Acórdão nº 0890/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Janeiro de 2017
Magistrado Responsável | CASIMIRO GON |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.
A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………….., S.A., com os demais sinais autos, contra a liquidação de IRC relativo ao ano de 2003, por retenção na fonte, no montante de € 1.367.476,55, aquando da colocação à disposição dos dividendos que auferiu da sua participação no Banco B………., S.A.
1.2.
Termina as alegações formulando as conclusões seguintes: A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a impugnação sub judice, deduzida do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa da liquidação, por retenção na fonte efetuada no ano de 2003, à taxa de 15% prevista no art. 10º, nº 2, al. c), da Convenção entre a República Portuguesa e o Reino da Espanha para evitar a Dupla Tributação (CDT), na quantia de € 1.367.476,55, do IRC devido por dividendos pagos à impugnante, entidade residente em Espanha e aí sujeita ao imposto espanhol homólogo ao IRC e não isenta, sem estabelecimento estável em território nacional, no montante de € 9.116.510,32, com referência ao ano de 2002, por sociedade residente, em virtude da sua participação no capital desta.
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A sentença de que se interpôs recurso julgou procedente a impugnação [sentença em análise] examinando a legalidade do ato de retenção na fonte pelo seu confronto com o direito comunitário, ponderando a legislação aplicável, em particular o art. 10º da referida CDT entre Portugal e Espanha, as normas do CIRC na redação vigente à data dos factos, nomeadamente o nº 3 do art. 14º do CIRC, e o decidido pelo TJUE em dois acórdãos, proferidos nos proc.s C–199/10 e C-487/08, para concluir que, diante do direito comunitário, impunha-se ao TAF apurar se, perante a isenção de tributação sobre os dividendos distribuídos a entidades residentes no território nacional, existia (ou não) anulação da referida tributação em Espanha (seja por via da CDT, seja pelo tratamento que lhe é dado pelo equivalente espanhol do IRC).
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No que concerne aos juros indemnizatórios peticionados, a sentença considera que o ato de retenção impugnado encontrar-se-ia afetado de erro imputável aos serviços, porque o contribuinte teria seguido “um normativo, constante de Código Tributário, [violador] de princípio do direito comunitário”, situação em que “não deve ficar mais desprotegido do que ficaria se seguisse meras orientações administrativas”, condenou a Fazenda Pública no pagamento de juros indemnizatórios sobre a quantia retida desde 29.04.2003 até efetivo pagamento.
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Ora com o assim decidido, e salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública, conformar-se, existindo erro sobre os pressupostos de direito da decisão proferida na impugnação sub judice, em termos que afetam irremediavelmente a validade substancial da sentença, pelas razões que passa a explanar.
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Se para efeito de utilização do pedido de revisão oficiosa nos termos do art. 78º da LGT cabia fazer apelo ao conceito de erro imputável aos serviços, porque a tal erro estava equiparado o erro na autoliquidação e, segundo a sentença, por identidade de razões, o erro na retenção na fonte, para efeito de atribuição de juros indemnizatórios ao abrigo do art. 43º da LGT já não se pode defender que o ato de retenção estivesse de algum modo afetado de erro imputável aos serviços, pois essa equiparação já não encontra no art. 43º da LGT norma que a sustente equiparável à do nº 2 do art. 78º.
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A ficção do nº 2 do art. 78º da LGT não vale para outros efeitos, designadamente para determinar direito a juros indemnizatórios - cfr., designadamente, o acórdão desse Colendo STA tirado em 06.10.2005 no proc. 536/07, citado em acórdão de 18.11.2015, proc. 01509/13.
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Daí que, ao contrário do que declara a sentença não se esteja perante um erro imputável aos serviços para efeitos do nº 1 do art. 43º da LGT, nem cabe reconhecer o direito a juros indemnizatórios ao abrigo dessa norma.
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Prevalece aqui o conceito de que nos casos de autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta “tanto a determinação da matéria coletável como a liquidação são levados a cabo pelo próprio contribuinte ou por substituto, pelo que estará afastada, em regra, a possibilidade de existir erro imputável aos serviços da Administração Tributária, no momento em que são praticados os atos que determinam a quantia a pagar”, conforme esclarece Jorge Lopes de Sousa, in CPPT Anotado e Comentado, 6ª ed., em nota 6-a) ao art. 61º.
I. Não é indiferente para o contribuinte impugnar ou não os atos de liquidação dentro dos respetivos prazos, pois em caso de anulação em processo impugnatório, judicial ou administrativo, pode ser invocada qualquer ilegalidade e há direito a juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido até à emissão da nota de crédito, nos termos dos art.s 43º, nº 1, da LGT e 61º, nº 5, do CPPT, J. enquanto nos casos de revisão oficiosa da liquidação, quando não é feita por iniciativa do contribuinte no prazo de reclamação administrativa, apenas haverá direito a juros indemnizatórios nos termos do art. 43º, nº 3, da LGT - entendimento vertido no acórdão desse Colendo STA mencionado na sentença recorrida, datado de 12.03.2012, proc. 01007/11, que indica ser seguido também por Casalta Nabais.
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A circunstância de que o emprego da revisão oficiosa por iniciativa da Administração Tributária a pedido do contribuinte enquanto meio complementar dos meios impugnatórios, por decurso dos prazos previstos para utilização destes meios, comporta a penalização da negligência do interessado aqui impugnante em empregar os meios impugnatórios dentro dos respetivos prazos, L. levando a que o prolongamento dos efeitos prejudiciais dos atos alvo do pedido de revisão se prolongassem por motivos imputáveis a essa negligência ou inércia, não merecendo a tutela do direito a juros indemnizatórios do indevidamente pago no período em que a lei considera que o interessado se deixou submeter a esses efeitos - dormientibus non succurrit jus (cfr. Jorge Lopes de Sousa, ob. cit., em nota 14)-b) ao art. 61º).
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E a esta conclusão não obsta que o pedido do contribuinte de revisão oficiosa por iniciativa da Administração Tributária, tacitamente indeferido, só tenha vindo a ser atendido judicialmente, pela sentença proferida na impugnação em apreço, porque esta meio impugnatório foi desencadeado por causa e com fundamento no indeferimento tácito daquela revisão oficiosa pedida enquanto meio complementar, N. subsistindo aqui, nesta sede, as razões pelas quais a tutela do direito a juros indemnizatórios do indevidamente pago, em princípio, só deveria ser concedida a partir do momento em que a lei considera que a Administração entrou em incumprimento do dever de decidir o pedido, sob pena de subversão da coerência normativa apontada pela doutrina citada.
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Por outro lado, não é porque o ato de liquidação veio a ser anulado por decisão proferida em impugnação judicial do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa por iniciativa da Administração Tributária a pedido do contribuinte que deixam de valer aqui os motivos pelos quais a lei não reconhece direito a juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido até à emissão da nota de crédito, nos termos dos art.s 43º, nº 1, da LGT e 61º, nº 5, do CPPT, mas apenas nos termos do art. 43º, nº 3, da LGT, conforme a orientação jurisprudencial seguida nesse sentido indicada no referido acórdão desse Colendo STA tirado em 12.03.2012.
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No entanto, a Fazenda Pública propugna que, dados os contornos do caso e dos termos em que a sentença decidiu, a atribuição de juros indemnizatórios não pode sequer ter apoio na al. c) do nº 3 do art. 43º, que protela o termo inicial da contagem do prazo pelo qual são devidos juros para depois de um ano do pedido de revisão quando esta tenha desencadeada por iniciativa do contribuinte.
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É que, mesmo na sequência (de) pedido do contribuinte de que revisão oficiosa nas condições de iniciativa da Administração Tributária, esta não poderia decidir pela desconformidade do ato de retenção com a lei.
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Veja-se que, segundo o decidido pelo TJUE em dois acórdãos, proferidos nos proc.s C-199/10 e C-487/08, o direito comunitário impõe que sejam os órgãos jurisdicionais dos Estados-membros que promovem o reenvio verificar se a legislação nacional do Estado-Membro de residência da sociedade beneficiária dos rendimentos a quem foi retido imposto na fonte a tarefa de verificar se o imposto retido na fonte pode ser imputado no imposto devido nesse Estado-Membro de residência até ao montante dessa diferença de tratamento, S. ie, averiguar se a diferença de tratamento entre os dividendos distribuídos a sociedades estabelecidas noutros Estados-Membros e os dividendos distribuídos às sociedades residentes desaparece totalmente.
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Assim, o Tribunal a quo assumiu a resolução da questão de averiguar se, perante a isenção de tributação sobre os dividendos distribuídos a entidades residentes no território nacional, existia (ou não) anulação da referida tributação em Espanha (seja por via da CDT, seja pelo tratamento que lhe é dado pelo equivalente espanhol do IRC), confrontando os factos com a lei portuguesa e a lei espanhola e considerando a eventual imputação do IRC retido no apuramento do imposto congénere espanhol, mas esta resolução ou tarefa não era exigível à Administração Tributária.
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À luz do direito comunitário, tal como declarado pelos ditos acórdãos do TJUE, entre outros, a apreciação da conformidade de um tal ato de retenção é casuística e faz-se pela invocação do direito do Estado-membro da residência do beneficiário dos rendimentos, a fim de verificar da neutralização da diferença de tratamento fiscal dos dividendos distribuídos a entidade não residente em face daquele aplicável às residentes em território nacional.
V. Tal como referido em acórdão desse Colendo STA de 04.03.2015...
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