Acórdão nº 0795/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Março de 2017
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 29 de Março de 2017 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A………….., melhor identificada nos autos, inconformada com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 27/03/2014, exarado a fls. 899/932, proferido no processo nº 06537/13 que julgou improcedente a impugnação por ela deduzida na qualidade de revertida e responsável tributária da sociedade B……………., SA, contra a liquidação adicional de IRC e juros, no montante global de 4.988.997,52€, veio ao abrigo do disposto na alínea b) do nº1 do artigo 27º do ETAF, e nos artigos 280º, 282º e 284.º do CPPT, interpor recurso para o Pleno do Contencioso deste Tribunal por considerar que tal decisão está em oposição, com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 17 de Janeiro de 2012, proferido no âmbito do processo nº 05039/11.
2 – A recorrente também veio requerer a reforma do acórdão invocando para o efeito que o acórdão recorrido está em contradição com a decisão proferida pelo acórdão do TCA Sul de 17 de Janeiro de 2012, no processo nº 05039/11 que anulou a liquidação em virtude do reinvestimento efectivamente ocorrido referente à mesma sociedade.
Porém, por acórdão de 16-10-2014, a fls. 1000/1003 o Tribunal Central Administrativo Sul indeferiu o referido pedido de reforma do acórdão.
3 – Por despacho de 17 de março de 2015, a fls. 1044 dos autos, o Exmº Relator do TCA Sul veio admitir o recurso por oposição de acórdãos interposto pela recorrente através das alegações de recurso de fls. 1015/1034, por considerar haver decisões contraditórias sobre a mesma questão fundamental de direito, determinando a notificação das partes para proferirem as alegações de recurso nos termos do artº 284º, nº5 do CPPT.
4 - A recorrente veio apresentar a fls. 1053/1089 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões: «
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Vem o presente recurso interposto do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul no recurso identificado em epígrafe (Acórdão-Recorrido), com fundamento em oposição de julgados com o Acórdão também do mesmo Tribunal Central, de 17 de Janeiro de 2012, proferido no processo n.º 05039/11, e já junto aos presentes Autos a fls-. 946 a 971 (Acórdão-Fundamento).
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Oposição já demonstrada pela Recorrente perante o Tribunal a quo, o qual julgou categoricamente existir a referida contradição — cfr. a fls. 1049 dos Autos — tendo, nessa medida, sido notificada a Recorrente para, querendo, apresentar as suas alegações nos termos do artigo 284, n° 5, do CPPT.
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Sucede que a ora Recorrente já tinha requerido ao Tribunal a quo a inutilidade superveniente da instância por extinção do seu objecto, tendo, todavia, tal tribunal entendido já se encontrar esgotado o seu poder jurisdicional uma vez proferido o Acórdão-Recorrido.
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Tal não impede, muito pelo contrário, a verificação in casu de inutilidade superveniente da lide por extinção do seu objecto, o que se alega de seguida a título de QUESTÃO PRÉVIA nas presentes alegações.
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Efectivamente, o Tribunal Central Administrativo Sul decretou, no Acórdão-Fundamento, a anulação da liquidação adicional subjacente ao presente processo — liquidação adicional de IRC de 2002 n.º 20078310014020 — tendo a mesmo sido já anulada pela AT, tal como resulta de certidão junta como doc. n.º 1 em anexo à alegação tendente a demonstrar a oposição e que ora se junta em anexo para maior facilidade de exame.
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Ou seja, e na presente data, não só se encontra juridicamente consolidada na ordem jurídica a ilegalidade material da liquidação adicional subjacente aos presentes Autos, como a própria liquidação de imposto em crise foi anulada.
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Como é sabido, a instância extingue-se com a impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide. Ora, «há a extinção da instância por impossibilidade da lide, ou porque se extinguiu o sujeito, porque se extinguiu o objecto ou porque se extinguiu a causa» — cfr. Alberto dos Reis (Coimbra, 1982) Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 3.ª Edição, p. 393 (cit., sublinhado nosso).
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É precisamente pelo facto de o objecto se encontrar extinto que que a Fazenda Pública não chegou a apresentar qualquer alegação tendente a demonstrar a inexistência de oposição, reconhecendo (nem que seja a titulo tácito e implícito) essa evidência.
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Note-se que mesmo se extinguindo a instância nunca se poderá ter como consolidada na ordem jurídica a decisão a quo posto que recaiu sobre um objecto inexistente (it., um imposto já anulado à data da sua prolação).
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A responsabilidade pelas custas só poderá ficar a cargo da Recorrida uma vez que foi a AT quem deu causa — com a emissão de uma liquidação de imposto ilegal, entretanto anulada — à presente acção, sendo este o sentido da Lei — artigo 536, n.º 3, do CPC (anterior 450.°) — e a posição unânime da jurisprudência fiscal em casos de inutilidade superveniente da lide. Por todos, vide o recente Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 13 de Agosto de 2014, proferido no processo n.º 0828/14.
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No presente caso pretender que as custas ficassem a cargo da ora Recorrente seria um absoluto atropelo à mais elementar justiça; desde logo (i) porque, como vimos, foi a AT quem deu azo a todo este processo ao emitir a liquidação, reverter o processo de execução, e notificar a ora Recorrente da liquidação; (ii) depois, porque essa liquidação foi entretanto anulada judicialmente por a mesma ser ilegal.
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De resto todo este processo tem sido verdadeiramente kafkiano na medida em que a Recorrente foi revertida num processo de execução de uma dívida de uma sociedade que pouco ou nada conhecia, tendo sido obrigada a apresentar a presente impugnação da liquidação (que viria a ser julgada procedente na primeira instância mas depois alterada pela segunda instância) e ainda deduzir oposição à execução, processo que correu junto do TT de Lisboa com o n.º 2048/09.0 BELRS, e no qual foi decretada a inutilidade superveniente da lide precisamente por anulação do imposto (cfr. doc. n.º 2 em anexo).
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Tudo isto num processo onde a liquidação em causa ascende (ou melhor, ascendia) a praticamente 5 milhões de Euros podendo determinar um valor de custas absolutamente incomportável para a ora Recorrente (que é uma pessoa singular, viúva e praticamente sem rendimentos...).
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Em todo o caso, e caso assim não se entenda, com a presente peça processual, a Recorrente vem também demonstrar que entre o Acórdão-Recorrido e o Acórdão-Fundamento do presente recurso — Acórdão do TCA Sul, de 17 de Janeiro de 2012, proferido no processo n.º 05039/11 e que consta dos Autos a fls. 946 a 971 — existe manifesta oposição, e que este último aresto subscreveu a solução legalmente adequada e justa ao contrário do Acórdão-Recorrido.
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Quanto ao requisito da oposição atinente à identidade de situações de facto e da questão de direito em causa, veja-se que ao Acórdão-Fundamento e ao Acórdão-Recorrido subjazem não só a mesma situação fáctica como, adiante-se, a mesma questão de direito.
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Com efeito, (i) É a mesma sociedade a que respeita a liquidação e dívida de imposto — B……….. SGPS; (ii) É a mesma dívida de imposto — IRC de 2002 — que tem na origem a mesma liquidação adicional de IRC — n.º 20078310014020 — que foi revertida à ora Recorrente; (iii) São os mesmos fundamentos para tributar — não ter existido, alegadamente, reinvestimento da mais-valia obtida em 1999 — assentes no mesmo Relatório de Inspecção Tributária; (iv) É a mesma a questão jurídica em confronto — ter, ou não, existido reinvestimento em 2000 daquela mais-valia obtida em 1999, e a relevância dos documentos societários que o atestam.
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Vale assim dizer, e em suma, que em ambos os processos, o sujeito passivo inicial é o mesmo (sociedade B……………… SGPS) e o que se discute é a uma — e mesma — coisa: o reinvestimento em 2000 da mais-valia obtida em 1999.
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Verificado este primeiro requisito, constata-se que ante a mesma situação fáctica e perante a mesma questão de direito, o Tribunal a quo decidiu em sentido absolutamente díspar e contraditório ao que julgou o Acórdão-Fundamento.
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Em concreto, o Acórdão-Fundamento pronuncia-se pela anulação do acto tributário em causa por considerar que a posição da AT e da Fazenda Pública — de que não se encontrava demonstrado o reinvestimento previsto no Código do IRC — é contrária aos factos e à Lei Fiscal à data dos factos.
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Ao passo que o Acórdão-Recorrido sustenta o contrário, mantendo o acto tributário impugnado pela ora Recorrente, por julgar não verificado o referido vício de violação de lei.
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Em particular, em ambos os processos analisou-se a verificação, ou não, de reinvestimento da uma — e a mesma — mais-valia apurada pela B……….. SGPS em 2000, tendo a Recorrente sempre sustentado que o reinvestimento tinha efectivamente ocorrido, o que foi, aliás, confirmado pela Inspecção-Geral de Finanças e como foi, igualmente, e reconhecido no Acórdão-Fundamento.
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Efectivamente, foi este o entendimento adoptado pelo TCA Sul no Acórdão-Fundamento e, contraditoriamente, negado no Acórdão- Recorrido, estando em causa o mesmo enquadramento normativo, a saber o artigo 44.º do Código do IRC, na redacção à data dos factos.
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Da análise do último dos requisitos para que se conclua no sentido da verificação de oposição entre o Acórdão-Fundamento e o Acórdão-Recorrido, o qual se prende com a necessidade de que a situação impugnada não esteja em sintonia com a jurisprudência consolidada do STA, afigura-se claro que a posição assumida pelo acórdão-recorrido, no que respeita à interpretação do artigo 44.º do Código do IRC, não se mostra conforme a jurisprudência consolidada do STA o que se conclui perante a constatação de que o Acórdão-Fundamento, que data de 2013, é do TCA Sul e consagra posição totalmente oposta nunca se referindo o primeiro a jurisprudência do STA.
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Ante o exposto, mostra-se demonstrado o preenchimento de todas as condições de que depende a conclusão pela existência de oposição entre o Acórdão-Recorrido e o...
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