Acórdão nº 1347/15.7T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelS
Data da Resolução04 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra A Autora interpôs a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra a Ré EDP, pedindo a sua condenação: - no pagamento em quantia não inferior a €173.188.04, correspondente aos danos por si sofridos e originados por instalação da Ré e a que esta lhes deu causa no exercício da sua actividade.

Subsidiariamente, - como responsável pelos riscos próprios da actividade que exerce e que da mesma beneficia, pelos prejuízos que derivam da condução ou entrega de energia eléctrica, como pelos resultantes da própria instalação, devendo ser condenada em quantia não inferior a €173.188.04, correspondente aos danos sofridos pela autora, sendo que, esta quantia se encontrará a coberto do capital segurado pela Ré; - a condenação da Ré no valor que se vier a apurar, como sendo devido, pelo decurso do tempo, pela falta de produção, desde a data da entrada desta acção em Juízo, até efectivo e integral pagamento dos valores reclamados e no pagamento de juros sobre a quantia em que a Ré for condenada.

Para fundamentar a sua pretensão alega, em síntese: - No terreno baldio sito na freguesia de V..., ocorreu um incêndio no dia 10 de Dezembro de 2013, tendo resultado um total de 160 hectares de área ardida, composta por diversos tipos de vegetação.

- Desde que o incêndio foi detectado foi identificada como causa a queda de uma linha eléctrica de média tensão, propriedade da Ré EDP, que estava obsoleta, sem a manutenção que lhe é própria e devida, não se encontrava em estado de conservação adequado, e por acção do vento que se fazia sentir, soltou-se do suporte isolante e depois de “bambolear/balançar”, “andando à solta”, embateu na vegetação (designadamente em pinheiros) e provocou imediatamente o incêndio, pois que o tempo apresentava-se seco.

- Se não se tivesse soltado a linha do suporte e aí houvesse a devida limpeza no terreno, nada teria acontecido.

- A Ré EDP, alguns dias após o incêndio, mandou substituir as linhas e alguns postes, e determinado que a área de protecção por baixo das linhas fosse alargada de 12 para 20 metros.

- A área ardida de aproximadamente 160 hectares de pinheiro bravo, estava em regime de novedio, com idade média de 8 anos, sendo 57 hectares de área comunitária e sob a administração dos compartes, e 103 hectares de área privada.

- O povoamento de pinheiro bravo ardido que existia no terreno baldio, em consequência do incêndio, era jovem, não permitindo qualquer hipótese de regeneração natural, havendo necessidade de intervenção urgente para potenciar uma rápida recuperação biofísica.

- A perda do povoamento existente na propriedade “ardida” causou um prejuízo para a Autora de quantia não inferior a € 50.616,00 a que acresce quantia não inferior a 11.388,60 euros (513m3 x € 22,2 preço da madeira), deduzida do valor das operações de exploração florestal (corte), rechega e transporte e a este valor acrescerá o que se vier a apurar, pelo decurso do tempo, pela falta de produção, desde a data da entrada da acção em Juízo até efectivo e integral pagamento/reparação dos prejuízos, a liquidar oportunamente.

A Ré EDP contestou, impugnando os factos alegados pela Autora e alegando o seguinte: - através de técnicos efectuou nos dias 19.12.2008 (Ordem de Manutenção nº 6280976567), 25.02.2010 (Ordem de Manutenção nº 6281239800) e 15.10.2012 (Ordem de Manutenção nº 6281655291) inspecções à rede, nomeadamente ensaios termográficos, não existindo registos de anomalias quer nos condutores quer no isolamento e realizou, ainda, acções de limpeza de faixa de protecção e trabalhos de manutenção e limpeza em cumprimento do DL nº 124/2006, de 28 de Junho (faixa de gestão de combustíveis), de acordo com o Plano Municipal de Defesa da Floresta Contra Incêndios do concelho de Seia e o ramal de MT em causa que alimenta o PTD nº 80 R... não está inserido no novo Plano Municipal de Defesa de Floresta Contra Incêndios, nos termos do DL n.º 124/2006, de 28 de Junho, com a redacção conferida pelo DL n.º 17/2009, de 14 de Janeiro.

- a linha eléctrica foi objecto de uma remodelação em 2005 com substituição de condutores e isolamento e que não mandou substituir as linhas e alguns postes alguns dias após o incêndio, sendo que em Janeiro de 2014, através da Ordem de Manutenção nº 6281920076, executou uma intervenção na rede apenas para reposição definitiva da linha solta, afilaçamento de condutores e espiamento de alguns apoios, intervenção de manutenção habitual sempre que ocorre um incêndio e este afecta as redes eléctricas de alta tensão, sendo falso que tenha havido alargamento da faixa de protecção de 12 para 20 metros, atendendo a que a vegetação foi queimada pelo incêndio e, por via disso, não foi efectuada nenhuma limpeza de faixa e a causa provável para a queda da linha eléctrica da Ré EDP terá sido o incêndio e não aquela a causa deste.

- a invocação da responsabilidade objectiva não poderá proceder, atendendo a que o dia do incêndio foi caracterizado por condições atmosféricas bastante adversas, nomeadamente ventos muito fortes, com rajadas superiores a 100 Km/h, que afectaram a região de V..., concelho de Seia e a ocorrência de tais fenómenos é exterior ao normal funcionamento da rede eléctrica da ré o que teria sempre de configurar uma causa de força maior, excludente da responsabilidade da distribuidora de energia eléctrica sendo que tal evento – vento de intensidade excepcional - não tinha qualquer hipótese de ser dominado ou evitado pela ré e verificou-se que o condutor caído a cerca de 0,50 metros do solo se desprendeu do isolador devido à ruptura da filaça a qual só poderia ter sido causada pela força do vento conjugada com a força do calor que veio a provocar a dilatação das filaças.

- a sua responsabilidade emergente da sua actividade encontra-se transferida para a seguradora Companhia de Seguros F..., S. A., por contrato de seguro titulado pela Apólice nº..., que cobre o presente sinistro e se o valor do sinistro ultrapassar o limite de 50.000,00 euros será automaticamente accionada a apólice de excesso emitida pela seguradora I..., S.A., nomeadamente, a apólice nº ..., em vigor à data dos factos, para o risco de actividade da segurada EDP Distribuição Energia, S.A. e com cobertura de 100.000,00 €, em excesso de 50.000,00 €, por sinistro e sem limite agregado.

Foram admitidas as intervenções provocadas das seguradoras Companhia de Seguros F..., S.A., e I..., S.A..

A F..., Companhia de Seguros, S.A.

[1] contestou, impugnando os factos alegados pela Autora, alegando que no dia 10 de Dezembro de 2013 encontrava-se válido e eficaz o contrato de seguro titulado pela apólice ..., celebrado entre si e a Ré EDP, no qual acordaram as partes, além do mais o funcionamento da apólice em “layers” (“Layer A” e “Layer B”), com a seguinte delimitação geral: a cobertura de 100.000,00€ em excesso de 50.000,00€, por sinistro e sem limite agregado; B. Cobertura de 5.000.000,00€ por sinistro e em agregado anual, em excesso de 150.000,00€; e a exclusão, de todas as garantias da apólice, das “responsabilidades, sinistros, custos e despesas: [N] d) Directa ou indirectamente causados por actos de Força Maior da natureza”.

Veio a ser proferida sentença que julgou a causa nos seguintes termos: Face ao exposto, julgo totalmente procedente, por provada, a presente acção e, em consequência: a) Condeno a chamada F... – COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

, a pagar à autora CONSELHO DIRECTIVO DA ASSEMBLEIA DE COMPARTES DOS BALDIOS DA FREGUESIA DE V...

a quantia global de 100.000,00 (cem mil) euros a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação e até efectivo e integral pagamento; b) Condeno a ré EDP – DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA, S.A.

, a pagar à autora CONSELHO DIRECTIVO DA ASSEMBLEIA DE COMPARTES DOS BALDIOS DA FREGUESIA DE V...

a quantia global de 73.188,04 euros (setenta e três mil cento e oitenta e oito euros e quatro cêntimos) euros a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação e até efectivo e integral pagamento e na quantia que se vier a apurar desde 8 de Setembro de 2015 (data da entrada da acção) até efectivo e integral pagamento, a título de falta de produção, a determinar na proporção de 5m3 x 57ha/ano ao preço de 22,20 euros por hectare.

  1. Condeno a ré e a chamada em custas na proporção do decaimento.

As Rés interpuseram recurso, formulando as seguintes alegações: EDP – Distribuição de Energia, S. A.: ...

F... – Companhia de Seguros, S. A.

: ...

A Autora na resposta às alegações apresentadas pela Recorrente EDP, S. A. coloca, como questão preliminar, o incumprimento por esta do ónus de impugnação a que alude o art.º 640º, n.º 1, do C. P. Civil, concluindo pela rejeição desse recurso, posição que torna extensiva ao recurso apresentado pela Ré Seguradora.

Para o caso de se entender não serem de rejeitar os recursos apresentados conclui pela confirmação da decisão proferida.

1. Do objecto do recurso Ambas as Recorrentes impugnaram parcialmente a decisão sobre a matéria de facto.

A Recorrida, nas contra-alegações, pronunciou-se no sentido do recurso não ser conhecido nessa parte, alegando que as Recorrentes não cumpriram as exigências formais contidas no artigo 640º do C. P. Civil, designadamente a indicação das passagens da gravação em que se fundam os recursos.

Contudo, da análise das alegações apresentadas por ambas as Recorrentes constata-se que estas não deixaram de indicar os concretos pontos de facto que consideram incorrectamente julgados, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, e os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida, tendo mencionado as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, acompanhadas da respectiva transcrição dos excertos que...

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