Acórdão nº 087/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Novembro de 2017

Magistrado ResponsávelFONSECA DA PAZ
Data da Resolução09 de Novembro de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: A………….., devidamente identificada nos autos, intentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Coimbra, recurso contencioso de anulação, contra a Câmara Municipal de Ovar, pedindo a declaração de nulidade ou a anulação da deliberação desta tomada na reunião de 21 de Fevereiro de 2002, que ordenou a demolição da construção que levara a efeito.

Por sentença datada de 19 de Setembro de 2012, foi negado provimento ao recurso.

É contra esta decisão que vem o presente recurso, interposto pela A., a qual, na respectiva alegação, formulou as seguintes conclusões: “1.ª - A decisão recorrida supôs, erroneamente, recair nas atribuições da Câmara Municipal, em matéria de legalização de obra particular a construir no terraço posterior do primeiro andar de uma fracção autónoma de imóvel constituído em propriedade horizontal - prédio esse composto de cave, rés-do-chão e cinco andares, no total de 21 fracções autónomas - dever assumir como pressuposto da legalização a obtenção de concordância dos condóminos que representam a maioria qualificada de dois terços do capital investido no imóvel, manifestada em assembleia de condóminos; 2.ª - A exigência de tal maioria constitui questão situada no âmbito das relações jurídico - privadas dos condóminos, a resolver pelo Código Civil, e, na falta de composição espontânea dos interesses das partes, pelos Tribunais Comuns, a solicitação dos condóminos. Pessoas em cujo interesse foram estabelecidas pelo regime privatístico da propriedade horizontal, normas relativas aos seus direitos e encargos. E também em protecção das quais foram pelo Direito privado legalmente instituídas diversas maiorias necessárias para a regularidade da reunião para a válida tomada de deliberação das assembleia de condóminos.

3.ª - Não existindo no Direito Público, em matéria de legalização de obras, preceito com o mesmo conteúdo daquele que se acha vertido no art. 1422.º, n.° 3 do Cód. Civil, em matéria de propriedade horizontal, só se pode concluir que, com o acto administrativo recorrido, a Recorrida pretendeu proceder à regulação de interesses privados, segundo normas do Direito Civil; 4.ª - Tendo a Administração decidido, com base no procedimento de legalização instaurado entretanto, após uma primeira fase de colaboração com o particular em vista do licenciamento, que a obra licenciada não podia ser legalizada; e que devia ser demolida. Nesta fase do procedimento, a Administração interpretou e aplicou exclusivamente normas de Direito Privado relativas à propriedade horizontal. Ao ordenar, inopinadamente, a sua demolição, a decisão administrativa recorrida contenciosamente nestes autos transcendeu os limites da função administrativa a que está confinada a Administração Municipal em matéria de licenciamento de obras; praticando actos próprios do Poder Judicial; 5.ª - E decidindo um conflito de interesses privado suscitado pela reclamação de um cidadão não condómino do prédio em que a obra se situava, a Administração, aqui Recorrida, resolveu uma questão jurídica, reservada à função jurisdicional. Tendo agido desse modo, a Administração incorreu em usurpação de poder. Sendo a deliberação nula, nos termos das disposições do art°. 133°., n°. 1 e 2 a) do CPA , com referência aos arts. 202°. e 235°., n°. 2 da Constituição e ao art. 13°., n°. 1 o ) da Lei n°. 158/99; 6.ª - A douta sentença recorrida, ao não ter decretado a nulidade do acto atacado, por usurpação de poder, incorreu em erro de julgamento, por violação, das disposições do art°. 133°., n°. 1 e 2 a) do CPA, com referência aos arts. 202° e 235°., n°. 2 da Constituição e ao art. 13°., n°. 1 o) da Lei n°. 158/99. Devendo ser substituída por outra que decrete a nulidade, por usurpação do poder, do acto atacado; 7.ª - A deliberação camarária impugnada, caso se não configure como deliberação nula por usurpação de poder, nos termos das disposições conjugadas do art. 133°., n°s. 1 e 2 a) do CPA, constituiu uma deliberação também nula, por incompetência absoluta da Câmara Municipal, sua autora. Nulidade que deveria ter ser declarada pela douta sentença recorrida, nos termos do n°. 1 e da alínea b) do n°. 2 do art. 133°. do CPA e do art. 363°., n°. 1 do Código Administrativo, com referência ao art. 235°., n°. 2 da Constituição e 13°., n°. 1 o) da Lei n°. 158/99; 8.ª - A douta sentença recorrida, ao não ter decretado a nulidade do acto atacado, com fundamento em incompetência absoluta da Câmara, incorreu em erro de julgamento, por violação do n°. 1 e da alínea b) do n°. 2 do art. 133°. do CPA e do art. 363°., n°. 1 do Código Administrativo, com referência ao art. 235°., n°. 2 da Constituição e 13°., n°. 1 o) da Lei n°. 158/99. Devendo ser substituída por outra que decrete a nulidade, por incompetência absoluta da entidade decidente para a prática do acto administrativo objecto de impugnação; 9.ª - A douta decisão recorrida considera que a exigência de comprovação de autorização dos condóminos, tomada em assembleia geral, e aprovada por certa maioria, se fundou na exigência de comprovação da legitimidade da requerente do licenciamento para a implantação da cobertura no terraço que integra a fracção - fracção cuja propriedade se encontra definitivamente inscrita a seu favor - nos termos do disposto na al. a) do art. 15°. do DL n°. 445/91. Porém: 10.ª - Considerando que a exigência de aprovação da obra pela maioria qualificada de condóminos enunciada no procedimento administrativo era um requisito de legitimidade do procedimento, a sentença recorrida violou, por erro de julgamento, o disposto no art. 15°., n°.1 a) do DL n°. 445/91, bem como o art. 9°., n°. 1 do DL n°. 555/99, conjugados com o art. 53°. do Cód. Proc. Adm. Devendo, também por isso, ser revogada; 11.ª - Face à reclamação do particular proprietário de fracção de um prédio diferente - o munícipe referido em 5 dos factos provados - a Recorrida deveria ter averiguado da sua competência para conhecer da sua pretensão; da legitimidade do munícipe requerente para obter das autoridades administrativas tutela dos seus interesses; da oportunidade do pedido. Não o tendo feito, a Administração Recorrida infringiu o disposto no art. 83.º. do CPA. A sentença recorrida, que não apreciou essa infracção; ao não ter, por omissão da aplicação da regra do art. 83°. do CPA à intervenção daquele munícipe, decretado a anulação do acto por violação de lei e incompetência, incorreu em erro de julgamento. Devendo, também por isso, ser revogada; 12.ª - A Recorrente apresentado à Câmara um pedido de informação prévia, nos termos do art. 13°. do DL n°. 445/91. Pedido em resposta ao qual a Câmara apenas exigiu, em matéria de autorização dos condóminos, documento comprovativo da anuência de 2/3. dos condóminos. Exigência que a Recorrente satisfez.

13.ª - Tendo em momento posterior a Câmara, ainda dentro do período de um ano subsequente à formulação desse pedido, exigido da Recorrente acta de realização da assembleia de condóminos à qual tivesse sido presente o pedido de autorização para realização de obras e da qual constasse que pelo menos 2/3 dos condóminos o autorizam. O acto administrativo recorrido é anulável, por erro nos pressupostos e por violação de lei; 14.ª - Com essa mudança de comportamento administrativo, a Câmara passou da exigência de comprovação a fazer por documento de anuência de 2/3 dos condóminos à exigência de comprovação por acta de deliberação de condóminos, da qual conste que, pelo menos 2/3 dos condóminos o autorizam. Pondo a cargo da Recorrente um ónus excessivo face à dificuldade de convocar assembleias de condóminos. E violando, ilegalmente, a sua vinculação anterior, de comprovação da autorização dos condóminos por simples documento, tomada em sede de informação prévia. A sentença recorrida deveria ter considerado o desrespeito de tal vinculação da Câmara Municipal, que consta da matéria de facto provada, determinante da anulação do acto, por infracção do disposto no art. 13°. do DL n°. 445/91. Por erro de julgamento, nesse aspecto face ao preceito do dito art. 13°. acabado de citar, a sentença recorrida deve ser revogada; 15.ª - Sobre o pedido de legalização da obra apresentado pela Recorrente, de 27 de Setembro de 1999, formou-se acto tácito de deferimento, nos termos do disposto nos arts. 61.º do DL n°. 445/91 e do art. 108°., n°s. 1, 2 e 3 a) do CPA.; 16.ª - Tal acto é um acto administrativo válido, constitutivo de direitos ou de interesses legalmente protegidos da Recorrente; e, por conseguinte, irrevogável; 17.ª - E acto administrativo irrevogável seria também, no caso dos autos, mesmo que fosse inválido, atento o prazo decorrido entre o momento da sua produção e o da tomada de decisão administrativa recorrida; 18.ª - Não tendo considerado que se formou deferimento tácito do pedido de legalização, a sentença recorrida violou o disposto no art 61°. do DL n°. 445/91 e no art. 108°., n°. 1 e 3 a) do CPA. Incorrendo em erro de julgamento. Devendo, também por isso, ser revogada; 19.ª - O acto administrativo contenciosamente recorrido violou a proibição legal de revogação de acto anterior válido, corporizado no deferimento tácito do pedido de legalização. Não tendo decretado a invalidade do acto administrativo recorrido, com fundamento na sua natureza de acto revogatório de acto administrativo anterior válido, a decisão recorrida voltou a incorrer em erro de julgamento, por violação do disposto no art. 140°., n°. 1 b) do CPA; 20.ª - A douta sentença recorrida violou o mesmo dever de decretar a invalidade do acto administrativo recorrido, com fundamento na sua natureza de acto revogatório de acto administrativo anterior mesmo que ele fosse inválido. Pois que o acto revogado foi praticado para além do prazo de um ano em que seria consentido à Administração proceder à sua revogação Não o tendo feito, violou as disposições conjugadas do art. 28°. da LPTA e do art. 141°. do CPA; 21.ª - A deliberação...

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