Acórdão nº 0442/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 20 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | COSTA REIS |
Data da Resolução | 20 de Junho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: A………… SA instaurou, Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja (doravante TAF), contra o MUNICÍPIO DE SINES, acção administrativa comum pedindo que este fosse condenado a pagar-lhe a quantia de 277.942,88 euros, acrescida de juros de mora, referente aos serviços que lhe tinha prestado relativos (1) a abastecimento de água para consumo humano e (2) recepção, tratamento e rejeição de efluentes domésticos.
O TAF julgou a acção procedente apenas no tocante ao pagamento dos serviços prestados pelo abastecimento de água.
O Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), para onde a Autora apelara, revogou essa decisão e julgou a acção totalmente procedente.
Inconformado, o Município de Sines interpôs a presente revista que finalizou do seguinte modo: A) O presente recurso de revista incide sobre o douto acórdão proferido pelo digníssimo Tribunal Central Administrativo Sul, através do qual decidiu revogar a douta decisão de primeira instância por entender que as contrapartidas que o Recorrente tem direito e que se dão como provadas na douta sentença da primeira instância não têm correspondência ou interdependência funcional para a aplicação do disposto no art.° 428° do CC por referência ao disposto no art.° 289° e 290º do CC e consequentemente condenou o R. no pagamento dos valores que constam das facturas referentes aos efluentes domésticos, únicas em discussão.
B) Impõe-se, com o devido respeito, que é muito, creiam-nos, a intervenção desse Venerando Tribunal, face ao flagrante erro de julgamento na aplicação do direito e deste aos factos, com o prejuízo daí decorrente para os interesses públicos e sociais relevantes, sendo certo que está em causa decisão sobre questão que se apresenta, no caso sub judice, como de especial capacidade de repercussão social e a intervenção desse Venerando Tribunal, urge de forma a dissipar dúvidas sobre a matéria de direito em apreço, bastante complexa, sobre o quadro legal que a regula, havendo utilidade prática na apreciação das questões suscitadas, tendo em vista uma boa administração da justiça e por ser necessária orientação jurídica esclarecedora desse Venerando Tribunal, nos termos do disposto no art.° 150º do CPTA, sendo que através do douto acórdão recorrido alcança-se uma decisão materialmente inconstitucional - tudo conforme melhor resulta das Alegações do presente Recurso.
C) Existe contradição insanável entre os factos provados, os fundamentos e a própria decisão porquanto o tribunal “a quo” afirma ao longo do douto acórdão recorrido a existência de “de prestação de serviços de resíduos sólidos urbanos” ou RSU, conforme resulta da página 16 -último parágrafo; - Vd. Página 18 - último parágrafo; Vd. página 21 - 6º parágrafo; - Vd. página 22 - último parágrafo -Vd. Página 23 - 1° parágrafo; - vd. Página 23 - 4° parágrafo - por conjugação ainda com o decido -Vd. Página 27 - último parágrafo - E - Vd. página 28 -1°, 2° e 3° parágrafos: V página 29 - 1° parágrafo - conforme melhor resulta das alegações do presente, quando o que se discute são efluentes domésticos.
D) Tal contradição tem como consequência a nulidade do douto acórdão, por violação do disposto no art.° 5°, n° 3, 154°, n° 1, 607°, n° 3 e n° 4, 609°, n° 1, art°6 15°, n° 1 al. c), por referência ao disposto nos artigos 633°, 666°, todos do CPC - Cfr. art.° 202°, art.° 205° ambos da CRP, ou sempre se estará perante um manifesto e grosseiro erro de julgamento por referência aos factos provados e própria fundamentação e causa de pedir e pedido, o que tem como consequência a revogação do Acórdão Recorrido e a manutenção da improcedência do pedido formulado pela A. quanto ao pagamento de efluentes domésticos.
E) Na verdade nos presentes autos não está causa qualquer questão atinente a resíduos sólidos urbanos, mas antes o que se discute são efluentes domésticos e o facto de tais efluentes domésticos consubstanciarem matéria-prima para a A. no processamento que a A. faz dos efluentes industriais que recebe directamente do complexo industrial de Sines.
F) O Tribunal “a quo” ao revogar a decisão de primeira instância fê-lo apenas e tão só por considerar que as contrapartidas que o R. tem direito, não têm “qualquer tipo de correspectividade ou interdependência funcional que são, estritamente necessárias, para a invocação da exceptio non adimpleti contractus”- o que só pode entender-se por o tribunal ter analisado o caso como se estivesse em causa serviços de recolha, transporte e valorização de resíduos sólidos urbanos o que, como resulta à evidência da acção bem como da sentença de primeira instância nada tem que ver com o objecto do litígio porque o que se discute são efluentes domésticos.
G) Por outro lado, o Tribunal “a quo” não obstante ter entendido que o documento/”acordo” a que se faz referência sob a alínea LL) do probatório se afigurava sem interesse para a decisão da causa, o certo é que traz tal documento à colação na fundamentação do acórdão de que ora se recorre, bem como decidiu quanto ao pedido de ampliação da matéria de facto, apenas e tão só efectuado por mera cautela de patrocínio, que tal matéria não se encontrava suficientemente especificada, sendo que, ao decidir como decidiu incorreu o Tribunal “a quo” em erro de julgamento por errada interpretação e aplicação do disposto nos art.°s 636°, n° 2, 639°, n° 2 e 3, 640°, n.ºs 1, 2 e 3 todos do CPC e art.° 20°, 202° e 205º da CRP ou sempre estará em causa uma nulidade da sentença, por omissão de pronúncia nos termos do disposto no art.° 615, n° 1 al. d) e n° 4 do CPC.
H) Na verdade, resulta à evidência das Contra-Alegações de Recurso do aqui Recorrente para o tribunal “a quo” nas quais se pede a ampliação do objecto do recurso, que o Recorrente cumpriu com o ónus que sobre si impendia. - Cfr. alíneas P) e Q) das Conclusões; Cfr. pontos 77, 78, 79, 80, das Contra-Alegações de Recurso; Cfr. art.° 636° do CPC. - Cfr. ainda que no acórdão recorrido são transcritas outras conclusões das contra-alegações que não as que foram efectivamente produzidas nos presentes autos, não obstante a similitude.
I) Pelo que, também nesta sede a entender-se que o acordo a que alude a alínea LL) do probatório se revela essencial para uma correcta aplicação do direito, deve ser julgada procedente a nulidade invocada ou o erro de julgamento, cuja apreciação se requer a título subsidiário.
J) E, há questões que o R. invocou e alegou em sede contestação que não foram conhecidas pela primeira instância em face da decisão alcançada, sendo que em sede das Contra-Alegações o R. requereu ao Tribunal “a quo” que as apreciasse a título subsidiário. - Cfr. al.ªs S, T), U), V), das Conclusões e pontos 86° a 90° das Contra-Alegações.
K) No que diz respeito à matéria ínsita na supra alínea J) do presente no acórdão de que se recorre decidiu-se que o R. não deu cumprimento ao disposto no art.° 639°, n° 1 e n° 2 do CPC, o que não corresponde à verdade, tendo o Tribunal “a quo” incorrido numa errada interpretação e aplicação do citado preceito legal, e bem ainda do disposto no art.° 665° do CPC, ex vi do art.° 140° do CPTA e violou o disposto no art.° 20° da CRP, o que se invoca a título subsidiário, caso seja de entender -o que não se admite mas que se invoca por mera cautela de patrocínio - que a decisão de que ora se recorre deve ser mantida, numa primeira análise.
L) Por outro lado, a considerar-se que estão em causa relações contratuais como se considerou, sendo certo que se exige quer por força da lei quer por força do contrato de concessão celebrado entre a A. e o Estado, a redução a escrito do respectivo contrato, tendo a acção sido estruturada com base no enriquecimento sem causa (art.° 473° e seguintes do CC), declarando-se a nulidade do contrato por força do disposto nas cláusulas 6°, 10°, 32° do Contrato de Concessão, art.° 184°, 185°, art.° 133° todos do CPA, art.° 14°, n° 1 al. c), art.° 18°, art.° 284°, n° 2, art.° 285°, n° 1 todos do CCP (DL n° 18/2008), a aplicar-se o disposto no art.° 289° do CC, não menos certo é que não há lugar a qualquer restituição, porque a tal se opõe desde logo o princípio da legalidade, da proporcionalidade, da justiça, da tutela da confiança, do princípio da repartição dos benefícios, ínsitos nos art.°s 2°, 3°, 12°, n°2, 13°, 20°, 202° da CRP, conjugados ainda com o disposto nos art.°s 133°, n° 1 e n°2 al. d) e al. f), art.° 134°, n° 1, n°2 e n°3, 184°, 185°, n°3, 189°, todos do CPA então vigente, art. 14° n° 1, al. c) e art. 18°, art° 96° n° 1, alíneas e), d), f), h), art.° 97°, art.° 280°, n°3,284°, n°2,285°, n° 1, todos do CCP (aprovado pelo DL n° 18/2008, de 29/01), art.° 334° do CC, e bem ainda por força do princípio da autonomia administrativa, financeira e patrimonial do Município de Sines consagrados nos art.°s 111°, n°2, 235°, nºs 1 e 2, art.° 238° da CRP e art.° 609° do CPC.
M) Para que opere o art.° 289° do CC necessário se torna que a acção tenha sido estruturada com base no pressuposto de que a recepção dos efluentes o foi no âmbito de um contrato válido, sendo que, no caso iudicio é manifesto que a A. estruturou a causa de pedir e o pedido apenas e tão só com base no instituto do enriquecimento sem causa porque bem sabia que ao não acordar com o R. a redução a escrito do contrato sempre estava em causa a nulidade, e não obstante usufruiu dos efluentes domésticos que no caso concreto constituem matéria prima para a A. e que daí retira e retirou todos os benefícios sem contudo remunerar o R. na proporção desses benefícios -Cfr. alíneas A), B), G), Q), MM), NN), OO), PP), QQ), YY), ZZ), AAA), BBB), CCC), DDD), FFF), GGG), HHH), III), JJJ), KKK), LLL), MMM), NNN), OOO), PPP) todas do probatório.; Cfr. fundamentação da decisão de primeira instância.
N) E, a conduta da A. é ilegal e ilícita e viola o princípio da boa fé que se impõe e impede assim qualquer restituição.
- Cfr. ainda art.° 334° do CC.
O) A manutenção da decisão de que ora se recorre tem como consequência legitimar a...
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