da matéria a presente Instância Local Cível de Leiria do Tribunal judicial da Comarca de Leiria, por para a presente ação ser competente a Instância Central de Família e Menores do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria (2ª Secção instalada em Pombal)».

Inconformado com tal decisão veio o Ministério público recorrer concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: 1. Os presentes autos versam sobre a decisão do Mm. Juiz a quo, de se declarar incompetente, em razão da matéria, para julgar a presente ação de interdição, por entender que a mesma, face ao disposto no art. 122.º da Lei 62/2013, de 26 de Agosto, mais concretamente, da alínea g), é da competência do Tribunal de Família e Menores.

  1. No sentido social, entende-se estado civil como a existência e condições da existência do indivíduo perante a lei civil (solteiro, casado, viúvo ou divorciado), o que em nada está relacionado com as situações julgadas e decididas nas ações de interdição ou seja, situações de incapacidade para o governo da sua pessoa e dos seus bens.

  2. O facto das ações de interdição serem objeto de registo, nos termos do disposto no art. 1º do Código de Registo Civil, não implica que estas assumam natureza de ação de estado civil, uma vez que no art. 1º do Código de Registo Civil encontram-se elencados vários factos, cujo registo, não obstante ser obrigatório, v.g., declaração de insolvência, em nada estão relacionados com o “estado civil das pessoas”.

  3. As ações de interdição não versam sobre o estado civil das pessoas, propriamente dito, mas sim sobre uma situação pessoal que afeta a capacidade de exercício de direitos do indivíduo.

  4. O instituto da interdição e da inabilitação encontram-se reguladas na lei substantiva no Livro I (parte geral), Título II (das Relações Jurídicas), Subtítulo I (das pessoas), Secção V (incapacidades), subsecção I e II, a par com a maioridade e emancipação (subsecção I e II), releva, uma vez que, a interdição, tal como a menoridade, constituem modalidades de incapacidade para o exercício de direito, colocando-se as questões relacionadas com as mesmas, nomeadamente, a sua declaração, no plano da titularidade de situações jurídicas, relevante para efeitos de capacidade para ser parte em negócio jurídico.

  5. Deste modo, é indubitável, que, por exemplo, no caso de incumprimento de contrato em que uma das partes é menor, legalmente representada, os tribunais chamados para resolver a questão não serão os tribunais de Família e Menores, mas sim, os tribunais de instância central ou local, apesar de se tratar de questão relacionada com menor.

  6. Atendendo aos princípios proclamados pela “nova organização judiciária”, nomeadamente o espírito de especialização judiciária, apenas as questões de menores e família devem ser tratadas nos Tribunais de Família e Menores.

  7. Por tudo o exposto, não podia o despacho declarar incompetente em razão da matéria a Instância Local Cível de Leiria, por o ser a Instância Central de Família e Menores do Tribunal de Judicial da Comarca de Leria (2ª Secção), devendo, antes, verificar-se os ulteriores termos do processo.

II A factualidade a considerar resulta do relatório supra.

III Na consideração de que o objeto dos recursos se delimita pelas conclusões das alegações (art. 635 nº 3 do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (art. 608 in fine), é a seguinte a questão a decidir: - Qual o tribunal competente, em razão da matéria, para conhecer da ação de interdição.

Recorreu o Ministério Público do despacho que decidiu que a Instância Local Cível de Leiria do Tribunal judicial da Comarca de Leiria era incompetente em razão da matéria para a presente ação de interdição sendo competente a Instância Central de Família e Menores do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria (2ª Secção instalada em Pombal).

Não foi indiferente para tal decisão, como da mesma resulta, o facto de ter ocorrido, com efeitos a partir de 01 de Setembro de 2014, uma reforma na orgânica judiciária com a entrada em vigor da Lei nº 62/2013 de 26 de agosto que aprovou a Lei da Organização do Sistema Judiciário.

Vejamos.

Dispõe o art. 138º do Código Civil, que «1. Podem ser interditos do exercício dos seus direitos todos aqueles que por anomalia psíquica, surdez-mudez ou...

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