Acórdão nº 4208/15.6T8PBL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LOUREIRO
Data da Resolução09 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório Por apenso à execução que lhes move a exequente, os embargantes deduziram embargos de execução e oposição à penhora, alegando, em resumo, que o requerimento executivo é inepto, por dele não se depreender qual o pedido e a causa de pedir, que o título executivo é inexequível por não ter expresso o valor da dívida e por não ter sido acompanhado de documento idóneo a comprovar que pelo menos uma prestação foi realizada, que não devem a quantia peticionada, que não foram interpelados previamente à instauração da execução para procederem ao pagamento e que a penhora é ilegal por o título apresentado não ter força executiva.

Contestou a exequente, pugnando pela improcedência dos embargos e da oposição, alegando para tanto, em resumo, que o requerimento executivo não é inepto, que o contrato de mútuo é título executivo ao abrigo do artigo 46º/c do anterior Código de Processo Civil (doravante VCPC) à luz do qual deve ser aferida a respectiva exequibilidade, que tentou interpelar os embargantes para o pagamento, em vão, que a não interpelação não afasta a situação de incumprimento, uma vez que a obrigação exequenda tinha prazo certo e consta do contrato que a citação para a acção executiva vale como interpelação, e que a oposição à penhora deve improceder.

Realizada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador julgando os embargos e a oposição totalmente improcedentes.

Não se conformando com o assim decidido, apelaram os embargantes, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: ...

Contra-alegou a exequente, pugnando pela improcedência da apelação.

Dispensados os vistos, cumpre decidir.

II - Principais questões a decidir Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – doravante NCPC), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) se a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação ou por ter omitido o conhecimento de questões que deveriam ter conhecidas; 2ª) se o requerimento executivo é inepto; 3ª) se, em abstracto, o título executivo não suporta a pretensão executiva formulada pela exequente; 4ª) se, em concreto, o título executivo permite a cobrança coerciva dos créditos exequendos dada a circunstância de os embargantes não terem sido interpelados prévia e extrajudicialmente para cumprirem; 5ª) se a penhora é ilegal porque o título exequendo não tem eficácia executiva e porque os embargantes não devem a quantia exequenda.

III – Fundamentação A) De facto Os factos provados O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos: “1) Foi apresentado como título executivo um contrato, designado por contrato de mútuo, cuja cópia consta de fls. 4 a 5 v.º da execução e que dou por integralmente reproduzida (facto dado como provado com base no documento para o qual se remete).” B) De direito Primeira questão: se a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação ou por ter omitido o conhecimento de questões que deveriam ter sido conhecidas.

1.1.

A resposta a esta questão é, manifestamente, negativa, como passa a demonstrar-se.

...

Segunda questão: se o requerimento executivo é inepto.

  1. 2.1.

    Para fundamentar a ineptidão da petição que pretendem ver declarada, alegaram os embargantes o seguinte: “1º Parece aos Executados que o r.i. apresentado pela Exequente é inepto.

    2º Isto porque, atendendo ao “pretenso” título dado à execução e ao alegado na parte destinada aos “factos”, não se depreende qual o pedido e a causa de pedir da mesma.

    3º Na verdade, ao deparar-se com o teor da notificação correspondente ao processo em questão, os Executados não descortina qual a razão, ou qual o motivo porque são Executados na presente Execução.

    4º A Exequente pouco alega na exposição dos factos, no Requerimento Executivo apresentado aos Executados, que permita elucidar as partes, quer seja do “negócio”, quer dos montantes e sua natureza, o valor dos juros vencidos e vincendos, etc.

    5º O que se diz na exposição dos factos, é o mesmo que nada se dizer, atendendo ao disposto no artigo 467º do C.P.C.

    6º 5/21 4 E face ao “teor” de tal Requerimento Executivo, os Executados vêem-se obrigados a “adivinhar” sobre o verdadeiro motivo pelo qual foram agora demandados, sem saber se a oposição que agora apresentam vai de encontro ao que é efetivamente pedido pela Exequente.

    7º Quem apresenta petição em Tribunal, como o faz neste caso a Exequente, tem de fundamentar de facto e de direito as razões da sua vinda a Tribunal.

    8º Ao analisarmos o r.i., apresentado pela Exequente, não conseguimos saber o que pretende, que contrato foi celebrado, quais as condições, que tipo de serviço foi prestado, o negócio celebrado, etc.

    9º Segundo o Prof. Antunes Varela, Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 234-235,”… causa de pedir é o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido, pelo que, se o autor não mencionar esse facto concreto, a petição será inepta”.

    10º É assim manifestamente inepto o Requerimento Executivo apresentado pela Exequente, pelo que deverá o mesmo ser rejeitado.

    11º Por esse facto, deve este Venerando Tribunal, declarar inepto o r.i., anulando-se todos os atos tomados posteriormente. 12º O que aqui se requer, com todas as consequências legais daí resultantes.

    ”.

    Como assim, sustentam os apelantes que a exequente não indicou em termos perceptíveis para os embargantes o pedido e a causa de pedir, o que, em abstracto, poderia integrar os vícios de falta ou ininteligibilidade do pedido ou da causa de pedir (art. 186º/1/2/a NCPC).

    2.2.

    Não assiste manifestamente razão aos apelantes.

    2.2.1.

    Quanto ao pedido, emerge com evidência do requerimento executivo que a exequente pretende a cobrança coerciva do capital de 155.954,20 euros, acrescido de juros desde 2013/04/08 a 2015/09/30, no montante de 26.184,22 euros, às taxas e com os reportes temporais enunciados no requerimento em questão, cláusula penal de 3.0000000% desde 2013/04/28, no valor de 11.501,63 euros, seguros no valor de 361,46 euros, juros moratórios sobre seguros no valor de 50,17 euros, imposto sobre seguros no valor de 2,00 euros, mutuários conta despesas no valor de 5.061,74 euros, imposto sobre despesas no valor de 202,47 euros, imposto de selo no valor de 1.507,44 euros, tudo no montante global de 200.825,33 euros – fls. 76.

    Existe, por isso, pedido formulado e de modo perfeitamente inteligível.

    2.2.2.

    No que toca à causa de pedir, é sabido que na acção executiva a mesma é constituída pelo título executivo e pelos factos constitutivos da obrigação exequenda cuja cobrança coerciva se peticiona, devendo estes estar reflectidos naquele – acórdãos do STJ de 9/2/2012, proferido no processo 8553/06.3TBMTS.P1.S1., de 2/6/2011, proferido no processo 3376/09.0TBLRA-B.C1.S1, de 24/11/83, publicado no BMJ nº 331, p. 469, da Relação de Guimarães de 15/3/2007, proferido no processo 413/07-1, da Relação do Porto de 18/2/2002, proferido no processo 0151831, de 25/2/2002, proferido no processo 0151894, Remédio Marques, Curso de Processo Executivo, p. 58.

    No caso em apreço, a causa de pedir da presente execução é integrada pelo contrato de mútuo, com constituição de fiança, que está documentado a fls. 76 vº a 79 vº destes autos, por via do qual, designadamente, a embargante Clínica se confessou devedora à exequente da quantia de 159.000 euros (cláusula 1ª), que se obrigou a pagar à exequente nas condições (prazo de amortização e número de prestações, juros devidos, cláusula penal em caso de incumprimento, despesas e encargos devidos ….), previstas naquele mesmo contrato, constituindo-se os demais embargantes, solidariamente, como fiadores e principais pagadores das dívidas contraídas perante a exequente pela devedora principal ao abrigo daquele contrato (cláusula 11ª), sendo justamente com base no clausulado constante daquele contrato que a exequente se arroga o direito a cobrar coercivamente de todos os embargantes a quantia de 200.825,33 euros supra referida.

    A exequente preencheu, assim, a exigência legal de indicação da causa de pedir, sendo esta perfeitamente clara e, consequentemente, inteligível.

    2.3.

    Não se verifica, assim, a ineptidão da petição inicial.

    2.4.

    Sustentam os apelantes, no entanto, que o título executivo não existe, pois: i) por um lado está em causa um documento particular (conclusão 5ª); ii) por outro lado, dele não emerge “… o incumprimento pelos Recorrentes de obrigação exequenda, constituída ao abrigo do mútuo que apresenta como título executivo” (conclusão 6ª), “O Mútuo junto, apenas se limita a documentar a constituição de uma hipoteca, sem que a correlativa prestação do credor se demonstre constituída e violada, pelo que, não configura título executivo (conclusão 7ª), “É necessário que o título exequendo esteja em condições de certificar a existência de obrigação que entre as partes se constituiu e formou e tal não resulta do Mútuo junto aos autos.

    ” (conclusão 8ª).

    2.4.1.

    No que concerne à circunstância do título executivo corporizar um documento meramente particular, afigura-se-nos que os embargantes pretendem prevalecer-se do estatuído no art. 703º/1 do NCPC e do facto de neste dispositivo se ter retirado eficácia executiva aos documentos particulares do tipo daquele que é dado como título executivo na presente execução, eficácia essa que era reconhecida pelo anterior 46º/1/c do VCPC.

    O título apresentado pela exequente remonta a 28/9/2012, ou seja, a data anterior à da entrada em vigor do NCPC (1/9/2013 – art. 8º da Lei 41/2013, de 26/6).

    Ora, como decidido pelo Tribunal Constitucional, com força obrigatória geral, no seu acórdão 408/2015, é inconstitucional a “….norma que aplica o artigo 703.º do Código de Processo Civil, aprovado em anexo à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho...

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