Acórdão nº 213/07.4TAPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 03 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No [já extinto] 1º Juízo do Tribunal Judicial da comarca de Pombal o Ministério Público requereu o julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, dos arguidos, Associação D... , A... , B... , e C... , todos com os demais sinais nos autos, imputando-lhes: - Aos quatro arguidos, em co-autoria material e concurso real, a prática de um crime continuado de auxílio à imigração ilegal, p. e p. pelos arts. 26º, 30º, nº 2 e 79º do C. Penal e 182º, nºs 1, 2 e 3 e 183º, nºs 1, 2 e 5, da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho, e a prática de um crime continuado de angariação de mão-de-obra ilegal, p. e p. pelos arts. 26º, 30º, nº 2 e 79º do C. Penal e 182º, nºs 1, 2 e 3 e 185º, nºs 1 e 2 da Lei nº 23/2007, de 4 de Julho; - Aos arguidos A... , B... e C... , em autoria material e concurso real com aqueles, a prática de um crime de associação criminosa, p. e p. pelos arts. 26º e 299º, nºs 1, 2 e 3 do C. Penal; - Ao arguido C... , em autoria material e concurso real com os anteriores, a prática de trinta e oito crimes de lenocínio, p. e p. pelos arts. 26º e 169º, nº 1 do C. Penal; - Aos arguidos A... e B... , em co-autoria material e concurso real com os anteriores, a prática de cinquenta e três crimes de lenocínio, p. e p. pelos arts. 26º e 169º, nº 1 do C. Penal; - A arguida associação, em co-autoria material e concurso real com os primeiros, a prática de quinze crimes de lenocínio, p. e p. pelos arts. 11º, nºs 1, 2, a), 4, 5, 6 e 7, 26º e 169º, nº 1 do C. Penal; - O arguido A... e a arguida associação, em co-autoria material e concurso real com os primeiros, um crime tentado de lenocínio de menores agravado, p. e p. pelos arts. 11º, nºs 1 e 2, a), 22º, 23º, nº 1, 73º e 175º, nºs 1 e 2, d), do C. penal; - As arguidas B... e associação, em co-autoria material e concurso real com os primeiros, um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 26º do C. Penal e 3º, nº 2, g), 86º, nº 1, d) e 95º, do regime Jurídico das armas e Munições; - A arguida associação incorreu ainda na pena de dissolução, prevista no art. 90º-F do C. Penal e na pena acessória de encerramento definitivo de estabelecimento, prevista no art. 90º-L, nºs 1 e 2 do C. Penal. Por acórdão de 21 de Dezembro de 2012, depositado no dia imediato, foi decidido: - Condenar o arguido A... , pela prática, em co-autoria, de três crimes de lenocínio, p. e p. pelo art. 169º, nº 1 do C. Penal, na pena de 2 anos de prisão por cada um e, em cúmulo, na pena única de 4 anos e 6 meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período, com regime de prova; - Condenar a arguida B... , pela prática, em co-autoria, de três crimes de lenocínio, p. e p. pelo art. 169º, nº 1 do C. Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão por cada um e, em cúmulo, na pena única de 2 anos e 9 meses de prisão, suspensa na respectiva execução pelo mesmo período; - Condenar a arguida associação, pela prática, em co-autoria, de três crimes de lenocínio, p. e p. pelos arts. 11º, nº 2, 90º-A, nº 1, 90º-F e 169º, nº 1, do C. Penal, na pena de dissolução; - Absolver os arguidos A... , B... e associação dos demais crimes que lhes eram imputados e absolver o arguido C... de todos os crimes que lhe eram imputados.

* Inconformado com a decisão, recorreu o arguido A... , formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: A. Com o presente recurso sobre os vícios do douto acórdão recorrido, reapreciação da prova bem como sobre matéria de Direito, no tocante à interpretação da norma penal incriminatória (não preenchimento integral dos requisitos objectivos para a punição), exerce-se o direito de "manifestação de posição contrária" ou "discordância de opinião", traduzido no direito de recorrer, vertido no nº 1 i) do art. 61º CPP e 32º, nº 1 da CRP; B. As alegadas escutas telefónicas, por não terem sido reproduzidas em audiência de discussão e julgamento nem mesmo levadas ao conhecimento do arguido vendo assim o mesmo também por esta via limitados de forma inexorável os seus direitos de defesa face às mesmas, não poderão ser valoradas nos termos do art. 355º CP e consequentemente terão de ser dados por não provados os factos 80 a 93, na sua integralidade, e parcialmente o facto 94 no tocante ao transporte; C. Têm-se por nulas tais alegadas escutas telefónicas, nos termos do art. 190º CPP, dado que foram interseccionadas em momento muitíssimo anterior ao da constituição como arguido do recorrente nos presentes autos, foram levadas a cabo no âmbito de inquérito distinto, realizadas no Inquérito 309/07.2GAANS, que veio a ser arquivado posteriormente, tendo sido ordenadas e realizadas no Inquérito 309/07.2GAANS, e estando em causa estabelecimento diverso, não incidindo sobre a Associação D... , alvo dos presentes autos e igualmente arguida, qualquer douto despacho de autorização das escutas; D. Ademais representam intromissão abusiva na vida privada, em violação dos princípios da legalidade, proporcionalidade, lealdade e boa-fé bem como de concordância prática, restringindo claramente o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar (artigo 26º, nº 1 da CRP), o direito ao sigilo e à inviolabilidade das comunicações (artigo 34º CRP) e o direito à palavra (falada), uma vez que, havendo toda uma panóplia imensa de acções de fiscalização, da mais diversa ordem (desde vigilâncias, buscas, apreensões, etc.) bem como inquirições de imensas testemunhas, não se percebe como se pôde ter, e doutamente decidir, por indispensável para descoberta da verdade ou por impossível ou muito difícil de obtenção da prova, sendo o requerimento de pedido das mesmas unicamente instruído pelo texto da lei, vagos conceitos de direito e sem qualquer concretização concreta de tal impossibilidade ou indispensabilidade, sendo assim, também por esta via, nulas; E. Tem-se por inconstitucional, por violação das garantias de defesa, a interpretação e dimensão normativa do art. 188º nº 7 CPP segundo a qual a transcrição de tais escutas, desacompanhada de qualquer audição das mesmas em sede de audiência de discussão e julgamento, possa valer como prova documental, nos termos dos arts. 164º ss CPP, a ser livremente valorada pelo Tribunal, sem necessidade de leitura em audiência ou exarar da sua análise em acta, na medida em que, ademais, sendo o papel em si mesmo mudo deixa por percepcionar aspectos deveras importantes da comunicação, como seja o tom de voz, prontidão, encadeamento e lógica da conversa, etc; F. Dando por integralmente reproduzidas, por razões de economia processual, as passagens supra identificadas em sede de motivação, maxime relativas aos depoimentos das testemunhas E... , F... , G... , H... e I... , tem-se assim por justificada a reapreciação da matéria de facto e da prova gravada, em conjugação com a demais, no sentido de se ter por logicamente inválida a generalização operada tendo por base um depoimento que se mostrará temporalmente delimitado até 16 de Fevereiro de 2007, da testemunha I... , inexistindo assim prova de que nos eventuais e posteriores actos de cariz sexual houvesse qualquer contrapartida para os arguidos bem como fomento, intenção lucrativa e efectivo lucro dos mesmos, a ponto de lhes possibilitar a sobrevivência e, pese embora a contradição imanente, aquisição de "bens de mais elevado de características não apuradas"; G. O recorrente nunca foi identificado, tido por presente na Associação em causa ou por qualquer outra forma sido encontrado em nenhuma das acções de vigilância ali de fiscalização ou demais actos levados a cabo, da mesma forma que não foi apontado por patrão ou pessoa que desse ordens/instruções por nenhuma das mulheres, sendo tal sido relatado serenamente pelas testemunhas ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento fossem elas mulheres inspectores, órgãos de polícia criminal, clientes ou ouvidas em qualquer outra qualidade.

H. Sem prejuízo da absolvição que infra se peticionará, apenas poderá ser dado por provado a existência de duas vítimas, e logo, sem prejuízo da defesa de crime continuado, dois crimes na medida em que erra o Tribunal a quo ao fazer, a fls. 34, alusão às declarações da testemunha H... pois em momento algum a mesma afirmou com segurança que havia tido relações com três mulheres diferentes, referindo sempre duas conforme ressalta cristalinamente da passagem 07:24 a 07:35 do seu depoimento, estando assim o Tribunal num colete-de-forças (como comprova o ponto 78 em que dá por provados 3 casos mas apenas identifica duas mulheres!), do qual não se poderá libertar sem, violação do princípio in dubio pro reo, pois nada autoriza que uma dessas duas mulheres não fosse a própria I... , tendo de inexistir assim soma dela própria às duas referidas pelo cliente; I. Ao não discriminar as receitas e despesas fica o Tribunal a quo impedido de catalogar corno lucros certas eventuais receitas não provadas, sendo que, ademais, tal qual decorre da factualidade dada por provada seria praticada a actividade de alterne, no âmbito da qual haveria repartição em partes iguais ao passo que, a fazer fé no que se mostra dado por provado, sempre nos actos de cariz sexual, a percentagem seria menor inexistindo assim qualquer necessidade expressa por parte dos arguidos de exploração da mesma dadas as receitas advenientes dos "copos"; J. Perante a nebulosa de declarações é manifesto, claro e inequívoco que fica a dúvida sobre a efectiva prática dos factos (maxime a existência de contrapartida para os arguidos após Fevereiro de 2007 bem como efectivo e prévio fomento da prostituição!), redundando a condenação em prejuízo das garantias de defesa e do princípio in dubio pro reo, devendo o arguido ser absolvido em razão da ausência e insuficiência de prova, pois em caso de empate ou dúvida a CRP decide a contenda não a favor do recorrente em particular mas de todo e qualquer arguido colocado na mesmíssima situação, não se podendo ter tal salto lógico e...

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