Acórdão nº 1444/10.5TBCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução20 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I - RELATÓRIO MR (…) intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo ordinário, contra: 1. E (…) e mulher, A (…), 2. M (…), viúva, por si e em representação dos seus filhos menores, D (…), F (…) e C (…).

Pedindo a condenação dos Réus: a) a reconhecerem o direito do autor a ser remunerado pelo trabalho referente à divisão da Quinta K... e melhor descrito no articulado; b) a pagarem ao autor, a título de honorários pelo referido trabalho, o valor de 1% do valor pelo qual a Quinta K... foi ou será alienada com o limite mínimo de 40.000,00€, ou, em alternativa, c) a pagarem ao autor os honorários devidos pelo trabalho desenvolvido e supra descrito, e que desde já contabiliza em 40.000,00€ ao qual devem acrescer os juros à taxa legal, que se vencerem após a citação.

Alegando, para o efeito e em síntese: na ação ordinária que correu entre o aqui autor e os aqui réus ficou demonstrado que os aqui réus se comprometeram a pagar o trabalho desenvolvido pelo autor em todo o processo de preparação da Quinta K..., no valor acordado de 1% do valor da venda; tendo aí sido decidido que apenas se provou que esse montante será devido quando a venda da Quinta se concretizar, tem o autor o direito a recebê-lo, ainda que tal só venha a acontecer quando a venda for concretizada; como tal pretende obter a condenação dos Réus no pagamento da referida percentagem de 1% do valor pelo qual venha a ser alienado o prédio dos réus; em alternativa, no caso de os RR. decidirem não alienar a Quinta K..., devem estes pagar ao Autor todo o trabalho realizado em prol do interesse e benefício do património dos RR.; o património dos RR. ficou substancialmente valorizado, em resultado do trabalho desenvolvido pelo autor na separação dos 3 prédios de que se compunha a Quinta K..., encontrando-se o mesmo em condições de venda imediata; para além do tempo despendido no trabalho realizado – que há de considerar-se um trabalho técnico – o autor faz jus a ser também ressarcido pelo resultado do seu trabalho, isto é, pela mais valia que obteve a favor dos RR.; se assim não for, os RR. ficam enriquecidos à custa do trabalho prestado pelo Autor, devendo este receber efetivamente aquilo a que tem direito; considerando o tempo despendido (mais de 400 horas em trabalho de gabinete) mais deslocações a diversas entidades e reuniões com as partes, julga o autor ser adequado uma remuneração calculada a partir da mais valia introduzida no património dos RR., que jamais pode ser inferior ao valor por estes proposto, isto é, de 40.000,00 €.

Os 1ºs, e os 2ºs. RR., apresentaram cada um a sua contestação através de articulados autónomos, nos quais invocam a exceção de caso julgado face à interposição e decisão da ação ordinária n° 1787/08.0TBCBR, que correu termos na 2ª Secção da Vara Mista de Coimbra, por se verificar em ambas identidade dos sujeitos, causa de pedir e pedido. Os 1ºs.RR. invocam ainda a prescrição do pedido alternativo consubstanciado no enriquecimento sem causa. Todos concluem pela sua absolvição do pedido, pedindo a condenação do autor como litigante de má-fé.

O autor apresentou articulado de Réplica, no qual se pronunciou no sentido da improcedência das invocadas exceções.

Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença a julgar a ação parcialmente procedente por provada, condenando os Réus a pagar aos Autores a quantia de quantia de €20 000,00 euros [sendo à quantia devida pelos RR. E (…) e A (…), deduzido o crédito de custas de parte da responsabilidade do autor no montante de 449,21€], a que acrescem juros de mora desde a data da notificação desta decisão aos Réus, à taxa de 4%, até pagamento, absolvendo os Réus do restante pedido.

Não se conformando com a mesma, todos os intervenientes processuais dela interpõem recurso de apelação.

Os réus E (…) e mulher, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: (…).

* A Ré C (…), termina a motivação do recurso por si interposto, formulando as seguintes conclusões: (…) A Ré, M (…), por si e em representação dos seus filhos menores, sintetiza a motivação do recurso por si interposto, nas seguintes conclusões: (…) Pela sua parte, a autora sintetiza a motivação do recurso por si interposto, através das seguintes conclusões: (…) * Quer a Ré C (…) quer o autor apresentaram contra-alegações aos recursos interpostos pela parte contrária.

Cumpridos que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no artigo 657°, nº2, in fine, do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso. II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo[1] –, as questões suscitadas na sequência da interposição dos recursos da autora e dos réus, são as seguintes: Apelação dos RR. E (…)e mulher: 1. Improcedência manifesta do pedido alternativo.

Apelação da Ré C (…): 1. Impugnação da matéria de facto.

  1. Inviabilidade da invocação do instituto do enriquecimento sem causa numa relação contratual.

  2. Inadmissibilidade do recurso à equidade.

    Apelação da Ré M (…) 1. Verificação da exceção de caso julgado relativamente ao pedido alternativo.

  3. Impugnação da matéria de facto – pontos 2, 8, 11 e 18.

    Apelação da autor 1. Impugnação da matéria de facto 2. Valor a atribuir ao autor pelos serviços por si prestados.

    III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DOS RECURSOS 1. Exceção de caso julgado relativamente ao pedido alternativo.

    Sendo indiscutível que uma causa se repete quando há coincidência em simultâneo quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir, dúvidas não poderão haver quanto à não verificação da exceção de caso julgado relativamente ao pedido formulado em alternativa e relativamente ao qual se encontram a prosseguir os presentes autos.

    Com efeito, embora haja alguma coincidência quer nos factos por si alegados, quer na pretensão exercida pelo autor em ambas as ações, o fundamento jurídico em que faz assentar tal pretensão é distinto: Na ação nº 1787/08.0TBCBR, os autores pedem a condenação dos réus no pagamento da quantia de 40.000,00 €, correspondente aos honorários pelos serviços por si prestados aos Réus, em conformidade com o acordado. Alegando ter cumprido a sua obrigação decorrente do contrato celebrado entre ambos, o pagamento de tal quantia é peticionado como correspondendo à remuneração acordada. Ou seja, o que aí se encontrava em causa era o cumprimento por parte dos réus da obrigação emergente de tal contrato, em conformidade com o valor acordado entre as partes.

    Na presente ação, em sede de pedido formulado por via alternativa, e aceitando o decidido na 1ª ação, no sentido de que, tendo a remuneração sido condicionada à venda da Quinta, tal condição não se havia verificado, o autor, alegando que, caso os réus decidam não alienar a referida Quinta, deverão pagar ao autor o trabalho por si realizado no interesse e benefício do património dos réus. Em consequência, e peticionando embora a mesma quantia de 40.000,00 €, fá-lo agora a título de compensação pelo trabalho despendido, em montante a determinar pelo valor do enriquecimento que a atividade do autor importou para o património dos réus (ou seja, embora não o alegue expressamente na petição inicial, a calcular de acordo com as regras do enriquecimento sem causa).

    Embora peticionando a condenação dos réus em igual montante, o pedido, a pretensão formulada em cada uma das ações é distinta – na primeira, é peticionada a condenação dos réus no pagamento do preço acordado entre as partes, na presente ação, partindo do reconhecimento de que a condição já não se verificará, é peticionada a condenação dos réus a pagarem ao autor o valor que o resultado do seu trabalho veio incorporar no património dos réus, enriquecendo-os. Ou seja, se a primeira ação é uma ação de simples cumprimento de um contrato, relativamente ao pedido alternativo formulado na presente ação parte-se precisamente da circunstância de que o facto de que dependia a obrigação de prestação da ré nunca se irá realizar, pretendendo o autor ser compensado pelo facto de, pela sua parte, já ter cumprido a obrigação para si emergente de tal contrato.

    Consistindo a causa de pedir no facto jurídico constitutivo do efeito pretendido pelo autor (artigo 581º, nº4 do NCPC), abarca todos os factos que integram a previsão da norma ou das normas materiais que estatuem o efeito pretendido. É o conjunto de factos, que à luz da ordem normativa, desencadeia consequências jurídicas. É o facto jurídico concreto gerador do direito invocado pelo Autor e em que este baseia a sua pretensão, isto é, o pedido.

    Ou seja, a causa de pedir não é formada pelos factos enquanto acontecimentos naturalísticos, mas enquanto suscetíveis de preencher a previsão normativa em que se funda a pretensão do autor.

    No caso em apreço, embora, por se tratar de causas de pedir complexas, haja alguns factos coincidentes, o autor fundamenta o seu pedido alternativo num distinto fundamento jurídico (não confundir com diversa qualificação jurídica): partindo da ideia de que a condição de que fizeram depender o pagamento do preço acordado já não se irá realizar, alega, agora, factos tendentes a demonstrar que o resultado do trabalho que despendeu importou uma mais-valia para o património dos réus, enriquecendo-o.

    Não havendo coincidência no pedido nem nas causas de pedir, não se tem por verificada a invocada exceção de caso julgado relativamente ao pedido formulado pelo autor em alternativa, confirmando-se a decisão proferida a tal respeito no despacho saneador.

  4. Impugnação da matéria de facto.

    Os tribunais da Relação, sendo tribunais de segunda instância, têm atualmente competência para conhecer tanto de questões de direito, como de questões de facto.

    Segundo o nº1 do artigo 662º do NCPC, a decisão proferida sobre a matéria de pode ser...

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