Acórdão nº 303/12.1TBSPS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | ARLINDO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 24 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A A... , CRL, deduziu a presente ação declarativa, então, sob a forma de processo ordinário, contra B... e esposa C... , D... , E... , e F... , já todos identificados nos autos, alegando ser titular de um crédito de € 93.599,24, e respetivos juros, sobre os réus B... e esposa C... , derivado de contratos de mútuo e de depósito bancário com eles celebrados, e do vencimento de uma letra de câmbio em que são avalistas.
Revelando-se o património dos referidos réus B... e esposa C... insuficiente para pagamento desse montante em dívida, o dito réu repudiou, por escritura pública, e com o consentimento da esposa, agindo ambos de má fé, as heranças abertas por óbito de seus pais G... e H... , indicando como única descendência sucessível as suas filhas, as rés D... e E... . Repúdio este que, sendo ato gratuito, ocorreu em momento posterior à constituição do aludido crédito da autora, e do qual resulta, na perspetiva desta, a diminuição da garantia patrimonial desse crédito.
Por outro lado, as rés D... , E... e F... procederam já, mediante procedimento de habilitação e partilha, e agindo de má fé, à partilha da referida herança, sendo adjudicados à ré F... todos os bens relacionados, e às restantes rés apenas tornas. Ora, segundo a autora, desta partilha resulta também a diminuição da garantia patrimonial do seu mencionado crédito, sendo ainda certo que nela foi omitido um prédio urbano pertencente aos autores da herança.
Desse modo, pretende a autora, com a presente ação, aceitar as referidas heranças em nome do réu B... , impugnar a partilha efetuada, realizar partilha adicional, e assim executar contra os bens dessa herança, na medida do quinhão do réu B... , a sentença a proferir nestes autos.
Por isso, peticiona a autora, a final: - A condenação dos réus B... e C... no pagamento da quantia de € 93.599,24, e respetivos juros; - Que se considere a herança aberta por óbito dos pais do réu B... aceite pela autora, para que esta execute o seu crédito pelo valor do quinhão deste réu; - A declaração de ineficácia da partilha efetuada relativamente a si; - A inclusão na referida herança do prédio urbano nela omitido, de modo a que possa executar o seu crédito também contra esse bem.
Citados para o efeito, todos os réus contestaram, solicitando a improcedência da ação, impugnando alguns dos factos alegados e que o repúdio da herança não teve como motivação o crédito a que se arroga a autora, bem como que a partilha se destinou a regularizar uma dívida do 1.º réu marido para com a herança, no montante de 248.000,00 €, razão pela qual, aqueles se obrigaram a pagar metade desta quantia à ré F... .
No que aqui interessa, já depois de designada data para realização da audiência de julgamento, veio entretanto a apurar-se que os réus B... e esposa C... foram declarados insolventes, por sentença proferida em 01 de Fevereiro de 2016 e transitada em julgado em 22 desse mesmo mês e ano – cfr. fls. 334 e certidão de fl.s 338 a 344.
Notificadas as partes para se pronunciarem sobre a possibilidade de extinção dos autos por inutilidade superveniente da lide, apenas a autora veio requerer o prosseguimento do processo, cf. fl.s 346 v.º e 347, defendendo não ser de aplicar a jurisprudência uniformizada fixada no AUJ n.º 1/2014, com o fundamento em os efeitos da presente acção serem idênticos aos da impugnação pauliana, não se resumindo a mesma a apreciar questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, pretendendo aceitar em nome do réu as heranças por este renunciadas, executando contra os seus bens a sentença a proferir nos presentes autos.
Invoca, ainda, o facto de nos termos do disposto no artigo 127.º, n.º 2, do CIRE, de acordo com o qual, a presente acção deve prosseguir os seus termos, excepto se o A.I. resolver o acto impugnado, caso em que a acção deve ficar suspensa até à decisão definitiva dessa resolução.
Conclusos os autos à M.ma Juiz a quo, foi por esta proferida a decisão de fl.s 360 a 364 (aqui recorrida), nos termos que, se passam a transcrever: “Cumpre apreciar e decidir a questão suscitada, tendo designadamente em perspetiva a jurisprudência uniformizada fixada no AC STJ nº 1/2014 (DR 1ª série, de 25/2/2014).
Dispõe o artigo 85º, nº 1, CIRE: “Declarada a insolvência, todas as ações pendentes em que se apreciem questões relativas a bens compreendidos na massa insolvente, intentadas contra o devedor, ou mesmo contra terceiros, mas cujo resultado possa influenciar o valor da massa (…) são apensadas ao processo de insolvência (…)”. Tal apensação deve ser interpretada à luz dos fins do processo de insolvência, nos termos em que estes se mostram, designadamente, consagrados no artigo 1º CIRE. E o certo é que, sendo a insolvência um processo de execução universal que visa liquidar o património insolvente e repartir o produto obtido pelos credores, vinha sendo questionado se a declaração judicial de insolvência é ou não compatível com a prossecução de ação em que o credor pretende ver reconhecido um crédito sobre o devedor/insolvente. Sobre esta questão, a jurisprudência mostrava-se dividida, defendendo uma parte que a decisão que declara a insolvência, transitada em julgado, torna inútil a lide da ação declarativa e outra que tal inutilidade apenas ocorre a partir do momento em que é proferida sentença de verificação de créditos. Tal questão...
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