Acórdão nº 0372/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução15 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de impugnação judicial com o n.º 579/14.0BEPRT 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (doravante também Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, julgando procedente a impugnação judicial deduzida, após indeferimento sucessivo da reclamação graciosa e do recurso hierárquico, pela sociedade denominada “A……….., Lda.” (adiante Impugnante ou Recorrida), anulou as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) dos exercícios de 2007 e 2008, por discordar da decisão na parte em que entendeu ilegal a correcção que a Administração tributária (AT) efectuou por não aceitar como custos dedutíveis para efeitos de determinação da matéria tributável os montantes correspondentes ao Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) suportado pela sociedade quando das aquisições de automóveis efectuadas noutros Estados-Membros da União Europeia (transacções intracomunitárias).

1.2 O recurso foi admitido, com subida imediata e nos próprios autos e a Recorrente apresentou a motivação do recurso, que resumiu em conclusões do seguinte teor (Porque usamos o itálico nas transcrições, os excertos que estavam em itálico no original surgirão, aqui como adiante, em tipo normal.

): «A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) e respectivos juros compensatórios relativas aos períodos de tributação de 2007 e 2008, no montante de € 58.104,45 e € 108.166,93, bem como das decisões de indeferimento proferidas em sede de reclamação graciosa e recurso hierárquico.

  1. Nos presentes autos foi produzida prova documental e prova testemunhal, ora entende a Fazenda Pública que a questão a dirimir nos presentes autos, é uma questão de direito, e a prova testemunhal produzida foi infrutífera para responder ao que realmente interessa.

  2. Ou seja, a resolução do presente litígio circunscreve-se tão só à questão de saber se quando o sujeito passivo não exerce o direito de reembolso do IVA, nos termos da 8.ª Directiva do Conselho, o montante desse IVA contabilizado como custo é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável em IRC? D. Encontra-se preenchido o requisito da indispensabilidade exigido no n.º 1 do artigo 23.º do CIRC? E. Entende a Fazenda Pública que, não tendo a impugnante exercido o direito de reembolso, ao abrigo da 8.ª Directiva do Conselho, o montante do IVA contabilizado como custo não é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável em IRC, porque não se verifica o requisito da indispensabilidade exigido no n.º 1 do artigo 23.º do CIRC.

  3. A Impugnante, na qualidade de sujeito passivo, foi objecto de uma acção de inspecção com a ordem de serviço n.º OI201007182, classificada de âmbito geral (al. a) do n.º 1 do artigo 14.º do Regime Complementar de Processo de Inspecção Tributária (RCPIT)), abrangendo os exercícios de 2007 e 2008.

  4. Da referida acção de inspecção resultaram correcções de natureza meramente aritmética à matéria tributável, em sede de IRC e de IVA para os referidos anos de 2007 e 2008.

  5. Verificaram os Serviços de Inspecção Tributária (SIT) que a impugnante, em 2007 e 2008, havia importado e legalizado vários veículos automóveis.

    I. Tais automóveis foram facturados pelos fornecedores comunitários com liquidação de IVA do país de origem (evidenciado nas respectivas facturas).

  6. A impugnante contabilizou os montantes de IVA comunitário como custo fiscal integrado nos preços de aquisição dos veículos.

  7. Nos termos da 8.ª Directiva do Conselho (79/1072/CEE), os sujeitos passivos de IVA estabelecidos em território português têm direito ao reembolso do IVA suportado nas operações realizadas noutros Estados Membros da EU.

    L. Sempre que não seja exercido o direito ao reembolso nos termos ínsitos na 8.ª Directiva do Conselho (79/1072/CEE) o montante de IVA contabilizado como custo não é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável em IRC, porque não se verifica o requisito da indispensabilidade.

  8. No que ao tema diz respeito, a então Direcção de Serviços do IRC veiculou instruções na Circular n.º 14/2008, de 11 de Julho, isto porque haviam sido suscitadas dúvidas sobre o enquadramento fiscal, em sede do IRC, do IVA suportado apesar de não ser exercido o direito à sua restituição, conferido pela 8.ª Directiva do Concelho (79/1072/CEE), de 6 de Dezembro.

  9. No ponto 2. da referida Circular refere-se que “Sempre que não seja exercido esse direito, o montante do IVA contabilizado como custo não é dedutível para efeitos de determinação do lucro tributável em IRC, porque não se verifica o requisito de indispensabilidade exigido pelo n.º 1 do artigo 23.º do respectivo Código”.

  10. A ratio do entendimento veiculado na Circular 14/2008 da DSIRC é clarividente, pois se o IVA suportado no espaço comunitário é recuperável, não deve por isso ser considerado como custo.

  11. E, por ser recuperável não se verifica a sua indispensabilidade para ser considerado como custo (artigo 23.º do CIRC).

  12. Deste entendimento foi a impugnante conhecedora, através do RIT, veja-se para tanto 1.2.1 – Custos não dedutíveis – IVA comunitário.

  13. E, não ofereceu qualquer prova da verificação do requisito para a sua dedutibilidade em sede de IRC (que tinha exercido o direito ao reembolso ou que tinha sido efectuado tal pedido).

  14. Assim como também nunca a impugnante contestou a ratio da Circular 14/2008 da DSIRC.

  15. A sentença do Tribunal a quo dá como assente que “(...) O Tribunal retira a convicção que a Impugnante procedeu efectivamente à contabilização do IVA suportado nas transacções comunitárias como custo, sendo que em caso algum a Impugnante coloca em causa tal factualidade vertida no relatório de inspecção, pelo que se deve ter a mesma por assente;” U. Conclui também o Tribunal na sentença que ora se recorre que, “(...) no caso em apreço o IVA suportado nas transacções com fornecedores de outros Estados-Membros da União Europeia era susceptível de ser reembolsado.

    Acontece que, conforme resulta dos autos, a impugnante não exerceu o direito de reembolso junto das entidades europeias competentes.

    ” V. Contudo, dispõe que “Não o tendo feito, afigura-se que existe de facto um custo para a impugnante e que assim sendo foi indispensável para a realização da sua actividade”.

  16. Ora, entende a Fazenda Pública, salvo o devido respeito por opinião diversa, que tendo o Tribunal dado como assente que a impugnante, aqui recorrida, contabilizou o IVA suportado nas transacções comunitárias como custo, que esse mesmo IVA era susceptível de ser reembolsado, e não tendo a recorrida exercido o direito de reembolso junto das entidades europeias competentes, a sentença teria que ser improcedente.

    X. O custo teria que ser considerada como não indispensável para a realização da actividade.

  17. A douta sentença que ora se recorre decidiu pela anulação das liquidações adicionais de IRC também por falta de fundamentação da liquidação e a violação do princípio do inquisitório e da verdade material previsto no artigo 58.º, da LGT, porquanto a A.T não efectuou todas as diligências a que está obrigada nos termos desta norma com vista ao apuramento da verdade material (...) Z. Dispõe o referido normativo legal, artigo 58.º da LGT, que “A administração tributária deve, no procedimento, realizar todas as diligências necessárias à satisfação do interesse público e à descoberta da verdade material, não estando subordinada à iniciativa do autor do pedido.

    ” AA. Como expõe António Lima Guerreiro in Lei Geral Tributária, Anotada, Editora Rei dos Livros, 2001, pág. 265 “O princípio do inquisitório – ou da oficialidade ou verdade real – significa ser a administração tributária quem dirige o procedimento, determinando, mesmo nos casos em que tenha sido iniciado, não oficiosamente, mas por solicitação dos interessados, o modo como se desenvolve. (...) 2- Em sentido amplo, o princípio do inquisitório quer dizer igualmente não estar a administração tributária limitada na condução do procedimento pelas pretensões dos contribuintes ou outros obrigados tributários. (...) 3- O princípio do inquisitório está também associado à informalidade ou flexibilidade do procedimento tributário, que é uma garantia de que o órgão instrutor tem a liberdade da escolha das diligências necessárias para a satisfação do interesse público e a descoberta da verdade material” BB. Já o princípio da verdade material encontra-se consagrado no artigo 6.º do RCPIT que dispõe “O procedimento de inspecção visa a descoberta da verdade material, devendo a administração tributária adoptar oficiosamente as iniciativas adequadas a esse objectivo.

    ” CC. Impõe, portanto, que a administração tributária no âmbito do procedimento de inspecção procure recolher os elementos probatórios que possibilitem mais tarde fundamentar o acto tributário que venha a praticar.

    DD. Trata-se, pois, de investigar e apurar o correcto cumprimento das obrigações fiscais e, com base nessa investigação, recolher elementos que permitam apurar a eventual existência de irregularidades.

    EE. No caso em apreço, a AT cumpriu com o disposto no artigo 58.º da LGT e artigo 6.º do RCPIT, pois os STI, recolheram prova suficiente para sustentar as correcções efectuadas, materializada nas facturas de aquisição dos veículos importados, emitidas pelos fornecedores comunitários, na revelação contabilística do impugnante, informação remetida pela DGAIEC, assim como as respostas obtidas pela circularização efectuada aos clientes da impugnante, como relata o RIT, constitui prova bastante na medida em que da análise das facturas se pode concluir, sem margem para qualquer reserva, que as operações em apreço foram sujeitas a imposto normal no respectivo estado membro e como tal poderia/deveria ter sido exercido o direito de reembolso do IVA nos...

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