Acórdão nº 0449/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Março de 2017
Magistrado Responsável | CASIMIRO GON |
Data da Resolução | 15 de Março de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1.
A Fazenda Pública interpõe recurso da sentença do TAF de Loulé que julgou procedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de IRS do ano de 2006, por A………… e B………… (na sequência de indeferimento de recurso hierárquico apresentado contra indeferimento de reclamação graciosa) e anulou a decisão da Administração Tributária de revogação da decisão proferida na reclamação, determinando que a liquidação fosse efectuada nos exactos termos que resultaram da decisão de deferimento, proferida em 17/06/2010, pelo Director de Finanças de Faro.
1.2.
Apresentou as seguintes conclusões das suas alegações: 1. A douta sentença recorrida considerou procedente a acção interposta pelos impugnantes considerando que a AT violou o art. 141° do CPA no que respeita ao despacho de reforma de decisão anterior de deferimento proferida em Reclamação Graciosa pelo Director de Finanças de Faro; 2. Fundamentou-se tal decisão na possibilidade legal de revogação de actos administrativos em matéria tributária prevista no art. 79° da LGT e verificando que nem aquela Lei Geral Tributária nem o CPPT “contêm qualquer norma sobre o prazo para a aludida revogação, pelo que o mesmo só pode ser o constante das regras do CPA — diploma que constitui legislação complementar e subsidiária ao direito tributário (...) e que devem ser aplicadas no direito tributário de acordo com a natureza do caso omisso, mais precisamente as regras que diretamente regulam a revogação dos atos administrativos nos arts. 136° e segs.” 3. Vem depois a sentença recorrida entender que “(...) o processo tributário encontra-se especialmente regulado no CPPT só sendo admissível recorrer às normas previstas no CPTA nos termos do disposto na al. c) do art. 2° do CPPT, quando a solução não esteja prevista, ou nos casos em que o legislador expressamente remeter para aquelas.” 4. Nesta ordem de ideias, a douta sentença recorrida conclui que o prazo de 15 dias previsto no n° 2 do art. 102° do CPPT é o de maior amplitude temporal que permitia o recurso judicial do acto decisório de uma reclamação graciosa, pelo que, tendo a decisão revogada ocorrido em 2010-06-21 e o acto de revogação em 2010-07-06, este último é ilegal; 5. Concorda-se plenamente com o teor da fundamentação reproduzida da conclusão 2ª supra; 6. Não concordamos é com a interpretação segundo a qual, uma vez aplicado o art. 141° do CPA, considerar-se que o prazo para o recurso judicial é o da impugnação do indeferimento de reclamação graciosa previsto no CPPT, isto é, o prazo de 15 dias; 7. Citando as notas ao art. 79° da LGT in “Lei Geral Tributária Anotada” de Guerreiro, António Lima, Editora Rei dos Livros, Lx, 2001, pp. 349 351, diz a nota 1: “O presente artigo declara a aplicabilidade à decisão do procedimento tributário, seja qual for a sua natureza, dos institutos da revogação, reforma, ratificação, conversão e rectificação dos actos administrativos em geral.” 8. Por sua vez, a nota 3 ao mesmo artigo entende: “Os actos administrativos em matéria fiscal que sejam constitutivos de direitos, só podem, pois, ser revogados com fundamento em invalidade, nos termos e prazos do artigo 141° do CPA. Esse prazo que é de um ano, é o do recurso contencioso do Ministério Público dos actos administrativos com fundamento em ilegalidade (artigo 28°, número 1, alínea c) da LPTA e prevalece sobre o prazo de caducidade do direito de liquidação previsto nos artigos 45° e 46° da presente lei.” 9. Ora, actualmente, a LPTA foi substituída pelo CPTA, sendo que o actual art. 58° n° 1 a) deste Código prevê que o prazo de impugnação de actos anuláveis é de um ano se promovida pelo Ministério Público.
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Nos termos do art. 141° n° 2 do CPA, se houver prazos diferentes para o recurso contencioso, atender-se-á ao que terminar em último lugar.
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Verifica-se que a douta decisão recorrida bem se socorreu desta norma da legislação complementar, ex vi art. 2° alínea c) da LGT (e não art. 2° do CPPT, conforme decidido, uma vez que a norma sobre prazo cuja lacuna se pretende integrar é o art. 79° da LGT).
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Não obstante, a sentença recorrida não aplicou os prazos previstos para o contencioso administrativo conforme a previsão da norma do direito complementar de que se socorreu, voltando outrossim, a aplicar os prazos previstos no CPPT.
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Subscreve-se o mui douto entendimento exposto no Acórdão do STA de 2013-05-15, proferido no Proc. n° 0566/12; 14. Ao optar pela aplicação das regras de direito administrativo para regular a revogação da decisão de deferimento proferida em reclamação graciosa, a Mm.ª Juiz a quo devia aplicar aquele regime em bloco qual seja o art. 141° do CPA conjugado com o art. 58° do CPTA. Não o tendo feito, incorreu em erro de julgamento, resultando violadas aquelas disposições legais.
Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da sentença recorrida.
1.3.
Não foram apresentadas contra-alegações.
1.4.
O MP emite Parecer nos termos seguintes: «1. Vem o presente recurso interposto da sentença de fls. 73 e seguintes, que julgou procedente a acção de impugnação judicial e anulou a decisão da administração tributária de revogação de decisão proferida em sede de reclamação e determinou que a liquidação fosse efectuada de acordo com a anterior decisão de deferimento da mesma.
Para o efeito e invocando o entendimento sufragado por António Lima Guerreiro, em anotação ao artigo 79° da Lei Geral Tributária (in “LGT Anotada”, editora Rei dos Livros, Lx., 2001, pp. 349/351), alega a Recorrente Fazenda Pública que o referido preceito legal consagra a aplicação à decisão do procedimento tributário, seja qual for a sua natureza, dos institutos da revogação, reforma, ratificação, conversão e rectificação dos actos administrativos em geral. E de acordo com o artigo 141º do CPA, conjugado com o disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 58º do CPTA, o prazo de revogação dos actos administrativos em matéria fiscal é de um ano (prazo de recurso concedido ao Ministério Público).
Conclui a Recorrente que a sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação da lei, motivo pelo qual pugna pela sua revogação.
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Na sentença recorrida deu-se como assente, entre outras coisas, que em 15/03/2010 os aqui recorridos apresentaram reclamação graciosa contra o acto de liquidação de IRS do ano de 2006, a qual foi objecto de decisão de deferimento proferida pelo director de finanças de Faro, datada de 17/06/2010, e notificada aos ali reclamantes através de carta registada remetida em 18/06/2010.
E em 17/09/2010 foi proferida nova decisão pelo director de finanças de Faro, reformando a anterior decisão, deferindo apenas parcialmente aquelas reclamações na parte relativa ao estado civil de casados e indeferindo na parte restante, a qual foi notificada aos reclamantes em 27/09/2010.
Desta decisão foi interposto recurso hierárquico, ao qual foi negado provimento, por despacho da senhora directora de serviços, datado de 20/12/2010, e notificado aos interessados através de ofício que lhe foi remetido em 04/01/2011. E do indeferimento deste recurso foi apresentada em 07/04/2011 a impugnação judicial que deu origem aos presentes autos.
Para se decidir pela procedência da acção de impugnação judicial a Mma. Juiz “a quo” considerou que o meio adequado para impugnar contenciosamente o indeferimento da reclamação graciosa era a impugnação judicial, cujo prazo é de 15 dias, nos termos do artigo 102º, nº 2, do CPPT. E seria neste prazo que a administração tributária podia reformar a decisão de deferimento da reclamação, que configurava um acto constitutivo de direitos, nos termos dos artigos 136º e 141°do CPA. Tendo sido ultrapassado o referido prazo, a reforma daquela decisão já não era possível, motivo pelo qual concluiu que a decisão proferida a 17/09/2010 pelo senhor director de finanças de Faro padecia do vício de ilegalidade.
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A questão que se coloca é a de saber qual é o prazo de revogação de decisão de deferimento de reclamação graciosa interposta contra um acto de liquidação de IRS, na qual foi deferida a pretensão dos contribuintes.
A questão que se coloca prende-se com a legalidade da decisão do senhor director de finanças de Faro que revogando uma anterior decisão...
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