Acórdão nº 389/12.9TBPCV-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução06 de Outubro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO N (…) veio, por apenso à execução que contra si é movida pela C (…), S.A., deduzir oposição à execução, com os seguintes fundamentos, entre outros: os contratos de mútuo que sustentam a execução foram celebrados pelo opoente com o escopo exclusivo de adquirir imóvel para habitação própria e permanente; tendo a construção do imóvel sido financiada pela exequente, cujo empréstimo se encontrava garantido por hipoteca sobre o edifício e respetivas frações, no âmbito de execução movida contra a construtora veio a exequente a adquirir dez frações no edifício em causa; a exequente nunca concluiu as 10 frações de que é proprietária, nem, na qualidade de administradora provisória do condomínio, diligenciou para a conclusão das partes comuns, encontrando-se o prédio inacabado, levando a entidade administrativa à eminente decisão de demolir o prédio; ao intentar a presente ação executiva, a exequente atua em abuso de direito, devendo, em consequência, ser extinta a execução; - a exequente coartou a possibilidade do oponente usar a fração em causa para o fim a que o levou a contratar os empréstimos aqui em execução; - recusou a dação em cumprimento do imóvel; - não concluiu a construção das 10 frações de que é titular; - não diligenciou, na qualidade de administradora provisória do condomínio, as resoluções da CM de Vila Nova de Poiares para preservação da segurança e salubridade do edifício; sendo a fração do opoente inabitável, está gorado o escopo que determinou a celebração dos contratos de mútuo e legitima a resolução dos contratos, em conformidade com o disposto no art. 437º do Cód. Civil ou a recusa das prestações; assim, é legítimo ao oponente recusar o pagamento das prestações dos contratos de mútuo enquanto a exequente não cumprir a sua obrigação de conclusão das frações de que é titular e nas partes comuns do prédio, pelo que, também por este motivo a execução deve ser julgada extinta.

A exequente apresentou contestação no sentido da improcedência da oposição.

O juiz a quo, considerando reunirem os autos todos os elementos para o conhecimento do mérito, proferiu sentença a julgar improcedente a oposição, determinando o prosseguimento da execução.

* Inconformados com tal decisão, os executados/oponentes dela interpuseram recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: 1. A douta sentença recorrida é nula por omissão de pronúncia - Cfr. art.º 615º n.º 1 al. d) do CPC.

  1. O recorrente alegou que a exequente, na qualidade de administradora provisória do prédio não logrou pela conclusão das partes comuns do edifício nem pela conclusão das 10 frações que adquiriu ao construtor, o que impossibilitou que o recorrente pudesse habitar a sua fração.

  2. A sentença recorrida é absolutamente omissa quanto a esta questão. O mesmo se diga em relação aos factos alegados pela recorrente quanto às diligências que desencadeou para lograr a dação em pagamento.

  3. A exequente detinha, nos termos do art.º 1435º-A n.º 1 do CC a qualidade de administradora provisória do condomínio do prédio onde se encontram as frações adquiridas com recurso ao mútuo em discussão nos presentes autos.

  4. A exequente era titular de 10 frações no edifício, adquiridos em processo de execução ao construtor, de que era credora hipotecária.

  5. O construtor foi dissolvido e liquidado administrativamente.

  6. A exequente detinha a dupla qualidade de administradora provisória e detentora da maioria das frações, por via de sucessão com o construtor.

  7. De entre as funções do Administrador do Condomínio, destaca-se a previsão do art.º 1436º al. f) do CC, que estatui o dever do Administrador realizar os actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns.

  8. Atos conservatórios são os destinados a evitar a deterioração ou destruição dos bens, podendo ter natureza material ou judicial.

  9. Impunha-se à exequente, na qualidade de administradora provisória do condomínio que diligenciasse no sentido da conclusão das partes comuns do prédio.

  10. Sem que se achem concluídas as partes comuns do edifício este é inabitável, incluindo, naturalmente, as frações do recorrente - Desde logo, impossibilita e emissão de licença de utilização.

  11. A exequente não se pode eximir desta dupla qualidade que detém. Por um lado, administradora provisória do condomínio e, por outro, credora hipotecária do executado, ora recorrente.

  12. Não pode, por um lado exigir o cumprimento do contrato de mútuo celebrado com o exequente e, por outro, por via da omissão de atuação na qualidade de administradora do condomínio, impedir a fruição da fração.

  13. Se o fizer - como fez - atua com manifesto abuso de direito, devendo a sua pretensão improceder.

  14. Não é consentâneo com os ditames da boa-fé, considerar que a exequente é tão só e apenas mutuante nos contratos em causa nos presentes autos, quando é simultaneamente detentora da maioria das frações e detém a qualidade de administradora provisória do condomínio.

  15. Ao adquirir todas as frações do empreiteiro, que constituem a maioria do capital investido no prédio, não só a exequente se tornou administradora provisória do condomínio como até substituiu o empreiteiro na obrigação de conclusão das partes comuns do edificou, por via da sucessão na sua posição contratual.

  16. Atento o poder que, por esta via, lhe ficou investido, apenas a exequente tinha a possibilidade (desde logo financeira) para concluir o edifício (falamos das partes comuns) e, desta forma, tornar o prédio habitável.

  17. Apenas a exequente tinha a possibilidade e capacidade, atenta sua posição maioritária, de diligenciar pela conclusão das partes comuns do edifício.

  18. Não o fez, apesar de se ter comprometido com Câmara Municipal de Vila Nova de Poiares a lograr tal desiderato.

  19. Ora, patenteando este cumprimento e exigindo qualquer contraprestação do executado, a exequente atua como manifesto abuso de direito.

  20. O instituto do abuso do direito tutela, deste modo, situações em que a aplicação de um preceito legal, normalmente ajustada, numa concreta situação da relação jurídica, se revela injusta e fere o sentido de justiça dominante.

  21. O Direito não pode deixar de tutelar certas expectativas que espontaneamente emergem dos contratos e das relações interpessoais e, por isso, fixa os limites da responsabilidade na interação social, reconhecendo e criando normas que colidem de forma particular as expectativas criadas.

  22. Foram alegados factos em sede de Oposição que, a serem demonstrados, permitiriam demonstrar a existência de uma atuação pela exequente com abuso de direito. Porém, não foi dada possibilidade às partes da discussão oral da causa com a inerente produção de prova.

  23. Foi, assim, violado o princípio da imediação que se traduz, essencialmente, no contacto direito entre o juiz e as diversas fontes de prova.

  24. A audiência preliminar destina-se a facultar às partes a discussão da matéria de facto e de direito, quando o juiz tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, da causa.

  25. In casu, foi proferida sentença sem que tal possibilidade fosse facultada às partes, inquinando a mesma de nulidade.

    * Não foram apresentadas contra-alegações.

    Dispensados os vistos legais ao abrigo do disposto no nº4, do artigo 657º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.

    II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais...

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