Acórdão nº 319/10.2TBAGN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução14 de Abril de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra O Município de A...

, pessoa colectiva de direito público, com o n.º (...) , com sede na (...) , em Arganil, intentou a presente acção declarativa comum, então, sob a forma de processo ordinário, contra os réus, B... e mulher C...

(adiante designados 1ºs réus), residentes na freguesia de (...) , em Arganil, e D...

(adiante designada 2ª ré), residente na Rua (...) Lisboa, peticionando a sua condenação dos réus: a) A reconhecerem que o caminho que tem início na Rua x(...) , cerca de 15/20 metros a Sul da ponte da Ribeira (...) , segue em linha recta, em direcção Poente/Nascente, com o comprimento de 7 metros, onde se encontram 7 degraus, flecte à direita, na direcção Norte/Sul, desenvolve-se por mais 8 degraus, prolonga-se por mais 14 metros até às escadas (cerca de 15 degraus) de acesso à casa de habitação de E...e às capelas de (...) e do (...) , e que até à década de 1960 deu acesso às povoações de P (...) , E (...) e S (...) , por onde qualquer pessoa circulava, é um caminho público; b) A demolirem e retirarem do identificado caminho o portão que ali colocaram e que impede a livre circulação das pessoas; c) A absterem-se de praticar quaisquer actos que impeçam ou dificultem a passagem de quem quer que seja pelo referido caminho.

Em ordem a sustentar a sua pretensão, a autora alega, em síntese, que, desde tempos imemoriais até à década de 1960, pelo caminho referido em a) do petitório, acima identificado, sempre passou livremente quem se dirigisse às capelas de (...) e do (...) , ao beirado da casa de F..., à habitação pertença de E... e às povoações de P (...) , E (...) e S (...) .

Segue dizendo que era por esse caminho que as pessoas da freguesia da (...) transitavam com lenha, mato e carregos, que transportavam de e para as suas propriedades, sendo esse o único caminho que existia para estabelecer a ligação entre a freguesia da (...) e as povoações de P (...) , E (...) e S (...) .

Adianta que o caminho em causa, que até à década de 1960 era constituído por um trilho em terra, sempre foi mantido e melhorado por si e por outros organismos públicos, sendo que, há cerca de década e meia, os réus colocaram um portão, junto à Rua x(...) , que impede o acesso a qualquer outra pessoa, já que se mostra fechado à chave, procurando e logrando, dessa forma, impedir que outras pessoas circulem pelo referido caminho.

Conclui pugnando pelo carácter público do caminho, porquanto o mesmo, desde tempos imemoriais, encontra-se no uso directo e livre de todos os munícipes de A... , sendo a actuação dos réus ilegal e prejudicial para o interesse público, já que impede que o caminho seja usado livremente pelo público.

Juntou nove documentos, procuração forense e documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça.

*** Regularmente citados para os termos da presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário, vieram os réus, no prazo legal, contestar, invocando, em síntese, o seguinte: - A nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial; - A ilegitimidade plural passiva dos réus, por preterição de litisconsórcio necessário passivo, já que os réus não podem ser demandados desacompanhados de E...; - A prescrição do exercício do direito peticionado pelo autor, nos termos do disposto no art. 309.º do Código Civil; - Que, por si e pelos seus antecessores, utilizam a parcela de terreno, que o autor denomina de caminho, com exclusividade, para acesso às suas moradias, pelo menos desde 1960, de uma forma ininterrupta, à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, ignorando que estavam a lesar direitos de outrem e na convicção de estarem a exercer e serem titulares de um direito, tendo procedido à sua limpeza, colocado dois portões com chave, cimentando o chão, instalado grelhas de recepção de águas pluviais e executado as correspondentes caixas de recepção, pelo que adquiriram, por usucapião, servidão predial, a pé e para acesso às suas moradias, em favor dos prédios de que são respectivamente proprietários, formulando pedido reconvencional no sentido de que o tribunal declare e reconheça a referida aquisição, nos exactos termos propugnados.

Concluem pugnando pela improcedência da acção e pela condenação do autor como litigante de má-fé em multa e indemnização em seu favor.

Juntaram vinte documentos, procurações forenses e comprovativo do pagamento da taxa de justiça.

*** Replicou o autor pugnando, em síntese, pela improcedência das excepções invocadas pelos réus, do pedido de condenação como litigante de má-fé, e, bem assim, do pedido de reconvencional por aqueles aduzido, no caso de o mesmo ser admitido (o que não concebe por falta de fundamento legal), acabando por concluir nos termos peticionados na petição inicial.

*** Notificados da réplica, apresentaram os réus/reconvintes articulado que denominaram de tréplica, nos termos do qual suprem omissões apontadas pelo autor (entre os quais a indicação do valor da reconvenção) e pugnam que não assiste qualquer razão ao demandante.

*** Após convite do tribunal aos réus/reconvintes para aperfeiçoamento do articulado de contestação/reconvenção (ao qual os mesmos acederam apresentando nova peça processual aperfeiçoada) e concessão do exercício do contraditório à parte contrária (a qual, no exercício de tal direito, renovou a argumentação que plasmou na réplica), realizou-se uma audiência preliminar, a que se seguiu a prolação, por escrito, do despacho saneador, nos termos do qual o tribunal admitiu a reconvenção, fixou o valor da causa, julgou improcedente a invocada excepção dilatória de nulidade de todo o processo, por ineptidão da petição inicial, entendeu pela legitimidade plural passiva dos réus e seleccionou a matéria de facto relevante para a boa decisão a causa (assente e controvertida), segundo as diversas soluções plausíveis da questão de direito.

*** Após a instrução dos autos, encontrando-se já designada data para a realização da ora denominada audiência final, na senda do pugnado pelos réus/reconvintes, o tribunal determinou o chamamento à acção de terceira pessoa, designadamente de E..., o qual, citado para contestar, veio sufragar, em síntese, a argumentação expendida pelo autor, concluindo que a acção deverá ser julgada de acordo com a prova a produzir em julgamento.

No normal prosseguimento dos autos, teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova testemunhal nela produzida, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 439 a 467, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final se decidiu o seguinte: “Nestes termos, decide o tribunal: - Julgar totalmente improcedente, por não provada, a presente acção declarativa, e, em consequência, absolver os réus e o chamado dos pedidos contra eles aduzidos pelo autor; - Julgar totalmente improcedente, por não provada, a reconvenção, e, em consequência, absolver o autor/reconvindo do pedido reconvencional contra ele aduzido pelos réus/reconvintes; - Julgar improcedente o pedido de condenação do autor como litigante de má-fé, que dele vai absolvido.

*** Custas da acção pelo autor.

Custas da reconvenção pelos réus. (cf. art. 527, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil) Custas do incidente de litigância de má-fé pelos réus, fixando-se a taxa de justiça pelo mínimo legal. (cf. artigos 527, nºs 1 e 2 do CPC e 7, n.º4 do RCP e tabela II que lhe vem anexa)”.

Inconformado com a mesma, interpôs recurso a autora, Município de A... e subordinadamente, os réus reconvintes, B... , C... e D... , recursos, esses, admitidos, respectivamente, como de apelação e subordinado, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 513), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: Município de A... : 1-O teor da douta sentença douta sentença de que se recorre, está em oposição com os factos dados como provados nos pontos 1º a 19º e 27º.

2-De acordo com o entendimento expresso na douta sentença, que acolhe o entendimento da Jurisprudência, designadamente, o Assento do STJ de 19-04-1989, DR, I, de 2-6-1989 BMJ, 386º-121) através do qual resultou que são públicos “ os caminhos que, desde tempos imemoriais estão no uso directo e imediato do público”.

3-Apesar das correntes jurisprudenciais que se desenvolveram fixou-se jurisprudência no sentido de considerar públicos desde que seja utilizado livremente por todas as pessoas.

4- Tal como resulta da douta sentença, são públicos os caminhos que estejam no uso directo e imediato do mesmo pelo público, e que tal uso ocorra desde tempos imemoriais.

5-Até ao início da década de 1960, sempre pelo caminho em questão passou livremente, desde tempos imemoriais, quem se dirigisse às capelas de (...) e do (...) , ao beirado do prédio/casa de habitação de F..., aos prédios pertencentes, respectivamente, aos 1ºs e 2ª Réus e ao prédio do chamado E... e às povoações de P (...) , E (...) e S (...) .

6-Tal circulação verificou-se durante séculos, 7-Era por tal caminho que circulava as pessoas da freguesia para as suas propriedades.

8-A manutenção e melhoramento do caminho, até ao início da década de 1960 sempre foram assegurados pelo autor e outros organismos públicos, facto provado 16).

9-Resulta ainda dos factos provados 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º e 9), que o caminho em questão, se situa dentro da localidade (na malha urbana) da sede de freguesia da (...) , Concelho de A... .

10- Tendo em conta os factos dados como provados, não se aceita o douto entendimento do M. Juiz de 1ª instância, quando qualifica o caminho como atravessadouro, “ ou seja uma serventia pública que se fazia através dos terrenos particulares hoje pertencentes aos Réus e ao chamado, que tinham por finalidade encurtar o percurso entre locais determinados”.

11-Do facto provado 18) resulta que “ por volta do fim da década de 1950 e início de 1960, mas em data não concretamente apurada, foi melhorado o caminho...

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