Acórdão nº 859/13.1TBSCD-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelEMIDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução12 de Setembro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra A...

, residente na rua (...) , Santa Comba Dão, instaurou execução contra B...

, residente na rua (...) , Santa Comba Dão, para pagamento da quantia de 10 584,27 euros.

A execução tem por base 12 cheques.

Além de apresentar os cheques como títulos, o exequente alegou que os pais do executado tinham uma dívida para com ele e que o executado para evitar que se executasse o património dos seus pais assumiu o pagamento da dívida e entregou-lhes 23 cheques pré-datados de 800 euros cada um, 13 dos quais foram pagos. Os restantes, que servem de base à execução, não foram apresentados a pagamento em virtude de a respectiva conta bancária sacada carecer de fundos para o respectivo pagamento.

O executado opôs-se à execução por meio de embargos, com a alegação, em síntese, de que nunca entregou quaisquer cheques aos exequentes (que desconhecia até ser citado que os cheques estavam na posse dos exequentes); que desconhecia quaisquer dívidas dos seus pais ao exequente; que nunca se comprometeu ou assumiu perante o exequente a pagar-lhe quaisquer valores da responsabilidade dos pais dele, executado. No final, pediu se julgassem procedentes os embargos e que, em consequência, se julgasse extinta a execução.

O exequente contestou, pedindo se julgasse improcedente a oposição, com a alegação, em síntese, de que a obrigação subjacente aos cheques era dos pais do executado, conforme documento junto com o requerimento executivo e que a dívida foi assumida pelo executado para evitar que o património dos pais fosse executado.

Em 4 de Agosto de 2014 faleceu o executado. Foi habilitada como sua sucessora, para com ela prosseguir a acção, C... .

Após a realização da audiência final foi proferida sentença que, julgando improcedentes os embargos, determinou a continuação da acção executiva.

O embargante não se conformou com a sentença e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo se revogasse e substituísse a sentença por decisão que o absolvesse.

Os fundamentos do recurso consistiram, em síntese: 1. Na impugnação da decisão de julgar provado que os cheques foram assinados pelos executados e entregues aos exequentes, pelo menos com o conhecimento do executado, para pagamento de uma dívida que os pais deste, D... e marido B... , tinham para com aqueles, assumindo o executado o pagamento desta dívida, para o que foram entregues aos exequentes 25 cheques pré-datados de 800,00 euros cada, dos quais treze foram pagos; 2. Na alegação de que a sentença violou o disposto no artigo 595.º, n.º 1, alínea b), do Código Civil, e no artigo 1.º, n.º 2, da Lei Uniforme sobre o Cheque.

A exequente respondeu. Alegou, em síntese, que a decisão relativa à matéria de facto não merecia qualquer crítica; que a assunção de dívida podia operar-se tacitamente e que o apelante assumiu a dívida dos seus pais.

* Como se vê pela exposição efectuada, o recurso suscita questões de facto e de direito.

Considerando o princípio de que as questões suscitadas pelas partes devem ser resolvidas pela ordem imposta pela sua precedência lógica – princípio enunciado no n.º 1 do artigo 608.º do CPC a propósito da ordem do conhecimento, na sentença, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, mas que é aplicável à ordem do conhecimento das restantes questões -, dando aplicação a este princípio, impõe-se conhecer, em primeiro lugar, da impugnação da decisão relativa à matéria de facto.

É o que se fará de seguida.

Está em causa a decisão de julgar provado que “os cheques – os cheques são os que serviram de base à execução, cujas cópias constam de fls. 137 a 139 - foram assinados pelo executado e entregues aos exequentes, pelo menos com o conhecimento do executado, para pagamento de uma dívida que os pais deste, D... e marido B... , tinham para com aqueles, assumindo o executado o pagamento desta dívida, para o que foram entregues aos exequentes 25 cheques pré-datados de 800,00 euros cada, dos quais treze foram pagos”.

O tribunal a quo julgou provada esta matéria com base, em resumo, nos cheques juntos ao processo de execução, no facto do executado não ter impugnado a assinatura dos cheques, e com base nos depoimentos prestados pelas testemunhas indicadas pelos exequentes, E... e F... .

O recorrente pede se julgue não provado que ele, recorrente, assumiu a dívida dos pais, e que conhecia o fim a que se destinavam os cheques.

Segundo ele, o que se pode retirar de toda a prova produzida – que transcreveu e apreciou - é que só em Agosto de 2013 é que teve conhecimento de que o seu pai entregou os cheques ao exequente e que os mesmos foram emitidos e entregues pelo executado aos pais dele, executado, para pagar as obras na casa dele (executado) e das irmãs em Vila Nova de Mil Fontes.

Reapreciada a prova produzida, testemunhal e documental, e tendo em conta as posições as partes expressas no requerimento executivo e nos articulados, é de reconhecer em parte razão ao recorrente. Vejamos.

O recorrente não põe em causa no presente recurso – como já não punha nos embargos opostos à execução - que foi ele quem assinou os cheques que servem de base à execução. Como não põe em causa que os cheques foram entregues pelo seu pai ao primitivo exequente.

Sustenta, no entanto, que assinou-os e entregou-os ao pai, não para que este os entregasse posteriormente ao exequente para lhe pagar a alegada dívida dos pais, mas para pagar o preço de obras realizadas em casa dele e das irmãs em Vila Nova de Mil Fontes. Invocou, para tanto, o depoimento da sua própria irmã, a testemunha G... , e o de H... .

Reapreciados estes dois depoimentos, importa dizer o seguinte.

É exacto que a testemunha G... , instada a dizer se tinha conhecimento se o irmão (executado, ora recorrente) alguma vez tinha entregado cheques dele ao pai, respondeu que eles estavam a fazer obras numa casa no Alentejo e ele, executado, deixou uns cheques para pagar umas obras.

Mesmo que se desse crédito ao que disse a testemunha – e há razões para opor reservas ao que disse, se tivermos em conta que, sendo irmã do executado, quererá que o conflito seja visto numa perspectiva que lhe seja favorável-, o que daí resultava era uma realidade imprecisa. Com efeito, do que ela disse não se fica a saber se os cheques a que aludiu são os que servem de base à execução, pois não fez a indicação de qualquer facto ou circunstâncias que permitisse relacionar tais cheques com os que servem de base à execução. Realidade que, por ser imprecisa, não se pode dizer que seja contraditória com o que a exequente alegou.

A verdade é que o depoimento de H... lançou fundadas dúvidas sobre a veracidade da alegação do recorrente, segundo a qual a finalidade dos cheques que assinou e entregou ao pai era a de pagar as obras numa casa dele e das irmãs em Vila Nova de Mil Fontes. É que a referida testemunha – que afirmou ter feito uma obra de caixilharia em Vila Nova de Mil Fontes - afirmou que a obra pertencia a uma sociedade do pai do executado e que, além disso, o pai do executado, sob a alegação de que a obra tinha defeitos, não lhe pagou voluntariamente o preço; que só o fez depois de accionado judicialmente.

Não há, assim, indícios credíveis de que os cheques que servem de base à execução foram entregues pelo executado, ao seu pai, para pagar obras em casa dele (executado) em Vila Nova de Mil Fontes.

Os indícios que existem apontam no sentido de que os cheques foram entregues ao exequente pelo pai do executado para reembolsar parte de um empréstimo de dinheiro que aquele havia concedido a este.

Em primeiro lugar, estes indícios colhem-se no documento junto com o requerimento executivo -...

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