Acórdão nº 3146/12.9TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelLUIS CRAVO
Data da Resolução11 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO Na presente ação iniciada sobre a forma sumária, veio F (…), melhor identificado nos autos, demandar M (…) também ela melhor identificada neste processo.

Alega para tanto que: “- No dia 20 de Agosto de 2009 em Cantanhede a R. outorgou escritura de justificação notarial em que declarou que é dona, por o ter adquirido por usucapião do prédio (melhor identificado no artigo 1º da petição inicial).

Mais então declarou a R. que o prédio lhe ficara a pertencer por lhe ter sido adjudicado em partilha verbal, dos bens do casal dela e do seu ex-marido F (…), com quem fora casada no regime de adquiridos, e por volta do ano de 1988.

Porém é falso que a R. tenha adquirido por lhe ter sido adjudicado em partilha verbal dos bens do casal dela e do ex-marido, o prédio urbano justificado.

O prédio urbano justificado faz parte do acevo patrimonial do casal que foi do A. e da R. dissolvido por sentença do Tribunal de Primeira Instância de Melun França, transitada, revista e confirmada pelo douto acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra elaborada e transitada em 05.Fev.2009.

Acervo patrimonial ainda por partilhar por desacerto entre os interessados na divisão e partilha.

Jamais em tempo algum, os ex-cônjuges – hoje A. e R. acertaram entre si a forma ou o modo de separarem as meações respectivas no acervo patrimonial do casal que foi seu.

Até 1994, para os então ainda cônjuges entre si, era nula qualquer estipulação de separação verbal das meações nos bens do casal.

Correm seus termos para a competente separação das meações os autos de inventário/partilha de bens em casos especiais, procº. 1815/10.7TBCTB.

O prédio justificado adviera ao casal de A e R. por aquisição por compra e venda a terceiro ora inidentificável, em data, que não consegue precisar melhor, compreendida entre os anos de 1980 a 1982.

Termina peticionando: a) anulação da escritura de justificação notarial celebrada pela R; b )mandado anular o registo tabular impugnado, máxime a inscrº. Ap 2035 de 2009/10/29 na ficha nº 5042/20091029 Juntou documentos.

* Devidamente citada, a Ré contestou.

Referiu em síntese: “Por decisão de 21 de Maio de 1987 foi decretada a separação de pessoas e bens entre o casal requerida pela R. sendo certo que os bens do casal sitos em Portugal não foram contemplados no processo em causa.

Só em 1994, foi de facto requerido convolada a separação de pessoas e bens em divórcio, porém a separação de pessoas e bens decretada entre o casal em 1988, relativamente aos bens, produziu efeitos que produziria a dissolução do casamento, não sendo aqui aplicáveis as disposições da al. a) do artigo 318º do C.Civil Relativamente ao imóvel situado em Portugal, pouco tempo após a referida separação de pessoas e bens, em 1988, em dia e mês que a R. não sabe precisar, A e R. acordaram verbalmente na adjudicação à R. do único bem móvel de que eram proprietários em Portugal - o prédio dos autos.

Nessa altura o A. não exigiu à R. quaisquer tornas, tendo este ficado com a oficina de reparação de automóveis que era do casal.

Em 1992 o A, exigiu à R. a quantia de 80.000,00 francos a título de torna, dizendo-lhe que precisava daquela quantia para resolver problemas financeiros.

Não tendo sido reduzido a escrito o acordo celebrado entre as partes, a R. receou ver aqui A. dar o dito por não dito, pelo que cedeu às exigências do mesmo impondo-lhe porém que fizesse, perante notário um escrito que a protegesse e que lhe garantisse que nada mais viria a exigir, abatendo à quantia que estava a exigir, o valor da pensão alimentar devida pelo mesmo ao menor que ascendia à altura a 30.000,00 francos.

Em 01/07/1992 o aqui A. deslocou-se a um Cartório Notarial Francês, reduzindo a escrito o acordado, comprometendo-se a, mediante o pagamento da quantia de 50.000,00 francos, assinar um acto do qual cederia todos os seus direitos sobre o imóvel à aqui R.

E porque a R. já havia emprestado ao aqui A. a quantia de 4090,00 francos para pagar uma caução para tirar o irmão do A da prisão, a 07/03/1990, tentou colocar estes valores nas contas, porém o A. só aceitou abater cerca de metade da quantia emprestada, ou seja a quantia de 2.000,00 francos.

Acordando verbalmente que as tornas seria reduzidas a 48.000,00, valor aquele pago pela R ao A, através da emissão de vários cheques pré-datados.

Não sabendo do paradeiro do A, volvidos mais de 20 anos sobre o acordo que celebrou em 1988, a R. tentou resolver legalizar o imóvel através da escritura pública de justificação.

Desde 1988 a R. passou a comportar-se como única exclusiva proprietária do imóvel, exercendo com exclusividade a respectiva retenção, fruição, actuando em geral por forma e com os poderes correspondentes ao exercício do direito de propriedade sobre esses bens.´ Pelo que adquiriu tal imóvel por usucapião.

Juntou documentos Termina peticionando a condenação do A. como litigante de má-fé em multa e respectiva indemnização a favor da R. esta a liquidar em execução de sentença.

* O Autor respondeu, pugnando no sentido de a matéria de exceção ser julgada improcedente, por não provada, e a ação ser julgada procedente, por provada.

Foram juntas traduções de diversos documentos que constavam dos autos em língua francesa.

* Foi dispensada a audiência prévia, tendo-se prolatado o respetivo despacho saneador, e bem assim procedido à identificação do objeto do litígio, selecionando-se os temas da prova e admitindo-se os róis probatórios.

Não existiram reclamações e posteriormente foi designado dia para julgamento.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, a qual decorreu em obediência ao formalismo legal, como consta da respetiva ata.

* Na sentença, considerou-se, em suma, que face à factualidade apurada, designadamente configuradora do instituto jurídico da inversão de posse por parte da Ré, a qual a partir de 1988 passou a possuir em nome próprio o imóvel ajuizado (e não enquanto participante da sociedade conjugal), importava concluir no sentido da aquisição por parte da mesma do direito de propriedade sobre tal bem, por via do instituto da usucapião, assim improcedendo a ação, por não serem falsas (mas ao invés verdadeiras) as declarações prestadas perante o Notário e que deram origem à escritura de justificação notarial cuja impugnação foi intentada através da presente ação, termos em que se concluiu em conformidade, designadamente sendo absolvida a Ré de todo o peticionado pelo Autor.

* Inconformado com essa sentença, apresentou o Autor recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: (…) * Contra-alegou a Ré, relativamente ao que formulou as seguintes conclusões: (…) * Colhidos os vistos e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

* 2 – QUESTÕES A DECIDIR, tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelo Autor nas conclusões das suas alegações (arts. 635º, nº4, 636º, nº2 e 639º, ambos do n.C.P.Civil), por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608º, nº2, “in fine” do mesmo n.C.P.Civil), face ao que é possível detetar o seguinte: - impugnação da matéria de facto, por não ter sido valorada a factualidade articulada pela Ré no art. 21º da sua contestação, a qual devia figurar expressamente entre os factos “não provados”; - incorreto julgamento de direito, decorrente da indevida desconsideração da suspensão do prazo da prescrição aquisitiva constante do art. 318º, al. a) do C.Civil (aplicável “ex vi” do art. 1292º do mesmo C.Civil), face ao que não podia dar-se a usucapião, pois ainda não se tinha verificado o termo dos prazos legalmente previstos ( quinze anos e vinte anos) à data da realização da escritura de justificação notarial.

* 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado fixado/provado pelo tribunal a quo, ao que se seguirá o elenco dos factos que o mesmo tribunal considerou/decidiu que “não se provou”...

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