Acórdão nº 2308/13.6TJCBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2015

Magistrado ResponsávelMANUEL CAPELO
Data da Resolução16 de Dezembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra No Tribunal da Comarca de Coimbra – Instância local – secção civil - J2 - “N..., L.dª” instaurou a presente acção contra “Transportes V..., L.dª” alegando, em síntese, que em 12.Janeiro.2011 adquiriu à sociedade “S..., S.A. “ as mercadorias discriminadas nos artigos 1º e 2º da petição inicial, que foram entregues pela vendedora à Ré que se obrigou a transportá-las para as instalações da Autora, sucedendo que, no decurso do transporte, o camião onde essa mercadoria vinha acondicionada incendiou-se, com o consequente perecimento de parte desse conteúdo, causando-lhe prejuízos que contabilizou em 17.256,42 €, correspondente ao valor de compra das mercadorias e ao lucro que teria obtido com a sua revenda não tivessem perecido.

Sustenta que a esse dano acresce a importância de 1.119,30 €, que lhe debitaram os clientes a que se destinavam aquelas mercadorias, a título de compensação dos prejuízos decorrentes da não entrega atempada das mesmas e, ainda, que daquela importância de 17.256,42 €, cujo pagamento reclamou em 12.Outubro.2011, a Ré apenas lhe pagou a quantia de 8.085,96 €, tendo ainda recebido o valor de 1.107,00 € relativo aos salvados.

Mais alega que em 18.Dezembro.2012 e visando o pagamento do quantitativo ainda em dívida instaurou contra a Ré acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias que correu termos sob o n.º ..., no extinto 5º Juízo Cível, na qual a Ré foi absolvida da instância com fundamento em erro na forma de processo, estando em condições de beneficiar da manutenção dos efeitos civis derivados daquela acção nos termos previstos no nº 1 do artigo 289º do Código de Processo Civil, uma vez que a presente acção foi instaurada dentro dos 30 dias contados do trânsito em julgado da sentença proferida naquela primeira acção.

Com tais fundamentos pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de 9.182,86 € acrescida de juros de mora calculados à taxa legal para operações comerciais desde a citação até integral e efectivo pagamento.

A Ré, citada de forma válida e regular, contestou arguindo a excepção peremptória da extinção do direito de crédito da Autora mercê do decurso do prazo de um ano previsto nos artigos 24º do Decreto-Lei n.º 239/2009, de 4.Outubro, e 32º da Convenção CMR para a prescrição do direito à indemnização por danos decorrentes da responsabilidade da Ré, enquanto transportadora, no âmbito de um contrato de transporte rodoviário de mercadorias que no dia 12.Outubro.2011 celebrou com a sociedade “S..., Ldª”, expedidora e vendedora das mercadorias em questão, com vista à sua entrega à Autora, já que o prazo de trinta dias previsto naquele artigo 24º se conta a partir da aceitação da mercadoria pelo transportador - que, “in casu”, ocorreu em 12.Outubro.2011, coincidindo com a data da perda total - e, nessa medida, a Autora deveria ter exercido o seu direito à indemnização até ao dia 11.Novembro.2012, concluindo pela sua absolvição do pedido.

Alegou ainda a Autora já foi ressarcida de todos os prejuízos resultantes da perda daquela mercadoria na sequência do accionamento do “seguro CMR” contratado com a empresa seguradora “G..., S.p.a.”, para a qual transferira a sua responsabilidade civil pelo risco do transportes de cargas efectuadas pelo veículo transportador das mercadorias da Autora, concluindo que o ressarcimento de quaisquer outros danos ou prejuízos na carga transportada emergentes daquele transporte, incluindo a alegada perda de lucro e os prejuízos com o não cumprimento do prazo da entrega, são da responsabilidade daquela seguradora, com tais fundamentos requerendo a sua intervenção principal provocada.

Admitida a intervenção, a chamada “G..., S.p.a.” apresentou contestação, declinando a sua responsabilidade por nunca ter contratado com a Ré qualquer seguro de transporte no âmbito CMR e, ainda, invocando a excepção peremptória da prescrição do direito de indemnização da Autora, com os mesmos fundamentos aduzidos pela Ré, concluindo pela sua absolvição do pedido.

A Autora respondeu à excepção peremptória da prescrição argumentando que, logo após o acidente, reclamou da Ré o pagamento da indemnização, e que desde essa data decorreram negociações visando o pagamento da indemnização, aceitando a Ré a existência do sinistro e o direito ao pagamento dos respectivos prejuízos, só em 15.Março.2012 a informando que os não liquidaria na sua totalidade, concluindo que, face ao disposto no artigo 325º do Código Civil, a prescrição se tem por interrompida só começando a correr a partir do dia 15.Março.2012, com a consequente improcedência da excepção.

No despacho saneador, considerando a instância válida e regular, decidiu o tribunal “julgar procedente a excepção peremptória da prescrição do direito de indemnização invocado pela Autora “N..., Ldª” e, em consequência, absolver do pedido a Ré “Transportes V..., L.dª” e a interveniente “G..., S.p.a.”.

Inconformada com esta decisão dela interpôs recurso a Autora, concluindo que: ...

A recorrida apresentou contra alegações defendendo a confirmação da decisão apelada.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação O tribunal de primeira instância deu como provada a seguinte matéria de facto: … … Além de delimitado pelo objecto da acção; pelos eventuais casos julgados formados na instância recorrida e pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, o âmbito, subjectivo ou objectivo, do recurso pode ser limitado pelo próprio recorrente. Essa restrição pode ser realizada no requerimento de interposição ou nas conclusões da alegação (artº 635 nºs 2, 1ª parte, e 3 do CPC).

De harmonia com o despacho que admitiu o presente recurso ordinário de Apelação, por referência as conclusões nele expostas, o objecto deste remete, para a verificação de não ter ocorrido (ao contrário do decidido) a excepção peremptória da prescrição do direito de indemnização invocado pela Autora “N..., Ldª”.

A sentença recorrida para fundamentar a existência de prescrição considerou, implicitamente, que as relações entre a autora e a ré se encontravam na previsão das normas aplicáveis ao contrato de transporte e como tal, se lhe aplicava o disposto no 24º do Decreto-Lei nº 239/2003 de 4 de Outubro que fixa o prazo de um ano para o exercício do direito a indemnização por danos decorrentes da responsabilidade do transportador.

Ora, a recorrente protesta que por não ter outorgado qualquer contrato de transporte, estas regras não lhe podem ser aplicáveis, defesa esta que impõe, em primeiro lugar, uma abordagem, ainda que breve, à relação obrigacional eventualmente existente entre a aqui autora, como adquirente de uma determinada mercadoria a outrem, e a ré que a transportou por força de contrato celebrado com a vendedora dessa mercadoria.

Numa primeira visão, o contrato de transporte de mercadorias[1] rodoviário constitui uma das modalidades que pode derivar do contrato de transporte em geral[2] e é regulado internamente pelo Decreto-Lei n.º 239/2003 de 4 de Outubro e a nível internacional pela Convenção Relativa ao Contrato de Transporte Internacional de Mercadorias por Estrada de 19 de Maio[3], também conhecida por C.M.R.

[4]. O Decreto-Lei 239/2003 regula apenas e só o transporte rodoviário de mercadorias[5], tendo revogado todas as disposições do Código Comercial Português nas partes referentes ao transporte rodoviário, e possuindo um regime muito semelhante ao da C.M.R..

A lei portuguesa define o contrato de transporte rodoviário de mercadorias como o contrato...

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