Acórdão nº 7770/16.2T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 06 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução06 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2ª Secção): I – RELATÓRIO O (…) intenta a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra A (…), pedindo a sua condenação no pagamento de € 14.756,55, correspondendo € 9.839,70, a rendas em atraso, e € 4.919,85 a indemnização pela mora, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% sobre as mencionadas quantias desde a citação até efetivo e integral pagamento.

A Ré contesta com os seguintes fundamentos: o valor patrimonial do imóvel de que a senhoria partiu não corresponde à realidade, o rendimento da ré é inferior a cinco retribuições mínimas nacionais, pelo que a renda só podia ser atualizada nos termos previstos no artigo 35º, nº2, al. ii) do NRAU; desde há 3 anos e 4 meses que a ré vem pagando de renda a quantia de 122,70 € a título de renda, pelo que a pretensão da autora a uma renda de no valor de 375,00 €, além do mais com efeitos retroativos, constituiria um abuso do direito por parte da Autora.

Conclui pela improcedência da ação.

Realizada audiência final, pelo juiz a quo foi proferida sentença a julgar a ação procedente, condenando a ré no pedido.

* Inconformada com tal decisão a Ré dela interpôs recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: (…) * A autora apresenta contra-alegações no sentido da improcedência do recurso.

Dispensados que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº4 do artigo 657º do CPC, cumpre decidir do objeto do recurso.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso – cfr., artigos 635º, e 639, do Novo Código de Processo Civil –, as questões a decidir são as seguintes: 1. Impugnação da matéria de facto.

2. Comunicação da autora respeitante à atualização da renda.

3. Invocação por parte da Ré do disposto no art. 31º, nº4º do NRAU.

4. Abuso de direito.

III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO 1. Impugnação da matéria de facto.

Os tribunais da Relação, sendo tribunais de segunda instância, têm atualmente competência para conhecer tanto de questões de direito, como de questões de facto.

Segundo o nº1 do artigo 662º do NCPC, a decisão proferida sobre a matéria de pode ser alterada pela Relação, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.

Insurge-se a apelante quanto à decisão proferida nos pontos 14 e 15 da matéria de facto dada como provada, com o seguinte teor: 14. Entre Agosto de 2013 e a data da instauração da presente ação (Outubro de 2016), a A. tentou contactar a Ré, deslocando-se ao locado, sem que tenha encontrado alguém em casa e em Março de 2016 os mandatários das partes estabeleceram contactos com vista a uma solução consensual (art. 41º da contestação e 9º da resposta).

15. A A. padece de doença crónica do foro neurológico e é cuidadora de uma filha que padece de doença do foro psiquiátrico (art. 6º da resposta).

Contudo, os factos sob impugnação e que a Apelante pretende dar como “não provados”, nenhum interesse apresentam para a decisão a proferir na presente ação (nenhuma norma, ou sequer a boa-fé, impõe que o senhorio contacte previamente o arrendatário antes de instaurar uma ação para cobrança de rendas em atraso, assim como é irrelevante para este efeito a doença da autora ou da sua filha).

Assim sendo, não se conhece da impugnação deduzida, eliminando-se tais factos da matéria dada como provada, por irrelevantes.

*2. Matéria de facto: São os seguintes, os factos dados como provados pelo tribunal recorrido, com as alterações acima determinadas: 1- Por contrato de arrendamento celebrado no dia 1 de Maio de 1970 o pai da A., (…), deu de arrendamento a A (…), à data casado com a Ré, pelo prazo de um ano, sucessivamente renovável por igual período, o seguinte imóvel: Fração autónoma designada pela letra “C”, correspondente à Sub-Cave Dt.º, do prédio urbano sito na Rua x (...) , n.º 0 (...) , inscrito na matriz da freguesia de y (...) , concelho de z (...) (art. 3º da cont).

2- Por contrato de arrendamento celebrado no dia 10 de Agosto de 1983 o pai da A., (…), deu de arrendamento à R., entretanto divorciada de A (…), pelo prazo de um ano, sucessivamente renovável por igual período, o imóvel referido em 1) (art. 1º da p.i.).

3- Por partilha efetuada por escritura pública em 15 de Setembro de 1997 no 3.º Cartório Notarial de z (...) , por óbito do referido (…), veio aquele prédio à titularidade da A., mostrando-se a aquisição registada a seu favor pela AP. 42 de 31 de Março de 1998 (art. 2º e 3º da p.i.).

4- Desde a data referida em 3), a R. passou a efetuar o pagamento das rendas à A. (art. 4º da p.i.).

5- Face às atualizações que se foram sucedendo no tempo, em 2013, a R. pagava a título de renda mensal, o valor de 79,00 € (art. 5º da p.i.).

6- No dia 30 de Abril de 2013, a A. remeteu à R. carta registada com aviso de receção, por si recebida em 2 de Maio de 2013, informando-a da sua intenção de que o contrato referido em 2) transitasse para o novo regime de arrendamento urbano (arts. 7º e 10º da p.i.).

7- Na carta referida em 6), a A. propôs à R. que o contrato passasse a ter prazo certo e a duração de 5 anos e que o valor da renda fosse atualizado para o montante de € 375,00 mensais (arts. 8º e 9º da p.i.).

8- A Ré respondeu à A., por carta datada de 24 de Maio de 2013, com o seguinte teor: “(…) Oponho-me ao valor da renda proposto por V. Ex.ª, no montante de € 375,00 mensais, propondo que se mantenha o valor atual de € 79,00 mensais (artigo 31º, n.º 3, alínea b) do NRAU).

Oponho-me igualmente à alteração proposta com respeito à duração do contrato, devendo manter-se o contrato de arrendamento ora em vigor, sem qualquer alteração ao seu regime (artigo 31º, n.º 3, alínea c) do NRAU).

Refira-se ainda que o valor patrimonial do prédio de € 76.130,00, como constante da caderneta predial urbana, não está correto, porquanto não obstante o prédio ter sido inscrito na respetiva matriz predial urbana em 1989, o mesmo não foi construído na mesma data, do que é prova bastante o próprio contrato de arrendamento, celebrado em 1979.

Dali resulta que o coeficiente de vetustez não pode corresponder ao constante da avaliação constante da caderneta predial que me veio apresentar, sendo necessariamente muito inferior, pelo que o valor patrimonial do prédio deverá ser, em rigor e verdade, muito inferior, sendo, consequentemente, a renda ora proposta por V. Ex.ª muito elevada.

(…) Acresce que V. Ex.ª nunca efetuou obras quer de conservação quer de reparação no locado, tendo ficado estas por minha conta ao longo de todos estes anos de contrato. O locado precisa urgentemente de ser pintado e que seja substituída a canalização, condições elementares de qualquer imóvel destinado à habitação (…)” (art. 11º a 14º da p.i. e 12º, 13º, 16º e 17º da contestação).

9- Em 11 de Junho de 2013, a Autora remeteu nova missiva à Ré, com o seguinte teor: “(…) Face ao exposto, venho nos termos e ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 5 do artigo 33º da lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, doravante abreviadamente designada por NRAU (…), informá-la do seguinte: 1. Da atualização do valor mensal da renda para € 375,00, sendo a mesma devida no 1º dia do 2º mês seguinte ao da receção da presente comunicação (1 de Agosto de 2013). Refiro que a renda proposta poderia ter como limite máximo 1/15 do valor do locado, ou seja, € 5.075,33/ano, correspondente a € 422,94/mês.

2. Que nos termos da citada disposição legal, o referido contrato de arrendamento considera-se celebrado com prazo certo, pelo período de 5 anos, contados da presente comunicação.

3. A renda será atualizada dos atuais € 79,00 para € 375,00, a partir do 1º dia do 2º mês seguinte ao da receção da presente comunicação (1 de Agosto de 2013) (…)” (art. 15º e 16º da p.i.).

10- A Ré remeteu à A. carta registada em 11 de Julho de 2013, subscrita por...

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