Acórdão nº 6782/16.0T8CBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução07 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório A...

, divorciada, com os sinais dos autos, deduziu (em 13/09/2016) incidente de incumprimento das responsabilidades parentais contra B...

, divorciado, também identificado nos autos, por este não ter efectuado o pagamento de quaisquer prestações de alimentos ao filho C...

, desde que este, em 15/02/2010, atingiu a maioridade, não obstante este continuar a estudar, tendo concluído a licenciatura em 29/6/2016 e frequentando actualmente um mestrado numa escola em Berlim.

Assim – tendo em processo de divórcio por mútuo consentimento, que correu termos no T. F. de Coimbra, sido homologado, em 11/01/1999, o respectivo acordo de regulação das responsabilidades parentais, segundo o qual o pai contribuíria, a título de prestação alimentar, com a quantia mensal de 60.000$00, até ao dia 8 do mês a que respeitar – pede a condenação do requerido a pagar € 16.200,00 de alimentos vencidos e não pagos, acrescidos das prestações vincendas, numa multa e numa indemnização a favor da requerente e do filho em montante não inferior a € 1.000.

Notificado o requerido veio este, inter alia, invocar que a Lei nº 122/2015, de 1/9, não tem aplicação retroactiva, pelo que, tendo o C... atingido a maioridade antes da sua entrada em vigor, não está fixada qualquer obrigação de alimentos, não se podendo falar em incumprimento.

Conclusos os autos, foi proferida decisão que julgou improcedente o presente incumprimento das responsabilidades parentais.

Tendo-se expendido, para o efeito, o seguinte: “ Compulsando os autos principais – de divórcio por mútuo consentimento – verifico que em 15/2/92 nasceu C... , filho da requerente e do requerido, os quais acordaram (acordo este que foi judicialmente homologado) em que o requerido contribuísse mensalmente com a quantia de 60.000$00 para alimentos do filho, a entregar à mãe até ao dia 8 do mês a que disser respeito.

Assim, o C... atingiu a maioridade (cfr. o artigo 122º do C.C.) em 15/2/2010, aí tendo cessado a sua sujeição às responsabilidades parentais (cfr. o artigo 1877º do mesmo código).

Não obstante, o artigo 1880º dispõe : «Se no momento em que atingir a maioridade ou for emancipado, o filho não houver completado a sua formação profissional, manter-se-á a obrigação a que se refere o artigo anterior na medida em que seja razoável exigir aos pais o seu cumprimento e pelo tempo normalmente requerido para que aquela formação se complete» .

A obrigação referida no artigo anterior é a de sustento dos filhos, que recai sobre os pais.

No domínio da anterior redacção do artigo 1905º do C.C., a Jurisprudência dominante ia no sentido de que a pensão de alimentos caducava com a maioridade, pelo que o jovem poderia requerer, em processo próprio instaurado contra os progenitores na Conservatória do Registo Civil competente, e nos termos do DL. 272/2001 de 13/10, a fixação de alimentos ao abrigo do artigo 1880º acima transcrito.

Neste sentido, ver os Acórdãos da Relação de Lisboa de 6/3/2012, processo 109187-A/1995.L1-7 e de 17/6/2014, processo 6308/10.0tbcsc.L2-1, e do S.T.J. de 22/4/2008, processo 08B389, in www.dgsi.pt, entre outros.

Entretanto, em 1/10/2015, entrou em vigor a Lei nº 122/2015 de 1/9, que deu nova redacção ao artigo 1905º do C.C., dispondo agora o seu nº 2 : «Para efeitos do disposto no artigo1880º, entende-se que se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete 25 anos de idade, a pensão fixada a seu benefício durante a menoridade, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido, ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência» .

É nesta norma, com a redacção acabada de transcrever, que a requerente funda a sua pretensão.

Porém, não podemos esquecer que o filho das partes atingiu a maioridade muito antes da entrada em vigor da mencionada lei, concretamente, mais de cinco anos antes.

Por outro lado, não podemos ignorar que, de acordo com a própria alegação da requerente, o requerido deixou de pagar alimentos ao filho após este atingir a maioridade e este – que era quem dispunha exclusivamente de legitimidade para o efeito na altura – ficou inerte. Deste modo, o pedido formulado pela requerente só poderia proceder se se considerasse que a Lei nº 122/2015, nomeadamente na parte em que alterou a redacção do artigo 1905º do C.C., era de aplicação retroactiva.

Ora, não tendo a Lei nº 122/2015 incluído qualquer norma transitória, temos que a interpretar à luz do artigo 12º do C.C. : «1. A lei só dispõe para o futuro … 2. Quando a lei … dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor» .

Reafirmando o que já se declarou, temos que quando a Lei nº 122/2015 entrou em vigor, já não subsistia a obrigação alimentar a cargo do requerido, que havia caducado em 15/2/2010.

Deste modo, não é defensável a aplicabilidade da nova redacção do artigo 1905º do C.C. ao caso em apreço, não podendo «renascer» uma obrigação alimentar inexistente! Neste sentido, referindo-se inclusivamente a uma situação hipotética em tudo semelhante à dos presentes autos, veja-se o Acórdão da Relação de Lisboa de 2/6/2016, processo 47-16.5t8csc.L1-6, in www.dgsi.pt.

Assim, não estamos perante qualquer incumprimento do regime de exercício das responsabilidades parentais por parte do requerido.” Inconformada com tal decisão, interpôs a requerente o presente recurso, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que “considere aplicável ao caso concreto a Lei n.º 122/2015, de 01 de Setembro e, em consequência, declare que a prestação de alimentos fixada a favor do então menor C... , ora maior, se mantém na maioridade deste, desde Fevereiro de 2010 e até, pelo menos, ao momento em que o C... faça 25 anos, determinando-se o prosseguimento dos autos para apuramento das quantias devidas pelo recorrido à recorrente, a título de pensões de alimentos vencidas e não pagas desde a maioridade do C... até à presente data, acrescidas das prestações vincendas”.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1.ª Vem o presente recurso de apelação interposto pela recorrente da sentença proferida nos autos em epígrafe em 02.11.2016, a qual julgou improcedente o pedido de declaração da manutenção da pensão de alimentos fixada na menoridade até ao momento em que o filho perfizer vinte e cinco anos de idade e, em consequência, julgou também improcedente o incumprimento suscitado pela ora recorrente.

  1. A recorrente veio, em 13.09.2016, nos termos do disposto nos artigos 1880.º e 1905.º, n.º 2 do Código Civil e 989.º, n.º 3 do CPC, na redacção da Lei n.º 122/2015, de 01 de Setembro, requerer a declaração de manutenção para além da maioridade do filho C... (actualmente com vinte e quatro anos de idade) da pensão de alimentos fixada, durante a menoridade deste, no acordo homologado por sentença proferida nos autos principais de divórcio aos quais foram apensos os autos em epígrafe e deduzir incidente de incumprimento do regime de exercício das responsabilidades parentais estabelecido no que respeita à dita obrigação de alimentos.

  2. Na sentença recorrida, considerando o facto de o C... ter atingido a maioridade antes da entrada em vigor da referida Lei n.º 122/2015 , decidiu-se que esta Lei não tem aplicação retroactiva e julgaram-se improcedentes os pedidos formulados pela recorrente.

  3. A questão essencial a resolver é, assim, a de saber, face à mudança substancial operada pela Lei n.º 122/2015, de 01 de Setembro...

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