Acórdão nº 996/15.8T8CRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Maio de 2015

Magistrado ResponsávelALEXANDRE REIS
Data da Resolução05 de Maio de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: V...

e G...

, casados, intentaram este processo especial de revitalização de ambos os cônjuges, manifestando a vontade de encetarem negociações conducentes à sua revitalização por meio da aprovação de um plano de recuperação, para o que alegaram, em síntese: assumiram pessoalmente diversos créditos e garantias pessoais, nomeadamente como avalistas, da sociedade “R..., Lda”, de que são sócios e gerentes, que também se encontra em processo especial de revitalização, devido às dificuldades económicas que atravessa o respectivo sector de actividade (construção); provêm do exercício da sua actividade nessa sociedade os rendimentos do casal, cujo passivo ascende a € 2.757.770,54, sendo o respectivo activo constituído pelos bens que identificam.

O Sr. Administrador Judicial Provisório apresentou a lista provisória de créditos, a qual, não tendo sido objecto de impugnações, foi declarada como convertida em definitiva.

Foi apresentado o plano de revitalização dos requerentes, contendo, entre outras, as seguintes especificações, informações e propostas: - Os devedores são sócios da firma R..., Lda, também sujeita a PER, e o devedor marido ainda da firma M..., Lda, não tendo ambas as sociedades capacidade de financiamento.

- Ao longo da respectiva vida profissional os devedores sempre estiveram ligados à actividade da construção civil, também o objecto societário das referidas empresas.

- Cada um dos devedores aufere mensalmente € 485, com que fazem face às despesas básicas com alimentação, habitação e impostos.

- O valor total dos créditos reconhecidos é de € 3.275.580,99 – dos quais € 2.790,77 garantidos, € 7.823,03 privilegiados, € 1.145.973,51 comuns e € 2.118.993,68 sob condição –, sendo: € 2.929.594,33 a favor da credora C...; € 87.500,34 a favor do credor ISS (Segurança Social).

- Os seus activos imobiliários, com o valor patrimonial global de € 324.460, são: a) prédio misto (€ 41.770); b) prédio urbano (€ 125.520); c) fracção autónoma (€ 157.170).

- São ainda detentores de quatro quotas da dita sociedade R..., que perfazem a totalidade do capital social, no valor nominal de € 350.000, e de uma quota da dita sociedade M..., no valor nominal de € 50.000.

- «9 - Caso não seja aprovado plano de recuperação dos devedores, afigura-se que, existe com grande probabilidade a insolvência pessoal e posterior liquidação do seu património. O Administrador Judicial Provisório já deu conhecimento aos devedores que emitirá parecer de que os devedores se encontram insolventes, nos termos do número 4 do artigo 17º G do CIRE, parecer que os devedores concordam».

- «Em sede de liquidação: - Afigura-se que a venda dos imóveis de que os devedores são titulares, poderão ultrapassar o seu valor patrimonial, não ficarão muito aquém da liquidação das responsabilidades; - E relativamente às cotas nas sociedades, em sede de liquidação, não atingirá o valor nominal da cota, tendo em conta que uma das empresasse encontra em PER e a outra “M..., Lda” se encontra com bastantes dificuldades; - Pelo que, apenas o credor garantido seriam ressarcidos dos seus créditos e não na totalidade; - Os credores comuns nada receberiam, eventualmente apenas em sede de exoneração do passivo restante; 11 – Pelo que, em sede de liquidação o património dos devedores atingiria no máximo cerca de 500 mil euros; 12 – Por outro lado, o imóvel acima referenciado como armazém, em sede de plano de recuperação foi proposta a dação em pagamento ao credor garantido, como forma de redução das responsabilidades; 13 – E, na hipótese da exoneração do passivo restante, os rendimentos auferidos pelos devedores não reduzidos, pelo que, as posteriores entregas ao Administrador de Insolvência seriam diminutas e insuficientes até para a liquidação das dívidas da massa insolvência; 14 – Os créditos comuns, não seriam satisfeitos, ou seja, nada receberiam.».

- Os devedores informaram que «no plano de recuperação apresentado na sociedade R..., Lda” propuseram a redução das suas responsabilidades através da dação em pagamento» do seu património imobiliário à credora (hipotecária) C..., ficando o remanescente a ser liquidado em 200 prestações mensais e sucessivas, esclarecendo ser essa a melhor forma de ressarcir os seus credores, «tendo em conta que o valor das responsabilidades assumidas são de tal forma elevadas e os rendimentos dos devedores diminutos».

- Propõe-se a consolidação da dívida à Segurança Social na data da reversão, caso venha a ocorrer, e o seu pagamento em 100 prestações mensais e sucessivas, vencendo-se a primeira no mês seguinte à notificação por parte do credor do plano prestacional, com manutenção das garantias sobre bens dos devedores - Tendo em conta os rendimentos dos devedores, propõe-se que os seus rendimentos anuais superiores a € 12.000 sejam repartidos pelos restantes credores, durante dez anos.

O plano de revitalização dos devedores obteve o voto favorável da credora C..., representando 89,44% dos créditos com direito a voto, sem que fosse apresentado mais qualquer voto.

Não foi requerida ao Tribunal de 1ª instância por qualquer credor a recusa da homologação do referido plano.

Na sentença, o Sr. Juiz recusou a homologação do plano de revitalização dos devedores, por julgar: comprovada sua situação insolvência actual e a sua insusceptibilidade de recuperação por via do plano apresentado; verificadas a preterição substancial do princípio da igualdade não objectivamente justificada e a violação não negligenciável dos artigos 30º, 35º e 36º da LGT e 199º do CPPT, quanto ao crédito do ISS-IP.

Na sequência, em 24/2/2015 o Sr. Administrador Judicial Provisório apresentou o parecer de que os devedores se encontram em situação de insolvência actual e requereu a declaração da respectiva insolvência e, em 26/3/2015, foi proferida sentença de declaração de insolvência dos mesmos nos autos principais a que o PER se mostra apenso.

Inconformados, os requerentes/devedores apelaram, suscitando nas respectivas conclusões a questão de saber se não deveria ter sido recusada a homologação do plano de revitalização porquanto: ...

Os factos relevantes a considerar são os que se retiram do antecedente relatório.

Tendo em vista apreciar e decidir as questões enunciadas introduzimos o respectivo enquadramento com umas breves considerações gerais sobre o procedimento de revitalização em causa.

Desviando-se do paradigma em que assentava o direito anterior, o CIRE construiu o processo de insolvência como um instrumento de liquidação, com a primazia de mecanismos próprios de regulação de mercado e dos interesses de ordem económica dos credores, em detrimento da preservação do tecido económico e do emprego, confinando a recuperação a mera finalidade possível do processo.

Contudo, o Estado Português, no quadro do programa de assistência financeira a que se submeteu nos últimos anos, vinculou-se a alterar aquele código, com o proclamado objectivo de facilitar o resgate de empresas viáveis e apoiar a reabilitação de indivíduos financeiramente responsáveis. Foi nesse contexto que emergiu a Lei nº 16/2012, de 20/4, alterando o CIRE, nomeadamente regulamentando o novo processo especial de revitalização (PER), resultando da exposição de motivos da Proposta da Presidência do Conselho de Ministros que lhe deu origem que o principal objectivo da alteração do CIRE visou direccionar este último diploma para a recuperação de empresas devedoras, «privilegiando-se sempre que possível a manutenção do devedor no giro comercial, relegando-se para segundo plano a liquidação do seu património sempre que se mostre viável a sua recuperação» ([1]).

Assim, o art. 1º, nº 2 do CIRE ([2]) permite ao devedor que se encontre «em situação económica...

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