Acórdão nº 61/12.0TASCD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDA VENTURA
Data da Resolução28 de Janeiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: I. Relatório: 1. No Tribunal Judicial de santa Comba Dão (3º Juízo), após julgamento em processo comum singular, por sentença de 08-05-2014, o arguido A... , divorciado, comercial, nascido a 15.8.1973, natural de Currelos, Carregal do Sal, filho de (...) e de (...) e residente na Avenida (...) , em Carregal do Sal, foi condenado nos seguintes termos: (...) pela prática, como autor material, de um crime de desobediência qualificada, p. e p. pelo artigo 348º, n.º 2, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão e por um crime de descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público, p. e p. pelo art. 355º, do Código Penal na pena de 2 (dois) anos de prisão.

Em cúmulo jurídico, vai o arguido condenado na pena única de 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de prisão.

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso da sentença, tendo formulado na respectiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: 1. Afigura-se exagerada, desadequada e desproporcional a escolha e a medida da pena aplicação da medida de prisão efectiva ao caso em concreto, crime de desobediência qualificada, p. e p. pelo artigo 348°. n.º 2, do C.P.. condenação na pena de 1 ano de prisão, tanto mais que esta só deve ser aplicada in extremis, e é uma extrema ratio; em detrimento das penas de substituição e ou suspensão da pena.

  2. Mais exagerada, desadequada e desproporcional a escolha e a medida da pena, aplicação da medida de prisão efectiva ao crime de descaminho ou destruição de objectos colocados sob o poder público, p. e p. pelo artigo 355°, do Código Penal, condenação na pena de prisão de 2 anos, tanto mais que esta só deve ser aplicada in extremis, é uma extrema ratio, em detrimento das penas de substituição e ou suspensão da pena.

  3. Por maioria de razão, desadequado e desproporcional o quantum do cúmulo jurídico e a pena do concurso, fixação da pena única de 2 anos e 4 meses de prisão, repudiando o uso de qualquer substituição ou suspensão da mesma, baseando tal decisão predominantemente nos antecedentes criminais do arguido.

  4. O arguido está hoje, inserido social, familiar e profissionalmente, 5. O arguido é comercial e aufere uma média de e 1000,00 mensais.

  5. É filho único, vive com os Pais, estando estes na sua dependência afectiva e monetária.

  6. O Arguido tem o firme propósito de não voltar a praticar quaisquer factos que de algum modo o possam associar a um passado, presente e futuro de delinquência, tendo-se mostrado colaborante e arrependido.

  7. O Arguido aproveitou as oportunidades que lhe foram dadas, sendo hoje um cidadão estimado e respeitado na comunidade onde está inserido.

  8. Com a sua condenação na pena de prisão efectiva de 2 anos e 4 meses verá todos os seus esforços frustrados, arruinada a sua vida pessoal, familiar e profissional, não podendo honrar os seus compromissos nem dar apoio ao seu filho menor e Pais. A substituição da pena de prisão ou a sua suspensão não porá em causa a ordem e tranquilidade públicas, porquanto não há perigo da continuação da actividade criminosa e a gravidade dos crimes é diminuta; 10. Deve, pois, aquela medida da pena e a sua escolha ser substituído por outra menos gravosa não privativa da liberdade, designadamente pela prestação de trabalho a favor da comunidade, ou suspensão com regime de prova, ou outra que se entenda, 11. Ou, caso assim não se entenda, pela sua suspensão.

  9. Podendo, de igual modo, fazer-se uso da suspensão da pena de prisão, o que em última instância, se requer, medida esta que se afigura mais adequada e suficiente ás exigências cautelares que no caso se impõem e proporcionais à gravidade dos crimes em apreço, praticados pelo arguido.

    A Sentença de fls. (...), ora posta em crise, violou o exarado nas normas norteadoras da escolha e da medida da pena, sendo que estas normas deviam ter sido interpretadas, pela Meritíssima Juíza a quo, no sentido de não ser aplicada ao ora recorrente a prisão efectiva, devendo, como tal, ser revogada a Douta Sentença recorrida — com a violação dos artigos 400, 430, 50°, 53°,58°, 70°, 71°, 72°, e 73°, e proferida nova Sentença nos termos acima indicados.

    Termos em que, e nos melhores de Direito, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o decidido e substituído por outro, nos termos indicados. De todo o modo, sempre farão Vossas Excelências a costumada JUSTIÇA 3.

    O Magistrado do Ministério Público não respondeu ao recurso.

  10. Neste Tribunal da Relação, o Exmº. Procurador-Geral Adjunto, manifestou-se no sentido da confirmação integral da sentença sob recurso, nos seguintes termos (transcritos): O recorrente A..., aqui recorrente tem legitimidade, está em tempo e nada obsta ao conhecimento do objecto do recurso.

    Não poderia ser outra a decisão do Tribunal na perspectiva de defesa da eficácia mínima do ordenamento jurídico-penal português. considerado no caso a total incapacidade revelada pelo Arguido de interiorizar a abstinência em não cometer crimes, que afinal mais não é do que a obrigação imposta a qualquer cidadão. Da panóplia de medidas alternativas à prisão tout já aplicadas nada surtiu efeito positivo.

    Justificando a decretada pena de prisão efectiva, disse o Tribunal: “O arguido A... tem antecedentes criminais por factos de idêntica e diversa natureza, numa sucessão ininterrupta cio factos desde 2001 até 2013, sendo que em relação ao crime de desobediência tem duas condenações pelo mesmo crime, anterior e posterior à data dos factos e quanto ao crime de descaminho muitas das condenações são por crime de natureza similar! aproximada ( falsificação de documento, abuso de confiança fiscal e abuso de confiança à segurança social).

    Dada a personalidade do agente manifestada no facto o ao que consta do seu registo criminal, as necessidades de prevenção de prática de futuros crimes e de recuperação social do arguido., não pode concluir-se por um prognóstico favorável de que a simples censura do facto e ameaça da prisão realizem as finalidades da punição. Na verdade, estamos perante um arguido que permanece indiferente aos comandos ético-jurídicos que lhe são dirigidos e alheio ás solenes advertências que cada condenação acarreta, persistindo numa conduta anti-jurídica e delitual, disso sendo notório a prática destes factos em pleno período da suspensão de execução da pena de prisão de 5 anos, suspensa por igual período, em que foi condenado ( no âmbito da decisão de cúmulo jurídico efectuada no processo 11.0 82/06.1IDVIS- o período de suspensão iniciou-se em 11.05.20 10 e terminará e. 11.05.2015), sendo que o arguido não se coibiu de praticar. nesse período, apenas estes factos, mas também os dos autos n.° 295/11.4TASCD (crime de coacção na forma tentada, em Outubro de 2011), os do processo 40/12.7PCLRA ( crime de abuso de confiança, em 09.12.2011) e o processo 186/13.4GCSCD ( crime de desobediência em 13.07.2013). Este comportamento posterior é impressivo no que à indiferença e desconsideração do arguido respeita perante todas as oportunidades que lhe têm sido proporcionadas ( repare-se que, de todas as condenações sofridas, nenhuma o foi em prisão efectiva), violando, sistematicamente, os sucessivos juízos de prognose que lhe têm sido feitos, não sendo possível, neste momento e perante este quadro factual, crer que o arguido, em liberdade, saberá aproveitar para mudar de atitude e comportamento, apesar da sua inserção familiar e profissional actual”.

    É na verdade impressionante o quadro traçado pelo Tribunal, que de todo inviabiliza a pretensão da Exma. Advogada do Recorrente, a qual, diga-se sem qualquer desprimor, assume uma postura irrealista ao considerar a decisão do Tribunal “exagerada, desadequada e desproporcional” e reclamando de forma clamorosamente indevida violação das normas dos artigos 40.°. 43.°, 50.°, 53•0, 58.°, 70.°, 71.°, 72.° e 73.°, todas do C. Penal.

    A nosso ver o recurso é pois para improceder. Tal é o nosso parecer.

    5 - No uso do seu direito de resposta, o arguido reitera a argumentação já expendida na sua motivação de recurso, pugnando pela procedência do mesmo.

    Colhidos os vistos, foram os autos submetidos a conferência, cumprindo apreciar e decidir.

    1. Fundamentação: 1. Poderes cognitivos do tribunal ad quem e delimitação do objecto do recurso: Conforme Jurisprudência constante e pacífica, são as conclusões extraídas pelos recorrentes das respectivas motivações que delimitam o âmbito dos recursos, sem prejuízo das questões cujo conhecimento é oficioso, indicadas no art. 410.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (cfr. Ac. do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de Outubro, publicado no DR, 1-A de 28-12-1995).

    Assim, no caso sub judicie cumpre apreciar: Medida da pena/substituição/suspensão.

  11. Na sentença recorrida, foram considerados provados os seguintes factos: 1. No âmbito do procedimento cautelar que correu termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Santa Comba Dão sob o n.º 661/11.5TBSCD, que a “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, CRL” moveu contra “B..., Lda.” foi ordenada, por sentença transitada em julgado em 25.10.2011, a apreensão e restituição definitiva à “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo, CRL” do veículo automóvel de marca “Opel”, modelo “Astra GTC 1.9 CDTI”, com o n.º de matrícula EF....

  12. Em cumprimento de tal decisão o militar da GNR D..., no dia 5 de Outubro de 2011 contactou o arguido A... para proceder à entrega do veículo e dos documentos de tal veículo, ao que o mesmo se recusou.

  13. Por tal facto, no dia 21.10.2011 e 13.12.2011 a Sra. Juiz de Direito, no âmbito do referido processo n.º 661/11.5TBSCD proferiu despacho ordenando a notificação do possuidor do veículo (o arguido A...) para, no prazo de 10 dias, proceder à entrega do veículo e respectivos documentos no posto policial da sua área de residência ou, caso dispusesse de título justificativo de não entrega, no mesmo prazo, disso fazendo prova nos autos, sob pena de, não o fazendo...

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