Acórdão nº 60/15.0GATND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Outubro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução25 de Outubro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório 1. No âmbito do processo comum (singular) n.º 60/15.0GATND do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, Tondela – Juízo C. Genérica, mediante acusação pública, foi o arguido A...

, melhor identificado nos autos, submetido a julgamento, sendo-lhe, então, imputada a prática em autoria material e na forma consumada de um crime de cultivo de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 40.º, nº 1 do D.L. n.º 15/93, de 22.01, por referência à tabela I-C, anexa.

  1. Realizada a audiência de discussão e julgamento por sentença de 27.04.2017 o tribunal decidiu [transcrição do dispositivo]: Por tudo o exposto tribunal julga parcialmente procedente a acusação formulada pelo Ministério Público contra o arguido A.. e por isso, o tribunal: A). Condena-o numa pena de prisão de 2 anos de prisão efetiva, pela prática como autor material e na forma consumada de um crime de tráfico de menor gravidade, na modalidade de plantio, previsto e punido pelo artigo 25.º, al. a) do D.L. 15/93 de 22 de Janeiro.

    […] Declaro perdida a favor do estado o estupefaciente, apreendido nos presentes autos, bem como os restantes objetos apreendidos nos presentes autos devendo os mesmos ser destruídos.

    […].

  2. Inconformado com o assim decidido recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões: 1ª O arguido foi acusado, “em autoria material, na forma consumada na prática de 1 (um) crime de cultivo de estupefacientes, previsto e punido, pelo artigo 40.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22.01, por referência à tabela I-C, anexa àquele diploma” e condenado “pela prática como autor material e na forma consumada de um crime de tráfico de menor gravidade”, p. e p. pelo artigo 25º, al. a) do Decreto-lei n.º 15/93 de 22 de Janeiro, pela prática dos factos dados como provados – do ponto n.º 1 a 16 – da Sentença; 2ª O arguido remeteu-se ao silêncio durante todo o julgamento, não tendo por isso prestado quaisquer declarações. O direito ao silêncio por parte do arguido não o poderá prejudicar em qualquer circunstância não sendo por isso admissível que, em virtude desse mesmo silêncio se possam extrair quaisquer consequências probatórias. Não se poderá, em razão desse silêncio por parte do arguido, e na falta da produção de prova em contrário, considerar como factos provados que as plantas apreendidas “não se destinavam ao consumo exclusivo do arguido” – cf. Ponto n.º 7 dos “Factos provados da Sentença”, uma vez que, atenta a toda a prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento nada resulta que comprove esse facto; 3ª. Conforma melhor consta da acusação o arguido vinha acusado “ (…) em autoria material, na forma consumada na prática de 1 (um) crime de cultivo de estupefaciente, previsto e punido, pelo artigo 40.º, n.º 1, do Dec. Lei nº 15/93, de 22.01, por referência à tabela I-C, anexa àquele diploma”. No entanto, e no momento em que lia a acusação ao arguido, o Meritíssimo Sr. Dr. Juiz altera a qualificação jurídica dos factos – cf. transcrição constante nas folhas nº 2 e 3 do presente recurso. Esta é uma clara e evidente violação do princípio do acusatório, uma vez que é alterada, de uma forma irregular, os termos constantes na acusação do MP – fls. 94 a 99 – e que imputam ao arguido apenas o crime p.p. no n.º 1 do artigo 40.º do supra citado Decreto-Lei, posição que de resto o Dig.mo Senhor Magistrado do MP manteve até ao final do julgamento.

    4ª No dia 18/04/2017, data em que estava agendada a leitura de Sentença, o Meritíssimo Senhor Dr. Juiz reabriu a audiência tendo de seguida proferido despacho transcrito na fls. 4 deste recurso e cf. fls. 144 a 146 do processo principal. Ora, salvo melhor opinião, a mera circunstância de que “Dos factos constantes da acusação não resulta que o arguido destinasse as plantas que detinha para seu consumo” não é, por si só, suficiente para se depreender que não se verifica o elemento especial do tipo e, por via disso, determinar-se que o cultivo das referidas plantas não integre o art.º 40 do Decreto-Lei n.º 15/93.

    5ª Para alterar a qualificação jurídica seria determinante sim, que, mediante a prova produzida em sede de audiência e julgamento, se demonstrasse que o arguido daria destino diverso – que não o consumo exclusivo – às plantas apreendidas e ao produto estupefaciente. Ou seja que não restassem quaisquer dúvidas de que o arguido cultivou as referidas plantas para o fim de tráfico, pois só assim seria possível enquadrar tal ilícito no art.º 21º ou 25º do Dec-Lei n.º 15/93; 6ª Com tal despacho Tribunal não só altera os factos constantes da acusação, mas também faz um juízo de intenção do arguido com o fundamento de que “ (…) tendo em conta o disposto no art.º 25º do Decreto-Lei n.º 15/93, tais atos serão passíveis de integrar tal ilícito, atendendo à quantidade de material que no momento detinha, mas não à possibilidade que as noventa e seis plantas tinham, de produzir, cerca noventa KG de cabeças ou botões, determinou uma alteração da qualificação jurídica dos factos, uma vez que está omitido na acusação o destino a dar a tais plantas” – o sublinhado é nosso; 7ª Apesar dos factos concretos constantes da acusação, escorados entre outros elementos, pelo relatório do Laboratório de Polícia Cientifica da Policia Judiciária e que, após exame, verificou que as plantas apreendidas tratava-se de 26,700 gramas de canábis (FLS/SUMID) com um grau de pureza de 1,9 (THC) que daria para 10 doses – cf. exame pericial de fls. 40 – o Tribunal não dando cumprimento ao disposto no nº 1 do art.º 163º do Código de processo Penal, optou ao invés por uma tese quase académica, alicerçada na possibilidade que as noventa e seis plantas tinham em produzir os tais cerca de noventa quilogramas (!) de cabeças e botões, e desta forma justificar essa mesma alteração jurídica, admitindo que todas essas 96 plantas – ainda num estádio muitíssimo prematuro e de germinação – vingassem até à fase adulta para produzir esses hipotéticos 90 Kg; 8ª Na Sentença agora recorrida, no ponto “II Fundamentação”, é referido, no ponto “Quanto à medida da respetiva” pena no penúltimo parágrafo, “Dentro da moldura penal correspondente – tendo em conta a quantidade de plantas que o arguido tinha germinadas e pressupondo que cerca de metade chegaria à idade adulta, com a consequente colheita, a gravidade do ilícito é elevada”; 9ª No espaço temporal que mediou o despacho proferido de alteração da qualificação jurídica e a leitura da Sentença, e sem que fosse produzida qualquer outra prova, concluiu que, afinal, não seriam a totalidade das 96 plantas a chegar à idade adulta, “pressupondo” que metade atingiriam esse estádio; 10ª O nosso Direito Penal é assente no FACTO e não no agente ou em pressupostos.

    11ª Atendendo ao nº 5 dos “Factos Provados” que refere que o produto estupefaciente apreendido “veio a revelar tratar-se de 26,700 gramas de cannabis (FLS/SUMID) com um grau de pureza de 1.9 (THC) que daria para 10 doses conforma exame pericial de fls. 40”, estamos perante uma quantidade de produto estupefaciente muitíssimo reduzida que não excede as dez doses, sendo que por isso, e no nosso entender, os factos constantes da acusação estavam juridicamente corretos e devidamente enquadrados; 12ª Quanto ao ponto nº 7 dos “Factos Provados”, é referido que “As plantas que se encontravam na fase inicial de crescimento e germinação, não se destinavam ao consumo exclusivo do arguido”...

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