Acórdão nº 2675/13.1TBLRA-E.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução22 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO Decretada a insolvência de T (…), Lda., por sentença de 11 de junho de 2013, O credor reclamante J (…) veio requerer a qualificação da insolvência como culposa, propondo que sejam afetados por tal qualificação as seguintes pessoas (individuais e coletivas):

  1. JM (…); b) JA (…); c) FM (…); d) Várias sociedades comerciais que identifica nos arts. 51º a 62º do seu requerimento; alegando diversa factualidade que, em seu entender, integraria a qualificação da insolvência como culposa por preenchimento das alíneas a), b), d), e), g) e i), do nº2 do artigo 186º CIRE, O Sr. Administrador de insolvência emitiu parecer nos termos do disposto no artigo 188º nº1 do CIRE, fazendo apelo à repercussão da crise financeira internacional e o abrandamento da economia mundial para justificar a situação de insolvência da sociedade insolvente; reconhecendo que a alegada violação do dever de apresentação à insolvência, dada a antiguidade do crédito da Segurança Social, é suscetível de presumir a existência de culpa grave, considera inexistir prova do nexo de causalidade entre a conduta dos administradores e a ocorrência ou agravamento da situação de insolvência.

    Conclui pela qualificação da insolvência como fortuita.

    O Magistrado do Ministério Público pronunciou-se no sentido da qualificação da insolvência como culposa, por força do disposto no artigo 186º, ns. 1 e 2, alíneas d) e f), e alínea a) do nº3, do CIRE, com culpa grave por parte dos respetivos administradores JM (…) e JA (…).

    Citada a devedora e os demais requeridos, estes vieram deduzir oposição alegando que o circunstancialismo que deu origem à situação de insolvência, por si só, não parece suficiente para afastar a existência de culpa grave dos seus administradores, que o oponente JA(…) nunca exerceu de facto as funções de gerente, e ainda que a opoente FM (…) nunca exerceu a função de gerente nem de direito, nem de facto.

    Concluem no sentido de que a insolvência deve ser declarada fortuita.

    *Realizada audiência de julgamento, foi proferida sentença a: “Julgar o presente incidente de qualificação da insolvência parcialmente procedente, por provado em igual medida, em consequência do que: a) - Qualifica-se como culposa a insolvência de T (...) , Lda; b) - Consideram-se afetados pela qualificação da insolvência como culposa os gerentes da sociedade devedora JM (…) e JA (…); c) - Declaro JM (…) e JA (…) inibidos para administrar patrimónios de terceiros e para o exercício do comércio durante um período de 2 (dois) anos, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão da sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa, nos termos do disposto no n.º 2, al. c) do CIRE; d) - Determinar a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente que sejam detidos pelos referidos gerentes, pessoas afetadas pela qualificação; e) - Condenar solidariamente os Requeridos JM (…) e JA (…) a indemnizar os credores da sociedade devedora pela diferença que apresentem os créditos reconhecidos e não satisfeitos entre a data em que se deveria ter apresentado à insolvência e a data da declaração da insolvência, até porque apenas nesta medida a sua atuação agravou a situação destes credores, a quantificar em liquidação de sentença, nos termos da parte final do n.º 4 do art.º 189.º do CIRE.

    *Absolve-se a requerida FM (…) do pedido formulado.”*Não se conformando com a mesma, os requeridos JM (…) e JA (…), dela interpuseram recurso de apelação, concluindo a respetiva motivação, com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem parcialmente[1]: (…)*O Ministério Público, apresenta contra-alegações no sentido da manutenção do decidido.

    Cumpridos que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº2, in fine, do artigo 657º CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.

    II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639º, do Novo Código de Processo –, as questões a decidir são unicamente as seguintes: 1. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto.

    1. Qualificação da insolvência como culposa por força do preenchimento da al. a) do nº3 do art. 186º CIRE 3. Se a qualificação da insolvência como culposa deve abranger o requerido/Apelante JA (…).

    2. Condenação dos afetados pela qualificação da insolvência no passivo não satisfeito pelas forças da massa insolvente.

    III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Impugnação da matéria de facto Os tribunais da Relação, sendo tribunais de segunda instância, têm atualmente competência para conhecer tanto de questões de direito, como de questões de facto.

    Segundo o nº1 do artigo 662º do NCPC, a decisão proferida sobre a matéria de pode ser alterada pela Relação, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.

    Para que o tribunal se encontre habilitado para proceder à reapreciação da prova, o artigo 640º, do CPC, impõe as seguintes condições de exercício da impugnação da matéria de facto: “1 – Quando seja impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

  2. Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.

    2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:

  3. Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevante; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.” A impugnação da matéria de facto que tenha por fundamento a errada valoração de depoimentos gravados, deverá, assim, sob pena de rejeição, preencher os seguintes requisitos: a) indicação dos concretos pontos de facto considerados incorretamente julgados, que deverão ser enunciados na motivação do recurso e sintetizados nas conclusões; b) indicação dos concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impõem decisão diversa, sobre os pontos da matéria de facto impugnados; c) indicação, ou transcrição, exata das passagens da gravação erradamente valoradas. Estes requisitos visam assegurar a plena compreensão da impugnação deduzida à decisão sobre a matéria de facto, mediante a identificação concreta e precisa de quais os pontos incorretamente julgados e de quais os motivos de discordância, de modo a que se torne claro com base em que argumentação e em que elementos de prova, no entender do impugnante, se imporia decisão diversa da que foi proferida pelo tribunal.

    Tais exigências surgem como uma decorrência do princípio da autorresponsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo[2], assegurando a seriedade do próprio recurso intentado pelo impugnante.

    *(…)*A. Matéria de Facto: O tribunal recorrido deu como provados, entre outros, os seguintes factos (que aqui se reproduzem apenas parcialmente, na parte em que possam ter relevo para as questões objeto do presente recurso), com as alterações aqui introduzidas: (…) 14º Em 11/06/2013, a “T (…), Lda.” -, foi declarada insolvente, tendo o A. reclamado créditos no respetivo processo de insolvência; (…) 33º A sociedade T (…), Lda. labora no local referido.

    34º Atualmente é a T (…), Lda. que efetua descontos para a Segurança Social relativamente a trabalhadores que aí prestam trabalho e que antes prestavam trabalho integrados no quadro de pessoal da insolvente T (…), Lda..

    35º A referida empresa exerce atividade de fabricação, acabamentos, pintura, embalagem e expedição de artigos e objetos de iluminação e candeeiros.

    1. O local da sede da insolvente corresponde, atualmente, além de outras, à sede das sociedades referidas: - A. (…), LDA., NIPC (...) , a qual apresenta:

  4. Objecto social: Fabrico de vidro de artigos de iluminação; b) Sócios e gerentes: JM (…) e JA (…) - T (…) (...) , Lda, NIPC (...) , a qual apresenta: a) Objecto social: Indústria e Comércio de Vidros para Iluminação; b) Sócios: JM (…), JA (…) ; e F (…) S.A; c) Gerentes: JM (…) e J A (…) - T (…)Produtos de Iluminação, Lda (a insolvente), NIPC (...), a qual apresenta: a) Objeto social: Fabrico e montagem de candeeiros e objectos de iluminação; b) Sócios: T (…)Serviços e Gestão, S.A e F (…) S.A.; d) Gerentes: JM (…) e J A (…) - T (…) – Indústria de Vidro, Lda, NIPC (...), a qual apresenta: a) Objecto social: Produção e acabamento de vidros para iluminação; b) Sócios: T (…) Serviços de Gestão, S.A. e F (…)– Empresa Financeira de Gestão e Desenvolvimento, S.A; e) Gerentes: JM (…) e J A (…) 37º A sociedade T (…) – Indústria de Vidro, Lda foi declarada insolvente em 20/10/2009.

    - T (…) – PRODUÇÃO DE VIDRO DE CRISTALARIA, LDA, NIPC (...) , a qual apresenta:

  5. Objecto social: Produção de vidro de cristalaria, desenvolvimento e aplicação de tecnologias avançadas para a sua produção e transformação; b) Sócios: T (…) Serviços de Gestão, S.A. e F (…) –...

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