Acórdão nº 338/14.0GBFND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelIN
Data da Resolução13 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da 4.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório No processo supra identificado foi julgado o arguido A...

, solteiro, desempregado, nascido a 06-12-1967, natural da freguesia de (...) , concelho da Covilhã, filho de (...) e de (...) , residente na rua (...) , Covilhã, pela prática de dois crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148.º, n.º 1, do C. Penal.

*A fls. 96 a 113 vieram as ofendidas B...

e C...

deduzir pedido de indemnização cível contra D... SEGUROS, SA, peticionando a sua condenação no pagamento das seguintes quantias: À ofendida B...

a quantia global de 30.280,20 euros, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

À ofendida C...

a quantia global de 46.111,38 euros, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

A quantia que se vier a liquidar em execução de sentença, dependendo do resultado da perícia médico-legal.

*O tribunal decidiu condenar:

  1. O arguido A...

    pela prática, em autoria material, na forma consumada, e em concurso real, de dois crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo art. 148.º, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art. 15.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa, cada um, à taxa diária de 5,00 (cinco) euros.

    Na pena única de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de 5,00 (cinco) euros, o que perfaz a multa global de 750,00 (setecentos e cinquenta) euros.

  2. A demandada D... SEGUROS, SA a pagar: - À ofendida C...

    a quantia global de 28.643,60 (vinte e oito mil seiscentos e quarenta e três euros e sessenta cêntimos), sendo 20.000,00 (vinte mil) euros, a titulo de danos morais, 8.000,00 (oito mil) euros, a titulo de dano biológico, ambas acrescidas dos respectivos juros de mora, contados desde a data da presente decisão, e a quantia de 634,60 (seiscentos e trinta e quatro euros e sessenta cêntimos) euros, a titulo de danos patrimoniais, acrescida dos respectivos juros de mora, vencidos e vincendos, contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento – cfr. arts. cfr. arts. 566, 805, n. 3, 806 e 559, todos do C. Civil; - À ofendida B...

    a quantia global de 20.000,00 (vinte mil) euros, sendo 15.000,00 (quinze mil) euros, a titulo de danos morais, e 5.000,00 (cinco mil) euros, a titulo de dano biológico, ambas acrescidas dos respectivos juros de mora, contados desde a data da presente decisão.

    Às ofendidas C... e B... a quantia que vier a liquidar-se em execução de sentença - cfr. arts. 564.º, n.º 2, do C. Civil e 661.º, n.º 2, do CPC -, eventualmente a instaurar, pelos danos patrimoniais, designadamente medicação, exames, terapias, eventuais cirurgias e tratamentos decorrentes das sequelas descritas nos relatórios periciais de fls. 258 a 261 e 266 a 269, e dores, angústias e ansiedades dai decorrentes.

    *Inconformada recorreu a demandada D... SEGUROS, SA, formulando as seguintes conclusões: «1. As indemnizações fixadas pela M.ma Juiz do douto Tribunal a quo têm como intuito ressarcir as Demandantes pelo Dano Moral que cada uma sofreu em consequência do presente sinistro, mas também o chamado Dano Moral Reflexo ou Indirecto.

    1. Ao admitir-se que todos os danos reflexos por familiares do lesado são indemnizáveis, estaríamos a esvaziar o conteúdo da norma constante no artigo 496.°, n.º 4, segunda parte do Código Civil.

    2. No Boletim do Ministério da Justiça, n.º 101, pág. 138 e segs., o Prof. Vaz Serra que interveio activamente nos trabalhos preparatórios do Cód. Civil de 1966, formulou uma norma que previa clara e directamente a ressarcibilidade daquele tipo de danos, no § 5 da proposta de redacção oferecida para o art. 759.º da parte do Direito das Obrigações daquele código, preceito este que não passou para o texto final por ter essa pretensão sido rejeitada.

    3. A norma contida no artigo 496.º, n.º 4, segunda parte do Código Civil é uma norma excepcional, que não comporta aplicação analógica.

    4. O julgador é um intérprete e um aplicador da lei, não podendo alterar a mesma por via jurisprudencial.

    5. No entendimento da Recorrente, a doutrina que defende que os danos reflexos são indemnizáveis está claramente a alterar a lei.

    6. Uma vez que a M.ma Juiz do douto Tribunal a quo para fixar o quantum indemnizatório pelos danos morais das Demandantes considerou também a existência de danos morais reflexos, a indemnização a fixar pelos referidos danos morais tem obrigatoriamente que ser reduzida.

    7. O valor de uma indemnização por danos não patrimoniais afere-se através do recurso ao critério da equidade.

    8. Através, de uma breve pesquisa da nossa jurisprudência, verificamos que os montantes de € 15.000,00 e de € 20.000,00 atribuídos a título de danos não patrimoniais, respectivamente, às Demandantes B... e C... não são adequados, por serem excessivos, aos princípios de equidade e razoabilidade que devem pautar a aplicação da justiça, não se encontrando em sintonia com outras indemnizações que os tribunais têm aplicado, devendo ser, neste ponto, alterada a decisão, fixando-se as indemnizações a este título num valor mais ajustado com a análise do caso concreto.

    9. Conforme refere a M.ma Juiz na sentença, apenas relativamente à Demandante C... é que foi admitida a existência de um dano futuro.

    10. Conforme bem refere a M.ma Juiz do douto Tribunal a quo "O dano futuro é previsível quando se pode prognosticar, conjecturar com antecipação ao tempo em que acontecerá, a sua ocorrência. No caso contrário, isto é, quando o homem medianamente prudente e avisado o não prognostica, o dano é imprevisível".

    11. Ora, uma vez que não ficou demonstrado que a Demandante B... venha a sofrer um agravamento das suas lesões, não é possível considerar a existência de um dano futuro relativamente a esta, pelo que tal dano não é indemnizável, nos termos do disposto no artigo 564.º, n.º 2 do Código Civil.

    12. E, assim sendo, não pode a Recorrente ser condenada a liquidar à Demandante B... a quantia que se vier a liquidar em execução de sentença pelos danos futuros patrimoniais e não patrimoniais que esta venha a sofrer».

      *Notificado o Ministério Público, arguido e demandantes nos termos do art. 413.º, n.º 1, do CPP, não houve respostas.

      Nesta instância, os autos tiveram vista do Ex.mo Senhor Procurador-geral Adjunto, para os feitos do art. 416.º, n.º 1, do CPP, o qual, incidindo o recurso apenas sobre os pedidos cíveis, limitou-se a apor o visto.

      Foi cumprido o art. 418.º, do CPP, e uma vez colhidos os vistos legais, indo os autos à conferência, cumpre decidir.

      Vejamos, com relevância para a decisão do recurso, a factualidade apurada pelo tribunal: Factos provados: «1. No dia 3 de março de 2014, cerca das 19H30, o arguido conduzia o automóvel ligeiro de passageiros, com a matrícula 34-47-RO, na EN 18, ao Km 54,900, nesta cidade do Fundão, no sentido Fundão/Covilhã.

    13. Naquela mesma circunstância de tempo e lugar, atravessam a passadeira para peões existente naquela estrada, a ofendida C... e a ofendida B... .

    14. E faziam-no, atento o sentido de marcha do automóvel conduzido pelo arguido, do lado esquerdo para o lado direito.

    15. As ofendidas iniciaram a travessia da passadeira e percorreram toda a hemifaixa de rodagem do lado esquerdo, atento o sentido do arguido, e ainda parte da hemifaixa por onde o arguido circulava, num total de 5,10m.

    16. Antes da passadeira, atento o sentido de marcha do automóvel conduzido pelo arguido, encontra-se um sinal avisador da passagem de peões.

    17. Como o arguido seguia distraído e não adequou a marcha do automóvel ao local, aproximação da passadeira, fez embater a viatura que conduzia nas ofendidas, quando estas atravessavam a passadeira para peões.

    18. Só imobilizando o automóvel 5,20m para além do limite da passadeira.

    19. Mercê do embate sofrido as ofendidas tiveram que receber tratamento médico no CHCB, Hospital da Covilhã.

    20. Onde a ofendida B... ficou internada até ao dia 13 de março de 2014.

    21. A ofendida C... , para além das dores sofridas, sofreu fratura do 1/3 distal do cúbito esquerda mais sequela de fratura de hallux pé esquerdo associada a entorse da tibiotársica, edema nasal.

    22. Quando foi submetida a exame médico pericial apresentava “Fenómenos dolorosos no punho esquerdo e cotovelo esquerdo” e “ Membro superior esquerdo: limitação ligeira das mobilidades do punho esquerdo”.

    23. Tais lesões foram consolidadas em 21-07-2014, e terão determinado 140 dias com afetação da capacidade de trabalho geral e profissional, resultando para a ofendida uma limitação ligeira da mobilidade do punho esquerdo.

    24. Quanto à ofendida B... , para além das dores sofridas, apresentava fratura dos ramos púbicos à direita e escoriação do cotovelo.

    25. Quando foi submetida a exame médico pericial apresentava “Fenómenos dolorosos: dor ao baixar-se e em sentada em cadeiras baixas.” 15. As lesões descritas pelo CHCB, segundo o relatório pericial, tiveram a sua consolidação em 31-07-2014, e terão determinado 45 dias de afetação da capacidade de trabalho geral e profissional.

    26. O arguido agiu com a total falta de cuidado a que era capaz e estava obrigado, pois que conduzia um veículo automóvel na estrada e, por isso, impunha-se-lhe que estivesse com atenção e que adequasse a velocidade a que seguia à estrada, em particular, porque pela frente deparava-se-lhe uma passadeira para travessia de peões, que estava devidamente sinalizada, e por isso, impunha-se que travasse e evitasse o embate.

    27. Foi, pois, pela culpa do arguido e pelo desrespeito pelas regras estradais, que o acidente se deu.

    28. O arguido sabia que o seu comportamento lhe era proibido e punido por lei penal como crime.

    29. O arguido confessou os factos que lhe vinham imputados.

    30. O arguido não tem antecedentes criminais.

    31. O arguido é solteiro e encontra-se desempregado. Aufere um rendimento de reinserção, no montante...

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