Acórdão nº 1524/12.2T3AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelALCINA DA COSTA RIBEIRO
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO 1.

Por sentença proferida em 25 de Fevereiro de 2014, foram, cada um dos arguidos, A... e B... , com sinais nos autos, condenados pela prática de um crime previsto e punido pelo art. 316º, nº1, do Código de Trabalho conjugado com o disposto nos artigos 311º, 312º e 315º, do mesmo diploma, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 10€ (dez euros), num total de 1500,00€ (mil e quinhentos euros).

Mais foram os arguidos condenados a pagar, solidariamente, à demandante, C... , a quantia de 3 000€ (três mil euros), acrescida de juros legais a contar da notificação do pedido de indemnização cível, a título de danos não patrimoniais. 2.

Inconformados recorrem os arguidos, formulando as conclusões que a seguir se sintetizam: 1ª – Como resulta da matéria de facto provada e dos documentos juntos aos autos, a sociedade F... Unipessoal, Lda., é uma micro-empresa, contando com 4 trabalhadores, à data do seu encerramento.

  1. – Sucede que os arguidos foram condenados erradamente por ilicitude no encerramento, nos termos previstos pelo nº 1, do art. 316º, do Código de Trabalho, como se fosse uma pequena, média ou grande empresa.

  2. – À micro-empresa apenas é exigida a comunicação da decisão de encerramento, ficando dispensada a fase negocial, nos termos previstos pelo nº 4, do art. 346º, aplicável por força do estatuído no art. 315º, in fine, do Código de Trabalho de 2009.

  3. – Os arguidos agindo em representação da micro-empresa, comunicaram às trabalhadoras o encerramento com a antecedência de 6 dias.

  4. – Não lhes é aplicável o art. 311º e 312º, nem o nº 1 do art. 316º, do Código de Trabalho.

  5. – Nem a insuficiência de aviso prévio em Microempresa se poderia traduzir em responsabilidade 7ª – Enferma de manifesta inconstitucionalidade a interpretação do art. 315º do Código de Trabalho de que decorra a exclusão do regime previsto pelo nº 4 do art. 363º do Código de Trabalho, com aplicação do nº1, do art. 316º, por violação da proporcionalidade que decorre da noção de Estado de Direito e do principio da legalidade democrática – art. 2º, 3º, 18º e 86º, da Constituição.

  6. – Deve, em consequência ser revogada a decisão recorrida e serem os arguidos absolvidos do crime que lhes é imputado.

  7. – Deve, ainda ser decidida a improcedência do pedido cível, que tem por suporte os danos morais causados pela falta de pagamento dos créditos de férias e de fim de contrato (parcialmente satisfeitos pelo Fundo de Garantia Salarial) e pelo subsequente desemprego, na medida em que nem este, nem a incobrabilidade, decorrem da exiguidade do aviso prévio verificado, nem a demandante cível invocou danos relacionados com a exiguidade de aviso prévio, pelo que deve o pedido cível improceder na íntegra. 10ª – Quando porém, assim, não se entenda e, a título subsidiário, dir-se-á, ainda; 11ª – A exegese do nº1 do art. 316º do Código de Trabalho aponta não apenas para empresas de maior dimensão, designadamente as industriais, como também para as situações de desprotecção máxima do trabalhador.

  8. – Não é o caso da Assistente nem o das demais trabalhadoras que tinham a possibilidade de reclamar a integração na empresa mãe, a E... , dona de outros estabelecimentos.

  9. – Não apenas porque lhe prestavam serviços ocasionais, sendo a F..., detida a 100% pela E... e partilhando com ela estruturas organizativas comuns, mas também porque a E... incorporou um dos dois únicos estabelecimentos seus, reabrindo-os dias depois e prosseguindo na sua exploração.

  10. – O direito laboral atribui grande relevo a tais vicissitudes, com reforço do estatuto dos trabalhadores que têm a opção de reclamar a sua reintegração na empresa dominante incorporante – cf. art. 101º, 285º e 334º do Código de Trabalho.

  11. – Opção que as trabalhadoras da F... não exerceram, pois não reclamaram a integração na E... .

  12. – Esse é um direito que lhes assiste, o que não quer dizer que essa opção possa, na prática, determinar se a actuação dos arguidos integra ou não responsabilidade criminal.

  13. – Deve a decisão recorrida ser revogada e os arguidos absolvidos do crime que lhe é imputado ou, quando assim não se entenda, substancialmente reduzida a pena de multa, por se revelar excessiva nas concretas circunstâncias do caso.

  14. – Deve, igualmente, improceder o pedido cível porquanto os alegados danos morais decorrem da opção da própria demandante que não reclamou a sua reintegração na empresa mãe como era seu direito.

  15. – Quando assim não se entenda devem os danos morais ser substancialmente reduzidos, uma vez que as dificuldades da empresa eram de pleno conhecimento da demandante pelo menos desde que recusou assumir a gerência da loja ou qualquer outra solução.

  1. O Ministério Público em primeira instância respondeu à motivação dos Recorrentes (fls. 327 a 329), tendo concluído que, não obstante tratar-se de uma micro-empresa, ainda assim, os arguidos cometeram o crime pelo qual foram condenados, devendo, por isso, manter-se a sentença sob recurso.

  2. O Digno Procurador-Geral-Adjunto, nesta Relação, acolhendo os argumentos da Senhora Procuradora Adjunta que subscreveu a resposta referida em 3, pugnou pela improcedência do Recurso.

  3. Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, nada obstando ao conhecimento de mérito do Recurso.

    II – A DECISÃO RECORRIDA A primeira instância deu como assentes os seguintes factos: 1. Os arguidos são, pelo menos, desde 22 de Dezembro de 2008, os únicos gerentes da sociedade por quotas F... Unipessoal, Lda., com o NIPC (...) , com sede no (...) , na Gafanha da Nazaré – Ílhavo (Doc.1), qualidade que ainda mantinham, pelo menos, em Dezembro de 2012.

  4. Por sua vez, a sociedade F... Unipessoal, Lda. tem por objecto o Comércio a retalho de bijutaria, perfumaria, brinquedos, recordações, vestuário, adornos pessoais, marroquinaria, revistas, jornais e tabaco. Comércio por grosso de bijutaria, perfumaria, brinquedos, recordações, vestuário e adornos pessoais.

  5. A sociedade F... Unipessoal, Lda. exerceu a sua atividade em estabelecimentos comerciais de venda ao público, na cidade de Aveiro, até 29 de Fevereiro de 2012, entre outros, nos estabelecimentos situados na Rua (...) e na Av. (...) , ambos em Aveiro.

  6. Em data não concretamente apurada, mas com efeitos reportados a 1-6-1991, os arguidos admitiram C... , id. a fls. 26, para trabalhar na loja situada na Rua (...) , pertencente à sociedade F... Unipessoal, Lda., sob as suas ordens, direcção e fiscalização, na sua qualidade de sócios gerentes da sociedade, para a qual também admitiram as trabalhadoras G..., id. a fls. 30 e H..., id. a fls. 32, estas rotativamente entre as duas lojas referidas em 3., desde datas não concretamente apuradas mas, pelo menos, desde 22-12-2008.

  7. E, para trabalhar na loja situada na Av. H..., em Aveiro, os arguidos admitiram J..., id. a fls. 28, desde data não concretamente apurada mas, pelo menos, desde 22-12-2008.

  8. Em data não concretamente apurada do mês de Fevereiro de 2012, os arguidos reuniram-se com aquelas empregadas, referidas em 4. e 5., e manifestaram-lhes a sua intenção de, a partir do dia 18 de Fevereiro de 2012, encerrarem para férias os estabelecimentos comerciais supra referidos, devendo elas iniciarem o gozo das férias a que tinham direito nesse ano após aquela data, como veio a acontecer.

  9. Então, encontrando-se aquelas trabalhadoras em gozo de férias, por carta datada de 23 de Fevereiro de 2012, assinada pelo arguido A... e com o conhecimento e consentimento da arguida, na qualidade de sócios gerentes da sociedade F... Unipessoal, Lda., da qual apuseram o carimbo, os arguidos comunicaram às trabalhadoras que por motivos alheios à nossa vontade, somos obrigados a encerrar a empresa, por falta de meios. A queda abrupta do volume de vendas e das margens de comercialização não nos permite subsistir. Lamentamos, mas não podemos continuar a assegurar o seu posto de trabalho. Enviamos-lhe, em anexo, o mod. RP5044-DGSS, devidamente preenchido e assinado, para solicitar o subsídio de desemprego e para o mais que tiver por conveniente. Apresentamos os melhores cumprimentos. Atentamente, 8. E, a partir de 1 de Março de 2012, os arguidos encerraram os estabelecimentos identificados em 3., impedindo as trabalhadoras supra identificadas, desde essa data em diante, de acederem aos locais de trabalho e recusando-lhes o fornecimento de trabalho e de condições e instrumentos para o levarem a efeito.

  10. Porém, os arguidos, agindo em representação da sociedade F... Unipessoal, Lda. não haviam iniciado qualquer procedimento com vista a despedimento colectivo que incluísse aquelas trabalhadoras, nem tinham implementado procedimento visando a extinção dos respectivos postos de trabalho com o consequente despedimento das trabalhadoras, nem tinham organizado procedimento tendo por objectivo a redução temporária do período normal de trabalho ou a suspensão do contrato de trabalho das mesmas.

  11. Com efeito, os arguidos agindo sempre em representação da sociedade F... Unipessoal, Lda., sequer liquidaram às trabalhadoras qualquer indemnização pela cessação dos contratos de trabalho, nem qualquer quantia referente a férias, subsídios de férias e de natal, valores pelos quais foi condenada no Juízo de Trabalho de Aveiro no âmbito das acções intentadas pelas trabalhadoras supra referidas, com os números 281/12.7T4AVR; 279/12.5T4AVR; 489/12.5T4AVR e 280/12.9T4AVR e que ainda se encontram em falta.

  12. Os arguidos sabiam que antes de encerrarem os estabelecimentos comerciais supra referidos estavam obrigados a iniciarem procedimento com vista a despedimento colectivo que incluísse aquelas trabalhadoras, e a implementarem procedimento visando a extinção dos respectivos postos de trabalho com o consequente despedimento das trabalhadoras e ainda que tinham que organizar procedimento tendo por objectivo a redução temporária do período normal de...

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