Acórdão nº 010/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução12 de Julho de 2017
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso jurisdicional da sentença proferida no processo de anulação de venda com o n.º 902/07.3BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A………… (adiante Requerente ou Recorrente) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Tributário de Lisboa julgou improcedente o pedido de anulação por ele deduzido relativamente a uma venda em sede de execução fiscal.

1.2 Com o requerimento de interposição de recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor: «I- O ora recorrente sempre teve intenção de visitar o bem, contudo por livre arbítrio, dos fiéis depositários, nunca viu a sua pretensão satisfeita.

II- Sendo que o motivo dado, ao ora recorrente que o bem está arrendado, sendo impeditivo de o visitar.

III- O ora recorrente não se conformando com o sucedido, vem requerer a anulação da venda, com base na falta de inspecção do bem, na irregularidade do processo de venda, desde logo a falta de uma descrição exaustiva do bem, como a falta de indicação do valor exacto da renda, e não menos importante, com fundamento na violação de princípios inerentes à actuação da Administração Pública, como a transparência e a igualdade, cfr. artigos 188.º, 191.º, 195.º, 196.º, 197.º, 202.º, 818.º, 822.º, 838.º, 839.º, todos CPC e artigos 36.º, 248.º, 249.º e 253.º CPPT e artigo 77.º LGT.

IV- Tendo, sem margem para qualquer dúvida, o ora recorrente legitimidade para formular o pedido de anulação de venda, com base na privação de direitos que lhe estão subjacentes na lei, tudo conforme argumentos melhor expendidos supra em Alegações, cfr. artigos 157.º, 195.º, 197.º e 200.º todos CPC.

V- Sendo o elemento de conexão a intenção de compra do bem imóvel.

VI- Aliás a falta de indicação do valor da renda e a impossibilidade de observar o bem penhorado, e a consequente impossibilidade e obstaculização não apresentação [sic] da proposta pelo requerente constituem fundamentos, mais que suficientes, para a anulação da venda, cfr. artigos 195.º, 197.º, 812.º, 817.º, 818.º, 821.º, 822.º e 826.º, todos CPC.

VII- É de senso comum que ninguém compra um bem com um valor consideravelmente alto, quando não tem um conhecimento exaustivo do mesmo, como é o caso, já que o recorrente desconhece, desde logo a sua rentabilidade e a sua estrutura.

VIII- Estando a Administração Fiscal obrigada a efectuar uma descrição exaustiva do bem a vender, não é suficiente nem legal uma descrição sumária do mesmo, cfr. artigos 195.º, 197.º, 812.º, 817.º, 818.º, 821.º, 822.º e 826.º, todos CPC e artigos 248.º, 249.º, 253.º e 257.º todos CPPT.

IX- Mais, avaliação feita pelo promissor comprador presencialmente é fundamental e imprescindível para a decisão de aquisição/proposta.

Nesta senda, X- Mal andou a douta sentença recorrida, ao reconhecer que o recorrente apenas não viu o imóvel por não ter chegado a acordo com o arrendatário relativamente ao dia e hora para visitar o mesmo.

XI- Na verdade, a referida “visita” foi recusada ao recorrente.

XII- Recusa esta que viola todo o preceituado legal que supra se expôs e identificou.

XIII- Assim também não sendo de proceder que o facto de o depositário não ter procedido à possibilidade de vista do andar em causa, não seja repercutida na esfera jurídica do impugnante.

XIV- Quando na verdade o é, XV- Pois que este tinha como dever apresentar o bem a todo e qualquer interessado, XVI- Como o era o aqui recorrente.

XVII- Sendo que a postura adoptada pelo depositário, repercutindo-se directamente na esfera jurídica do impugnante, por violação do preceituado legal supra melhor indicado, determina a nulidade da venda, o que se requer.

XVIII- O que aliás melhor resulta da Verdade Material dos factos quando confrontada com o facto dado por provado na douta sentença em U), i e, XIX- O recorrente tentou visitar o imóvel, XX- E tal não lhe foi permitido.

XXI- O que não foi caso único, considerando ademais o facto dado por provado na douta sentença em W).

XXII- Ora na verdade é o próprio decorrer da douta sentença ora em crise que fundamenta e dá fundamento ao presente recurso e, que na verdade, determina também per si, a procedência por provada do presente recurso.

XXIII- Veio o recorrente alegar cfr. melhor se encontra descrito e juridicamente fundamentado com base nos respectivos artigos e base legal, a existência de uma omissão de um acto e formalidade imposta por Lei, XXIV- Nomeadamente o acesso a visitar o imóvel bem como, XXV- A descrição pormenorizada de todo o contexto da venda judicial, nomeadamente valor de renda, identificação do arrendatário, entre outros requisitos supra melhor identificados, XXVI- Assim e concordando com a douta sentença proferida “... a omissão de um acto ou de uma formalidade imposta pela Lei, como, ainda, da circunstância de essa omissão poder ter tido influência no acto de venda realizado” existe, é manifesta e notória, está reconhecida nos autos e importa, ao contrário do que foi entendimento do douto Tribunal a quo, ainda que tenha vindo a reconhecer tais factos como provados, que se declare nula a venda judicial ora em crise.

XXVII- Sendo então de aplicar o quanto melhor dispõem não só os supra mencionados artigos mas ainda e também, os artigos 201.º e 909.º CPC.

XXVIII- No tudo o mais, não se pode comungar com a douta sentença ora em crise, porquanto na verdade, tem o recorrente interesse legítimo na questão jurídica em causa e, por essa mesma razão, dever-lhe-á ser reconhecida tal legitimidade.

XXIX- Pois que qualquer nulidade – in casu por omissão de formalidades essenciais – pode ser invocada a todo o tempo por qualquer interessado.

XXX- Mais obviamente, perante a indicada omissão e impossibilidade de realização de visita, se estar perante erro sobre o objecto - art. 257.º CPPT.

XXXI- Sendo na verdade este o elemento de conexão do recorrente, i e, a impossibilidade de exercer o seu livre Direito, atendendo à grosseira omissão que se verifica nos autos e ainda, a impossibilidade de visitar o imóvel.

XXXII- Porquanto a descrição não se refere com exaustão ao bem em si, XXXIII- Mas a todas as condicionantes, vicissitudes e ónus que sobre o mesmo dizem respeito, sendo estas características essenciais para que seja apresentada e oferecida uma proposta.

XXXIV- Assim, o ora recorrente, não se conforma com a douta sentença, mais devendo, em consonância com os argumentos melhor esgrimidos e base legal indicada, ser declarado procedente o presente Recurso, o que se requer.

Nos termos em que se requer a V. Ex. a anulação da venda nos termos do art. 279.º n.º 1, alínea b) e a marcação de uma data para uma visita ao bem imóvel para que seja possível, o ora recorrente possa apresentar uma proposta, dignificando, assim a tão acostumada JUSTIÇA!».

1.3 O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

1.4 Os Recorridos não contra-alegaram.

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, foi dada vista ao Ministério Público e o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «[…] Se bem entendemos o conteúdo do que vem alegado, o ora Recorrente concretiza a sua legitimidade no facto de não ter podido inspeccionar o bem vendido, na falta da sua descrição exaustiva, na falta da indicação do valor exacto da renda e “na violação de princípios inerentes à actuação da Administração Pública, como a transparência e a igualdade” (cfr. Conclusão III).

A anulação de venda efectuada em processo de execução fiscal segue, nos seus traços essenciais, o regime previsto no CPC (cfr. o art. 257.º do CPPT e os arts. 908.º e 909.º, ambos do CPC, na redacção que então vigorava).

Manifestamente não pode a legitimidade activa do ora Recorrente assentar, como bem se refere na sentença recorrida, nos fundamentos de anulação da venda que pressupõem a qualidade de adquirente do bem, como é o caso do erro sobre o bem vendido ou sobre as suas qualidades, por desconformidade com o que foi anunciado ou a existência de algum ónus real que não tenha sido tomado em consideração e não haja caducado (art. 257.º, n.º 1. al. a) do CPPT e art. 908.º, n.º 1 do CPC) e também não pode assentar naqueles fundamento que pressupõem a qualidade de executado ou revertido, como é o caso do fundamento a que alude o art. 257.º, n.º 1, al. b) do CPPT.

Contudo, como decorre do disposto na al. c) do n.º 1 do art. 257.º, n.º 1, al. c) do CPPT e art. 909.º, n.º 1 do CPPT, não se esgotam nesses mencionados fundamentos as hipóteses para requerer a anulação da venda em processo de execução fiscal. Nomeadamente, pode a anulação do acto da venda resultar da ocorrência de nulidade processual, pela prática de um acto que a lei não admita ou pela omissão de um acto ou formalidade que a lei prescreva, quando a lei expressamente declare a nulidade ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa (art. 201.º, n.º 1, por remissão do art. 909.º, n.º 1, al. c), ambos do CPC).

Sucede que a legitimidade para requerer a anulação de venda com fundamento na prática de acto que a lei não admita ou na omissão de acto ou formalidade que a lei prescreva apenas pode radicar, salvo melhor entendimento, naqueles que, sendo intervenientes no processo de execução fiscal, o que não é o caso do ora Recorrente, têm interesse directo na observância da formalidade omitida ou na repetição ou eliminação do acto em causa.

Sempre se dirá, no entanto, que não se manifesta, no caso em apreço, acção ou omissão que lei expressamente comine com a nulidade, nem omissão...

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