Acórdão nº 01045/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Junho de 2017
Magistrado Responsável | FONSECA DA PAZ |
Data da Resolução | 01 de Junho de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA: RELATÓRIO A………… intentou, contra o “Hospital de S. João, EPE” e os médicos, B………… e C…………, acção administrativa comum, pedindo que estes fossem condenados a, solidariamente, pagarem-lhe a quantia de € 241.335,15, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida dos juros de mora contados à taxa legal desde a citação dos RR. até efectivo pagamento.
O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, após absolver da instância, com fundamento na sua ilegitimidade, os identificados médicos, julgou a ação parcialmente procedente e condenou o R. Hospital de S. João EPE, a pagar ao A. a quantia global de € 222.400,00, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, Tendo o R. interposto recurso desta sentença para o TCA Norte, este tribunal, por acórdão de 08/04/2016, concedeu-lhe parcial provimento, reduzindo a metade o quantum indemnizatório em que ele fora condenado.
Inconformado com tal decisão, o A. interpôs revista para este STA, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: “I.
Por douto acórdão proferido no passado dia 8 de Abril de 2016, pelo Tribunal Central Administrativo Norte, que apreciando o recurso interposto pelo aqui recorrido Hospital de S. João, E.P.E., julgou o mesmo parcialmente procedente e nessa medida alterou a sentença proferida pelo Tribunal de Primeira Instância.
II.
O tribunal de primeira instância recorde-se, havia condenado o recorrido Hospital de S. João, E.P.E., a pagar uma indemnização ao Autor, ora Recorrente, a quantia de € 222.400,00, acrescida de juros de mora desde a citação e efetivo e até integral pagamento.
III.
O Tribunal de primeira instância “formou a sua convicção relativamente à matéria de facto, tendo por base o posicionamento das partes exarado nos respetivos articulados e a documentação constante dos autos bem assim como na análise crítica de toda a prova produzida nos autos”.
IV.
Daquela decisão, entendeu o Réu Hospital de S. João, E.P.E. interpor recurso por considerar que, o Tribunal “a quo” deveria ter-se pronunciado em sentido diferente, na parte em que considerou como provados os factos constantes dos pontos 46, 47 e 49.
V.
Ou, caso assim não entendesse o Tribunal “ad quem”, e considerasse como provado que os agentes do Réu Hospital usaram de má prática clínica na intervenção cirúrgica do Autor, aqui Recorrente, efetuada no dia 20 de Abril de 2000, a indemnização arbitrada a título de danos patrimoniais e por danos não patrimoniais, fosse reduzida para metade.
VI.
O Tribunal Central Administrativo Norte entendeu, bem como entende o recorrente, que os factos considerados provados e não provados pelo Tribunal de 1ª Instância, não mereceram qualquer reparo ou alteração.
VII.
O douto Acórdão recorrido, apreciando todas aquelas questões suscitadas em sede de recurso de apelação interposto pelo Réu Hospital, decidiu que relativamente à pretensão deste atinente à alteração da matéria de facto, sob os pontos 46, 47 e 49 dos factos provados, o recurso deveria ser improcedente.
VIII.
O Tribunal Central Administrativo Norte no acórdão fundamenta a sua decisão relativamente à manutenção dos factos provados e não provados pelo Tribunal de 1ª Instância, revelando não só a sua concordância, mas acima de tudo, a análise lógica e criteriosa efetuada pelo tribunal de Primeira Instância de acordo com as regras da lógica e da experiência aplicáveis ao caso em apreço.
IX.
Contudo e pese embora aquilo que se acabou de alegar, surpreendentemente e no que respeita à pretensão do ali recorrente na redução do montante indemnizatório fixado pelo Tribunal de Primeira Instância em 50%, entendeu o Tribunal “ad quo” julgar o recurso procedente nessa parte, condenando o “Réu Hospital a pagar ao Autor o montante de €111.200,00, acrescidos de juros de mora, desde a data da citação, até integral reembolso.” X.
O presente recurso de revista, tem assim por objeto a decisão proferida pelo Tribunal Central Administrativo Norte na parte em que reduziu a indemnização fixada pelo Tribunal de Primeira Instância a liquidar ao Autor, ora Recorrente, pelo Réu Hospital em 50%.
XI.
Na verdade e ao contrário do que foi sustentado no Acórdão recorrido, afigura-se que o Tribunal Central Administrativo deveria ter também mantido a decisão proferida pelo tribunal de Primeira Instância nesta parte, tendo em conta, por um lado a prova documental junta aos autos e, acima de tudo os depoimentos das testemunhas arroladas, que depuseram sobre aquela factualidade de forma exaustiva e esclarecedora.
XII.
Pese embora o recorrente não desconheça, que a orientação jurisprudencial tem sido no sentido de considerar que o princípio da imediação impede, na prática, a sindicabilidade das decisões tomadas pela 1ª Instância em matéria de facto, aquilo que se verifica é que o Tribunal Central Administrativo Norte, fez uma incorreta “reanálise” da prova testemunhal produzida em sede de julgamento.
XIII.
Salvo o devido respeito pelo Tribunal Central Administrativo do Norte do teor do Acórdão proferido, resulta que não só o réu ali recorrente desvirtuou os depoimentos prestados, como também o próprio tribunal desvirtuou o sentido e alcance dos depoimentos prestados e aos quais fez referência no Acórdão proferido, como ignorou por completo os restantes depoimentos prestados, que se afiguram da maior importância para se estabelecer o “quantum indemnizatório” XIV.
Não se entende como foi possível ao Tribunal Central Administrativo do Norte no caso em apreço, ter decidido a partir do confronto entre dois depoimentos, a qual dos mesmos deverá ser atribuído maior valor probatório ou se quisermos, a razão pela qual considerar um e não considerar outro.
XV.
A verdade porém, é que no entender do aqui Recorrente, do depoimento das testemunhas resultou sem qualquer sombra de dúvidas que a lesão infligida ao Autor, aqui Recorrente, fruto da má prática dos Agentes do Réu Hospital, causaram naquele sequelas lesionais, funcionais e situacionais do membro superior direito e que, tais sequelas têm nefastas implicações para o seu quotidiano, passando a ser uma pessoa fisicamente diminuída, que não pode fazer esforços, quer sejam estes de lazer ou profissionais.
XVI.
O aqui Recorrente ficou com dificuldade em todas as atividades que exijam preensão com a mão direita, tendo ficado com incapacidade total para a sua profissão habitual - oficial de 1ª - não tendo, em virtude de tal, conseguido arranjar ocupação profissional. A lesão de que o Recorrente foi alvo, causa-lhe dores constantes e limitações que permanecerão para toda a sua vida, tendo em consequência desse facto deixado de fazer a vida familiar, social e profissional que tinha até à data dos factos, o que lhe causou grandes dissabores e que, culminou com o seu divórcio, passando a sentir-se vexado, amargurado, diminuído, humilhado e a sofrer de depressão - conforme factos considerados provados pelo Tribunal de Primeira Instância.
XVII.
No entender do recorrente a prova produzida em sede de audiência de julgamento, bem como a prova testemunhal junta aos autos foi suficiente para que a resposta do Tribunal Central Administrativo do Norte fosse no sentido de confirmar na íntegra, a douta sentença no sentido de considerar justo, adequado e equitativo o montante de € 182.400,00 fixado a título de indemnização por danos patrimoniais e €40.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
XVIII.
Não entende o ora Recorrente como pôde o Tribunal Central Administrativo considerar por um lado que os factos dados como provados e não provados pelo Tribunal de 1ª Instância não merecem qualquer reparo, por terem sido corretamente apreciados por este, considerando mesmo que o Réu Hospital, nas suas alegações de recurso da decisão proferida pelo tribunal de 1ª instância, desvirtua e descontextualiza a prova produzida nas sessões de julgamento e depois, alterar a decisão no que diz respeito ao quantum indemnizatório, por entender que o anteriormente fixado não respeita os princípios de equidade, fundamentando para o efeito a sua decisão em argumentos que contrariam esses mesmos factos provados (que considerou como corretamente apreciados e que entendeu não alterar).
XIX.
Nem podemos inclusivamente olvidar que, relativamente ao ponto 49 da matéria de facto dada como provada, o Tribunal Central Administrativo do Norte no acórdão por si proferido em 8 de Abril de 2016 e confirmado no acórdão ora recorrido, considerou inclusivamente que “a alteração da redacção do ponto nº 49) não teria virtualidade para contender com o sentido da decisão.” XX. Ou seja, considera aquele respeitoso Tribunal que ainda, que o ponto 49 dos factos provados - que recordemos referia que “ao estar incapacitado permanentemente e ao não poder fazer a sua vida familiar, social e profissional que tinha até à data dos factos, o Autor sente-se amargamente vexado, enxovalhado e humilhado.” - fosse alterada a sua redação, tal não alteraria o sentido da decisão.
XXI.
O Tribunal Central Administrativo do Porto fundamentou a sua decisão em reduzir em 50% o quantum indemnizatório relativo aos danos patrimoniais, por considerar que o Recorrido não tinha emprego fixo (fazia biscates) e que, nos anos de 1999 e 2000 não declarou às Finanças quaisquer rendimentos.
XXII.
Ora, se atentarmos à prova testemunhal produzida em sede de audiência e julgamento constatamos que o Tribunal Central Administrativo do Norte não poderia concluir como concluiu.
XXIII.
A verdade é que a testemunha D…………, irmão do aqui recorrente, referiu aos costumes que o Recorrente, em tempos, trabalhou com ele a fazer biscates, mas precisamente por esse motivo (o trabalho não ser certo e contínuo), tinha ido trabalhar com outras pessoas, também testemunhas no presente processo, por assegurar assim que tinha trabalho fixo.
XXIV.
Aquilo que foi referido pela aludida testemunha, a questão dos “biscates” e que “nunca tinha trabalhos fixos” não...
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