Acórdão nº 24484/16.6T8LSB-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução06 de Junho de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A...

, residente na (...) Sobral de Monte Agraço, instaurou a presente ação especial requerendo a declaração de insolvência de B... e C...

, casados, residentes na Rua (...) Peniche.

Fundamentou a sua pretensão no facto de ser titular de um crédito vencido titulado por três cheques no valor global de 40.000,00 €, devolvidos pelo sistema de compensação com a informação de falta de provisão, que deu à execução em meados de 2007, sem que tenha almejado até à data o seu pagamento e mostrando-se o património conhecido aos requeridos muito onerado.

Concluiu que os requeridos estão impossibilitados de cumprir com as suas obrigações (20.º n.º 1 al. a) do CIRE) e que o valor do seu crédito, pelo seu montante e circunstâncias que acompanham o incumprimento, indiciam que estão incapazes de satisfazer pontualmente o seu crédito (art.º 20.º n.º 1 al. b) do CIRE).

Com a petição inicial efectuou algumas menções do artigo 23.º n.º 2 als. b), d) e nº 3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa.

Citados os requeridos vieram deduzir oposição por excepção (dilatória) ao invocar a ausência de legitimidade processual da autora, com o fundamento em que o crédito a que esta se arroga, ser litigioso e ainda não se encontrar reconhecido por sentença, não obstante a pendência de processo judicial que o tem por objecto; a existência de litispendência ou de causa prejudicial com o processo executivo pendente e os seus incidentes declarativos (embargos); a ineptidão do requerimento inicial, com fundamento em a requerente não ter alegado a verificação de algum dos factores índices legalmente previstos e, por fim, impugnam especificadamente o alegado estado de insolvência em virtude do seu património ser suficiente para fazer face aos seus compromissos financeiros e por último que as dívidas pendentes são em número e montantes diversos dos alegados.

Conforme despacho proferido nos autos a 11.01.2017, constante de fl.s 269 a 272, foram apreciadas todas as excepções dilatórias invocadas pelos requeridos e em sentido negativo.

Especificando, considerou-se não ser inepta a p.i., com o fundamento em que, embora de forma sintética, a requerente, alegou os factos suficientes para que se dê por existente a situação de insolvência em que se encontram os requeridos, o que estes entenderam, atenta a oposição que deduziram; que as acções têm diverso objecto e finalidade, não se verificando litispendência nem se trata de questão prejudicial, bem como que a requerente é parte legítima, por ter interesse directo em demandar.

Realizou-se a audiência de julgamento com observância do legal formalismo, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 346 a 360, na qual se seleccionou a matéria de facto dada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final se declarou a insolvência dos requeridos, com as consequências daí decorrentes e expressamente referidas de fl.s 357 a 360, que aqui se dão por reproduzidos.

Inconformados com a mesma, interpuseram recurso os requeridos, B... e mulher C... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, em separado e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 376), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

  1. A requerente A... , requereu a Insolvência dos requeridos, alegando que, no âmbito da sua actividade comercial cedeu as quotas de uma sociedade que detinha em Lisboa, para além disso, vendeu aos requeridos um conjunto de equipamento (mobília) e de produtos de cosmética e de cabeleireiro de que era proprietária.

  2. Verteu que, em 2007 intentou então o competente processo executivo n.º 18322/07.8YYLSB que corre termos no Tribunal Comarca de Lisboa - Inst. Central - 1ª Secção de Execução - J5, onde obteve vencimento no apenso dos embargos e posteriormente no recurso interposto pelos embargantes para o Tribunal da Relação de Lisboa.

  3. Contabilizando o seu crédito, já com juros de mora vencidos, em montante próximo dos € 70.000,00 (setenta mil euros).

  4. Citados para os termos dos autos, vieram os requeridos a deduzir oposição, suscitando a excepção dilatória, designadamente de ausência de legitimidade activa por parte da requerente, e a ineptidão do requerimento inicial, por ausência de alegação e verificação de algum(uns) dos factores índices previstos no nº 1 do artigo 20º do CIRE.

  5. Em 11.01.2017 foi proferido despacho pré-saneador, que se encontra a fls. 207 a 210 dos autos, o qual indeferiu as excepções invocadas pelos requeridos.

  6. Em 25.01.2017 realizou-se a audiência de discussão e julgamento, sem observância do disposto no nº 5 do artigo 35º do CIRE, ainda que, a acta elaborada nos autos (de fls. 277 a 282) contenha a menção expressa que fora proferido despacho saneador, bem como que, não foram apresentadas reclamações do mesmo.

  7. Encontra-se vertido sob a acta a audiência de discussão e julgamento que foi proferido despacho saneador, antes da produção de prova, bem como que “Neste momento, foi dada a palavras aos Ilustres Mandatários para, querendo, reclamar do despacho que antecede.

    Nessa sequência, disseram nada ter a opor ou a requerer”.

  8. Porém, tal não corresponde à verdade, como se poderá comprovar pela audição das várias fachas do registo áudio de tal diligência.

  9. O despacho saneador foi proferido após as alegações finais, isto é, após terminar a produção da prova, de forma sucinta, inaudível, de tal forma que o seu registo se encontra imperceptível – registo áudio gravado 11h44m03s a 11h45m15s.

  10. Determina a lei que o Tribunal deverá seleccionar a matéria de facto relevante que considere assente e a que constitui a base instrutória, onde o Juiz selecciona a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que deva considerar-se controvertida (artigo 596°, CPC), e que, por isso, deve ser objecto de prova.

  11. Compulsados os autos, verifica-se que o Tribunal a quo, realizou a audiência de julgamento sem fixar a base instrutória, e as partes procederem à produção de prova sem conhecer matéria de facto relevante para a decisão da causa.

  12. A omissão de um acto que a lei define como o início e finalidade da audiência de discussão e julgamento, constitui uma irregularidade com influência na decisão da causa.

  13. Ora, nos termos do artigo 195º do CPC, aplicável por remissão do artigo 17º do CIRE, a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, produz nulidade da decisão.

  14. Os requeridos alegaram a ilegitimidade da requerente para promover o pedido de insolvência, sustentando que à data da entrada da petição inicial, o crédito em causa afigurava-se como litigioso, isto é, que ainda não foi judicialmente reconhecido, por decisão transitada em julgado.

  15. O crédito cuja titularidade a requerente se arroga e que serve de fundamento ao pedido de declaração de insolvência dos requeridos era litigioso, só tendo sido reconhecido em 10 de Janeiro de 2017, mediante acórdão do STJ, que se encontra a fls. 230 a 243 dos autos.

  16. As circunstâncias do incumprimento por parte dos requeridos, no caso dos autos, não revelam a sua incapacidade de satisfazer a generalidade das suas obrigações, seja perante a requerente, ou, terceiros.

  17. Com o merecido respeito por opinião contrária, uma vez que a legitimidade deve ser provada pelo requerente, parece que bastará ao devedor tornar duvidosa a existência do crédito para que o tribunal tenha de indeferir o requerimento de insolvência, sem prejuízo da possibilidade de o credor continuar a poder instaurar processo judicial para cobrança desse crédito.

  18. E sendo o crédito litigioso, não podia afirmar-se, que a requerente é credora dos requerida, daí a ilegitimidade da requerente para formular o pedido de declaração de insolvência dos requeridos.

  19. Os requeridos em sede de oposição verteram que a a requerente não indicou sob o seu petitório qual(is) as alíneas do nº 1 do artigo 20º do CIRE, em que enquadra o seu pedido.

  20. Vertendo que, constitui ónus do requerente da insolvência a alegação e prova dos factores índices ou presuntivos da insolvência, sendo que só após a alegação de algum dos factores índice, passará a cumprir ao devedor o afastamento da presunção, mediante a prova da sua solvabilidade.

  21. Alegando que, se tais factos não forem plasmados na petição ela é inepta e o pedido emerge manifestamente improcedente, sendo caso para indeferimento liminar - artigo 27º nº1 al a) do CIRE.

  22. Sublinhe-se que a requerente nem sequer indicou o valor da acção no seu requerimento inicial, e o Tribunal a quo não se pronunciou sobre tal facto, fixando o valor da causa mediante despacho em fase anterior ao julgamento.

  23. A causa de pedir concretiza-se nos factos dos quais decorre a conclusão final de que o devedor se encontra impossibilitado de cumprir as suas obrigações, que tem de advir dos factos previstos na lei, esse ónus não foi cumprido pela requerente sob o seu petitório, onde a insuficiência de factos que possam preencher algum dos factores índice previstos no nº 1 do artigo 20 - importava a improcedência do pedido de declaração de insolvência.

  24. Atendendo à prova documental e testemunhal produzida em audiência, o recorrente entende que a sentença relativa à matéria de facto não cumpre a lei substantiva, nem processual, porquanto dela constam como provados alguns factos para os quais, de acordo com as regras da produção da prova, deveriam ser dados como não provados.

  25. Resulta do ponto nº 2.1.8, dos factos dados como provados em julgamento que: “2.1.8.

    Mostra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Óbidos um lote de terreno para construção sito na zona do (...) , com 983 m2 e um valor tributário de 17.016,62 €, e com as seguintes inscrições vigentes; hipoteca voluntária a favor da J..., EP, pela Ap. 3 de 24.09.1986 até ao VMA de 45.000.000$00; hipoteca voluntária a favor da J..., EP, pela Ap. 4 de 07.05.1987 até ao VMA de...

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