Acórdão nº 1786/14.0TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 31 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA DOMINGAS SIM
Data da Resolução31 de Maio de 2016
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório A... e mulher F..., reformados, residentes na Rua ..., instauraram acção declarativa, a seguir a forma do processo comum, contra Freguesia de ..., com sede no ..., pedindo a final: “a) fosse declarada a nulidade do negócio/contrato de compra e venda celebrado entre AA e Ré e objecto dos autos, por inobservância da forma legal; b) no caso de se entender que as partes celebraram uma doação da parcela do imóvel, fosse declarada a nulidade desse negócio, por inobservância da forma legal; c) em qualquer caso, fosse a ré condenada a restituir aos AA tudo o que tivesse sido prestado ou, não sendo possível a restituição em espécie, o valor correspondente, que, no caso, equivale ao pagamento do valor de €5.080,50 (cinco mil e oitenta euros e cinquenta cêntimos); a) fosse declarado que a ré não cumpriu de forma culposa o contrato celebrado com os AA; b) devendo ser condenada no cumprimento da prestação a que se vinculou, ou seja, à execução do muro de vedação da propriedade dos AA identificada em 1.º, na parte que confronta com a Rua do Barreiro, nos termos e condições melhor definidas nos art.ºs 5.º e 9.º da petição inicial e de acordo com as melhores artes e técnicas de construção civil; c) fosse a ré condenada no pagamento da sanção pecuniária compulsória de €50,00 pro cada dia de atraso no cumprimento da sua prestação, devendo suportar as custas e encargos legais.

    Em fundamento alegaram, em síntese útil, que são os donos do prédio que identificam no art.º 1.º, pinhal sito ao Barreiro, freguesia de ..., com a área inscrita de 1473 m2 e real de 1617 m2, a confrontar ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... e descrito na CRP de ... Tal prédio sempre esteve vedado com muro de pedra com a altura de cerca de 80 cm, nas suas confrontações poente e sul.

    Mais alegaram que, pretendendo alargar a Rua do Barreiro, a Ré chegou a acordo com os demandantes, nos termos do qual estes procederam à cedência de uma faixa de terreno no limite poente do seu prédio, com o comprimento de cerca de 30 metros por cerca de 2,25 mt de largura, num total de 67,74 m2, obrigando-se a demandada, em contrapartida, a executar/reconstruir, em toda a referida extensão e em substituição do muro de pedra antiga, um outro muro de blocos, com o mínimo de 80 cm de altura, com pilares e lentel com ferro e acabado com chapisco e reboco, tudo executado e concluído de acordo com as melhores artes e técnicas de construção civil, negócio este que veio a ser reduzido a escrito em papel timbrado da Freguesia de ...

    Na sequência de celebração do dito acordo, a Ré procedeu, durante o ano de 2008, ao alargamento da sobredita Rua do Barreiro, tendo integrado no leito de tal arruamento a faixa de terreno do prédio dos Autores acima referida, demolindo para o efeito o muro de vedação de pedra que nele existia. Não obstante, nunca a Ré edificou, até aos dias de hoje, o muro ao longo da confinância do prédio com o referido arruamento, conforme se havia obrigado, a despeito das interpelações que para tanto lhe foram feitas.

    Acresce que o acordo celebrado é nulo por inobservância da forma legalmente prescrita, quer se entenda que estamos perante um contrato oneroso, quer se entenda que se trata de negócio gratuito, atento o disposto nos art.ºs 875.º e 947.º, n.º 1 do CC. Todavia, porque a restituição da parcela incorporada no arruamento não é já possível, por ter integrado o domínio público, deverá a Ré ser condenada na restituição do valor correspondente, à razão de €75,00 por m2 ou, em alternativa, a reconstruir o muro conforme se havia obrigado, caso em que se impõe a sua condenação numa sanção pecuniária compulsória de valor não inferior a €50,00 por dia.

    Regularmente citada, contestou a Ré, acusando os AA de estarem a actuar em abuso de direito uma vez que, conforme relatam, foram os próprios quem recusou a construção do muro quando a contestante pretendeu fazê-lo, uma vez que, segundo então invocaram, haviam celebrado acordo com a sociedade de construções ..., Lda., nos termos do qual esta procederia à edificação de uma moradia em banda no prédio em causa, o que importaria a demolição de eventual muro que a Ré ali executasse, pelo que a edificação do muro de vedação, na sua localização final, ficaria a cargo da empreiteira. E foi esse o motivo pelo qual a contestante não procedeu à edificação do muro de vedação na confinância com a Rua do Barreiro, conforme se havia obrigado, tanto mais que cumpriu todos os acordos que na mesma altura celebrou com os restantes proprietários que contribuíram para o alargamento do referido arruamento.

    Deste modo, concluiu, não foi a Ré quem incumpriu o acordo, mas antes os AA quem renunciou à contrapartida acordada, sendo claramente abusivas as pretensões formuladas.

    Os AA responderam à matéria de excepção, negando ter renunciado à contrapartida acordada a qual, em todo o caso, teria de revestir a forma escrita, pelo que sempre deverá improceder.

    Devolvendo a imputação de litigância de má-fé, requereram a final a condenação da Ré a este título.

    Fixado o valor da causa, foi dispensada a realização da audiência prévia e os autos remetidos para julgamento.

    Teve lugar audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida douta sentença que decretou a total improcedência da acção, com a consequente absolvição da ré de todos os pedidos formulados, tendo absolvido ambas as partes da imputada litigância de má-fé.

    Inconformados, apelaram os AA e, tendo desenvolvido as razões da sua discordância nas alegações apresentadas, remataram-nas com as seguintes conclusões: ...

    Contra alegou a ré, defendendo naturalmente a manutenção do julgado.

    Assente que pelo teor das conclusões se fixa e delimita o objecto do recurso, as questões suscitadas pelos apelantes reconduzem-se a saber se ocorreu erro de julgamento no que respeita aos factos vertidos na sentença sob os n.ºs 10 a 14 e quanto aos que foram considerados não provados, bem como errada qualificação do acordo celebrado entre AA e Ré, o qual deverá ser declarado nulo por ausência da forma legalmente prescrita, devendo em todo o caso considerar-se que a obrigação a que a ré se vinculou não se encontra extinta.

    Da impugnação da matéria de facto Por razões de ordem lógica e metodológica, sabido que as questões de facto precedem as de direito, começaremos por apreciar as primeiras.

    ...

    Resulta do que vem de se expor que a decisão proferida quanto à matéria sob impugnação se harmoniza perfeitamente com a prova produzida, acolhendo a versão que, com elevado grau de probabilidade, corresponde àquilo que efectivamente se passou. Deste modo, e sabido que o juiz não poderá almejar alcançar a certeza absoluta, fora do seu alcance, impõe-se confirmar a decisão proferida quanto aos factos em causa.

    1. Fundamentação De facto Agora estabilizada e lógica e cronologicamente ordenada, é a seguinte a matéria de facto a considerar: 1. Os Autores são donos do seguinte prédio rústico: pinhal, sito ao Barreiro, freguesia de ..., com a área inscrita de 1473 m2 e real de 1617 m2, a confrontar ...

    2. Desde...

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