Acórdão nº 587/11.2TBPMS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDO MONTEIRO
Data da Resolução27 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: Transportes Rodoviários de Mercadoria (…), S.A., intentou ação contra Companhia de Seguros (…), S.A., pedindo a condenação desta: a) A pagar-lhe, a título de indemnização pelo sinistro ocorrido a 26/01/2010, a quantia de €115.302,59, acrescida dos juros de mora vincendos e da quantia de €235,49, por cada dia de paralisação da cisterna; b) A pagar-lhe, a título de indemnização pelo sinistro ocorrido a 28/07/2010, a quantia de €57.417,46, acrescida dos juros de mora vincendos e da quantia de €235,49, por cada dia de paralisação da cisterna; c) A pagar-lhe, a título de indemnização pelo sinistro ocorrido a 15/12/2010, a quantia de €49.559,14, acrescida dos juros de mora vincendos e da quantia de €235,49, por cada dia de paralisação da cisterna; d) A pagar-lhe o valor a liquidar em sede de execução de sentença pela descarga e armazenamento dos produtos contaminados.

No decurso da ação, a Autora amplia/rectifica o pedido formulado, relativamente ao 2.º sinistro, de €17.451,84 para €19.775,39 e liquidou o pedido formulado na quantia de €43.330,16 e de €974,14 (relativamente ao 1.º sinistro) e na quantia de €7.010,64 (relativamente ao 3.º sinistro).

Para tanto, a Autora alegou, em síntese: No âmbito da sua actividade de transporte internacional de mercadorias por estrada, em três ocasiões diferentes do ano de 2010, foram contaminados os produtos que transportava, sendo responsável perante o respectivo lesado pelo pagamento de indemnização pelos prejuízos causados, nos valores mencionados, responsabilidade que havia transferido para a Ré.

Face à inércia desta em assumir o pagamento da indemnização devida ou por aguardar instruções da parte desta sobre o destino dos produtos contaminados, a Autora veio ainda a sofrer prejuízos pela paralisação dos veículos e outros que reclama.

A Ré contestou, em síntese: A destinatária dos produtos não era a identificada “V (…)”.

Não foi feita reserva na receção do produto no 2º sinistro.

A Autora não tem qualquer culpa e nada mais podia fazer quanto à lavagem, obtendo o certificado da mesma.

A Autora é responsável pelos salvados.

A Autora não colaborou com a Ré no apuramento das responsabilidades.

Foi admitida a intervenção acessória de T (…), S.L., M (…), Lda. e de L (…) S.A.

Apenas a primeira apresentou contestação, alegando que a cisterna em causa ficou limpa de qualquer resíduo ou impureza.

Realizado o julgamento, foi proferida a seguinte sentença: Condenar a Ré Seguradora a pagar à Autora (Transportadora) a quantia de €88.761,44 (oitenta e um mil, setecentos e sessenta e um euros e quarenta e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a notificação da sentença até efectivo pagamento.

Condenar a Seguradora a pagar à Autora a quantia que se vier a apurar em sede de liquidação de sentença, correspondente a metade do montante despendido com as despesas com a descarga do produto contaminado do 2.º transporte/sinistro (encaminhamento como resíduo ou outro destino), acrescida de juros de mora, à taxa legal, até efectivo pagamento.

Absolver a Ré dos restantes pedidos.

* Inconformada, a Autora recorreu e apresenta as seguintes conclusões: (…) * Também inconformada, a Seguradora recorreu e apresenta as seguintes conclusões: (…) * Apenas contra alegou a interveniente T (…) relativamente ao 1º sinistro, defendendo que não teve qualquer participação no que se passou após a operação de limpeza, nomeadamente com os salvados, paralisação da cisterna e negociações entre a Autora e a Ré, para regularização do sinistro, e aderindo à argumentação desta última.

* Questões a decidir: Reapreciação da matéria de facto.

Quem é a destinatária da mercadoria e parte nos contratos de transporte no 1º e 3º sinistros.

A responsabilidade da transportadora.

A falta de reservas no recebimento da mercadoria no 2º sinistro.

A liquidação do IVA.

A liquidação das franquias.

A responsabilidade pelos salvados e paralização das cisternas. Valor diário da referida paralização.

Definição da mora.

Danos sofridos no veículo durante a paragem deste no 3º sinistro.

* Reapreciação da matéria de facto.

(…) * Os factos provados são então os seguintes: 1. A Autora dedica-se aos transportes rodoviários ocasionais de mercadorias, nacionais e internacionais e à compra e venda de materiais de construção e produtos conexos.

  1. A Ré dedica-se, à actividade seguradora.

  2. Autora e Ré celebraram um “contrato de seguro” de «Responsabilidade Civil do Transportador que se regula pelas Condições Particulares, Condições Especiais, Condições Gerais desta apólice e pela Convenção Relativa ao Contrato de Transporte Internacional de Mercadorias por Estrada (CMR)», titulado pela apólice 790015687, de acordo com o qual, «…garante a responsabilidade civil do Segurado, que, nos termos da Convenção, lhe seja imputável na qualidade de Transportador Rodoviário Internacional de Mercadorias», «…abrange, até ao limite do valor seguro constante das Condições Particulares, o pagamento de indemnizações que, nos termos da Convenção, sejam devidas pelo Segurado na qualidade de transportador, em consequência de perdas ou danos causados às mercadorias transportadas no veículo transportador, exclusivamente durante o respectivo transporte» e «Esta garantia inicia-se, sem prejuízo do disposto no artigo 6.º, no momento em que as mercadorias são carregadas no veículo transportador no local de início da viagem, vigora durante o percurso normal desta…».

  3. De acordo com aquelas condições gerais, “TERCEIRO” é «Aquele que, em consequência de um sinistro sofra uma lesão material que origine danos susceptíveis de, nos termos da lei civil e desta apólice, serem reparados e indemnizados» e “SINISTRO” é «O acontecimento de carácter fortuito, súbito e independente da vontade do Tomador do Seguro ou do Segurado, susceptível de fazer funcionar as garantias do contrato».

  4. Entre outras exclusões, o contrato de seguro em causa «nunca garante os danos, perdas ou despesas que decorram, directa ou indirectamente, de (...) acto ou omissões dolosos do tomador do seguro, do segurado ou de pessoas por quem estes sejam civilmente responsáveis».

  5. E «nunca garante os danos, perdas ou despesas, directa ou indirectamente de (...) remoção de destroços das mercadorias transportadas (ou de) perdas de mercado, demora na entrega ou quaisquer outras perdas consequenciais».

  6. Nos termos do referido contrato são obrigações da ora Autora «fornecer ao segurador todas as provas solicitadas, bem como os relatórios e documentos que possua ou venha a obter», «não abonar extrajudicialmente a indemnização reclamada sem autorização escrita do segurador, bem como não formular ofertas, tomar compromissos ou praticar algum acto tendente a reconhecer a responsabilidade do segurador, a fixar a natureza e o valor da indemnização ou que, de qualquer forma, estabeleça ou signifique a sua responsabilidade».

  7. Mais ficou a ora Autora obrigada «a enviar ao segurador, o mais rapidamente possível, (...) cópia da factura comercial».

  8. O segurador obriga-se, entre outras, a “Efectuar com prontidão e diligência as averiguações e peritagens necessárias ao reconhecimento do sinistro e à avaliação dos danos, sob pena de responder por perdas e danos” e a “Pagar a indemnização devida logo que concluídas as averiguações e peritagens necessárias ao reconhecimento da responsabilidade do segurado e ao estabelecimento do acordo quanto ao valor a indemnizar. Se decorridos 30 dias, o segurador, de posse de todos os elementos indispensáveis à reparação dos danos ou ao pagamento da indemnização acordada, não tiver realizado essa obrigação, por causa não justificada ou que lhe seja imputável, incorrerá em mora, vencendo a indemnização juros à taxa legal em vigor”.

    1. Transporte/sinistro [26 de Janeiro de 2010]: 10. O semi-reboque com a matrícula L-17 (...) CE ficou abrangido pelo contrato de seguro dos autos como aderente n.º 0009.

  9. Tendo sido estabelecido para aquele um capital seguro de €25.000,00 e uma franquia, ou parte primeira de qualquer indemnização sempre a cargo da ora Autora, de «10,00% dos prejuízos indemnizáveis, mínimo de 500,00 €».

  10. No dia 21 de Janeiro de 2010, o conjunto de veículos tractor com a matrícula (...) CE e cisterna com a matrícula L – 17 (...) CE, carregou em França um produto designado por EMULWAX SW 330 – parafina.

  11. Daí foi transportado e descarregado em Espanha no dia 25 de Janeiro de 2010.

  12. No mesmo dia, 25 de Janeiro de 2010, após a dita descarga, procedeu-se à limpeza da já identificada cisterna no Lavaderos de Tradilo em Tarragona, Espanha.

  13. Naquele lavadero foram lavados e vaporizados todos os tanques da cisterna.

  14. Além disso, foram também lavados os circuitos e ar, porta mangueiras e todos os outros acessórios, tendo-se procedido à respectiva operação de purificação.

  15. O conjunto destas operações de limpeza deu origem à emissão por parte do Lavadero Tradilo do certificado de lavagem n.º ES-EN 0742433 datado de 25 de Janeiro de 2010.

  16. No dia 26 de Janeiro de 2010, o mesmo conjunto de veículos, carregou em Tarragona, Espanha, na Sociedade S... Europe S.L., o seguinte: a) 11.980 kg de uma mercadoria designada por Acetato de Metilo; b) 6.660 Kg de uma mercadoria designada Monoetilenoglicol.

  17. Apesar de constar da declaração de expedição (CMR) como destinatário C... Portugal, S.A., os produtos melhor identificados no artigo anterior tiveram com destino final a sociedade V... , Lda., em Alcanena, Portugal.

  18. No dia 28 de Janeiro de 2010 quando se ia proceder à descarga dos produtos na V (…) Lda. verificou-se que, com excepção de 5.260 KG de acetato de Metilo, os produtos encontravam-se contaminados com resíduos de parafina, ou seja, resíduos do anterior produto transportado.

  19. Mediante tal constatação, o produto contaminado não foi aceite pela cliente V... , que procedeu à sua devolução.

  20. Tendo aqueles produtos permanecido nos tanques dos veículos da Autora, que assim ficou imobilizado naquelas...

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