Acórdão nº 238/13.0TMCBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelLU
Data da Resolução09 de Janeiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO S (…), residente na Rua (...) , X (...) , veio, nos termos do disposto nos artigos 988º e 990º, nº 4 do CPC, deduzir o presente incidente de alteração da atribuição da casa de morada de família contra C (…) residente na Rua (...), Y (...) .

Para tanto, alega, em síntese, que contraiu matrimónio com a requerida, tendo dessa união nascido a menor L (…). Por sentença proferida a 11 de Setembro de 2013, foi decretado o divórcio entre ambos, sendo que, anteriormente à referida acção de divórcio, foi intentada uma acção de regulação das responsabilidades parentais relativamente à menor tendo aí ficado decidido que, para efeitos do exercício das responsabilidades parentais referente ao actos de vida corrente da filha, esta continuaria a residir com a mãe na residência sita na Rua (…) X (...) .

O requerente defende, porém, a existência de circunstâncias supervenientes que alteram os factos que estiveram na base do acordo da regulação das responsabilidades parentais. Destarte, o requerente alega que a requerida decidiu ir viver definitivamente para Y (...) juntamente com a filha de ambos, a qual passou a frequentar a creche da W... em Y (...) , deixando de residir com esta na casa de morada de família que lhe tinha sido atribuída. Por outro lado, o requerente defenda que a casa de morada de família é um seu bem próprio, sendo que a requerida se recusa a entregar a chave do imóvel pese embora já não resida na aludida residência há mais de três anos.

Por fim, o requerente defende que não tem qualquer outro bem imóvel, residindo, actualmente e desde o decretamento do divórcio, com e na dependência da companheira na rua (…), X (...) , sendo certo que a casa de morada de família não tem água nem electricidade, encontrando-se vazia, fechada e a deteriorar-se.

* Designada data para a tentativa de conciliação que se revelou infrutífera, nos termos previsto no artigo 990º, nº 2 do CPC, foi proferida decisão, a título provisório, atribuindo ao requerente S (…) o direito à atribuição da Casa de Morada de família sita na Rua (…) X (...) , pelo que a requerida C (…) deveria desocupá-la no prazo de 10 dias, entregando a respectiva chave ao requerente. Foi, ainda, proferido despacho no sentido de se proceder à notificação da requerida para contestar a acção nos termos dos artigos 990º, nº 2 e 293º do CPC.

* Regularmente notificada, a requerida deduziu oposição por excepção e impugnação. Relativamente à primeira modalidade de defesa, a requerida sustenta que o direito de habitação que lhe foi atribuído no âmbito da sentença que homologou o acordo da regulação das responsabilidades relativamente à menor se encontra na sua esfera jurídica, pelo que a casa de morada de família se encontra onerada pelo direito de habitação constituído a seu favor. Por conseguinte, defende que tal direito dever-se-á reger pelo disposto nos artigos 1484º do CC., aplicando-se com as necessárias adaptações o disposto quanto ao usufruto, pelo que este direito se extingue pelo mesmo modo que o usufruto cujas circunstâncias estão contempladas no artigo 1476º do C.C. Nesse sentido, a requerida defende que inexistindo causa que permita a extinção desse direito não se vislumbra que exista alguma justificação que permita alterar o direito de habitação para o requerente, sendo certo que o presente incidente, como segue a tramitação prevista no disposto no artigo 990º do CPC, se caracteriza por ter como fim a alteração em definitivo do destino da casa de morada de família.

No que concerne à segunda modalidade de defesa, a requerida defende que o requerente não oferece qualquer facto que possa fundamentar uma necessidade de alteração do disposto no acordo homologado por sentença sobre o destino da casa de morada de família porquanto este reside há cerca de seis anos com a sua nova companheira, ou seja, tem centrada sua vida pessoal e conjugal numa outra morada.

Por outro lado, a requerida sustenta que pese embora não se discuta a titularidade do terreno onde se encontra implantada da casa de morada de família, esta não é um bem próprio do requerente uma vez que foi construída com recurso a crédito bancário contraído por ambos.

Por fim, a requerida apregoa que a aludida casa de morada de família não se encontra ao abandono, não correspondendo à verdade de que não frequenta casa há mais de três anos. No mais, defende que conserva no interior daquele bem imóvel os seus bens pessoais bem como os da sua filha menor, sendo que o requerente não tem qualquer bem pessoal.

Pugna, a final, pela procedência da excepção arguida e, caso assim não se entenda, pela improcedência, por não provado, do presente incidente de atribuição da casa de morada de família ao requerente.

* Não se conformando com a decisão provisória proferida por despacho na tentativa de conciliação que estabeleceu a entrega provisória da casa de morada de família ao Requerente, a Requerida veio interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Coimbra, o qual foi admitido, sendo que na sua apreciação o Tribunal de 2ª instância julgou procedente o recurso e revogou a decisão recorrida.

De referir que no mesmo despacho, foi designada data para inquirição das testemunhas arroladas pelas partes.

* Procedeu-se à inquirição das testemunhas arroladas, com observância do legal formalismo, conforme consta das respectivas actas. No decorrer da aludida inquirição, foi requerida oficiosamente pelo tribunal a junção aos autos de informação por parte do Banco (…) relativamente ao empréstimo bancário contraído pelo requerente e requerida por se considerar relevante para a boa decisão da causa.

* Veio, na sequência, a ser proferida sentença, na qual após identificação em “Relatório”, das partes e do litígio, se alinharam os factos provados e se consignou que não havia factos “não provados”, sendo que relativamente aos primeiros se apresentou a correspondente “Motivação”, após o que se considerou, em suma, que relativamente à necessidade de residência no presente sustentada pelo Requerente, as circunstâncias factuais apuradas pendiam no sentido da atribuição desse direito ao Requerente, e sem o pagamento à Requerida de qualquer compensação pela privação, por parte desta, da utilização que dela vem tendo [na medida em que “tendo os cônjuges (re)construído uma moradia num terreno pertencente ao património próprio de um deles, essa construção constitui uma benfeitoria útil e não a consignação da existência de um bem comum do casal. E, sendo um bem próprio do requerente não cremos que o mesmo deverá ficar onerado ao pagamento de qualquer renda e/contribuição (até porque o mesmo já suporta o pagamento integral das prestações referentes ao empréstimo bancário) porquanto a requerida não se vê privada de um bem que integra o património comum do casal ou que é seu bem próprio”], o que se traduziu no seguinte concreto “dispositivo”: «Decisão: Pelo exposto, julgo a presente acção procedente, atribuindo ao requerente S (…) a utilização da casa de morada de família, sita na Rua (…), X (...) , devendo a requerida C (…) proceder à entrega das chaves do imóvel no prazo de 10 dias Custas pela Requerida.

Registe e notifique.» * É com esta decisão que a Requerida não se conforma e dela vem interpor recurso de apelação, pedindo a revogação da mesma, apresentando as seguintes conclusões: (…) * Por sua vez, apresentou o Requerente as suas contra-alegações a fls.198-218, das quais extraiu as seguintes conclusões: (…) * Nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.

* 2 – QUESTÕES A DECIDIR: o âmbito do recurso encontra-se delimitado pelas conclusões que nele foram apresentadas e que atrás se transcreveram – arts. 635º, nº4 e 639º do n.C.P.Civil – e, por via disso, por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são: - impugnação da matéria de facto, quanto aos pontos “provados” sob os nos “17.”, “20.”, “22.” e “23.” (relativamente aos quais pugna por que, no essencial, sejam considerados “não provados”); - incorreto julgamento de direito/erro de decisão, ao decretar-se a entrega da casa de morada de família ao Requerente ora recorrido.

* 3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 3.1 – Como ponto de partida, e tendo em vista o conhecimento dos factos, cumpre começar desde logo por enunciar o elenco factual que foi considerado fixado/provado pelo tribunal a quo, sem olvidar que tal enunciação terá um carácter “provisório”, na medida em que o recurso tem em vista a alteração parcial dessa factualidade. Tendo presente esta circunstância, consignou-se o seguinte na 1ª instância: «Resultaram apurados os seguintes factos com interesse para a decisão da causa...

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