Acórdão nº 128/15.2T9CDN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução26 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Condeixa-a-Nova – Instância Local – Secção de Competência Genérica – J1, o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum com intervenção do tribunal singular, do arguido A... , com os demais sinais nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material, de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos arts. 137º, nº 2 e 69º, nº 1, a), ambos do C. Penal, de uma contra-ordenação, p. e p. pelo art. 81º, nºs 1 e 6, a) do C. da Estrada e de uma contra-ordenação p. e p. pelo art. 81º, nºs 5 e 6, b) do mesmo código.

Os assistentes B... e C... deduziram pedido de indemnização civil contra D... , SA, com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 173.318, por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros à taxa legal, desde a notificação do pedido e até integral pagamento.

O Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE, deduziu pedido de indemnização civil contra D... , SA, com vista à sua condenação no pagamento da quantia de € 17.576,27, correspondente ao valor da assistência prestada à vítima.

Os assistentes, em sede de pedido de indemnização civil, requereram a intervenção provocada do arguido e do Fundo de Garantia Automóvel, que foi deferida.

Por sentença de 6 de Julho de 2016 foi o arguido condenado, pela prática dos imputados crime de homicídio por negligência e contra-ordenações, na pena de um ano e oito meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período condicionada ao cumprimento das obrigações de resposta às convocatórias da DGRS, às apresentações ao respectivo técnico e frequência de programa de segurança rodoviária, na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de onze meses, e nas sanções acessórias de nove meses e de catorze meses de inibição de conduzir veículos motorizados.

Mais foi declarada a ilegitimidade do Fundo de Garantia Automóvel e do arguido, enquanto demandado civil, e os mesmos absolvidos da instância, e condenada a demandada D... , SA., no pagamento aos assistentes, da quantia de € 161.318, acrescida de juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia de € 3.318, desde a data da notificação do pedido, e sobre a quantia de € 158.000, desde a data da decisão, e no pagamento ao Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, EPE, da quantia de € 17.576,27, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação do pedido.

* Inconformada com a decisão, recorreu a demandada civil D... , SA., formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: 1ª.) O Tribunal recorrido considerou provado que o veículo (...) SG estava garantido pelo contrato de seguro titulado pela apólice nº (...) , válida, na data do acidente, estando a responsabilidade por danos causados a terceiros transferida para a demandada D... , Sa.

  1. ) A recorrente considera que houve erro de julgamento no tocante à resposta dada ao item 14) da matéria provada e no tocante ao facto do Tribunal “a quo” ter considerado NÃO PROVADO que o arguido tinha adquirido a viatura ligeira de passageiros com a matrícula (...) SG cerca de três semanas antes e NÃO PROVADO que o seguro da viatura estivesse, na data do sinistro, caducado e inválido.

  2. ) Com base nos depoimentos das testemunhas H... , I... e L... e nas declarações do arguido produzidas em julgamento e ainda por este prestadas a fls. 90 e 287 que confirmou em julgamento, conforme transcrições supra expostas e que aqui se dão por reproduzidas, é inequívoco que o Tribunal não poderia nunca ter considerado válido o seguro celebrado com a recorrente por ter havido alienação do veículo em data anterior ao acidente – cerca de três semanas.

  3. ) Logo, reapreciando a prova produzida e com base naqueles depoimentos/declarações terá o Tribunal ad quem de considerar provado que o arguido tinha adquirido o veículo (...) SG cerca de três semanas antes do acidente e que tal alienação produziu a caducidade/invalidade do contrato de seguro anteriormente celebrado com a recorrente pelo anterior proprietário H... .

  4. ) Nenhum relevo jurídico assume o facto do arguido não ter pago integralmente o preço do veículo porquanto a venda deu-se por mero efeito do contrato independentemente da obrigação de pagamento do preço estar ou não cumprida.

  5. ) Do mesmo modo, o facto do veículo estar registado em nome de pessoa diferente do arguido impede que este seja o verdadeiro proprietário porquanto o registo do veículo não tem natureza constitutiva do negócio de compra e venda.

  6. ) Decidindo como decidiu violou o Tribunal “a quo” o comando do artº. 21º do D.L. 291/2007 de 21 de Agosto e os artºs. 219º, 406º, 408º, 875º e 879º, entre outros, do Código Civil.

Termos em que, Deve ser concedido provimento ao recurso e declarar-se que à data do acidente não se encontrava transferida para a recorrente a responsabilidade civil automóvel do veículo (...) SG, e a mesma absolvida dos pedidos.

Assim se fazendo JUSTIÇA * O Fundo de Garantia Automóvel respondeu ao recurso, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo julgou corretamente, ao condenar a Ré seguradora.

2. A presunção registral não foi ilidida, já que não resultou provado que o Arguido tivesse adquirido o veículo em data anterior ao acidente.

3. Sendo o proprietário o tomador do seguro, e não tendo havido alienação, o seguro tem de operar, já que era válido e eficaz.

4. E como nasce a pretensão da seguradora, no sentido da caducidade do contrato de seguro por força de alienação do veículo? 5. É que algumas semanas antes do acidente, o segurado prometeu vender o veículo ao Arguido … mas a venda não chegou a concretizar-se.

6. De facto, ambos combinaram que a declaração de venda apenas seria assinada quando o pagamento integral estivesse efectuado.

7. O veículo não foi alienado – foi sim, embora de modo informal, prometida a alienação!! 8. E foi assumido por ambos os contraentes que a venda se faria depois do pagamento integral.

9. Tanto o Arguido como o proprietário do veículo declararam em julgamento que quando o veículo estivesse totalmente pago iriam “passar” a declaração de venda.

10. Bem andou o Tribunal a quo ao mencionar na douta sentença de fls. que «estando acordado o pagamento do preço em prestações, só quando o carro estivesse totalmente pago é que iria ser dele».

11. A assinatura da declaração de venda seria a concretização / celebração do negócio prometido.

12. Donde, que o contrato de seguro existia, sendo válido e eficaz à data do acidente que se discute nos presentes autos.

Termos em que deverá ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a douta decisão recorrida. ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA! * Também os assistentes responderam ao recurso, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: 1. O Tribunal a quo julgou e considerou, corretamente, que a viatura (...) SG estava garantida pelo contrato de seguro titulado pela apólice nº (...) , válida na data do acidente, estando a responsabilidade por danos causados a terceiros transferida para a demandada D... .

2. As declarações do arguido e demais testemunhas, proferidas no âmbito do inquérito, não podem ser valoradas, conforme resulta do despacho proferido nos autos, e da exposição apresentada pela recorrente.

3. Da prova produzida em toda a sua plenitude, não ficou provado, de forma inequívoca, que a presunção decorrente do registo tenha sido ilidida, uma vez que ficou provado que o arguido não adquiriu o veículo em data anterior ao acidente.

4. O tomador do seguro é o proprietário e, não tendo sido concretizada a alienação, o seguro tem de operar.

5. O arguido refere que o carro só seria dele depois da venda total e do pagamento, referindo que, até lá, o veículo seria do H... .

6. O arguido nunca pagou o veículo e nem sequer agiu como seu dono, não mais querendo saber do seu paradeiro após o acidente.

7. Estamos, quando muito, perante uma promessa de venda que não se veio a concretizar.

8. Negociações que foram realizadas entre duas pessoas, que não eram, sequer, titulares de habilitação legal quando o acidente se verificou, e sem que a demandada D... tivesse deixado de realizar o competente seguro que, após o acidente, vem dizer estar caducado.

9. Bem andou o Tribunal a quo ao mencionar, na douta sentença, que: “(...) estando acordado o pagamento do preço em prestações, só quando o carro estivesse totalmente pago é que iria ser dele” 10. O contrato de seguro existia, sendo válido e eficaz à data do acidente e, por tal, deve responder nos termos declarados na douta sentença.

Termos em que, com a manutenção da Douta SENTENÇA, deverá ser considerado improcedente o Recurso apresentado pela Demandada D... .

Assim será feita, JUSTIÇA! * A Exma. Procuradora-Geral Adjunta apôs o seu visto.

* Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir.

* II. FUNDAMENTAÇÃO Dispõe o art. 412º, nº 1 do C. Processo Penal que, a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido. As conclusões constituem pois, o limite do objecto do recurso, delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.

Assim, atentas as conclusões formuladas pela recorrente, as questões a decidir em ambos os recursos, sem prejuízo das de conhecimento oficioso, são: - A incorrecta decisão proferida sobre a matéria de facto; - A consequente ausência de responsabilidade civil por parte da demandada recorrente e sua absolvição.

* Para a resolução destas questões importa ter presente o que de relevante consta da sentença recorrida. Assim: A) Nela foram considerados provados os seguintes factos: “ (…).

1) No dia 1 de Junho de 2014, cerca das 05.15 horas, o arguido conduzia o veículo ligeiro de passageiros, com a matrícula (...) SG, no IC2, no sentido Condeixa – Pombal.

2) No veículo seguia...

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