Acórdão nº 357/14.6 TAMGR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelORLANDO GON
Data da Resolução13 de Dezembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, na 4.ª Secção, Criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

Relatório Pelo Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo Central Criminal de Leiria, Juiz 2, sob acusação do Ministério Público, foi submetida a julgamento, em processo comum, com intervenção do Tribunal Coletivo, a arguida A...

, solteira, operária fabril desempregada, filha de (...) e de (...) , nascida a 18.01.1983, natural da (...) , titular do CC n.º (...) , residente na Rua (...) ; imputando-se-lhe a prática, em autoria imediata, na forma consumada e em concurso efectivo, de um crime de perturbação do funcionamento de órgão constitucional, previsto e punido pelos artigos 26.º, 1.ª parte, 77.º e 334.º, al. a), por referência ao art.333.º, n.º 1; um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelos artigos 26.º, 1.ª parte, 77.º e 143.º, nº 1; e um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 26.º, 1.ª parte, 77.º, 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), todos artigos do Código Penal.

O Centro Hospitalar de (...) , EPE, deduziu pedido de indemnização civil requerendo a condenação da arguida no pagamento da quantia de € 92,75 acrescidos de juros vencidos e vincendos desde a citação até efectivo embolso, respeitantes ao tratamento hospitalar prestado a D... na sequência dos factos ocorridos no dia 20.05.2014..

D... deduziu pedido de indemnização civil requerendo a condenação da demandada A... no pagamento da quantia, nunca inferior, a € 750,00, a título de danos não patrimoniais pelos factos descritos na acusação.

Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Coletivo, por acórdão proferido a 9 de Maio de 2017, decidiu julgar procedente a acusação, bem como os pedidos de indemnização, e, consequentemente, condenar a arguida A... pela prática, em autoria imediata, na forma consumada e em concurso efectivo, de: - um crime de perturbação do funcionamento de órgão constitucional, previsto e punido pelo art.334º, alínea a), por referência ao art.333.º, n.º 1, ambos do Código Penal, na pena de nove meses de prisão; - um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo artigo 143º, nº1, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão; - um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de quatro meses de prisão; e - operar o cúmulo jurídico e, nos termos do art.77º, nºs 1 e 2, do Código Penal, condenar a arguida A... na pena única de um ano de prisão efectiva.

Mais decidiu: - Condenar a demandada A... a pagar ao Centro Hospitalar de (...) , EPE, a quantia de € 92,75, acrescida de juros legais desde a notificação até efectivo e integral pagamento, respeitantes ao tratamento hospitalar prestado a D... ; e - Condenar a demandada A... a pagar à demandante D... a quantia de € 750,00, a título de danos não patrimoniais.

Inconformada com a douta sentença dela interpôs recurso a arguida A...

, concluindo a sua motivação do modo seguinte:

  1. A arguida, ora recorrente, não se conforma com a decisão do Tribunal «a quo» que, salvo o devido respeito, não ponderou convenientemente todos os factores importantes e com relevância para uma correcta e justa determinação da medida concreta da pena.

  2. Relativamente aos crimes de ameaça e de ofensa à integridade fisica praticada pela arguida, julgamos ser adequada e suficiente a aplicação de uma pena não privativa da liberdade, ou seja, uma pena de multa que deve ser fixada tendo em atenção o ilícito praticado (que, de acordo com o Tribunal recorrido, as “lesões foram simples e de cura rápida” e o “grau de violação dos deveres impostos ao agente e a intensidade do dolo são médios”) e a condição económica da arguida.

  3. O Tribunal «a quo», para além de entender não aplicar pena de multa, também decidiu que não realizaria de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a execução em regime de permanência na habitação, ou em pena de prisão cumprida por dias livres, ou em trabalho a favor da comunidade, e, em última instância também não suspendeu a execução da pena de prisão de um ano em que condenou a recorrente.

  4. No relatório social constante nos autos lê-se que “a arguida é acompanhada por esta DGRSP no Âmbito do processo n.º 228/13.3GTLRA – Leiria – Inst. Local – Secção Criminal – J2, numa suspensão de execução da pena e no processo n.º 709/11.3PAMGR, numa prestação de trabalho a favor da comunidade, que se encontra suspenso por incapacidade temporária de A... para o trabalho. Genericamente tem aceitado a intervenção desta Direcção Geral e apresentou uma postura de adesão e acompanhamento”. Mais se lê que “ A... mantém-se a residir sozinha, em casa de renda, de tipologia T2, que oferece as necessárias condições de habitabilidade e conforto. Duas vezes por mês, ao fim de semana, e nas férias escolares, recebe a visita das filhas B... e C... ”, concluindo que “em caso de condenação, consideramos existirem condiçoes para eventual execução da medida na comunidade, com intervenção destes serviços de Reinserção Social”.

  5. Sucede que o Tribunal recorrido deu relevência a mais aos antecedentes criminais da arguida para efeitos da necessidade de prevenção e de ressocialização da arguida, quando verificamos, que todas as condenações versam sobre a protecção de bens jurídicos diversos dos presentes, não tendo qualquer conexão com os crimes praticados nos autos (onze pela prática do crime de condução de veículo sem habilitação legal, duas por desobediência e uma por burla informática, furto simples e falsificação de documentos). Assim, os antecedentes criminais da arguida, não devem pesar de forma tão negativa na determinação da medida concreta da pena conforme o Tribunal «a quo» considerou, ao ponto de condenar a arguida em pena de prisão efectiva.

  6. O Tribunal recorrido deveria ter substituído a pena de prisão aplicada por outra não privativa da liberdade.

  7. Sem conceder, caso não seja esse o entendimento, ou seja, caso se afigure adequada a aplicação de uma pena privativa da liberdade, deve a mesma ser suspensa na sua execução (cfr. artigo 50.º do Cód. Penal).

  8. O Acórdão ora recorrido terá, assim, violado os artigos 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 46.º, 47.º, 48.º, 50.º, 53.º, 70.º, 71.º, 77.º, 143.º, 153.º, 155.º 333.º e 334.º do Cód. Penal.

Termos em que, é adequada e suficiente a aplicação de uma pena de multa relativamente ao crime de ofensa à intergidade fisica e ao crime de ameaças, tendo em atenção o ilícito praticado e a condição económica da arguida.

Sem conceder, deve a pena de prisão ser substituida por pena não privativa da liberdade.

Sempre sem conceder, caso V. Ex.ªs entendam ser aplicada pena de prisão, deve a mesma ser suspensa na sua execução.

O Ministério Público no Juízo Central Criminal de Leiria, respondeu ao recurso interposto pela arguida, pugnando pela manifesta improcedência do recurso e manutenção integral do douto acórdão recorrido.

O Ex.mo Procurador-geral adjunto neste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de que o recurso deverá improceder, confirmando-se a douta decisão recorrida.

Notificado este parecer, nos termos e para efeitos do n.º 2 do art.417.º do Código de Processo Penal, não houve resposta.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Fundamentação A matéria de facto apurada e respetiva motivação constantes do acórdão recorrido é a seguinte: Factos provados: I) 1- No dia 20 de Maio de 2014 teve lugar, entre as 14h25 e as 14h55, nas instalações do Tribunal Judicial da Marinha Grande, conferência no âmbito do Processo de Promoção e Protecção n.º 1426/13.5TBMGR, que correu termos no 3º Juízo do Tribunal Judicial da Marinha Grande.

2- A referida conferência destinava-se a obter acordo de promoção e protecção relativamente às duas filhas menores ( B... e C... ) da arguida A... .

3- Assim que, no início da referida conferência, a Mm.ª Juiz explicou o objectivo da dita diligência, a arguida interrompeu a mesma proferindo, em voz alta, as seguintes expressões: “eu não concordo com esta merda”, “eu não aguento mais esta merda” e “vou partir esta merda toda”.

4- De imediato, a arguida ausentou-se da sala de audiências onde decorria a diligência, tendo permanecido, até ao final da diligência em causa, no átrio do tribunal.

5- Como consequência directa e necessária da conduta da arguida, a diligência em curso apenas foi retomada e realizada após a saída da arguida da sala de audiências, para além de não ter sido obtido o acordo que se pretendia; tendo o processo prosseguido para alegações.

II) 6- No final da referida conferência, D... , que também tinha participado na mesma, por ter à sua guarda a filha uma das filhas da arguida, saiu da sala de audiências sem que a arguida já se tivesse ausentado das instalações do Tribunal Judicial da Marinha Grande.

7- Nesse momento, a arguida dirigiu-se a D... e, sem que nada o fizesse prever, agarrou-a, com força, pelos braços e empurrou-a, arrastando-a até D... embater contra a porta de vidro que se situa junto à sala de audiências e separa o átrio do tribunal do corredor de acesso aos Serviços do Ministério Público.

8- Aí, a arguida agarrou D... pelos colarinhos e, enquanto a empurrava contra a porta de vidro e em tom de voz sério, disse-lhe: “eu mato-te”, “dou cabo de ti” e “faço-te a folha”, querendo, com isto, dizer que atentaria contra a vida daquela.

9- Como consequência directa e necessária da conduta da arguida, a referida D... sofreu dores e mal-estar, para além de uma equimose de bordos amarelados no terço médio da face posterior do antebraço com 4cm x 1cm.

10- Tal lesão determinou a D... e foi causa adequada de 6 dias para cura sem afectação da capacidade para o trabalho geral e para o trabalho profissional; deixando-a com marcas no antebraço e dores no corpo III) 11- A arguida A... agiu com o propósito de perturbar o normal funcionamento do Tribunal e obstar à realização do objectivo que presidiu à marcação da conferência em apreço.

12- A arguida A... agiu com o...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT