Acórdão nº 4255/15.8T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelRAMALHO PINTO
Data da Resolução17 de Novembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: A...

veio instaurar a presente acção emergente de contrato de trabalho contra B....

pedindo que a) seja declarada a existência de contrato de trabalho celebrado entre si e o Réu; b) seja declarada a resolução com justa causa desse contrato celebrado em Março de 2009; c) seja o Réu condenado a pagar-lhe a quantia global de € 20.555,69, referente a créditos de formação profissional, trabalho suplementar, subsídios de refeição e de férias e de Natal referente ao período entre 2009 e 2014; d) seja o Réu condenado a pagar-lhe a quantia de € 8.370,00, referente a indemnização pela resolução com justa causa; e) seja o Réu condenado a pagar-lhe a quantia de € 25.000,00, referente a indemnização por “actos discriminatórios e de assédio”, bem como as despesas de contabilidade para regularização da sua situação fiscal e quotizações na Segurança Social, a apurar em liquidação de sentença e ainda juros de mora.

Para tanto, alegou, em resumo, que foi admitida ao serviço do Réu, mediante contrato de trabalho, para exercer as funções de advogada sua subordinada. Mais alegou factos sustentadores dos pedidos de condenação do Réu.

O Réu contestou, concluindo pela improcedência da acção, […] Deduziu ainda reconvenção, pedindo a condenação da Autora a pagar-lhe a quantia de € 25.000,00, mais devendo a Autora, caso a acção venha a ser julgada procedente, ser condenada a restituir os valores recebidos desde Fevereiro de 2009 a Dezembro de 2014, bem como condenada no pagamento da indemnização por falta de cumprimento do aviso prévio, correspondente às quantias que se vierem a liquidar em sede de execução de sentença, sendo essas quantias acrescidas de juros de mora. Concretamente, pediu a condenação da Autora no pagamento da quantia de € 5.000 decorrente dos danos de natureza não patrimonial advenientes de alegadas injúrias, a condenação como litigante de má fé, no pagamento de multa, bem como de indemnização a favor do réu no valor de € 10.000, a condenação da Autora no pagamento da quantia de € 10.000 a título de compensação por danos morais causados com a instauração da presente acção.

A Autora apresentou resposta, pugnando designadamente pela competência da secção do trabalho do tribunal, pela improcedência das demais excepções e pela rejeição da reconvenção.

Em sede de despacho saneador, a Sr.ª Juíza do tribunal recorrido, considerou e decidiu designadamente o seguinte: “(...) Pelos fundamentos expostos, e atentas as normas legais citadas, decide-se julgar improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta em razão da matéria da Secção do Trabalho, invocada pelo R. B..., considerando esta 1.ª Secção do Trabalho competente para apreciar a presente acção.

(...) Pelos fundamentos expostos, e atentas as normas legais citadas, decide-se julgar improcedente a excepção dilatória de incompetência em razão do território invocada pelo R. B..., considerando esta 1.ª Secção do Trabalho territorialmente competente para apreciar a presente acção.

(...) Pelos fundamentos expostos, decide-se julgar improcedente a arguição, efectuada pelo R. B..., na sua contestação, da nulidade decorrente de erro na forma do processo, considerando-se adequada a presente forma processual (comum) a que recorreu a A. A....

(...) Pelos fundamentos expostos, decide-se julgar improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva deduzida, na sua contestação, pelo R. B..., considerando-o parte legítima para intervir nestes autos”.

Interposto recurso de apelação pelo Réu do despacho saneador, o tribunal a quo proferiu despacho admitindo o recurso unicamente na parte que o mesmo incide na decisão que apreciou a competência do tribunal e que apenas parcialmente admitiu o pedido reconvencional, não o admitindo quanto às demais questões.

Deste despacho não houve reclamação.

Por acórdão deste Tribunal da Relação, foi julgada improcedente a apelação.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, cuja parte decisória transcrevemos: “Pelos fundamentos expostos, e atentas as normas legais citadas, decide-se julgar a presente acção parcialmente procedente, bem como parcialmente procedente a reconvenção e, em consequência: 1) Declara-se a existência de um contrato de trabalho sem termo, celebrado em 02 de Março de 2009, entre a A., A... e o R., B....

2) Condena-se o R., B..., a pagar à A., A..., a título de subsídios de férias e de Natal respeitantes aos anos de 2009 a 2014 e a título de crédito de horas para formação profissional, a quantia total de € 11.480,01 (onze mil, quatrocentos e oitenta euros e um cêntimo), acrescida de juros de mora a contar da citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento, absolvendo-se o R. do demais peticionado pela A., na acção.

3) Condena-se a A., A..., a pagar ao R., B..., a título de indemnização pela denúncia do contrato de trabalho, sem aviso prévio, a quantia de € 2.251,46 (dois mil, duzentos e cinquenta e um euros e quarenta e seis cêntimos), absolvendo-se a A. do demais peticionado pelo R., na reconvenção.

4) Não se condena qualquer das partes como litigante de má fé.

* * Custas da acção e da reconvenção, por A. e R., na proporção dos respectivos decaimentos (art.º 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no art.º 1.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho).

x Inconformada com o decidido, veio o Réu interpor recurso de apelação, onde formulou as seguintes conclusões (sintetizadas após convite do relator nesse sentido): […] A Autora contra-alegou e apresentou recurso, onde formulou as seguintes conclusões: […] Ambas as partes contra-alegaram.

Foram colhidos os vistos legais.

O Exmº Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido da improcedência de ambos os recursos.

Tudo visto, cumpre decidir.

x Como é sabido, o âmbito dos recursos define-se pelas suas conclusões.

A este respeito, como ponto prévio e tal como já referimos no nosso despacho de 10/07/2017 (fls. 1692), este Tribunal de recurso não tem de apreciar todas as considerações, argumentos ou razões produzidas pela parte, mas tão só as questões objecto do mesmo recurso, entendidas as mesmas como aquelas que se reportam aos pontos fáctico-jurídicos estruturantes das posições assumidas pelas partes, ou seja, as que se prendem com a causa de pedir, com o pedido e com as (reais) excepções porventura aduzidas.

Nos presentes autos, e no recurso do Réu, a questão primordial a apreciar tem que ver com a eventual qualificação do contrato celebrado entre as partes como contrato de trabalho, sendo que, como mais adiante se desenvolverá, o traço distintivo determinante entre esse contrato e o de prestação de serviços reside na existência de subordinação jurídica no primeiro.

Assim sendo, porque em nada relevam para essa qualificação e porque a lei proíbe a prática de actos inúteis- artº 130º do CPC, devendo as decisões judiciais somente tratar da abordagem das questões que lhe são postas para apreciar, não serão objecto de apreciação os “argumentos” que o Réu- recorrente alinha nas suas conclusões (ainda extensas) 279 (“Prescrição honorários advogados”), 283 a 289 (“Regulação económica da actividade e tutela”), 290 a 304 (“Conta bancária da actividade profissional”) 306 a 312 (“Parceria sem fidelização”), 313 (“Actividade privada e pública”), 338 a 352 (“Da ausência de intimação para outorga de contrato e de acção para reconhecimento da existência de contrato de trabalho e, pelo contrário, do exercício conjunto de advocacia”) 357 a 362 (“Dos crimes de falsas declarações, procuradoria ilícita, usurpação de funções e falsificação de documentos e abuso de confiança”), 382 a 387 (“Princípio da prossecução do interesse público e protecção dos direitos e interesses dos cidadãos”) , 388 a 390 (“Princípio da justiça e da razoabilidade”), 391, 392 (“Princípio da boa-fé”) 396 a 399 (“Princípio da decisão”) e 400 a 402 (“Princípio da participação”).

Por outro lado, e no que toca à conclusão 448, a competência do tribunal foi já decidida, com trânsito em julgado, pelo acórdão desta Relação a que acima se fez referência.

Assim, e como questões em discussão, temos: - no recurso do Réu: - a nulidade da sentença; - a impugnação da matéria de facto.

- a qualificação do contrato- de trabalho ou de prestação de serviço; - o abuso de direito; - litigância de má-fé da Autora; - no recurso da Autora: - se a Autora foi objecto de assédio moral por parte do Réu.

x Na 1ª instância considerou-se provada a seguinte factualidade: […] x O direito: -a apelação do Réu: Discute-se na acção a natureza da relação contratual que ligava a Autora ao Réu, sustentando a primeira a existência de um contrato de trabalho, e propugnando o segundo pela qualificação como contrato de prestação de serviço.

Como é bom de ver, a solução dada a esta questão, que constitui objecto do recurso do Réu, condicionará a sorte do recurso da Autora, que pressupõe que se adopte a conclusão de que o contrato existente era de natureza jurídico-laboral.

Assim, e naturalmente, começaremos pelo recurso do Réu.

- as nulidades da sentença: Numa longa enunciação de fundamentos dessas nulidades, o Réu invoca-os nas conclusões 1 a 40, 414 a 437, bem como, aqui integrando a impugnação da matéria de facto na nulidade da sentença, nas conclusões 63 a 67 , 80 a 87, 95 a 113, e 123 a 147.

Contudo, tal arguição não obedeceu ao disposto no nº 1 do artº 77º do Cod. Proc. Trabalho, que estipula que a “arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso”.

Esta regra peculiar de que as nulidades da sentença têm de ser arguidas expressa e separadamente no requerimento de interposição do recurso é ditada por razões de economia e celeridade processuais e prende-se com a faculdade que o juiz tem de poder sempre suprir a nulidade antes da subida do recurso (nº 3 do artº 77º). Para que tal faculdade possa ser exercida, importa que a nulidade...

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