Acórdão nº 232/12.9TBTCS-AJ.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução20 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A... , por dependência do processo de insolvência, propôs acção declarativa de impugnação de resolução de ato em benefício da massa insolvente contra “Massa Insolvente de B..., S.A.” representada pela sua administradora da insolvência, peticionando, a final, que, na procedência da acção, a resolução do Sr. Administrador da Insolvência seja declarada a invalidade do acto resolutivo por falta de fundamentação de facto e de direito ou qualquer outra das causas nos termos alegados, nomeadamente por caducidade do direito à resolução.

Como fundamento da sua pretensão alega que da simples leitura da missiva recebida conducente à resolução do negócio em causa ressalta de imediato a sua nulidade uma vez que esta se limita a citar o art.º 120.º do CIRE e a afirmar a prejudicialidade do acto para a massa insolvente apenas se fundando na data em que o contrato foi realizado por contraponto com as datas do início do processo de insolvência e da declaração de insolvência, ali se afirmando que o autor agiu de má-fé sem alegar qualquer facto que permita tal conclusão.

Ademais invoca a caducidade do direito pois à data do envio da missiva da resolução há muito se encontrava prescrito o direito à resolução do negócio.

Citada a massa insolvente, contestou nos termos da peça constante de fls. 28 ss, nela tendo refutado a invocada nulidade/ineficácia da declaração resolutiva, por terem sido observados todos os requisitos legais, reafirmando que a resolução operou ao abrigo dos art.ºs 120.º e 119.º, n.º 3 do CIRE, tal como consta da missiva enviada aos demandantes e por estes recebida.

Mais alegou as circunstâncias em que tomou conhecimento do contrato em apreço, pugnando pela validade e eficácia da resolução atentando nas datas em que dele teve conhecimento e a data da resolução. No mais defendeu-se por impugnação, concluindo pela improcedência da acção. Juntou documentos.

Respondeu o autor impugnando os documentos juntos e reiterando o já alegado na petição inicial, relativamente à caducidade e inexistência de má fé da sua parte.

Teve lugar a audiência prévia elaborando-se despacho saneador e nele se relegou para momento posterior o conhecimento das questões prévias suscitadas quanto à validade da declaração de resolução e no que à matéria da excepção de caducidade respeita, considerando que ainda se mostrava possível alcançar uma solução consensual ditada pelas partes.

Foi fixado o objecto do litígio e dispensada a fixação de temas de prova tudo conforme decorre de fls. 90 e 91, designando-se dia para a realização da audiência de discussão e julgamento.

Aberta a audiência de discussão e julgamento, não se tendo logrado alcançar o acordo nos termos pretendidos pelas partes, foram as mesmas prevenidas para a possibilidade de conhecimento do mérito da causa de imediato, tendo-lhes sido permitido discutir de facto e de direito os termos do litígio. Nessa sequência, os Ilustres Mandatários do Autor e da Ré prescindiram da produção da prova arrolada e bem assim das alegações por terem considerado que as questões em apreço se mostram já suficientemente documentadas e debatidas nos autos.

Após o que foi proferida a sentença de fl.s 102 a 109 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva motivação e a final se decidiu o seguinte: “Cremos pois que atenta a parca alegação fáctica que consubstanciou a carta de resolução assiste razão ao Autor e nessa medida pelos motivos acima apontados, julga-se a acção procedente e, consequentemente, declara-se nula a resolução em benefício da Massa Insolvente praticada pelo Sr. Administrador de Insolvência.

Custas a cargo da Ré massa insolvente, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia – n.ºs 1 e 2 do art.º 527.º do Código de Processo Civil.”.

Inconformada com tal decisão, dela interpôs recurso a ré, massa insolvente, na sequência do que veio a ser proferido o Acórdão que antecede, de fl.s 124 a 135, no qual se determinou a anulação da decisão recorrida, a fim de ser produzida prova, quanto à má fé do ora autor.

Após a baixa dos autos ao Tribunal recorrido, realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância do legal formalismo e com recurso à gravação dos depoimentos prestados, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 177 a 185 v.º, na qual se seleccionou a matéria de facto dada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final se decidiu o seguinte: “Nos termos e com os fundamentos expostos, julgo procedente a presente acção e, consequentemente, declaro inválida, e sem nenhum efeito, a declaração de resolução do contrato de cessão de créditos celebrado entre o autor A... e B... , SA, mantendo-se válida e eficaz a referida cessão de créditos.

Custas pela ré massa insolvente, que se encontra dispensada do seu pagamento por beneficiar de apoio judiciário.”.

De novo, inconformada com a mesma, interpôs recurso a ré, “Massa Insolvente de B... , recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 203), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

  1. Vem o presente Recurso interposto da decisão proferida nos autos por se entender que a sentença recorrida ao declarar inválida e, sem nenhum efeito, a resolução em benefício da Massa Insolvente exercida pelo Sr. Administrador de Insolvência, não se conforma com as regras da experiência comum e da prova careada para os autos, devendo o facto nº 10 dos factos provados deve ter a seguinte redacção: “O autor, na data da cessão de créditos, sabia que a B... , S.A. se encontrava em situação de insolvência” B) Quanto ao requisito da má fé, o A.I. refere, na missiva de resolução, remetida ao A., refere, o seguinte: “(…) 8. (…)Subjacente à outorga do contrato em causa, existe não só da parte da sociedade insolvente, como, também, da parte de V. Excia, má fé, dado que o alegado documento foi elaborado e assinado na pendência do Processo de Insolvência, bem sabendo a real situação económica e financeira da sociedade.

    1. Por outro lado, como já referimos, entendemos existir má-fé por parte de V.Excia, porquanto tinha conhecimento de que se a Sociedade B... há muito que apresentava numa situação de pré-insolvência (sendo do conhecimento que o processo de insolvência se encontrava pendente em Tribunal) e de que a outorga do contrato de cessão de créditos em referencia iria, única e simplesmente, ter como beneficiários as pessoas identificadas no mesmo, existindo claro favorecimento de credores.(…) 13.Em face do circunstancialismo descrito, V.Excia não podia deixar de ignorar a prejudicialidade do acto em apreço, por este afectar, necessariamente, os direitos dos credores da insolvência (designadamente os trabalhadores), o que aliado, ao seu necessário conhecimento da situação económica em que se encontrava a Sociedade B... , S.A como próxima do limiar da insolvência, acarreta que se tenha de concluir que se verifica má-fé.

    (…)” C) O A.I., na carta de resolução em beneficio da massa insolvente, salvo melhor entendimento em sentido contrário, enunciou e alegou os factos concretos pelos quais entende ter havido prejudicialidade e má fé na outorga do contrato de cessão de créditos em referência.

  2. O direito potestativo do A. para poder impugnar os factos foi garantido na missiva de resolução em benefício da massa insolvente que foi dirigida.

  3. Com o devido respeito, não pode o A. vir invocar a falta de fundamentação, quando na realidade, percebeu o alcance dos concretos factos alegados e enunciados pelo A.I., na missiva de resolução, impugnando-os de forma especificada.

  4. A carta de resolução remetida pelo A.I. ao A. contém, salvo o devido respeito o quantum satis para o cabal exercício do direito potestativo, tanto mais que este foi exercido de forma plena pelo A.

  5. O próprio autor admite ter tido conhecimento da situação financeira débil da insolvente.

  6. Do depoimento do autor, conjugado com os documentos juntos aos autos pela massa insolvente, constantes de fls. 21/2 (cópia do anúncio da declaração de insolvência de B... , S.A.); fls. 46 (cópia do anúncio intitulado “mau pagador” datado de 11.10.2012); fls. 47/49 (cópia do anúncio datado de 02.01.2013 intitulado “2012 em retrospectiva”); fls. 50/2 (cópia do anúncio datado de 07.03.2013 intitulado “assembleia municipal autoriza extinção da empresa Mais Ourém”), é necessário retirar a conclusão de que o autor, na data da cessão de créditos, sabia que a B... , S.A. se encontrava em situação económica difícil, tudo fazendo antever a sua insolvência (facto que, aliás, já era do conhecimento geral).

  7. O primitivo contrato de cessão de créditos foi assinado na pendência do processo de insolvência e cedência a favor do A. ocorreu a título gratuito (já após a declaração de insolvência da Sociedade B... , SA, facto que foi do conhecimento público e que o A., na qualidade de ex-trabalhador não poderia ignorar) J) A situação económica e financeira da Sociedade B... , SA era do conhecimento público (e, de forma muito mais clarividente, dos seus trabalhadores ou ex-trabalhadores – bem como dos cessionários dos créditos).

  8. A declaração de resolução encontra-se devidamente fundamentada, no que concerne à prejudicialidade do acto que foi objecto da resolução e no que concerne ao requisito da má fé, não podendo, salvo o devido respeito, a sentença recorrida concluir que “Ademais e como vimos, encontramo-nos limitados aos factos constantes da missiva – a fundamentar o direito de resolução do contrato de cessão de créditos - enviada pelo Sr. Administrador de Insolvência ao autor, nos termos do artigo 123.º do CIRE, sob pena de se concluir pela nulidade do direito de resolução por ausência dos factos onsubstanciadores do requisito da má fé. Ora, compreende-se que assim seja, sob pena de se coarctar a garantia do impugnante que tem de ter conhecimento dos factos e apreender o alcance dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT